terça-feira, 27 de setembro de 2016

SÃO VICENTE DE PAULO, O ALQUIMISTA


Por Francisco José dos Santos Braga




São Vicente de Paulo, piedoso filantropo e alquimista


I.  INTRODUÇÃO



O texto que será reproduzido abaixo foi extraído do livro "As Mansões Filosofais", por Fulcanelli, um dos mais generosos autores que se propuseram a expor aos estudiosos a difícil arte da concretização do "opus magnum" ou grande obra alquímica. 

Entre 1922 e 1923, após receber o Dom de Deus, o sábio e alquimista Fulcanelli produziu a Pedra Filosofal e operou uma transmutação de 100 gramas de chumbo em ouro no laboratório da fábrica de gás de Sarcelles, na presença do pintor Julien Champagne (1877-1932) e do químico Gaston Jean-Baptiste Sauvage (1897-1968).

Fulcanelli desapareceu pouco antes da publicação do seu primeiro livro intitulado "O Mistério das Catedrais" (1926) e só voltou a aparecer ao seu discípulo Eugène Canseliet em 1953, na cidade espanhola de Sevilha. Em 1930, foi lançado o segundo livro de Fulcanelli intitulado "As Mansões Filosofais", donde extraí o trecho abaixo em que o protagonista é São Vicente de Paulo, consistindo de duas epístolas de sua autoria, sendo a primeira de 24/06/1607 e a segunda datada de janeiro de 1608, ambas endereçadas ao Sr. De Comet, advogado no tribunal presidial de Dax. A minha escolha da passagem que tem esse ilustre personagem como protagonista deve-se ao meu desejo de prestar homenagem a este santo católico e respeitado alquimista, falecido em Paris em 27 de setembro de 1660 portanto, na data de hoje é lembrado e reverenciado pela cristandade e venerado como fundador de quatro instituições voltadas para a caridade: a "Confraria das Damas da Caridade", os "Servos dos Pobres", a "Congregação dos Padres da Missão", conhecidos como padres lazaristas, em 1625 e, principalmente, as "Filhas da Caridade", em 1633. Inspirada na sua doutrina, temos no Brasil a SSVP-Sociedade de São Vicente de Paulo que segue a regra da Confederação Internacional da SSVP e cuja ação é muito profícua entre nós.

Fulcanelli (1839-1953), pseudônimo de um alquimista francês contemporâneo cujo verdadeiro nome ainda é objeto de debates e controvérsias, foi o Mestre de Eugène Canseliet desde 1915, razão por que este foi escolhido para ser o autor do prefácio da primeira edição de "As Mansões Filosofais" (1930) e das duas seguintes (1958 e 1965) da mesma obra. Esse discípulo predileto também seria mais tarde agraciado com o privilégio de autoria do prefácio da primeira e terceira edições de "O Mistério das Catedrais" (1925 e 1964).

Canseliet, além de ser um excelente divulgador das obras de seu Mestre, escreveu também magníficas obras de sua autoria: "A Alquimia explicada sobre os Textos clássicos", "Três antigos Tratados de Alquimia", "As doze Chaves da Filosofia" pelo irmão Basile Valentin e com tradução, introdução, notas e explicação das imagens por Canseliet, etc. 

A alquimia influenciou principalmente duas ciências contemporâneas, podendo dizer que se saíram altamente favorecidas com a sua influência: a química, que, por seu método científico e por ter determinado o seu campo experimental, praticamente sucedeu a alquimia no que se convencionou chamar de "laboratório alquímico" necessário para a transformação paulatina da prima matéria; e a psicologia, especialmente através de Jung que extraiu importantes conclusões e fixou seu método de análise psicológica através da comparação desta disciplina com a alquimia.

É claro que, além dos conceitos tipicamente químicos atualmente conhecidos, a alquimia ia além da química através de sua filosofia chamada "hermética", nome derivado de Hermes (Mercúrio), que era o principal símbolo da substância que é transformada durante o processo alquímico. [FRANZ, 1998, 15] definiu bem essa correspondência existente entre a alquimia e a química: 
"A alquimia é uma ciência natural que representa uma tentativa de entendimento de fenômenos materiais de natureza; é um misto da física e da química desses tempos remotos e corresponde à atitude mental consciente daqueles que a estudaram e se concentraram no mistério da natureza, em especial dos fenômenos materiais. Também é o princípio de uma ciência empírica." 
Àqueles leitores que porventura ainda não estejam familiarizados com a alquimia e sua terminologia, devo informar que Carl Gustav Jung, grande psicólogo, se sentiu profundamente atraído pela alquimia, que principalmente a partir de 1928 passaria a ser tema recorrente em suas pesquisas e publicações. Esse autor, em entrevista com Mircea Eliade em agosto de 1952, afirmou que 
"a alquimia representa a projeção em laboratório de um drama ao mesmo tempo cósmico e psicológico." 
Daí Jung extraiu sua hipótese de uma metáfora alquímica, dado que a alquimia sempre ocupou um lugar de destaque na vida de Jung seja pelo número quanto pela importância dos livros dedicados a esse tema. A partir de seu trabalho de comparação, foi o primeiro que mostrou que o simbolismo alquímico conserva ainda hoje um significado vital e que a verdade dos antigos alquimistas lançam luzes sobre fatos e processos descobertos no âmbito de uma psicologia marcadamente empírica. É assim que todos os estágios psíquicos ligados ao processo de individuação foram vistos por Jung a partir dos estágios alquímicos, inclusive o próprio processo de análise. Depois de Jung, muitos estudiosos também se serviram desta metáfora alquímica para estudar, descrever, explicar e desenvolver os estágios do processo de individuação. 

Segundo [PEREIRA, 1992, 117-118], Sabina Spielrein deu uma indicação de que, por volta de 1912, Jung teve contato com a figura do alquimista Zózimo que, a partir daí, iria desempenhar importante papel na interpretação junguiana da alquimia.  Outro contato importante de Jung com a alquimia deu-se em 1928 através da leitura do Segredo da Flor de Ouro, texto esotérico taoísta chinês traduzido para o alemão por Richard Wilhelm, que o enviou naquele mesmo ano para que Jung fizesse dele uma apreciação. A partir daí Jung passou a estudar alquimia com afinco, estendendo-se esse estudo por quase quinze anos antes que ele se decidisse a publicar algo a respeito do tema. A bibliografia de Jung é ampla, abrangendo Estudos Alquímicos (1943), Psicologia e Alquimia (1944), Aion-Estudos sobre o Simbolismo do Si-mesmo (1951), Mysterium Coniunctionis (1955), etc. e mostra a vastidão da documentação pesquisada por Jung.







II.  TRECHOS DE DUAS EPÍSTOLAS DE  SÃO VICENTE DE PAULO IN [FULCANELLI, 1965, 106-111]




"(...) Entre os alquimistas que utilizaram o ouro para o aumentar, com o auxílio de fórmulas que os conduziram ao êxito, citaremos o padre veneziano Pantheus: Naxágoras, autor da Alchymia denudata (1715); De Locques; Duclos; Bernardo de Labadye; José de Chesne, barão de Morancé, médico ordinário do rei Henrique IV; Brás de Vigenère; Bardin, do Havre (1638); Mademoiselle de Mattinville (1610); Yardley, inventor inglês de um processo transmitido a um luveiro de Londres, Garden, em 1716, depois comunicado por Fernando Hockley ao doutor Sigismundo Bacstrom, e que foi objecto duma carta deste a L. Sand, em 1804; por fim, o piedoso filantropo S. Vicente de Paulo, fundador dos Padres da Missão (1625), da congregação das Irmãs da Caridade (1634), etc.

Seja-nos permitido determo-nos um instante nesta grande e nobre figura, bem como no seu labor oculto, em geral ignorado.

Sabe-se que, no trajecto de uma viagem que fez de Marselha a Narbona, S. Vicente de Paulo foi aprisionado por piratas barbarescos e levado cativo para Túnis. Tinha então vinte e quatro anos. ¹ Asseguram-nos também que conseguiu trazer o seu último amo, um renegado, ao seio da Igreja, que regressou a França e estacionou em Roma, onde o papa Paulo V o recebeu com muita deferência. É a partir desse momento que empreendeu as suas fundações piedosas e instituições caritativas. Mas o que se livram bem de nos dizer é que o Pai das crianças abandonadas, como lhe chamavam em vida, tinha aprendido alquimia, como lhe chamavam em vida, tinha aprendido alquimia durante o seu cativeiro. Assim se explica, sem que seja necessária intervenção milagrosa, que o grande apóstolo da caridade cristã tenha tido meios para realizar as suas numerosas obras filantrópicas. ²  Era, aliás, um homem prático, positivo, resoluto, não descurando os seus negócios, nada sonhador nem propenso ao misticismo. De resto, uma alma profundamente humana, sob a aparência rude de homem activo, tenaz, ambicioso.

Há duas cartas dele muito sugestivas no referente aos seus trabalhos (al)químicos. A primeira, escrita ao Sr. De Comet, advogado no tribunal presidial de Dax, foi publicada várias vezes e analisada por Jorge Bois, em Le Péril occultiste (Paris, Victor Retaux, s. d.). Foi escrita de Avinhão e datada de 24 de junho de 1607. Extraímos desse documento, que é bastante longo, a passagem referente ao momento em que Vicente de Paulo, tendo terminado a missão que o levara a Marselha, se prepara para voltar a Toulouse: 
"(...) Estando prestes a partir por terra, fui persuadido por um fidalgo com quem estava alojado a embarcar com ele até Narbona, dado que o tempo era a favor; o que eu fiz, mais para lá estar e para poupar, ou, melhor dizendo, para lá não estar nunca e perder tudo. O vento foi-nos tão favorável que teríamos chegado nesse mesmo dia a Narbona, que ficava a cinquenta léguas, se Deus não permitisse que três bergantins turcos que rondavam a costa do golfo de Lião (para apresar os barcos que vinham de Beaucaire, onde havia feira, que se considera ser uma das mais belas da cristandade) nos tivessem dado caça e atacado tão vivamente que dois ou três dos nossos estão mortos e todos os outros feridos, e mesmo eu, que recebi um frechada que me servirá de relógio todo o resto da minha vida, não fôssemos constrangidos a entregar-nos a esses larápios, e piores que tigres; cujos primeiros acessos de raiva foram retalhar o nosso piloto em mil pedaços por terem perdido um dos seus principais, além de quatro ou cinco forçados que os nossos lhes mataram. Feito isto, acorrentaram-nos, depois de nos terem agredido grosseiramente, prosseguindo a sua façanha, fazendo mil roubalheiras, dando contudo liberdade àqueles que se rendiam sem combater, depois de os terem roubado; e por fim, carregados de mercadoria, ao cabo de sete ou oito dias, tomaram a rota da Beberia, covil e valhacouto de ladrões sem o abono do Grão Turco, onde ao chegar nos expuseram à venda com relato verbal da nossa captura, que eles diziam ter sido feito num navio espanhol, porque sem essa mentira teríamos sido libertados pelo cônsul que o Rei lá tem para tornar livre o comércio aos Franceses. O processo que usaram para a nossa venda foi que, depois de nos terem despido todos nus, nos entregaram a cada um um par de bragas, um blusão de linho, com um capuz; passearam-nos pela cidade de Túnis, onde tinham vindo para nos vender. Tendo-nos feito dar cinco ou seis voltas à cidade, de cadeia ao pescoço, levaram-nos outra vez para o barco, a fim de que os mercadores viessem ver quem podia comer, e quem não podia, para mostrar que as nossas chagas não eram mortais. Feito isto, levaram-nos outra vez para a praça, onde os mercadores vieram visitar-nos de igual modo ao que se faz para a compra de um cavalo ou de um boi, fazendo-nos abrir a boca para examinar os nossos dentes, palpando-nos as costelas, sondando as nossas chagas, e fazendo-nos caminhar a passo, trotar ou correr, depois carregar com fardos, depois lutar para ver a força de cada um, e mil outras espécies de brutalidades.
Eu fui vendido a um pescador, que foi constrangido a desfazer-se de mim sem demora, por nada me ser mais contrário que o mar, e depois vendido pelo pescador a um velho, médico espagírico, soberano extractor de quintessência, homem muito humano e tratável, o qual, ao que me dizia, tinha trabalhado cinquenta anos à procura da pedra filosofal, e em vão quanto à pedra, mas muito seguramente quanto a outras espécies de transmutação dos metais. À fé do que eu o vi muita vez fundir conjuntamente tanto ouro como prata, torná-los em pequenas lamelas, e depois acamá-las num certo pó, depois sobre outras lamelas, de depois em cima de outro pó num cadinho ou vaso de fusão de ourives, mantê-lo no fogo durante vinte e quatro horas, depois abri-lo e achar que a prata se tornara em ouro; e mais vezes ainda fixar azougue em prata fina, que ele vendia para dar aos pobres. A minha ocupação era atear o fogo em dez ou doze fornalhas, na qual, graças a Deus, não tinha mais trabalho que prazer. Gostava muito de mim, e agradava-lhe muito discorrer comigo acerca da alquimia, e também da sua lei, para a qual fazia todos os esforços de atrair-me, prometendo-me grande riqueza e todo o seu saber. Deus operou sempre em mim uma crença de libertação pelas assíduas preces que Lhe fazia e à Virgem Maria, só pela intercessão da qual eu cria firmemente ter sido libertado. A esperança e crença firme que portanto eu tinha de tornar a ver-vos, Senhor, me fez ser assíduo em rogar-lhe que me ensinasse o meio de curar os cálculos, milagre que eu lhe vi fazer todos os dias; o que ele fez, até fazendo-me preparar e administrar os ingredientes...
Fiquei com esse velho desde o mês de setembro de 1605 até ao mês de agosto seguinte, em que ele foi preso e levado ao Grande Sultão, para trabalhar para ele; mas em vão, porque morreu de pena no caminho. Deixou-me ao seu sobrinho, verdadeiro antropomorfita, que me revendeu pouco depois da morte do seu tio, porque ouviu dizer que vinha o Senhor de Breve, como embaixador do Rei, com boas e expressas cartas patentes do Grão Turco, para recobrar os escravos cristãos. Um renegado de Nice, na Sabóia, inimigo de natureza, comprou-me e levou-me para o seu temato (assim se chama o bem que se detém como rendeiro do grande senhor, porque o povo não tem nada, tudo é do Sultão). O temato desse homem era na montanha, onde o país é extremamente quente e deserto."
 Depois de ter convertido esse homem, Vicente partiu com ele, dez meses depois,
" (...) ao cabo dos quais continua o escritor fugimos num pequeno escaler e chegámos no vigésimo oitavo dia a Aigues-Mortes, e pouco depois a Avinhão, onde monsenhor o Vice-Legado recebeu publicamente o renegado, de lágrimas nos olhos e de soluços na garganta, na igreja de São Pedro, para honra de Deus e edificação dos espectadores. O meu dito senhor...  fez-me esta honra de muito me amar e acarinhar, por alguns segredos de alquimia que eu lhe havia ensinado, dos quais ele fez mais caso, disse ele, do que si io gli avessi dato un monte di oro, porque nisso trabalhou todo o tempo da sua vida, e não respira outro contentamento...
Vicente Depaul" ³ 

Em janeiro de 1608, uma segunda epístola, endereçada de Roma ao mesmo destinatário, mostra-nos Vicente de Paulo iniciando o Vice-Legado de Avinhão, que acabamos de mencionar, e muito bem visto na corte, graças aos seus segredos espagíricos. 
"(...) O meu estado é portanto tal, numa palavra, que estou nesta cidade de Roma, onde continuo os meus estudos, sustentado por Monsenhor o Vice-Legado, que o era de Avinhão, que me dá a honra de gostar de mim e de desejar a minha promoção, por lhe ter mostrado muito belas e curiosas coisas que eu aprendi durante a minha escravidão com esse velho turco de quem vos escrevi e a quem fui vendido, do número das quais curiosidades faz parte o começo, não a total perfeição, do espelho de Arquimedes; uma mola artificial para fazer falar uma caveira, da qual esse miserável se servia para seduzir o povo, dizendo-lhe que o seu deus Maomé lhe fazia ouvir a sua vontade por meio dessa caveira, e mil outras belas coisas geométricas, que com ele aprendi, das quais o meu dito senhor é tão cioso que nem mesmo quer que eu me aproxime de ninguém, pelo medo que tem de que lhas ensine, desejando ter só ele a reputação de saber essas coisas, as quais se compraz às vezes a mostrar a Sua Santidade e aos cardeais." 

Apesar do pouco crédito que concede aos alquimistas e à sua ciência, Jorge Bois reconhece no entanto que não se pode suspeitar da sinceridade do narrador, nem da realidade das experiências que este viu praticar. 
"É uma testemunha escreve ele que reúne todas as garantias que se podem esperar de uma testemunha ocular, frequente e notoriamente desinteressada, condição que não se encontra no mesmo grau nos investigadores que narram as suas próprias experiências, e que estão sempre preocupados com um ponto de vista particular. É uma boa testemunha, mas é um homem: não é infalível. Pode ter-se enganado e tomado por ouro o que era apenas uma liga de ouro e prata. É o que somos levados a crer, segundo as nossas ideias actuais, e o hábito que devemos à nossa educação de incluir a transmutação entre as fábulas. Mas se nos limitarmos a ponderar simplesmente o testemunho que examinamos, o erro deixa de ser possível. Nele se diz claramente que o alquimista fundia conjuntamente tanto ouro como prata: eis portanto a liga bem definida. Essa liga é laminada. Em seguida, as lâminas são dispostas em camadas, separadas por camadas de um certo pó que não é descrito de outro modo. Esse pó não é a pedra filosofal, mas possui uma das suas propriedades: opera a transmutação. Aquece-se durante vinte e quatro horas, e a prata que entrava na liga é transformada em ouro. Esse ouro é revendido, e assim por diante. Não há nenhum engano na distinção dos metais. Além disso, é inverossímil, sendo a operação frequente e o ouro negociado com mercadores, que um tão enorme erro se produzisse tão facilmente. Porque nessa época toda a gente acreditava na alquimia; e os ourives, os banqueiros, os mercadores, sabiam muito bem distinguir o ouro puro do ouro ligado a outros metais. Desde Arquimedes, toda a gente sabe conhecer o ouro pela relação que existe entre o seu volume e o seu peso. Os príncipes moedeiros falsos enganam os seus súbditos, mas não enganam a balança dos banqueiros, nem a arte dos contrastadores. Não se fazia comércio de ouro vendendo por ouro o que o não era. Na época em que nos situamos, em 1605, em Túnis, que era então um dos mercados mais conhecidos do comércio internacional, era uma fraude tão difícil, tão perigosa, como seria hoje, por exemplo, em Londres, Amsterdão ou Paris, onde os grandes pagamentos de ouro se fazem em lingotes. Tal é o mais demonstrativo, em nosso entender, dos factos que podemos apurar em apoio da opinião dos alquimistas quanto à realidade da transmutação."
 
Fonte: "As Mansões Filosofais", por Fulcanelli, Lisboa: Edições 70, Ltda, pp. 106-111


III.  NOTAS  EXPLICATIVAS


¹   Nascido em Poux, perto de Dax, em 1581, os biógrafos dizem que nasceu em 1576, embora ele próprio dê a sua idade exacta em vários pontos da sua correspondência. Este erro explica-se pelo facto de, com a cumplicidade dos prelados agindo contra as decisões do Concílio de Trento, o terem feito passar fraudulentamente por ter vinte e quatro anos, quando não contava senão dezanove, quando foi ordenado padre em 1600.

²   S. Vicente de Paulo fundou, diz-nos o abade Pétin (Dictionnaire hagiographique, na Encyclopédie de Migne, Paris, 1850), um hospital para galerianos, em Marselha, estabeleceu em Paris as casas dos órfãos, das Filhas da Providência, das Filhas da Cruz; o Hospital de Jesus, das Crianças Abandonadas e o Hospital Geral da Salpêtrière. Sem falar do hospital de Sainte-Renne, que ele fundou na Borgonha, socorreu várias províncias, assoladas pela fome e pela peste: e as esmolas que ele fez distribuir na Lorena e na Champanha atingem cerca de dois milhões de "francos-ouro".

³  Ignoramos o motivo por que a História e os biógrafos se obstinam em manter a ortografia fantasista Vicente de Paulo. Este não precisa de partícula para ser nobre entre os nobres. Todas as suas epístolas são assinadas Depaulo. Encontra-se esse nome assim escrito numa convocação maçônica reproduzida a páginas 130-131 do Dictionnaire d' Occultisme de E. Desormes e Adriano Basílio (Angers, Lachèse, 1897). Não nos devemos admirar, além disso, de que uma loja, obedecendo ao código de caridade e de alta fraternidade que regia a Maçonaria no século XVIII, se pusesse sob a proteção nominal do grande filantropo. O documento em questão, datado de 14 de fevereiro de 1835, emana da loja Salut, Force, Union, do Capítulo dos Discípulos de Saint Vincent Depaul, ligado ao Oriente de Paris e fundado em 1777.

⁴  É tanto menos possível enganarmo-nos quanto à natureza dessa liga, quanto a prata provoca no ouro uma descoloração tal que não pode passar despercebida. Ora, neste caso, ela é quase total; como os metais foram ligados com pesos iguais, a liga aparece branca.





IV.  BIBLIOGRAFIA CONSULTADA




FRANZ,  M.-L.: Alquimia. Introdução ao Simbolismo e à Psicologia. São Paulo: Ed. Cultrix, 1998


FULCANELLI: O Mistério das Catedrais, Lisboa: Edições 70 Ltda., edição de 1964, 213 pp.
                         As Mansões Filosofais, Lisboa: Edições 70 Ltda., edição de 1965, 447 pp. 

PEREIRA, M.: L'alchimia e la psicologia di Jung in CAROTENUTO, A.: Tratatto di Psicologia Analítica. Volume primo. Torino: La dimensione culturale, UTET, 1992, pp. 415-445.