Por Carmen María Ruiz Vivas *
Tradução literal do espanhol por Francisco José dos Santos Braga
RESUMO
O exílio foi uma punição que se deu na Roma Antiga. Embora muitos tenham sofrido esta condenação, Cícero e Ovídio destacam-se por terem fornecido abundante documentação sobre essa experiência traumática. Em particular, o foco está nos textos que endereçaram às suas esposas, Terência e Fábia, respectivamente. A visão dos acontecimentos na perspectiva dos condenados fornece informações sobre o discurso de gênero vigente, por meio do qual se esperava que as esposas fossem defensoras dos interesses de seus cônjuges, e até mesmo mediadoras do seu perdão. A riqueza de informação permite analisar este modelo ideal de feminilidade numa perspectiva de gênero, permitindo compreender como as mulheres foram concebidas como integradoras, pacificadoras e cuidadoras das suas famílias em contextos de especial agitação e crise familiar. Por sua vez, esses ideais permitiram a ação e a agência femininas nesses contextos, como foi possível testemunhar noutras fontes.
Palavras-chave: feminilidade, casamento, exílio, mediação.
Nomes de local: Roma
Período: Antiguidade
O exílio é um fenômeno que ocorreu ao longo de todos os períodos históricos e que atualmente continua a afetar populações em diferentes pontos geográficos e por diversas razões. A continuidade desta prática faz com que se encare não como um acontecimento isolado e distante, mas como uma questão de plena atualidade, para a qual a história possa ser útil à compreensão do nosso próprio presente. Esse componente de atualidade, presente em outras periodizações históricas, é um campo historiográfico que deve mergulhar nos problemas sociais ², para o qual é necessário orientar também a História Antiga e com o compromisso que deve caracterizar o ato de historiar ³.
O objeto deste trabalho não se refere ao exílio de grupos populacionais, realidade que também ocorreu na Antiguidade — em consequência de guerras, por exemplo ⁴ —, mas se centra no exílio individual de figuras pertencentes à elite, como Cícero e Ovídio. As razões dos seus exílios foram unicamente políticas. A particularidade destas sentenças, associadas aos privilégios desses indivíduos, não diminui o interesse da análise, numa perspectiva social e de gênero, dos textos que eles escreveram durante essas fases da vida. Em particular, o foco está na forma como eles se dirigiram às suas esposas, Terência e Fábia, para solicitar sua mediação, o que evidencia o que esperaram da atuação dessas mulheres diante desses contextos.
Nem Cícero nem Ovídio aceitaram o exílio, situação que lhes causou um trauma profundo e uma grande crise. Suas cartas tinham uma forte carga emocional resultante da experiência de vulnerabilidade que ambos viveram. A sua identidade até então tinha sido construída em torno da ligação com a pátria romana. Ao serem obrigados a abandoná-la, redefiniram o seu papel de cidadania e de masculinidade; assim, o desenraizamento, para eles, levou à modificação da sua posição no mundo ⁵. A profundidade da ferida sofrida foi até entendida como uma morte em vida ⁶. Portanto, os textos que endereçaram às suas esposas são pedidos de ajuda, refletindo como elas foram fontes de esperança e apoio para os exilados. Embora, infelizmente, as vozes delas não tenham sido preservadas.
O estudo conjunto, e a partir de uma perspectiva de gênero, das cartas e das mensagens que Cícero dirigiu a Terência durante a crise da República (58-57 a.C.), e dos textos que Ovídio escreveu a Fábia no início do Principado (8-17 d.C.) permite a análise e compreensão dos valores, percepções e estratégias em torno do papel ideal da feminilidade romana, bem como das possibilidades de agência que isso trouxe para as mulheres. Além disso, esta análise situa-se em duas fases distintas da história política romana, o que nos permite contemplar as continuações, rupturas e inovações deste modelo de feminilidade. Tomadas em conjunto, todas estas questões são de grande interesse para a história das mulheres e para a história da Roma Antiga.
Palavras-chave: feminilidade, casamento, exílio, mediação.
Nomes de local: Roma
Período: Antiguidade
O exílio é um fenômeno que ocorreu ao longo de todos os períodos históricos e que atualmente continua a afetar populações em diferentes pontos geográficos e por diversas razões. A continuidade desta prática faz com que se encare não como um acontecimento isolado e distante, mas como uma questão de plena atualidade, para a qual a história possa ser útil à compreensão do nosso próprio presente. Esse componente de atualidade, presente em outras periodizações históricas, é um campo historiográfico que deve mergulhar nos problemas sociais ², para o qual é necessário orientar também a História Antiga e com o compromisso que deve caracterizar o ato de historiar ³.
O objeto deste trabalho não se refere ao exílio de grupos populacionais, realidade que também ocorreu na Antiguidade — em consequência de guerras, por exemplo ⁴ —, mas se centra no exílio individual de figuras pertencentes à elite, como Cícero e Ovídio. As razões dos seus exílios foram unicamente políticas. A particularidade destas sentenças, associadas aos privilégios desses indivíduos, não diminui o interesse da análise, numa perspectiva social e de gênero, dos textos que eles escreveram durante essas fases da vida. Em particular, o foco está na forma como eles se dirigiram às suas esposas, Terência e Fábia, para solicitar sua mediação, o que evidencia o que esperaram da atuação dessas mulheres diante desses contextos.
Nem Cícero nem Ovídio aceitaram o exílio, situação que lhes causou um trauma profundo e uma grande crise. Suas cartas tinham uma forte carga emocional resultante da experiência de vulnerabilidade que ambos viveram. A sua identidade até então tinha sido construída em torno da ligação com a pátria romana. Ao serem obrigados a abandoná-la, redefiniram o seu papel de cidadania e de masculinidade; assim, o desenraizamento, para eles, levou à modificação da sua posição no mundo ⁵. A profundidade da ferida sofrida foi até entendida como uma morte em vida ⁶. Portanto, os textos que endereçaram às suas esposas são pedidos de ajuda, refletindo como elas foram fontes de esperança e apoio para os exilados. Embora, infelizmente, as vozes delas não tenham sido preservadas.
O estudo conjunto, e a partir de uma perspectiva de gênero, das cartas e das mensagens que Cícero dirigiu a Terência durante a crise da República (58-57 a.C.), e dos textos que Ovídio escreveu a Fábia no início do Principado (8-17 d.C.) permite a análise e compreensão dos valores, percepções e estratégias em torno do papel ideal da feminilidade romana, bem como das possibilidades de agência que isso trouxe para as mulheres. Além disso, esta análise situa-se em duas fases distintas da história política romana, o que nos permite contemplar as continuações, rupturas e inovações deste modelo de feminilidade. Tomadas em conjunto, todas estas questões são de grande interesse para a história das mulheres e para a história da Roma Antiga.
1. A EXPERIÊNCIA DOS EXILADOS ATRAVÉS DAS CARTAS E OUTROS ESCRITOS
O termo exilium englobava tanto exílios voluntários como sentenças de relegatio ou deportatio ⁷. A prática do exílio foi uma constante ao longo da história de Roma, sendo um tipo de sentença que afetava tanto os homens, sobre os quais se conservam a maior parte das menções, como as mulheres e crianças. Além disso, deve-se ressaltar que essas sentenças não afetaram apenas as pessoas que com elas foram diretamente punidas, mas também tiveram implicações para suas famílias – e outros agentes, como escravos, libertos ou vínculos clientelistas ⁸ — que puderam ou não tê-los acompanhado, e que também sofreram a crise emocional e a vulnerabilidade a que esse tipo de sentença expunha ⁹.
Outro aspecto comum do exílio romano é que a priori não precisavam ser condenações de prisão perpétua, mas, dependendo do tipo, poderiam ser revogadas ou melhoradas. Esta questão fez com que os condenados pudessem realizar estratégias de mediação e negociação para alcançar melhorias na sua situação ou mesmo o perdão e a possibilidade de retorno. Este caráter indefinitivo ou de abertura ao diálogo determinou que recorressem a diferentes agentes de mediação, fazendo parte dessa estratégia as esposas — a par de outros indivíduos como familiares, amizades ou clientelas, fundamentalmente.
Por si só, a escrita foi um meio de resistência e resiliência para os exilados, pois foi um instrumento através do qual gestionaram estratégias políticas que visavam a sua salvação ¹⁰. Foi também uma ferramenta com a qual enfrentaram a experiência traumática do exílio a nível emocional, e que lhes permitiu manter o contato com os seus entes queridos, fazendo com que os exilados participassem da realidade familiar e da comunidade política romana, da qual se viam privados. Porém, o caráter dos exílios e dos escritos produzidos por Cícero e Ovídio diferem tanto pela personalidade de cada um deles, quanto pelo contexto em que viveram. Esta diversidade exige a sua correta contextualização.
1.1 AS CARTAS DE CÍCERO A TERÊNCIA
O exílio de Cícero foi “voluntário”, ou seja, ele optou pelo exílio para evitar a pena capital por suas ações como cônsul durante a conspiração de Catilina de 63 a.C., que levou ao assassinato de cidadãos romanos envolvidos na conspiração. Em 58 a.C., Clódio, tribuno da plebe, promulgou uma lei contra quem tivesse condenado à morte um cidadão romano sem julgamento, razão pela qual Cícero optou por abandonar Roma para evitar ser condenado, sendo esta opção a mais benéfica para ele e para a sua família ¹¹. Essa estratégia foi um costume — mais do que uma condenação — da elite política romana para evitar a pena capital. Ao mesmo tempo, foi uma forma de manter certa harmonia cívica e evitar a eclosão de maiores tensões face a figuras e ações algo conflituosas ¹². O exílio do orador durou desde 58 a.C. até 57 a.C., quando retornou a Roma graças à mudança de governo daquele ano, possibilitando ao Senado que decretasse seu retorno — e graças ao apoio de figuras como Pompeu e outras redes de apoio políticas.
Deste período, que passou principalmente em Salônica e Dirráquio, conservaram-se algumas das cartas que dirigiu ao amigo Ático, mas também a outros agentes, como a sua mulher, Terência ¹³. Elas confirmam a situação de vulnerabilidade e crise que o locutor vivenciava e como buscava apoio material e emocional em seus entes queridos ¹⁴. As epístolas preservadas representam um retrato verdadeiro e humano da experiência de vida do exilado e documentam o papel relevante de sua esposa — que já havia estado presente em seus escritos ¹⁵ — através das quatro cartas preservadas que o orador lhe dirigiu durante sua estada ¹⁶. O vínculo entre os dois era bastante afetivo, o que levou inclusive à proposta de que a sua relação pudesse ser comparável à de amizade ¹⁷ —, o que tem sido argumentado com base nos paralelos com outras cartas que o orador dirigiu aos seus amigos ¹⁸.
Embora houvesse a possibilidade de Terência e o resto da família de Cícero o acompanharem ¹⁹, ele preferiu que permanecessem em Roma, como afirma explicitamente numa das cartas que dirigiu à sua esposa: “Pessoalmente, prefiro que você permaneça em Roma, embora eu esteja ciente de que a maior parte deste fardo recai sobre você” ²⁰. Permanecendo em Roma, Terência pôde atuar como mediadora e administradora dos bens da família ²¹, além dos seus próprios, por ser uma matrona bastante abastada ²².
No entanto, esta situação fez com que Terência estivesse exposta a situações de precariedade e vulnerabilidade, social e economicamente em Roma ²³. As próprias cartas falam de um episódio de violência que esta matrona teve que enfrentar, visto que foi perseguida pelos inimigos do marido, ao atuar como fiel defensora de seus interesses, ao tentar recuperar seus bens e garantir seu retorno, a ponto de ela ter que se refugiar no templo das Vestais ²⁴. Cícero tinha consciência da precariedade a que sua esposa estava exposta — questão que ele mesmo destacou em discursos após o exílio ²⁵. De fato, numa carta dirigida a Ático, descreveu-a como: “Terência, a mais infeliz de todas as mulheres” ²⁶. Esta carta foi escrita em 29 de novembro de 58 a.C., mesma data em que pediu a Terência que permanecesse em Roma, mostrando que Cícero tinha plena consciência das dificuldades que sua esposa sofria. Na verdade, a notícia da ação de Clódio contra Terência chegou a Cícero através do seu amigo Públio Valério ²⁷, o que foi interpretado como um sinal da força e autonomia da matrona que não manifestou a necessidade de informar diretamente o marido ²⁸.
A permanência de Terência em Roma — apesar das dificuldades — reflete um modelo familiar em que, na ausência do pater familias, a matrona era responsável pela administração das propriedades, mantendo laços de amizade e clientela; de apoio emocional e também de coesão familiar. Questões que são reconhecidas nas palavras do próprio Cícero: “Entretanto, enquanto você mantiver a esperança, não desistirei para não dar a impressão de que tudo se perdeu por minha causa” ²⁹.
1.2 OS ESCRITOS DE OVÍDIO A FÁBIA: CARTAS E POEMAS
O exílio de Ovídio ocorreu num contexto político bastante diferente das tensões típicas do fim da República, uma vez que o seu exílio se deu em 8 d.C. durante os últimos anos do Principado de Augusto (27 a.C. – 14 d.C.) ³⁰. A historiografia não chegou a um consenso com os verdadeiros motivos do exílio do poeta, tão somente com base no que foi mencionado pelo próprio Ovídio, o qual assinalou que o motivo foi um error — sem especificar qual — e um carmen, que teria ido contra o legislação e ideologia moral do Principado ³¹. Ao contrário de Cícero, Ovídio não teve escolha, pois foi condenado à relegação, decretada pelo próprio Augusto ³². Embora esta sentença lhe tenha permitido preservar a sua cidadania e bens, a particularidade foi a escolha do destino: Ovídio teve que se estabelecer na cidade de Tomis, às margens do Mar Negro, sendo a primeira vez que um local tão remoto foi escolhido para esta condenação ³³. Outra questão substancial para a compreensão deste exílio é que, ao contrário de Cícero, o poeta não foi perdoado e morreu longe de sua terra natal em 17 d.C.
Durante esse período, Ovídio produziu as obras Tristia e Epistulae ex Ponto. Nelas ele expressou suas emoções no exílio e fez pedidos ao príncipe, seus amigos e familiares, dirigindo-se à sua esposa Fábia ³⁴ e instando-a a mediar e salvá-lo. Uma parte dos seus escritos de exílio foi-lhe dirigida — embora sem mencionar o seu nome — o que contrastou com obras anteriores do poeta ³⁵. De modo geral, Ovídio encontrou na poesia um recurso para tentar reverter a sua situação ³⁶ e na qual atribuiu um papel bastante concreto à sua esposa.
A Fábia ele dirigiu um total de duas cartas e dedicou-lhe nove poemas da obra Tristia ³⁷. Nessa obra, através de figuras mitológicas, construiu modelos de gênero que o poeta esperava que a sua esposa imitasse para a sua salvação ³⁸, reproduzindo certos padrões de comportamento feminino ideal, partilhados pela ideologia romana e também verificáveis em Heroides, obra anterior ao exílio ³⁹. Este paralelismo fez com que Fábia fosse definida como “a última heroína ovidiana” ⁴⁰. No seu conjunto, tanto as obras pré como pós-exílio foram permeadas por padrões de gênero típicos da época, onde construiu o papel ideal de uma matrona romana diante das difíceis vicissitudes causadas pelas ausências masculinas. O autor utilizou esse recurso para promover ou condicionar o comportamento de sua esposa, como mediadora, durante seu próprio exílio ⁴¹.
Sabe-se que Fábia permaneceu em Roma, provavelmente devido à sua potencial capacidade de mediadora e por pertencer à gens Fabia, uma família com boa posição social e econômica ⁴². Pelo que se deduz das cartas de Ovídio, parece que ela se movia em círculos próximos à domus augusta. Apesar da posição privilegiada de Fábia, e embora a situação na Urbs não fosse tão tensa como a do final da República, não deve ter sido fácil ser esposa de um exilado ⁴³. Nesse sentido, destacam-se as palavras que Ovídio lhe escreveu na segunda carta que lhe dirigiu:
“Assegura-te de que a inveja destas (pessoas) não possa dizer: 'Ela é lenta em atuar em prol da salvação do seu infeliz marido'. Visto que me faltam forças para poder puxar o carro, esforça-te por suster o jugo vacilante. Enfermo e falhando-me o pulso, volto-me ao médico que me socorre enquanto me sobejar um último sopro de vida. O que eu faria por ti, se estivesse com mais vigor, dá-mo tu a mim, já que estais mais forte. Assim o exigem o amor conjugal e a lei matrimonial. Teus próprios princípios, ó esposa, o reclamam” ⁴⁴.
Mas, além de aludir às possíveis críticas que sua esposa poderia estar sofrendo por parte de outras mulheres, o apelo que ele faz a Fábia é extremamente relevante. Ele ressalta que a mediação dela faria parte do pacto conjugal e amor (amor foedusque maritum) que os uniu. E ao basear a obrigação de Fábia de agir em prol da salvação do seu marido (salute viri) nos costumes e na tradição, ele torna isso uma responsabilidade conjugal obrigatória.
A informação preservada é bastante escassa para saber se essa matrona agiu como o fez Terência, no entanto, a análise comparada do papel atribuído a estas duas matronas permite indagar em vários aspectos: porque se considerou que nestas situações de crise familiar elas tinham de agir, ou seja, quais valores morais sustentaram esta responsabilidade feminina; e, seguindo estas atribuições de gênero, como estas mulheres, desde sua condição feminina, puderam ou tiveram de atuar como mediadoras dos interesses de seus maridos?
2. A MORAL MATRIMONIAL ROMANA ENTRE OS SÉCULOS I a.C.– I d.C.
"Convém que te dediques com toda a tua alma e com todas as tuas forças e que te esforces em meu favor noite e dia. E, conquanto outros me ajudem, tu deves superar meus amigos e, como esposa, ser a primeira a cumprir teu dever.
Meus livros te assinalaram um importante papel: dizem que tu és exemplo de boa esposa (conjugis exemplum diceris esse bonae)." ⁴⁵
Nesse texto Ovídio recorda explicitamente a Fábia que ela deve ser a principal mediadora de sua causa, acima dos demais. Na verdade, cumprir esse papel é o que fará dela uma esposa exemplar. Anteriormente, Cícero também durante seu exílio reconheceu o papel protagonista e fundamental de Terência nas mediações: “Acho que farei assim: se houver esperança de retorno, você a firmará e a favorecerá” ⁴⁶. A este respeito, Susan Treggiari destacou que “Terentia was clearly one of the most active of Cicero's supporters” ⁴⁷ — em colaboração com outros agentes.
Para além da evidências que reconhecem claramente o papel de liderança e esperado destas mulheres como agentes de mediação dos seus maridos, pode-se questionar o contexto moral pelo qual esta responsabilidade foi atribuída às matronas. Para isso, é fundamental investigar o sentido moral construído em torno da instituição do casamento romano e, em particular, em torno do papel da mulher dentro dele, aspectos aos quais Ovídio alude diretamente quando menciona o pacto e os costumes matrimoniais ⁴⁸.
A moralidade romana foi construída e mantida em torno de uma série de valores canalizados nas virtudes, destinadas a condicionar o comportamento dos agentes em diversos campos. As virtutes no plural passavam a significar “virtudes” ou “boas qualidades” ⁴⁹, razão por que estas foram consideradas abstrações de ideias positivas a que os agentes deviam aspirar nas suas ações. Sua emulação alcançaria o bem-estar comunitário ⁵⁰.
A análise das virtudes de pietas (piedade), fides (fidelidade) e concordia (harmonia) nos aproxima da moral conjugal romana e nos permite estudar o papel esperado das esposas em contextos de exílio e de dificuldades.
A pietas, em sentido amplo, foi uma virtude que regulava as relações familiares: era a abstração do respeito e do sentido do dever devido aos deuses, à pátria ou aos pais. Nesta fase da história de Roma, o termo passou para a esfera familiar. Nesta esfera, ao contrário do que tradicionalmente se pensa, a pietas não era a imposição ou o poder punitivo do pai de família, mas sim a devoção, as emoções e os afetos imbuídos do sentido do dever e que se dariam entre os diferentes membros da unidade familiar e num sentido mais bidirecional ⁵¹. Esta virtude foi estrutural nas relações familiares, funcionando como um código de comportamento que sustentava uma variedade de emoções e afetos e que determinava o que era aceitável e o que não era ⁵², sendo uma norma social não escrita ⁵³.
Este significado é constatado em Ovídio no Tr. 5.5, quando dirigiu a Fábia, por seu aniversário, poema em cujo conteúdo exaltava os valores da pietas e da fides como definidores de uma boa esposa na ausência do marido ⁵⁴. Na elegia em questão, comparou-se com figuras como Ulisses, ou outros homens condenados à distância da sua terra natal – símile bem frequente na sua poesia de exílio ⁵⁵. Ao mesmo tempo, assimilou Fábia com heroínas como Andrômaca e Penélope, que tiveram que conviver com a ausência dos maridos. Segundo o poeta, as virtudes dessas mulheres foram demonstradas nas dificuldades: deste modo, o pudor (pudicitia), os bons costumes (virtus), a honestidade (probitas) e a fidelidade (fides) nasceriam de vicissitudes complexas, e não de vidas alegres e fáceis ⁵⁶. Na verdade, mostrar essas virtudes nesses contextos difíceis seria o que lhes renderia glória (tempore laudis) ⁵⁷. Assim, com estes exemplos míticos ele exorta Fábia a “viver e amar o marido, pois assim está obrigada a fazê-lo, mesmo que ele esteja ausente (vivat, ametque virum, quoniam sic cogitur, absens)” ⁵⁸. Por fim, antes de pedir perdão a César, volta a dirigir-se diretamente a Fábia, escrevendo-lhe que o seu amor conjugal, encarnado na pietas, será conhecido graças ao que viveu devido ao exílio do marido ⁵⁹. Assim, de forma poética, ele convida sua esposa a imitar o comportamento dessas heroínas, sendo os valores da pietas e da fides cardeais para configurar aquele modelo de esposa ideal, que é devido ao marido, especialmente diante do exílio em si ⁶⁰.
Portanto, os textos de Ovídio documentam os valores morais ideais que ele atribui à sua esposa e que justificariam as ações de mediação femininas a que a exorta em outros textos. Estes modelos ideais foram um horizonte a que se aspirou nas uniões conjugais, responsabilizando as mulheres pelo seu bom funcionamento ⁶¹.
2.1 A concórdia a ser esperada das esposas no modelo marital romano
Enquanto a pietas e a fides são mencionadas nos textos dirigidos às esposas pelos autores discutidos, o valor da concordia não é explicitamente citado. Porém, sendo um aspecto fundador da união conjugal, dos bons costumes e da lei conjugal que Ovídio exige de Fábia, a análise da concordia poderia esclarecer um componente do papel do gênero feminino que facilitaria a compreensão dos valores que moveram à mediação feminina nesses contextos de exílio.
Aristóteles definiu a concordia — um conceito verificável no pensamento grego sob o termo homónoia — como a unidade de intenção entre várias partes ⁶². Varrão, para o pensamento romano, definiu-a como partilhar corações ⁶³. Portanto, o aspecto emocional e afetivo neste conceito é evidente e foi amplamente aceito ⁶⁴. Em geral, foi um valor essencial em qualquer tipo de relacionamento humano, permitindo a harmonia entre duas partes e, portanto, a durabilidade e o bem-estar dos laços sociais. Assim, outros autores definem a concordia como essencial para a manutenção de pactos (foedera) que garantam a prosperidade e a vida pacífica na comunidade humana ⁶⁵. Esta questão poderia estar ligada aos casamentos, uma vez que estes não deixam de ser um acordo entre duas partes ⁶⁶. Portanto, para a durabilidade da união, a concordia entre os cônjuges seria um valor almejado e louvado ⁶⁷, como foi constatado, por exemplo, na epigrafia funerária do período imperial ⁶⁸. Na verdade, desde o século II a.C., na obra de Plauto, o valor da concordia estava associado ao papel esperado da esposa romana, concretamente, como ideal de paz, de harmonia conjugal, que teria que constituir o dote feminino ⁶⁹.
A concordia como elemento essencial para o funcionamento ideal do casamento e da vida a dois ⁷⁰, pode ser percebida nas alianças que o noivo por vezes dava à futura esposa durante o rito da sponsalia, anterior à união conjugal ⁷¹. Como destacou Cándida Martínez, estes anéis representariam a concórdia e o pacto entre os futuros cônjuges, representando a dextrarum iunctio, símbolo da concórdia ⁷² — e identificável em outros suportes, como as moedas ⁷³. Assim, a ideia de harmonia era um princípio fundador da vida a dois que geraria a boa convivência entre ambos, e o fortalecimento dos laços da união.
Retomando a questão do modelo ideal de esposa diante do exílio, Fábia e Terência não foram as únicas matronas que tiveram que enfrentar essa situação de dificuldade e distanciamento do marido. Na Laudatio Turiae ⁷⁴, é narrada a experiência de vida de uma matrona que viveu durante os turbulentos anos do final da República, e cuja atuação foi ideal num contexto de exílio. Em que pese o nome do falecido não ter sido preservado, foi associado à figura de Turia, mencionada nos escritos de alguns autores ⁷⁵. O texto epigráfico é sobretudo uma laudatio, um elogio de um marido à sua esposa ideal, representando-a dentro dos cânones normativos do modelo tradicional de feminilidade romana ⁷⁶. Ao mesmo tempo, são narradas as complexas vicissitudes que esta mulher enfrentou: desde o assassinato de seu pai, a defesa de seu testamento, o exílio de seu noivo, e depois, seu posterior banimento; bem como outras questões como a ausência de filhos no casamento ou, finalmente, a enfermidade que a levou à morte ⁷⁷. Toda a narrativa é uma amostra do carinho mútuo, fidelidade, harmonia e afeto entre os cônjuges ⁷⁸.
Embora a concórdia não seja central no texto, ela é notada implicitamente. Por exemplo, o esposo salienta que viveu com a falecida durante 41 anos “sine offensa” ⁷⁹, sendo esta expressão uma forma alternativa de se referir à ausência de ofensas na vida conjugal, e, portanto, de identificar harmonia e piedade entre os cônjuges ⁸⁰. A segunda menção a essa questão do bom relacionamento e da paz conjugal é feita quando o viúvo ressalta que a concórdia entre eles era notável ⁸¹. Em particular, o esposo argumenta isso em resposta à proposta de divórcio que sua esposa fez devido à ausência de filhos. No entanto, rejeitou a possibilidade, preferindo manter a união com ela pelo carinho que os unia e pelo bom modelo de esposa que ela encarnava.
Neste sentido, é a concórdia, fundamento de uma união harmoniosa e boa, que, juntamente com a pietas e a fides, funciona como princípio conjugal que leva esta mulher a cumprir o seu dever — inclusive com ações de mediação em contextos de exílio. A harmonia foi indispensável num sentido político para a comunidade romana, já que permitiu que a ordem prevalecesse e que os cidadãos cumprissem as suas funções cívicas. Da mesma forma, atuou no casamento, sendo um princípio indispensável para que as esposas cumprissem o seu dever para com os maridos. Assim, concordia, pietas e fides formam uma série de valores indispensáveis para o modelo de boa esposa típico do século I a.C.—século I d.C.
A partir das perspectivas teóricas atuais é possível compreender como esses ideais construíram o papel matronal romano, atribuindo às mulheres a responsabilidade pelo cuidado e manutenção das relações humanas ⁸²; e em particular, em situações de conflito e desconforto, atribui-se-lhes o poder de integração desses laços, através dos afetos e emoções que ocorriam no seio das famílias. Este poder integrador das matronas tornou-se indispensável para o funcionamento da civitas, já que permitia o estabelecimento e a manutenção da coesão do grupo familiar e comunitário ⁸³. Um claro expoente desta responsabilidade feminina no modelo de feminilidade romano seria representado pela história das mulheres sabinas, as primeiras mulheres de Roma, cujo sequestro pelos Romanos teria provocado uma guerra entre os sequestradores e a comunidade sabina, à qual elas pertenciam. O confronto só pôde ser freado quando elas intervieram nele na qualidade de esposas, filhas e irmãs dos homens adversários ⁸⁴. Este relato foi reavaliado no século I a.C. em decorrência da situação de conflito que a comunidade política atravessou, e, portanto, funcionando como modelo exemplar de feminilidade, a imitar, para as matronas daquele período ⁸⁵.
Ou seja, embora nem sempre direta e explicitamente, os valores da pietas, associados ao dever, à fides, à fidelidade do vínculo conjugal, e à concordia, à harmonia da união, colocaram a mulher como responsável pela coesão familiar, especialmente em tempos de conflito e crise, como também se reflete nas lendas fundadoras da comunidade romana e é evidenciado em diferentes fontes. A evidência de que houve mulheres que assumiram e cumpriram dita responsabilidade é manifesta em fontes como a Laudatio Turiae.
3. FORMAS DE MEDIAÇÃO FEMININA DIANTE DOS EXÍLIOS
Uma vez analisada a razão pela qual estas mulheres puderam optar pela mediação, cumprindo de certa forma uma responsabilidade feminina, seria necessário aprofundar a forma como levaram a cabo suas ações. Uma questão fundamental é que as matronas romanas estiveram excluídas dos espaços da política institucionalizada, atribuindo-se-lhes assim papéis, funções e capacidades diferentes dos masculinos. Por tudo isso, seria apropriado aprofundar a forma como o seu papel de gênero determinou as formas de ação legítimas e ao alcance das mulheres em contextos de exílio de seus maridos.
3.1. Da República ao Principado: oscilações e sobrevivências nas mediações femininas
Os exílios de Cícero e Ovídio se distanciaram no tempo por apenas algumas décadas. Contudo, a transição da República para o Principado gerou oscilações e mudanças na forma como as suas esposas puderam atuar na qualidade de mediadoras. Além do plano ideal em que Ovídio se dirige a Fábia, Cícero oferece informações muito mais reais sobre como agiu Terência. Uma vez mais a carta enviada pelo orador à sua esposa em 29 de novembro de 58 a.C. resulta interessante pela informação sobre o papel ativo de Terência ajudando seu marido e tratando de reintegrar a unidade familiar. Cícero diz: “Agradeci aos amigos que me indicaste e entreguei as cartas a Dexipo, registrando por escrito que tinha sido informado por ti sobre o interesse deles” ⁸⁶. Em seguida ressalta que: “Por isso enviei-te em seguida a Aristócrito, para que possas me informar sem demora sobre como se inicia e como se organiza todo o assunto” ⁸⁷. Entre outras menções semelhantes, ele encerra a carta ressaltando que “Tua próxima carta, ou no máximo a seguinte, me permitirá decidir o que devo fazer. Por enquanto, por favor, informe-me minuciosamente sobre tudo, embora eu deva agora esperar mais fatos do que palavras” ⁸⁸.
Não há dúvida de que Terência, sem participar da política institucional, esteve inserida nos laços de amizade e nas redes de clientela de seu marido, sendo promotora e contribuindo assim para gerar espaços de solidariedade e apoio ao exilado através do contato com outros agentes masculinos. Além disso, a sua posição econômica também favoreceu o seu papel ativo e influente. Como foi demonstrado em outros trabalhos, as matronas de classe alta, na ausência de homens de família, tiveram maior liberdade para defender os interesses familiares ⁸⁹. Esta questão também esteve determinada pela maior autonomia de atuação para estas mulheres nas questões econômicas e sociais com respeito a fases anteriores ⁹⁰. Inclusive, o seu valor dentro do casamento mudou, tornando mais fácil que fossem consideradas mais como companheiras do que como objetos de propriedade masculina ⁹¹.
Em geral, foi esta nova posição de algumas mulheres durante a Roma no final da República, o que permitiu inclusive que se produzissem mediações através de redes femininas. Ou seja, aquelas mulheres que o necessitaram se dirigiram às familiares próximas dos detentores do poder, para que estas pudessem interceder pelas petições de outras mulheres ⁹². Durante o Principado, esta estratégia de mediação se consolidou quando o sistema político romano ficou estruturado em torno da família de Augusto, o que reforçou a posição de poder e influência de algumas mulheres daquela domus ⁹³. Esta questão fica evidenciada quando Ovídio aconselhou Fábia a dirigir os seus esforços de mediação exclusivamente à família imperial — possivelmente também devido à falta de outros recursos —, concretamente às mulheres próximas de Augusto, como Márcia ⁹⁴, embora, acima de tudo, sua mediação devia voltar-se a Lívia, esposa do príncipe: “deves suplicar com tua boca à esposa do César (Caesaris est coniunx ore precanda tuo)” ⁹⁵. Lívia foi mencionada em inúmeras ocasiões, como uma mulher protagonista na cena pública e como um instrumento de esperança para Ovídio, graças à sua capacidade de exercer o seu patrocínio político junto de Augusto ⁹⁶.
De fato, este papel intermediário de algumas mulheres da domus augusta entre outras matronas e os principes ou outros indivíduos masculinos no topo do poder é confirmado numa outra menção a Otávia, irmã de Augusto. Segundo a mesma, Tanúsia, esposa de Tito Vínio, que escondeu o marido na época das proscrições, se dirigiu a Otávia para que mediasse com seu irmão, conseguindo um encontro entre os dois para implorar pela salvação do marido. O final do episódio resultou no perdão de Tito Vínio ⁹⁷.
Além disso, esse tipo de comportamentos nas esposas geraria reconhecimento e exaltação pelas suas boas ações tanto na época republicana quanto na época imperial. Cícero descreveu Terência como uma esposa perfeita e fiel ⁹⁸. Ovídio prometeu que Fábia alcançaria glória e fama se conseguisse salvá-lo através de sua mediação: “cuida de me defender, sê para mim modelo de uma boa esposa e compensa com tuas virtudes o triste destino: a grande glória percorre um caminho íngreme” ⁹⁹. Na época imperial, também é conhecido o caso de uma certa Plotina elogiada por Apuleio como mulher única de grande fidelidade por ter salvado o marido perante César ¹⁰⁰. Mesmo que fosse simbólico, este tipo de ações também traria prestígio às esposas destes exilados, embora não isentas de riscos, sofrimentos e dificuldades, como também fica explícito nas fontes.
3.2. Formas de atuação esperadas nos discursos masculinos
Para além das relações e da ajuda que as mulheres puderam ter tido de outros agentes, Ovídio também dá instruções sobre como a sua esposa deveria comportar-se, idealmente e de acordo com os cânones de gênero, ao dirigir-se à domus augusta, para conseguir assim maior eficácia na realização dos seus desejos: “Por mim não deves empunhar o machado das Amazonas, nem carregar com mão leve o escudo de meia-lua” ¹⁰¹. De forma poética, Ovídio utiliza o contraexemplo das Amazonas para apontar como Fábia devia mediar segundo o modelo de feminilidade romana ¹⁰². As armas nunca seriam uma opção para atingir os objetivos de uma matrona. As mulheres estiveram excluídas da política formal e da participação no exército, marginalizadas do modelo cidadão-soldado que constituía a identidade cívica masculina ¹⁰³. Portanto, as formas de atuação delas tiveram que ser movidas por outros valores, mais ligadas ao papel de subordinação e submissão esperado e típico dos cânones tradicionais da feminilidade romana ¹⁰⁴.
Diante do uso ilegítimo da violência, a forma de mediação feminina teve que ser construída em torno de súplicas, palavras e choro, segundo Ovídio. A súplica foi o principal meio pelo qual as mulheres puderam mediar com as autoridades relevantes dentro dos cânones discursivos romanos. A súplica seria dirigida a quem tivesse poder suficiente para satisfazer ou ratificar os seus pedidos, sendo uma forma de mediação feminina bastante recorrente na história de Roma ¹⁰⁵. Ovídio diz: “Que tuas palavras não sejam senão súplicas ansiosas. Deves então chorar sem descanso, e prostrada no chão, estende os braços em direção a seus pés imortais” ¹⁰⁶. Nesta orientação sobre como se dirigir aos membros da domus augusta, Ovídio reforça a ação da súplica com gestos, prostrando no chão e recorrendo ao choro, sendo a performatividade da súplica um meio de comunicação destinado a comover pelo perdão do poeta.
Porém, na análise conjunta dos escritos de Ovídio no exílio com relação às cartas de Cícero, conclui-se que a realidade da mediação feminina nem sempre foi tão ideal quanto o poeta imaginava. O comportamento de Terência e de outras mulheres reflete maior agência. Estas mulheres, adoptando o papel de integradoras, movimentaram-se por vários meios para atingir os seus objetivos, embora sempre dentro dos cânones de gênero apropriados, mas valendo-se de atos, contatos e redes que teceram com outros agentes para atingir seus objetivos.
4. CONCLUSÕES
Do estudo conjunto de todas essas evidências, conclui-se que as esposas de exilados tiveram um papel fundamental para a salvação dos seus maridos e integração das suas famílias. Diante da vulnerabilidade e fragilidade dos exilados, esses depositaram nelas suas esperanças de regresso, que puderam agir com base na defesa de ideais como pietas ou fides, mas também na promoção da concordia, harmonia e integração das suas famílias, manifestaram certa autonomia na hora de transformar e melhorar as realidades de conflito e crise dos seus entes queridos. Essas ações lhes renderam reconhecimento e prestígio, por parte de seus maridos e outros agentes, como esposas ideais e modelares. Diante dessas elogiadas ações, tampouco podemos perder de vista a situação de vulnerabilidade, violência e crise a que elas também se viram expostas nesses momentos, nem a capacidade de agência e a fortaleza que manifestaram ao tentar subverter essa situação para seus maridos. O discurso normativo de gênero atribuiu estas funções às mulheres nos momentos de maior crise para o grupo familiar, como meio de salvação e integração através de meios pacíficos.
A perspectiva de gênero permitiu analisar as particularidades dessas ações femininas, a partir da posição de subordinação que ocupavam; excluídas da política formal, mas agindo a partir da sua própria condição de gênero para alcançar os seus objetivos. Também se tornou visível a importância de certos valores que operavam na comunidade romana, para construir e gerar espaços de paz e bem-estar. Áreas que foram em grande parte atribuídas à responsabilidade feminina, e que deveriam ser reconhecidas como indispensáveis ao funcionamento das unidades familiares e, por extensão, ao próprio Estado romano.
Em grande medida, historiar e tornar visível esta realidade associada às mulheres na sociedade romana, esta responsabilidade de integração e mediação, é essencial para gerar outros discursos e narrativas históricas. Como destacou Cintia Cockburn, “as probabilidades de mudança estão armazenadas no enorme edifício da história” ¹⁰⁷. Reconheçamos assim a violência que as mulheres sofreram, a opressão e a injustiça, mas reconheçamos também a sua agência, a sua resistência, a sua criatividade para conviver com os conflitos e, principalmente, reconheçamos como têm sido agentes essenciais para a sobrevivência emocional e material em todas as épocas históricas.
* Este estudo faz parte da pesquisa de doutorado da autora, atualmente em andamento, e financiada pelo Ministério das Universidades por meio do programa de Formação de Professores Universitários FPU19/01865. Parte do conteúdo deste trabalho foi apresentado no VII Seminário Internacional do Grupo Deméter “Sobre violência e vulnerabilidade no mundo antigo”, realizado nos dias 19 e 20 de maio de 2022. Este trabalho foi beneficiado e enriquecido com os comentários feitos no âmbito daquela reunião. A autora também agradece as observações críticas e sugestões feitas pelos revisores/as anônimos/as, que ajudaram a melhorar este trabalho.
II. NOTAS EXPLICATIVAS
1 Ov. Pont. 3.1.40-45
2 Cascajero, 2000: 17-21
3 Fontana, 1982: 9-12
4 Martinez e Oria, 2021: 43
5 Para a masculinidade romana entre a República e o Principado ver Goldberg, 2021.
6 Claasen, 1996a: 571-585.
7 Cohen, 2008: 206. Todas essas formas de deportações são abarcadas no termo "exílio" empregado neste trabalho, embora existam diferenças nas mesmas, por exemplo, a relegação permitia a manutenção dos direitos civis, diferentemente, por exemplo, de outras condenações como a deportação.
8 Kelly, 2006: 110-125.
9 Domínguez e Puyadas, 2021: 576.
10 Para épocas contemporâneas, como o caso do exílio espanhol, tem-se enfatizado a resistência que supõe a escrita (por exemplo, Guadalupe Adámez Castro, 2017; link: https://revistas.ucm.es/index.php/CHCO/article/view/60339). Consideramos que este mesmo caráter podemos encontrá-lo nos textos do mundo antigo referidos.
11 Kelly, 2006: 110-125. Para mais informações ver as biografias do orador: Rawson, 1975; Everitt, 2003; Pina Polo, 2005.
12 Kelly, 2006: 1-17.
13 Claasen, 1992: 27-28. Sabe-se que Cícero se correspondeu com mais gente através, por exemplo, da menção a uma carta recebida por Públio Valério em uma carta dirigida a Terência (Cíc. Fam. 7.14.2).
14 Face a esta documentação, contrasta enormemente o relato dos fatos que o orador oferece em seus discursos na volta do exílio. Veja-se Claasen, 1992: 31-33; Narducci, 1997.
15 Claasen, 1996b: 212-218.
16 Das cartas que Cícero escreveu em seu exílio, se conhecem as quatro que no ano de 58 a.C. dirigiu a Terência (Cíc. Fam. 6.14.4; Cícero. Fam. 7.14.2; Cíc. Fam. 8.14.1; Cíc. Fam. 9.14.3) – em face das 24 que neste ano escreveu a seu amigo Ático. Durante o ano de 57 a.C., antes de junho quando voltou do exílio, não enviou nenhuma carta a Terência, tendo enviado duas a Ático e uma a Quinto Metelo.
17 Greebe, 2003: 127-142. Se bem a amizade fosse um valor desejável no matrimônio na época imperial, não parece que na época republicana esse componente afetivo fosse tão desejado, razão pela qual é marcante a estreita relação entre Terência e Cícero. Para essa oscilação, ver Veyne, 1987.
18 Jeppesen-Wigelsworth, 2013: 350-365.
19 Kelly, 2006: 133–137; Domínguez e Puyadas, 2021: 600-603. Embora o orador não especifique quem o acompanhou no exílio, possivelmente alguns escravos e libertos, e outros, estiveram em sua companhia (Kelly, 2006: 134).
20 Cíc. Fam. 9.14.3, 5 (29 de novembro de 58 a.C.).
21 O exílio voluntário permitiu a manutenção dos direitos cívicos, embora envolvesse o confisco de propriedades. Por esta razão, foram desenvolvidas estratégias para salvaguardar os bens dos exilados (Kelly, 2006: 45-47). Para a gestão econômica de Terência, ver Dixon, 1984: 78-101; Bounopane, 2016: 51-64; Méndez, 2021: 151-171. Para o contexto geral das possibilidades econômicas das mulheres romanas, ver Cantarella, 2016.
22 Méndez, 2021: 154-155.
23 Brennan, 2012: 359. Para trabalhos sobre la biografia desta matrona ver Treggiari, 2007; Piquer, 2016.
24 Treggiari, 2007: 60–61.
25 Cíc. Dom. 23.
26 Cíc. Att. 68. 111. 23, 5 (29 de noviembro de 58 a.C.).
27 Cic. Fam. 7.14.2, 2 (5 de outubro d 58 a.C.).
28 Treggiari, 2007: 60-61; Brennan, 2012: 356; Méndez, 2021: 156-157.
29 Cíc. Fam. 9.14.3, 2 (29 de novembro de 58 a.C.).
30 A última década do Principado foi marcada por tensões externas, problemas militares e financeiros, fomes e tensões internas manifestadas no exílio, por exemplo, de Júlia, a filha do príncipe (Syme, 2010 [1939]: 205; McGowan, 2009: 17; Šterbenc Erker, 2023, pp. 43–44)
31 Claasen, 1996: 576–577.
32 Kelly, 2006: 65-69.
33 McGowan, 2009: 51; 207–208.
34 Para o contexto familiar desta figura ver Lewis, 2013.
35 Fabre–Serris, 2022: 76 e 83. Só é mencionada anteriormente e indiretamente no Ov. 3.13.
36 McGowan, 2009.
37 Helze, 1989: 183.
38 Larosa, 2014: 368-384. Fabre-Serris, 2022: 76-86.
39 Nesta obra o poeta escreveu uma série de cartas que contam a experiência de figuras mitológicas femininas – com exceção de Safo – através do qual expressam seu sofrimento e preço das glórias masculinas. Ver McKinley, 2001: 12; Fulkerson, 2005; Davies, 2006: 49.
40 Baeza e Buono, 2012.
41 Diferentemente das cartas endereçadas a Terência, a data exata dos escritos a Fábia é desconhecida.
42 Helzle, 1989: 184.
43 Constata-se o sofrimento de Fábia especialmente em Ov. Tr. 4.3.50–60.
44 Ov. Pont. 3.1.65-75
45 Ov. Pont. 3.1.40-45
46 Cíc. Fam. 6.14.4, 3 (29 de abril de 58 a.C.)
47 Treggiari, 2007:69
48 Ov. Pont. 3.1.65-75
49 Balmaceda, 2007: 296
50 Martínez e Ruiz, 2022:58. Ver Bevilacqua, 2016 e 2018.
51 Saller, 1988: 393-410
52 González, 2021: 306-318
53 Treggiari, 2005: 16. Cícero, de fato, ao falar das XII Tábuas, coloca a pietas como uma virtude sagrada, cujo cumprimento definiria os homens bons (Cic. Leg. 8.19). Sobre a importância da pietas na legislação romana, como elemento cujo cumprimento seria protegido, ver Grubbs, 2011, pp. 377–392.
54 Larosa, 2014: 377-379.
55 McGowan, 2009: 169-203.
56 Ov. Tr. 5.5.45-50.
57 Ov. Tr. 5.5.45-51.
58 Ov. Tr. 5.5.23-24
59 Ov. Tr. 5.5.60.
60 Para estes valores no modelo da esposa ideal na obra de Ovídio no exílio ver Larosa, 2014 e Fabre-Serris, 2022.
61 Não se deve perder de vista o carácter ideal, pois para além dos discursos, os descontentamentos e os divórcios eram frequentes na sociedade romana (Hallett, 1984: 230). Contudo, como sublinhou Suzanne Dixon, a ideia de afeto conjugal e o modelo conjugal ideal coexistiram com estas práticas (Dixon, 1985: 354).
62 Arist. EN. 9.6.1167a, 20-25. Ver Ferguson, 2017: 118.
63 Var. LL. 10. 56.
64 Akar, 2013: 38 y 60.
65 Lucr. 5. 1026–1027.
66 Ver a citação de Ovídio: Ov. Pont. 3.1.65-75.
67 Dixon, 1991: 99–113.
68 O exame desta questão está sendo abordado como parte da tese de doutorado da autora deste trabalho.
69 Pl. Am. 2. 2. 210
70 Veyne, 1985: 52–54.
71 Fayer, 2016: 105.
72 Martínez López, 2023: 60-61.
73 Ruiz Vivas, 2022.
74 CIL, VI, 1527, 31670, 37053. Dada a extensão e complexidade da inscrição, devido ao seu estado fragmentário, utilizou-se a reconstrução prevista no EDR (EDR093344). Outras edições e obras consultadas foram Evangelisti, 2012; Osgood, 2014 e Fontana, 2022.
75 Turia era esposa de Quinto Lucrécio Vespillo. Ela é mencionada por suas façanhas durante as proscrições de 43 AC. por alguns autores (VM 6. 7. 2; App. BC 6. 189-192). Ver Osgood, 2014: 3–11 e 117–135.
76 Hemelrijk, 2004, pp. 185-197. Essas virtudes seriam a modéstia (pudicitia), a obediência (opsequium), o trabalho com lã (lanificium), a piedade (pietas) ou a fidelidade (fides) entre outras listadas no texto, por ex. col. I. 31-32.
77 Para sua biografia completa ver Osgood, 2014.
78 Hemelrijk, 2004: 186.
79 Col. I. 29.
80 Dixon, 1991: 108-109.
81 Col. 46: “nota concordia nostra”.
82 Almudena Hernando analisou como, ao longo da história, nas sociedades patriarcais, a identidade feminina tem sido muito mais relacionais, o que as vincula ao desenvolvimento de tarefas de cuidado em questões materiais e emocionais. Ver Hernando 2022.
83 Martínez, 2012.
84 Liv. 1.11.2 e Liv. 1.13. Tito Lívio na história canônica que elabora da Urbs de Roma outorga um papel protagonista às sabinas em relação à concórdia, produzindo-se a primeira menção deste conceito em relação às mesmas (Akar, 2007: 247-249).
85 Rohr, 2019: 140-167.
86 Cíc. Fam. 9.14.3, 4.
87 Cíc. Fam. 9.14.3, 4.
88 Cíc. Fam. 9.14.3, 5.
89 Rohr Vio, 2019. Para diferentes casos ver também Cenerini e Rohr Vio (eds.), 2014.
90 Cantarella, 2016: 419-428. Sobre o poder e a autoridade através de redes de clientelismo, família ou clientela destas mulheres no final da República, ver também Treggiari, 2019: 217–229.
91 Veyne, 1985: 47–49. A difusão do casamento sine manu foi fundamental nesse processo, veja-se Cenerini, 2002. Embora tanto em um modelo quanto em outro, estariam subordinadas à vontade masculina, caracterizada pela estrutura hierárquica e patriarcal do casamento romano.
92 Na história canônica que Tito Lívio produziu, foram as mulheres sabinas que abordaram Hersília para mediar com seu marido Rômulo (Liv. 1. 11. 2). Outras fontes mais históricas atestam que na época das proscrições de 43 a.C. as matronas lideradas por Hortênsia para mediar com os triúnviros recorreram a Júlia e Fúlvia, mãe e esposa de Marco Antônio, e Otávia, irmã de Otaviano (Ap. B.C. 4.5.32).
93 Hallett, 1984: 3–6; Milnor, 2008: 1–5. Ver Cenerini, 2009. No caso de Lívia é bastante evidente. Ver Brännstedt, 2016.
94 Márcia parece que foi uma mulher próxima a Fábia, que esteve casada con Fábio Máximo e que descendiia dos Júlios, razão pela qual estava emparentada com o própio Augusto (Ov. Pont. 1.2.135).
95 Ov. Pont. 3.1.115
96 Fabre–Serris, 2021: 83–86
97 D. C. 47.7.4–5. A proscrição de Tito Vínio também é mencionada em Apiano, que dá destaque ao liberto nesta mediação (Ap. Bel. 4.44), e em Suetônio, que narra que Augusto concedeu ao liberto o status equestre (Suet. Aug. 27.2.). Ver Soraci, 2013: 96 e Rohr, 2019: 135 e 153–154.
98 Cíc. Fam. 6. 14. 4, 6 (29 de abril de 58 aC).
99 Ov. Tr. 4.3.75. Mesma ideia nas linhas seguintes Ov. Tr. 4.3.85.
100 Apul. Met. 7.6.3–5 e Apul. Met. 7.7.3–4.
101 Ov. Pont. 3.1.95.
102 Sebillotte, 2012: 103-119.
103 Martínez e Oria, 2021: 31–48. Pelo contrário, num sentido dicotômico, a ideologia de gênero relacionou as mulheres com valores de paz, ver Martínez López, 1998 e Mirón et al., 2004.
104 Cenerini, 2002: 14-29.
105 Conesa, 2020: 437–462.
106 Av. Pont. 3.1.150.
107 Cockburn, 2009: 336.
III. BIBLIOGRAFIA
ADÁMEZ CASTRO, G. (2017): Gritos de papel. Las cartas de súplica del exilio español (1936–1945), Granada, Comares.
AKAR, P. (2007): “Les Romains de la République avaient-ils besoin des femmes pour établir la concorde entre eux?”, en V. Sebillote y N. Ernoult (eds.), Problèmes du genre en Grèce ancienne, Paris, Éditions de la Sorbonne, 247-259.
AKAR, P. (2013): Concordia. Un idéal de la classe dirigeante romaine à la fin de la République, Paris, Publications de la Sorbonne.
BAEZA, E., e BUONO, V. (2012): “Fabia, l’ultima delle eroine ovidiane?”, en J. Luque y otros, (eds.), Dulces Camenae. Poética y poesía latinas, Granada, EUG, 137-146.
BALMACEDA, C. (2007): “Virtus romana en el siglo I a.C.”, Gerión, 25(1), 285-304. BEVILACQUA, L. (2016): “Un pantheon per le virtù: Antropologia delle divinità «ideali» a
Roma”, I Quaderni Del Ramo D ́Oro On-Line, 8, 128-161.
BEVILACQUA, L. (2018): “Un pantheon per le virtù II: L ́utilitas come valore civico-religioso delle divinità ideali”, I Quaderni Del Ramo D ́Oro On-Line, 10, 1-26.
BRÄNNSTEDT, L. (2016): Femina princeps. Livia ́s position in the Roman state, Lund,
Departamento de Arqueología e Historia Antigua (Tesis doctoral).
BRENNAN, T. (2012): “Perceptions of Women ́s Power in the Late Republic: Terentia, Fulvia and the Generation of 63 BCE”, en S. James y S. Dillon (eds.), A Companion to
Women in the Ancient World, Malden, Blackwell, 354–367.
BUONOPANE, A. (2016): “Terenzia, una matrona in domo et in re publica agens”, en F.
Cenerini e F. Rohr (eds.), Matronae in domo et in re publica agentes: spazi e occasioni dell’azione femminile nel mondo romano tra tarda repubblica e primo impero, Trieste, EUT, 51-64.
CANTARELLA, E. (2016): “Women and Patriarchy in Roman Law”, em P. Du Plessis e outros, (eds.), The Oxford Handbook of Roman Law and Society, Oxford, Oxford UP, 419- 432.
CASCAJERO, J. (2000): “Tiempo y tiempos para la Historia Antigua”, Gerión, 18, 17-40.
CENERINI, F. (2002): La donna romana, Bolonia, Il Mulino.
CENERINI, F. (2009): Dive e Donne. Mogli, madri, figlie e sorelle degli imperatori romani da Augusto a Commodo, Belluno, Angelini editore.
CENERINI, F., e ROHR VIO, F. (eds.) (2016): Matronae in domo et in re publica agentes:
spazi e occasioni dell’azione femminile nel mondo romano tra tarda repubblica e
primo impero, Trieste, EUT.
COCKBURN, C. (2007): Mujeres ante la guerra. Desde donde estamos. Barcelona, Icaria.
CONESA, P. (2020): “La palabra concedida. Discursos y actitudes transgresoras femeninas
en la antigua Roma monárquica y republicana”, Arenal, 27(2), 437-462.
CLAASEN, J. (1992): “Cicero ́s Banishment: Tempora et Mores”, Acta Classica, 35, 19–47.
CLAASEN, J. (1996a): “Exile, Death and Immortality: Voices from the Grave”, Latomus,
55(3), 571-590.
CLAASEN, J. (1996b): “Documents of a Crumbling Marriage: The Case of Cicero and
Terentia”, Phoenix, 50(3/4), 208-232.
COHEN, S. (2008): “Augustus, Julia and the Development of Exile 'Ad Insulam' ”, The
Classical Quarterly, 58(1), 206-217.
DAVIES, P. (2006): Ovid and Augustus. A Political Reading of Ovid's Erotic Poems, Bristol,
Bristol Classical Press.
DIXON, S. (1984): “Family Finances: Terentia and Tullia”, Antichthon, 18, 78-101.
_________ (1985): “The Marriage Alliance in the Roman Elite”, Journal of Family History, 10(4),
353-378.
_________ (1991): “The Sentimental Ideal of the Roman Family”, em RAWSON, B. (ed.), Marriage,
Divorce and Children in Ancient Rome, Oxford, Oxford UP, 99-114.
DOMÍNGUEZ, A. e PUYADAS, V. (2021): “Marginadas. Exilios, deportaciones y otras causas de movilidad forzada en la sociedad romana antigua”, en P. Pavón (ed.), Conditio feminae. Imágenes de la realidad femenina en el mundo romano, Roma, Quasar,
501-529.
EVERITT, A. (2003): Cicero. The Life and Times of Rome’s Greatest Politician, New York, Random House.
EVANGELISTI, S. (2012): “Laudatio funebre per una donna”, em FRIGGERI, R. e outros (eds.). Terme di Diocleziano. La collezione epigrafica, Roma, Electa, 238–243.
FABRE–SERRIS, J. (2022): “Literary Models and Social Challenges: Marital Love According to Ovid in the Tristia and Epistulae ex Ponto”, en C. Centlivres Challet (ed.), Married Life in Greco-Roman Antiquity, Londres, Routledge, 76–90.
FAYER, C. (2016): La vita familiare dei romani antichi. Dalla nascita al matrimonio, Roma, L ́Erma di Bretschneider.
FULKERSON, L. (2005): The Ovidian Heroine as Author. Reading, Writing, and Community in the Heroides, Cambridge, Cambridge UP.
FONTANA, J. (1982): Historia. Análisis del pasado y proyecto social, Barcelona, Crítica.
FONTANA, L. (2020): Laudatio Turiae e propaganda augustea: quando anche la morte è
política, Milán, Ledizioni.
GOLDBERG, C. (2021): Roman masculinity and politics from Republic to Empire, Nueva
York, Routledge.
GONZÁLEZ ESTRADA, L. (2021): “La sacralización de las relaciones familiares. Ejemplos
femeninos de la pietas romana”, em CID R. e outros (eds.), Madres y familias en la Antigüedad. Patrones femeninos en la transmisión de emociones y de patrimonio, Gijón, Trea, 305–321.
GREBE, S. (2003): “Marriage and Exile: Cicero ́s Letters to Terentia”, Helios, 30(2), 127- 146.
HALLETT, J. (1984): Fathers and Daughters in Roman Society. Women and the Elite Family, Princeton, Princeton UP.
HELZLE, M. (1989): “Mr and Mrs Ovid”, Greece and Rome, 36(2), 183-189.
HEMELRIJK, E. (2004): “Masculinity and Feminity in the Laudatio Turiae”, The Classical
Quarterly, 52(1), 185-197.
HERNANDO, A. (2022): La corriente de la Historia (y la contradicción de lo que somos),
Madrid, Traficantes de sueños.
JEPPESEN–WIGELSWORTH, A. (2013): “Amici and Coniuges in Cicero ́s Letters: Atticus
and Terentia”, Latomus, 72(2), 350-365.
KELLY, G. (2006): A History of Exile in the Roman Republic, Cambridge, Cambridge UP.
LAROSA, B. (2014): “Conjugal Fidelity and Mythical Parallels in Ovid’s Exile Poetry”,
Latomus, 73(2), 368-384.
LEWIS, A. (2013): “The Family Relationships of Ovid ́s Third Wife: A Reconsideration”,
Ancient Society, 43, 151-189.
MARTÍNEZ, C. (1998): “Eirene y Pax. Conceptualización y prácticas pacíficas femeninas en
las sociedades antiguas”, Arenal, 5(2), 239-261.
_______________ (2012): “Poder integrador de la mater familias romana”, en P. Díaz y otros (eds.).
Impulsando la historia desde la historia de las mujeres. La estela de Cristina Segura,
Huelva, Collectánea, 157-168.
_______________ (2023): “Mujeres, mediación y concordia en los discursos de paz de la Roma antigua”, en E. Díez y C. Martínez (eds.), Mujeres y discursos de paz en la historia, Berna, Peter Lang, 55-79.
MARTÍNEZ, C., e ORIA, M. (2021): “Entre la guerra y la paz. Aproximaciones metodológicas
al estudio de las mujeres y la guerra en el mundo antiguo”, en C. Pereira y otros (eds.), De Ilipa a Munda. Guerra y conflicto en el sur de Hispania, Lisboa, ULisboa, 31-48.
MARTÍNEZ, C. e RUIZ, C. M. (2022): “Entre pax y concordia. Las mujeres y las virtudes de paz ligadas al poder en la Roma antigua”, EuGeStA, 12, 57-92.
MCGOWAN, M. (2009): Ovid in Exile, Leiden, Brill.
MCKINLEY, K. (2001): Reading the Ovidian Heroine. “Metamorphoses” Commentaries
1100-1618, Leiden, Brill.
MÉNDEZ, B. (2021): “Un matrimonio sine manu. La participación de Terencia en las
finanzas y en la cohesión familiar”, em CID, R. y otros, (eds.), Madres y familias en la Antigüedad. Patrones femeninos en la transmisión de emociones y de patrimonio, Gijón, Trea, 151–171.
MILNOR, K. (2008): Gender, Domesticity and the Age of Augustus. Inventing Private Life, Oxford, Oxford UP.
MIRÓN, M.D y otros, (2004): Las mujeres y la paz: génesis y evolución de conceptualizaciones, símbolos y prácticas, Madrid, Instituto de la Mujer.
NARDUCCI, E. (1997): “Perceptions of Exile in Cicero: The Philosophical Interpretations of a Real Experience”, The American Journal of Philology, 118(1), 55-73.
OSGOOD, J. (2014): Turia. A Roman Woman' s Civil War, Oxford, Oxford UP.
PINA, F. (2005): Marco Tulio Cicerón, Barcelona, Ariel.
PIQUER, J.M (2016): “Terencia. Un perfil de matrona romana (Cic. Ad Fam. XIV)”, en R. Rodríguez y M. J. Bravo (eds.), Mujeres en tiempos de Augusto: realidad social e
imposición legal, Valencia, Tirant, 145-171.
ROHR, F. (2019): Le custodi del potere. Donne e politica alla fine della republica romana,
Roma, Salerno Editrice.
RUIZ, C. (2022): “Concordia: una virtud de paz en las monedas de mujeres del Alto imperio
romano”, Arenal, 29(2), 681-696.
SALLER, R. (1988): “Pietas, Obligation and Authority in the Roman Family”, en P. Kneissl
y V. Losemann (eds.), Alte Geschichte und Wissenschaftsgeschichte: Festschrift für
Karld Christ, Darmstadt, Wissenschaftliche Buchgesellschaft, 393-410.
SEBILLOTTE, V. (2012): “Las Amazonas no son mujeres, luego no existen”, en L. Sancho, L. y otros, (eds.), Logos y arkhé. Discurso político y autoridad en la Grecia Antigua,
Buenos Aires, Miño y Dávila, 103-119.
SORACI, C. (2011): “Speculatrix et propugnatrix meorum periculorum. Essere moglie a Roma in un’epoca di trasformazioni (I sec. a.C.-I sec. d.C.)”, en M. Intrieri y P. Siniscaldo (eds.), La città frammenti di Soria dall’Antichità all’età contemporánea, Roma, Aracne, 81-109.
SYME, R. (2010 [1939]): La revolución romana, Barcelona, Crítica.
TREGGIARI, S. (2005): “Putting the Family Across: Cicero on Natural Affection”, en M.
George (ed.), The Roman Family in the Empire. Rome, Italy, and Beyond, Oxford,
Oxford UP, 9-37.
TREGGIARI, S. (2007): The Women of Cicero’s Family: Terentia, Tullia and Publilia, Londres,
Routledge.
TREGGIARI, S. (2019): Servilia and Her Family, Oxford, Oxford UP.
VEYNE, P. (1987): “El matrimonio. El imperio romano”, en P. Ariès y G. Duby (eds.), Historia de la vida privada. Imperio romano y antigüedad tardía, Madrid, Taurus, 45–61.