terça-feira, 24 de setembro de 2019

PROJETO DE 1891 PARA A NOVA CAPITAL: A VÁRZEA DO MARÇAL


Por Francisco José dos Santos Braga


NOTICIARIO

Mudança da Capital — Conforme lhe requesitou a commissão eleita pelo Congresso para dar parecer sobre Constituição, resolveu o Governo deste Estado nomear os engenheiros Francisco Sá, Antonio Maria de Albuquerque, O. Connell Jersey, Juvenal Sá e Silva e G. Hongan e os medicos dr. Virginio Rolomberg, dr. Joaquim A. Sepulveda, afim de se incumbirem de estudar o local mais apropriado à nova capital do Estado e de apresentarem o respectivo parecer, dentro do praso maximo de 45 dias.
Desta commissão foi posteriormente dispensado o dr. Juvenal Sá por não ter-lhe sido concedida a necessaria licença pelo Ministerio da Agricultura, de que é empregado.

Capital de Minas — A commissão de constituição do Congresso Mineiro votou por 8 votos contra os dos srs. Xavier da Veiga e Levindo Lopes um credito de 4 mil contos para as despesas da mudança da Capital de Minas.

Fonte: GAZETA MINEIRA, São João del-Rei, 29 de abril de 1891, Anno VIII, nº 343, p. 2 e 3.


MELHORAMENTOS
––––––––––––––––––––––––––––––––––
NOVA CIDADE PROJECTADA NA VARZEA DO MARÇAL
Tendo observado e accuradamente estudado as excepcionaes e privilegiadas condicções da Varzea do Marçal situada na confluência dos rios Carandahy e das Mortes, que é neste trecho navegavel a vapor, para ser ahi edificada uma cidade modelo e pujante de elementos de prosperidade, em vista de sua localisação no centro das zonas distinctas do nosso Estado e na directriz das principaes linhas de communicação para todos os pontos de Minas e da Republica, conceberam os drs. Hermillo Alves, Toscano de Britto e Francisco Mourão, a grandiosa ideia de levar avante a construcção dessa nova cidade, que actuaria efficazmente para o engrandecimento do Estado.
Com este fim reuniram todos os documentos ha muito organisados por illustres cidadãos relativamente ao clima e topographia dessa afamada varzea e levantaram-lhe a planta exacta projectando ahi, no terreno natural, uma cidade que não terá superior em vantagens naturaes e onde será: — baratissima a edificação pelas facilidades de construção e riqueza de materiaes; confortável a vida; pequenas as despezas de alugueis, e modicos as de alimentação, pois ficará a nova cidade assentada no celleiro de Minas e relativamente proxima da região do littoral brazileiro.
As suas ruas, todas rectilineas, tem a largura de 20 a 60 metros, e são suas praças espaçosas, sendo as dimensões da principal maiores do que as da Praça da Republica no Rio de Janeiro.
Neste intuito fiseram esses dignos cidadãos requerimento aos poderes publicos pedindo authorisação para essa empreza com os seguintes favores: — cessão, pelo preço das terras devolutas, dos terrenos que o Governo possue nesse lugar, desapropriação, mediante indemnização, das propriedades particulares ahi situadas e preferencia, em igualdade de condicções para diversos serviços publicos da projectada cidade, obrigando-se, entretanto, os concessionarios a dar gratuitamente e nivelados os terrenos das praças e ruas, 100 alqueires para logradoiro municipal e edificios publicos no valor de mil contos de reis.
Sabendo, porém, esses patrioticos cidadãos que o Congresso, em resolução solemne, deliberara retirar de Ouro Preto a séde do Governo, entenderam, e bem, sem entrar no certamen travado, que deviam pôr à disposição do Congresso todos os seus planos e estudos, sem exigir a minima compensação, no presupposto de dever ser esse lugar o preferido para o estabelecimento da Capital, resalvando, apenas, o direito de proseguir na primitiva ideia, si outro fôr o lugar escolhido, o que não esperar-se das luzes e encendrado patriotismo do Congresso.
Obsequiosamente communicaram-nos esses srs. os seus planos e documentos autorisando-nos a dar-lhes publicidade, o que apressamo-nos em fazel-o, como os nossos leitores verão em seguida.
As plantas da nova cidade achão-se em exposição publica no SALÃO ASSIS e na vitrina do sr. Lovalho, aos lados de nossas officinas.

–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

Relatorio complementar da petição pedindo favores para construcção de uma cidade modelo, a margem do Rio das Mortes, entre Tiradentes e S. João d’El-Rei.

Srs. membros do Congresso Mineiro,
A vargem do Marçal, situada a 860 metros acima do nível do mar, a 21 gráos de latitude sul e a 14 de longitude occidental pelo meridiano do Rio de Janeiro, é limitada ao Sul e Oeste pelo Rio das Mortes, ao norte pelo rio Carandahy e a leste pela serra de S. José e collinas que se estendem d’esta às margens do rio Carandahy em cujo leito formão a imponente quéda conhecida pelo nome de “Cascata do Carandahy”.
Com os nomes de Mattosinhos e Quicumby prolonga-se esta planicie pela margem esquerda do Rio das Mortes, e, nesta parte, está assentada a risonha povoação de Mattosinhos, pitoresco arrabalde de S. João d’El-Rei, e afamado pela amabilidade do seu clima e fertilidade exhuberante do seu solo, onde se ostentam muitas chacaras nas quaes se cultivam, com muito bom exito, todas as especies fructiferas da flora brazileira e muitas da flora Européa.
Por um lado, dista a vargem do Marçal cerca de 5 kilometros da cidade de S. José de Tiradentes, e, pelo outro, se liga aos arrabaldes orientaes de S. João d’El-Rei.
À distancia de um kilometro existem as afamadas fontes thermaes conhecidas pelo nome de Aguas virtuosas, cujas preciosas propriedades medicinaes são reconhecidas, tendo perfunctoria analyse demonstrado, ao que nos consta, a existencia de arsenico em uma d’ellas e de ferro em outra ou em outras. Estas aguas, alem d’isto, conservam inalteravelmente a temperatura de 19 gráos centigrados.
Para fundação ahi de um estabelecimento balneario já o Governo de Minas celebrou contracto, em fins do passado anno de 1890, com o cidadão Custodio de Castro Moreira.
Pelo lado sul, a 4 kilometros à nord’este, despenha-se o rio Carandahy em opulenta cascata, com uma queda de 35,50 metros de altura e um volume d’agua de 346 milhões de littros em 24 horas, nas maiores secas, representando uma força superior a 200 toneladas por minuto (noticia publicada em 1881 pelo dr. Henrique Amaral).
O rio das Mortes é ahi navegavel a vapor em uma extensão de cerca de 30 kilometros, navegação que tem sido feita pelo cidadão José Antonio de Almeida.
Pelo lado do Oriente ergue-se a serra de S. José, offerecendo os mais bellos pontos de vista desejaveis, dividida em 2 ramos parallelos, entre os quaes existe, sobranceiro à planicie, um extenso valle, muito aprasivel para habitações campestres, e para o qual se póde subir de carro, tão suave é o seu declive.
Na vargem do Marçal, tão rica de bellezas naturaes, e de que deixamos dada uma ligeira e imperfeita ideia, pode ser edificada uma vasta cidade, contendo folgadamente uma população de 250 mil habitantes, sem incluir as vargens annexas do valle superior do Carandahy e do rio das Mortes, tanto para o lado de S. José de Tiradentes como para baixo, onde existe a fazenda do Pombal em que nasceu e viveu Tiradentes, o proto-martyr da independencia do Brazil.
A cidade desenvolvida por essas vargens que se succedem até S. José de Tiradentes e S. João d’El-Rei, será muito maior do que o Rio de Janeiro.
Na planta que este relatório accompanha está projectada uma cidade nestas condições com 42 ruas de 20 metros de largura, 4 avenidas de 30 metros, e 5 de 50 metros, alem de um boulevard contorno de 60 metros de largura.
O desenvolvimento total das ruas mede 96 kilometros.
Alem destas tem ainda mais a cidade 11 grandes praças e 22 menores, estando entre aquellas uma praça que é maior do que a Praça da Republica (Campo de S. Anna) na Capital Federal.
Incluem-se mais na planta: espaços apropriados para 1 parque, jardim zoologico e outros logares de recreio publico, não sendo de menor encanto as diversões que a navegação do rio das Mortes pode offerecer, onde, como em cidades do Prata, aos abastados da fortuna seria dado construirem habitações fluctuantes, que dotam aquellas cidades de tanta magia e de tanto encanto.
A topographia da vargem do Marçal é tão favorável que permettio, como se vê na planta, projectar-se, ahi, uma cidade modelo já quanto ao delineamento, já quanto à hygiene.
Sobre este ponto de vista não ha mais a desejar-se: o clima, temperado e secco, não tem superior, como o demonstram cabalmente observações officiaes, que a este se juntam, feitas em 1888 por uma commissão do Governo Geral.
Por essas observações vê-se: que o thermometro não apresenta oscillações nem bruscas, nem pronunciadas, visto como no longo periodo de 2 mezes, Julho e Agosto, a oscillação maxima foi em media de 1,9 constante, portanto, de acordo com as exigencias mais severas da hygiene.
Em Setembro a oscillação foi de 1,5.
Em Outubro e Novembro, epocha do verão e das inconstancias, o que disse o thermometro? Oscillou dentro de 3,4 constantemente.
Qual é o hygienista, o mais rigoroso, que não se deixa influenciar por dados tão lisongeiros?
Si a palavra do thermometro é assim sorprehendente confirmão-a cabalmente as observações meteorologicas complementares, porque o psychrometro, no longo espaço de 6 mezes, nos repete uma cifra sempre constante e de oscillações minimas na humidade relativa.
Outrosim o barometro, no mesmo periodo, se apresenta com uma elevação constante, sem saltos, docil, portanto à incontestavel superioridade do meio atmospherico onde o collocaram.
Igualmente o anemometro ao dar-nos conta da direção e força media dos ventos, vem dizer-nos que nesse longo periodo de 6 mezes reinou, quasi que constantemente, o vento N. E., o mais saudavel, todos o reconhecem, da zona intertropical, e com a força media de 3,1 metros no maximo, cifra que pela tabella annexa de Claudel significa de vento ligeiro a vento fresco.
A harmonia pois do thermometro, psychometro, barometro e anemometro autorizam a proposição formal de que o clima d'esta vargem é excepcional ou, antes, providencialmente benefico.
Vejamos agora como as condições teluricas nos são igualmente favoraveis em extremo.
O terreno, em pequena parte arenoso devido às enxurradas da serra, é quasi em sua totalidade de magnifica terra vegetal, sem que existam, em decomposição no subsolo, detrictos, que possam infeccionar a atmosphera. (Veja-se o relatorio do distincto medico da colonia, Dr. Affonso de Azevedo).
Estas condições, que autorisam desde logo a assegurar um logar saluberrimo, são confirmados pelos factos. É asim que na Vargem do Marçal existe um nucleo de colonos recem vindos de 497 habitantes, gente que não tem commodidades hygienicas e nem recursos de tratamento, entretanto, segundo a estatistica official de nascimentos e obitos que accompanha este, para 44 nascimentos em 1890, houve 9 obitos, sendo d'estes 5 adultos e 4 creanças.
Das creanças 3 morreram ao nascer e dos adultos 2 vieram ja gravemente doentes de Itália.
Reduz-se muito, portanto, a estatistica da morte, mas dando de barato, e tomando-a mesmo em bruto, teremos 44 nascimentos e 9 obitos ou um excesso de 35 individuos em uma população de menos de 500 pessoas, isto é, mais de 7% em favor da vida, em uma população onde o conforto, a hygiene, o bem estar, exprimem-se os cuidados uma quantidade negativa.
Esse mesmo relatorio official do medico da Colonia ao Governo nos diz, que na Vargem do Marçal não houve epidemias e que nem sequer ahi penetrou a influenza, epidemia que percorreu o mundo inteiro sem poupar S. João d'El-Rei, com quem, entretanto, sempre estavam em contacto diarios esses colonos.
Nem no logar, nem nas proximidades existem pantanos ou outras causas que possam determinar o impaludismo. Consultado o nivelamento que nos dá a declividade de meio por cento do terreno para o rio das Mortes sobressahe triumphante do estabelecimento perfeito de excellente rede de esgotos, que garantirá em absoluto, tanto quanto ser possa, a salubridade do local. E esta mesma declividade para um subsolo arenoso é o argumento incontrastavel da não existencia do impaludismo.
O rio Carandahy, o Agua Limpa e os mananciaes da serra, todos da melhor agua potavel, como está perfeitamente verificado, offerecem para o abastecimento de agua os seguintes recursos no minimo:
Carandahy    4.000 litros por segundo
Agua Limpa  1.000   "       "        "
Serra               500   "       "        "
                    _____
Total            5.500
ou 475,520,000 em 24 horas.
Todos estes mananciaes podem ser colhidos a menos de 5 kilometros de distancia do principal reservatorio, que se tiver de construir, e offerecem a altura de cerca de 40 metros o mais volumoso (o do Carandahy), e a de cerca de 25 metros os outros.
A começar na orla da cidade estendem-se as mattas virgens do Carandahy e Mosquito, que vão até a Lagôa Dourada, 4 legoas de distancia, e muito alem, mattas riquissimas de madeiras de lei e de marceneria, como sejam o ipê, jacarandá, oleo de diversas especies, peroba, pereira, sucupira, canjerana, cambará, bagre e muitas qualidades de preciosas canellas, etc.
E alem d'estas mattas, mais que suffiientes, a E. F. Oeste conduzirá com a maior facilidade madeiras abundantissimas desde Ibituruna até a decantada matta da Corda.
Na serra que limita a projectada cidade ha bellos calcareiros que dão nos excellentes marmores de varias cores, granito e um apreciado talco-achisto azul que se presta a completo polimento, como pode ser verirficado nas amostras que este acompanham, estando o ultimo empregado aqui nas columnas e arcos dos templos dos Franciscanos e dos Carmelitas, e nas Igrejas de S. José de Tiradentes, ostentando bellas talhas em pedra, que tanto têm extasiado nos illustre visitantes.
Na mesma serra o sr. H. I. Keen, director da companhia de Ocres de S. José, encontrou abundante turfa de 1ª qualidade, louza, mica, etc.
Ha magnifico barro e kaolim em abundancia para todos os productos da ceramica, desde o tijollo de alvenaria até a porcellana; como tambem existem perto jazidas de tabatinga, crystaes, cal, marmore branco e ocres de que já se faz importante exportação, havendo fundada uma Companhia de Ocres na vizinha cidade de Tiradentes.
Sob o ponto de vista da ligação da projectada cidade a todo o opulento estado de Minas por estradas de ferro, é questão conhecida e realisada.
Foi o estrategico desta posição, que assegura esplendido futuro a esta nova cidade, que fez nascer nos peticionarios a idéa de sua fundação.
Realmente: pelas estradas de ferro construidas do Oéste, Central e rêde da Leopoldina, está ligada esta zona à região conhecida por matta de Minas e com o Rio de Janeiro; como está ligada ao norte pela Central e estradas projectadas.
Para o sul, em linha recta, se vae pela Oéste e Muzambinho que se dirige, da estação de Lavras, à fronteira de S. Paulo.
Outrosim se liga com estados meridionaes da Republica pelos ramaes da Muzambinho e Rio Verde, como pela Oéste se prende à Uberaba, Araxá, Bagagem Patos e a sede à região do Paracatú e do S. Francisco.
Accresce mais que fica na directriz nas communicações de Goyaz e Matto Grosso e, pelas linhas projectadas de Oéste e de C..., se ligará ao planalto Central do Brazil, onde, pelo art. 3º da Constituição Federal, deverá ser edificada a nova capital da Republica.
Tendo-se em vista os contractos celebrados para construcção de linhas federaes, este ponto está por via ferrea ligado a todos os estados da Republica, razão pela qual a commissão de Viação Geral disse, em seu relatorio ao Governo Federal, ser a Oéste a arteria principal da viação da Republica.
Dest'arte é liquido não ser preciso alterar-se em cousa alguma o plano de viação geral deste Estado, para que sejam completas, como quasi já o estão, as communicações com todos os pontos do seu vasto territorio.
Constituido aqui um poderoso centro da actividade industrial e commercial no coração de Minas, tão intimamente ligado a todo o Estado, será um seguro penhor de sua união e integridade, e concorrerá para evitar que germinem as idéas de Sul e Oeste à S. Paulo, como do desmembramento da opulenta zona da matta que circumda o estado do Rio de Janeiro.
Demais, pela relativa proximidade da cidade do Rio de Janeiro, permittirá que este grande fóco de riquezas e de população nos forneça meios de rapido povoamento e engrandecimento, e dest'arte a novo cidade reivindicar para Minas, os elementos de vida que a cidade do Rio roubou-lhe harindo nós assim desde logo grande parte de vida, visto como, por todas as condições de salubridade, de belleza, de commodidades, etc., se constituirá a nova cidade invencivel fóco de attracção para aquella população rica, que virá aqui reconstituir-se e fruir as delicias que a mais privilegiada natureza póde offerecer ao homem.
As excepcionaes condições deste logar, sob todos os pontos de vista, para centro de população, ha muito têm sido preconisadas.
Pombal pensou em estabelecer ahi um centro administrativo.
Os Inconfidentes destinaram-o para capital da Republica, como até o consignou a sentença que os condemnou.
E em todas as revoluções de Minas os espiritos ousados o escolhiam para centro de seu governo e operações.
Releva ainda ponderar que esta região está em uma zona comprehensiva de varios municipios, onde não ha memoria de perturbação no correr das estações do anno, sendo por isso enorme a producção de cereaes, o que valeu-lhe o nome, pelo qual a conhecem, de Celleiro de Minas.
De facto, nunca houve aqui carestia de generos alimenticios, que apenas têm, poucas vezes, subido de preço, pela enorme exportação para os municipios da matta e até para Ouro Preto.
O abastecimento, pois, de generos à nova cidade far-se-á com segurança, facilidade e modicidade de preços.
Para terminar, ainda mencionaremos a importante circumstancia de serem todos os terrenos, onde está projectada a cidade, com excepção de 1/10 mais ou menos, propriedade do Estado; estando 1/3 destes distribuidos em lotes incipientes de colonos e 2/3 em lotes não occupados.
Os lotes distribuidos podem ser trocados por outros uberrimos ao lado da colonia situada à margem direita do Carandahy.
São estas as succintas observações documentadas que os peticionarios julgam dever apresentar, não para esclarecimento dos illustres representantes de Minas, porque etes melhor  conhecem a questão aqui ventilada, mas para prova de que o projecto, que formulam, é fructo de um estudo acurado, tem bases de segura prosperidade e visa o engrandecimento do Estado de Minas, que estremecidamente amam e pelo qual farão o que nelles couber afim de que se mantenha sempre a preeminencia entre os estados da União Brazileira.
S. João d'El-Rei, 1º de Maio de 1891.

Convencidos das vantagens que advem ao Estado da fundação de nucleos de população racionalmente escolhidos, tendo em vista os interesses hygienicos e economicos, bem como os agricolas e industriaes, economicos em summa e estrategicos sob o ponto de vista da viação ferrea, concebemos plano de funda neste estado uma cidade modelo approveitando os poderosos e nnumeros elementos que reune a tradicional Varzea do Marçal, situada no valle do Rio Grande, o Missisipe do Brazil.
Para levar a effeito este tentamen, procedemos a estudos completos, como podeis verificar na planta da cidade que projectamos e de relatorio que a ella acompanha.
Esperavamos a reunião do Congresso ordinario para requerermos favores que nos habilitassem a levar aa effeito nossa tentativa, quando o Congresso Constituinte votou a mudança da capital do Estado.
Vimos, pela publicação dos trabalhos do Congresso que o valle do Rio Grande foi lembrado, tendo ate illustres congressistas pedido que a commissão do Governo fosse examinal-o, o que não poude realisar-se por escassez do tempo.
N'estas circumstancias, como a projectada cidade pode prestar-se a ser a capital de Minas, em nossa opinião, vimos offerecer ao illustrado Congresso Constituinte esses estudos, pedindo a V. Excia que se encarregue de ser o apresentante d'elles.
Se o Congresso entender que a cidade projectada deve ser a capital de Minas, offerecemos todos os estudos e plantas sem a menor recompensa ou favor, levados unicamente pelo dever que o patriotismo nos impõe de prestar nosso concurso a esta medida de grande alcance para o futuro do Estado e vencedora na opinião publica.
Pedimos, unicamente, que, se o Congresso Constituinte deliberar não acceitar o logar para a nova capital, nos sejam restituidos os referidos estudos e plantas afim de que possamos proseguir no nosso proposito de levar a effeito a fundação da cidade, para o que levaremos nosso requerimento ao Congresso ordinario.

NOTICIARIO

Capital de Minas — Consta-nos que o illustre congressista sr. dr. Adalberto da Luz apresentou a 29 do corrente mez, ao Congresso Mineiro as plantas, relatorio e estudos dos nossos amigos drs. Hermillo Alves, Toscano de Britto e Francisco Mourão relativamente a nova cidade na Varzea do Marçal, documentos que os mesmos srs. offereciam, sem remuneração de especie alguma, ao Congresso para serem apreciados em sua deliberação sobre a escolha do local para a nova capital.

Fonte: GAZETA MINEIRA, São João del-Rei, 31 de maio de 1891, Anno VIII, nº 346, p. 2 e 3.


A Vargem do Marçal ou A CAPITAL DE TIRADENTES

Folgamos de noticiar que, conforme publicaram os nossos illustrados collegas da Gazeta Mineira, uma commissão composta dos distinctos engenheiros drs. Hermillo Alves, Toscano de Brito e medico dr. Francisco de Paula Moreira Mourão, tenta transformar em realidade o grandioso plano da edificação de uma cidade-modelo na Vargem do Marçal.
Para este fim a supra-dita commissão organizando uma planta de projecto da cidade, levantada conforme a topographia do terreno, acaba de offerecel-a, acompanhando-a de um relatorio scientifico, ao Congresso mineiro, que actualmente se preoccupa com a determinação do melhor logar para a nova capital de Minas.
Assim procedeu a commissão, por saber que a Vargem do Marçal conta no Congresso grande numero de votos e póde obter preferencia pelas inquestionaveis vantagens que apresenta para o dito fim.
Entre todas que já foram por nós apontadas em artigos anteriores e que acabam de ser profiscientemente desenvolvidas pela commissão em seu relatorio, insistimos na facilidade de poder-se ali constituir em pouco tempo um grande nucleo de povoação, pela juncção de São João e São José, as quaes ficariam ligadas à nova cidade como suburbios.
Devido a essa e a outras felizes circumstancias, uma cidade capital edificada na Vargem do Marçal poderá em breve futuro rivalisar com S. Paulo e constituir um centro poderoso de actividade e progresso para Minas, o que de certo não acontecerá em outro logar que não tenha a seu favôr eguaes elementos.
Applaudindo o patriotismo da commissão, resta-nos aguardar e acatar o que fôr resolvido pelo Congresso, de cuja sabedoria tudo esperamos para a solução de tão momentoso assumpto.

Fonte: A PATRIA MINEIRA, São João del-Rei, 4 de junho de 1891, Anno III, nº 108, p. 3.

10 comentários:

Francisco José dos Santos Braga (compositor, pianista, escritor, tradutor, gerente do Blog do Braga e do Blog de São João del-Rei) disse...

Instaurada a República em 15/11/1889, a nova forma presidencialista de governo tinha como filosofia a modernização do país. Em Minas, embora a capital Ouro Preto representasse um passado colonial e imperial, entendia-se que o local deveria ser preservado por ter sido berço da Inconfidência Mineira, mas, a despeito disso, sentia-se a necessidade de mostrar a todo o Brasil uma nova capital mineira, símbolo da modernidade, e que assegurasse a unidade territorial que estava ameaçada pelas oligarquias do Sul e da Zona da Mata. Quando estavam acalorados os debates sobre a mudança da capital mineira, em 7 de abril de 1981 foi instalado o Congresso Constituinte mineiro e, na mesma data, houve a manifestação pessoal do então governador provisório Antônio Augusto de Lima ao referido Congresso Constituinte, na qual destaco o seguinte trecho:

"(...) O governo, no intuito de concorrer para a solução desta magna questão, depois de estudal-a em todas as suas faces, nomeadamente quanto à localização mais appropriada à edificação da nova cidade e de habilitar-se com os esclarecimentos e informações exigiveis, chegou à conclusão de que nenhum outro lugar reune maior somma de condições para o fim em vista, do que o planalto denominado Bello Horizonte, ou valle do Rio das Velhas, no municipio de Sabará, onde possui o estado consideravel extensão de terrenos. (...).
Palacio em Ouro Preto 7 de Abril de 1891."

Foi, então, instituída uma comissão de 11 membros ("Comissão dos Onze"), escolhida entre senadores e deputados, incumbida de dar parecer ao projeto da constituição, ao qual se incluiu a indicação da nova capital do Estado, a pedido do governador provisório.
Foi nesse ambiente polêmico que uma patriótica comissão de dois engenheiros, Drs. Hermillo Alves e Toscano de Britto, e de um médico, Dr. Francisco de Paula Moureira Mourão, apresentou ao Congresso Constituinte um plano de edificação de uma cidade-modelo na Vargem do Marçal, "tendo oferecido todos os estudos e plantas sem a menor recompensa ou favor."
No presente post, trago a público, entre outros assuntos, o relatório feito por essa patriótica comissão, em São João del-Rei, datado de 1º de maio de 1891, mas só publicado na GAZETA MINEIRA em 31 de maio do mesmo ano, com o título "Nova Cidade Projectada na Varzea do Marçal" na coluna Melhoramentos. Apresento igualmente uma matéria publicada em 4 de junho de 1891 in A PÁTRIA MINEIRA, com o título "A Vargem do Marçal ou A Capital de Tiradentes" na coluna Noticiário, aplaudindo o gesto nobre da GAZETA MINEIRA de ter publicado tão importante relatório para a história de São João del-Rei.

Link: https://bragamusician.blogspot.com/2019/09/projeto-de-1891-para-nova-capital.html

Cordial abraço,
Francisco Braga

Ana Lúcia Resende (licenciada na UEMA-Universidade Estadual do Maranhão) disse...

Boa tarde caro Braga.
Extremamente interessante seu trabalho.
Aprecio muito sua escrita e admirável labor de pesquisador e arqueólogo dos fatos.
Att.
Ana Resende

Prof. Fernando de Oliveira Teixeira (professor universitário, escritor, poeta e membro da Academia Divinopolitana de Letras) disse...

Grato pelo instigante tema noticiado. Abraço do Fernando Teixeira

Diamantino Bártolo (professor universitário Venade-Caminha-Portugal, gerente de blog que leva o seu nome http://diamantinobartolo.blogspot.com.br/) disse...

Bom dia, Francisco Braga.
Muito obrigado.
Boa semana
Diamantino Bártolo

José Geraldo Heleno (escritor e membro da Academia Barbacenense de Letras) disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Pe. José Raimundo Batista Bechelaine (filósofo e professor da FUNEDI/UEMG e membro da Academia Divinopolitana de Letras) disse...

Caro Confrade Braga,
Eu não tinha conhecimento nenhum disso. Mas avalio que, se está ideia se tivesse concretizado, teria sido um desastre para São João del Rei, Tiradentes e toda a redondeza. Pois, a meu ver, teriam sido engolidas e desfiguradas pelas exigências e expansão da nova Capital. Assim penso. Obrigado pelas interessantes matérias que você nos envia.
JRBBechelaine

Adenor Simões (escritor e político são-joanense) disse...

Muito importante esse seu registro, meu amigo Francisco.
Nossa história tem que ser preservada e sempre contada.
Forte abraço pra você e pra Rute.

Prof. Cupertino Santos (professor aposentado da rede paulistana de ensino fundamental) disse...

Caro professor Braga;
Curioso mas também, acima de tudo, importante excerto de pesquisa que contribui para a história mineira e brasileira. Impulsos "modernizantes" e bem intencionados na sua origem, também tiveram por contexto, aliás, a transferência da capital brasileira.
Cumprimentos,
Cupertino

Paulo Roberto Sousa Lima (escritor, gestor cultural e presidente eleito do IHG de São João del-Rei para o triênio 2018-2020) disse...

Prezado confrade, bom dia.
Há tempos li um texto (vou buscar a referência...) sobre a história de Belo Horizonte, onde parte do que retrata na seu página é ratificado e mais, no texto se inscrevia que parte da própria Comissão Construtura, formada sob a coordenação do Engº Aarão Reis, concordava com a qualificação da Várzea do Marçal para ali se instalar o projeto não de uma cidade-modelo, mas da própria Cidade de Minas.
Esse tema mostra o quanto se tem ainda que estudar para entendermos as múltiplas Minas dos Gerais. Parabéns pelo bom texto.
Paulo Sousa Lima

Jota Dangelo (diretor, ator, dramaturgo e gestor cultural, cronista e escritor) disse...

Há alguns anos, bem anos, encenei na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, numa primeira edição, no local das reuniões da Assembleia e em segunda edição na entrada do prédio da Assembleia,uma peça de minha autoria "A Mudança da Capital", baseada nas reuniões acontecidas em Barbacena na decisão da mudança da capital de Ouro Preto para Curral del-Rey, depois Belo Horizonte. Até hoje ainda tenho vontade, de vez em quando, de montar o texto em São João del-Rei, já que nossa terra era um dos locais preferenciais para a mudança da capital. Felizmente, na minha opinião, o projeto não foi aprovado...