sábado, 14 de setembro de 2024

GIMPEL, O TOLO

Por ISAAC BASHEVIS SINGER *
Transcrevemos, com a devida vênia da Editora Perspectiva S.A., o referido conto constante da COLEÇÃO JUDAICA, dirigida por J. Guinsburg, vol. 8 de 1966 intitulado O CONTO ÍDICHE, pp. 323-337.
Capa da 1ª edição de Gimfel The Fool, publicado em 1957 pela Noonday Press em inglês, traduzido do iídiche por Saul Bellow - Crédito: https://en.wikipedia.org/wiki/Gimpel_the_Fool
 
Sou Gimpel, o tolo. Não acho que seja um tolo. Ao contrário. Mas é assim que as pessoas me chamam. Deram-me o apelido desde os tempos de escola. Ao todo tive sete apelidos: imbecil, burro, cabelo de palha, toupeira, resmungão, parvo e tolo. O último pegou. Em que consistia minha tolice? Era facilmente enganado. Diziam: "Gimpel, você sabe que a mulher do rabi está dando à luz?" Não fui, pois, à aula. Bem, acontece que era mentira. Como é que eu poderia saber? Ela não estava de barriga grande. Mas eu nunca olhei a barriga dela. Será que isto é assim tão tolo? A turma pôs-se a rir, a zurrar, a patear e a dançar, cantando uma oração da noite. E, em vez das passas que se costuma distribuir quando uma mulher dá à luz, encheram a minha mão de excremento de cabra. 
Eu não era um fracalhão. Se eu acertasse em alguém, ele voaria longe. Mas o fato é que por natureza não sou um valentão. Penso com meus botões: "Deixe estar, não é nada". E é assim que tiram vantagem de mim. 
Voltando da escola, ouvi um cão latindo. Não tenho medo de cachorros, mas é claro que eu jamais os provocaria. De repente, um deles pode estar louco, e, se morder, não existe alma neste mundo que possa ajudar. Foi por isso que me desviei. Depois olhei em volta e vi a praça toda do mercado estourando de rir. Não era cachorro algum mas Wolf-Leib, o ladrão. Como é que eu ia adivinhar que era ele? Era igualzinho a uma cadela uivando. 
Quando os "trelosos" e os "passa-rasteiras" perceberam que era fácil enganar-me, cada um tentou sua sorte comigo. "Gimpel, o Tzar vem para Frampol; Gimpel, a lua caiu em Turbeen; Gimpel, a pequena Hodel Pedaço-de-Pele achou um tesouro atrás da casa de banhos." E eu, como um golem, acreditava em todos. Em primeiro lugar, tudo é possível, como está escrito na Sabedoria dos Pais, só que não sei bem como. Segundo, eu tinha de acreditar, já que a cidade inteira caía em cima de mim! Se alguma vez eu ousava dizer: "Ora, vocês estão brincando!", havia barulho. O pessoal ficava zangado: "Como assim? Quer dizer que todo mundo é mentiroso?" Que é que eu podia fazer? Acreditei neles, e espero, ao menos, que tenham ficado satisfeitos. 
Era órfão. Meu avô, que me criara, já estava com o pé na cova. E por isso me entregaram a um padeiro e como me infernizaram a vida lá! Toda menina, toda mulher que vinha assar um tabuleiro de biscoitos ou secar a massa de macarrão tinha de me fazer de tolo pelo menos uma vez. "Gimpel, no céu há uma feira; Gimpel, o rabi deu à luz um bezerro no sétimo mês; Gimpel, uma vaca voou sobre o telhado e pôs ovos de cobre." Uma vez apareceu um aluno da ieschivá para comprar um doce e disse:  Sabe, Gimpel, enquanto você estava aqui mexendo com a pá de padeiro, o Messias veio. Os mortos ressuscitaram. 
Que é que você está dizendo?  repliquei.  Não ouvi ninguém soprando o schofar
Ele falou:  Será que você é surdo? 
E todos começaram a gritar:  Nós ouvimos, nós ouvimos! Então Reitze, a fazedora de velas, apareceu, bradando com sua voz rouca:  Gimpel, seu pai e sua mãe levantaram-se do túmulo. Estão à sua procura. 
Para dizer a verdade, eu sabia muito bem que nada disso ocorrera, mas de qualquer maneira, já que todo o mundo estava falando, meti a minha roupa de lã e saí. Talvez tivesse acontecido alguma coisa. Que é que eu ia perder em procurar saber? Precisavam ver a algazarra que se levantou! Foi então que fiz a promessa de não acreditar em mais nada. Mas também não deu certo. Confundiam-me de tal modo que não mais sabia distinguir o branco do preto. 
Fui ao rabi à procura de conselho. Disse-me:  Está escrito: melhor ser tolo todos os dias de sua vida que ser mau uma hora que seja. O tolo não é você: são eles. Pois aquele que faz seu próximo envergonhar-se perde ele mesmo o paraíso. 
Depois de tudo isto a filha do rabi me engabelou. Ao sair do tribunal do rabi, disse-me ela:  Você já beijou a parede? 
Respondi:  Não, para quê? 
Explicou:  É uma lei, é preciso fazê-lo depois de cada visita. 
Bem, não parecia haver nenhum mal nisso. E ela explodiu na risada. Foi um belo truque. Ela me fez uma boa, não há dúvida. 
Quis ir embora para outra cidade, mas então todo o mundo começou a querer me arranjar casamento e tanto grudavam em mim que quase me rasgavam a roupa. Falavam, falavam, a ponto de me encher os ouvidos. Ela não era nenhuma donzela, mas a mim diziam que era uma virgem pura. Tinha um defeito no andar e diziam que era de propósito, de denguice. Era mãe de um bastardo, e a mim diziam que a criança era seu irmão menor. Gritava-lhes:  Vocês estão perdendo seu tempo. Jamais me casarei com aquela prostituta. 
Respondiam, indignados:  Isso é jeito de falar? Não sente vergonha de si mesmo? Poderíamos levá-lo ao rabi para multá-lo por injuriar a moça. 
Percebi então que não me livraria tão facilmente deles e pensei: "Estão resolvidos a fazer de mim seu palhaço. Acontece, porém, que quando a gente casa, o marido é que é o patrão, e se isto servir para ela, para mim também está bem. Além disto, não se pode passar pela vida em branca nuvem, nem esperar que assim seja". 
Fui até o casebre da moça, construído na areia, e a turma toda, berrando em coro, vinha atrás de mim. Comportavam-se como gente de circo. Quando chegamos ao lugar, pararam todos ao mesmo tempo. Tinham medo de se meter com Elka. Poria a boca no mundo e tinha uma língua feroz. Entrei na casa. Havia cordas estendidas de parede a parede e roupas secando. Estava junto ao tanque, descalça, lavando roupa. Vestia um surrado roupão de pelúcia. Usava tranças presas no alto da cabeça. Aquele cheiro quase me tirou o fôlego. 
Evidentemente, sabia quem eu era. Deu-me uma olhada e disse:  Vejam, quem está aqui! Ele veio, o bocó. Apanhe uma cadeira. 
Eu lhe contei tudo; não ocultei nada. 
Diga-me a verdade  disse eu  você é realmente virgem? E este infeliz do Iehiel, é de fato seu irmão menor? Não seja falsa comigo, pois sou órfão. 
Eu também sou órfã  respondeu  e se alguém quiser levá-lo no bico, que leve a breca. Mas eles que não pensem que podem tirar vantagem de mim. Quero um dote de cinquenta florins e, fora isso, que façam uma coleta. Senão, podem ir a... 
Ela era muito despachada. Retruquei:  É a noiva e não o noivo quem dá o dote. 
Nada de pechinchas comigo  replicou ela.  Sim-sim, não-não e pode tomar o caminho de volta. Pensei: "Deste mato não sai coelho". Mas a nossa cidade não é uma cidade pobre. Concordaram com tudo e começaram os preparativos do casamento. Acontece que na época grassava uma epidemia de disenteria. A cerimônia deu-se às portas do cemitério, perto da casa onde se preparavam os corpos. Os rapazes ficaram bêbados. Enquanto o contrato de casamento era redigido, ouvi o mais piedoso rabino-mor perguntar:  É a noiva viúva ou divorciada? 
E a mulher do coveiro respondeu por ela:  Ambos, viúva e divorciada. 
Foi um momento negro para mim. Mas que é que eu podia fazer, abandonar a noiva debaixo do pálio nupcial? 
Houve música e dança. Uma velhinha dançava à minha frente, abraçando um halá entrançado e branco. O mestre de cerimônia fez um "Deus tenha piedade" em memória dos pais da noiva. Os meninos de escola jogavam como no dia de Tischa B'Ab ¹. Ganhamos uma porção de presentes depois do sermão: um tabuleiro de macarrão, uma tina de amassar pão, um balde, vassouras, colheres, objetos de uso doméstico. Então dei uma olhada e vi dois fortes rapagões carregando um berço:  Para que precisamos disto?  perguntei. Então disseram:  Não dê tratos à bola por causa disto. Tá tudo certo, ele terá serventia. 
Percebi que ia ser engabelado. Por outro lado, que é que eu ia perder? Refleti: "Vamos ver no que vai dar tudo isso. Não é possível que a cidade inteira esteja ficando louca". 
 
¹ Nono dia de Ab: dia do mês em que os Judeus relembram com luto e jejum a destruição do Primeiro e do Segundo Templo.
 
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À noite fui até a cama onde minha mulher estava deitada, mas ela não me aceitou.  Ora essa, então foi para isso que nos casaram?  disse eu. 
E ela respondeu:  Minhas regras chegaram. 
Mas ontem a levaram ao banho ritual, e isto costuma ser depois, não é? 
Hoje não é ontem  retrucou  e ontem não é hoje. Pode dar o fora, se não gostar. 
Em resumo, esperei. 
Menos de quatro meses depois, ela deu à luz. A gente da cidade mal escondia as risadas. Mas que é que eu podia fazer? Ela sofria dores tão intoleráveis que quase subia pelas paredes. 
Gimpel  gritava  estou morrendo. Perdoe-me! 
A casa se encheu de mulheres. Ferviam panelas de água. Os gritos subiam aos céus. 
A única coisa a fazer era ir à Casa de Orações recitar salmos e foi o que fiz. 
A gente da cidade gostou disto, sem dúvida. Fiquei num canto rezando salmos e orações e eles acenavam com a cabeça em minha direção. 
Vai rezando, vai!  diziam para mim.  Rezar nunca engravidou mulher alguma. 
Um dos membros da congregação quis enfiar uma palha na minha boca, dizendo:  Feno para o gado... 
Por Deus, não teriam eles razão? 
Ela deu à luz um menino. Sexta-feira, na sinagoga, o schamess levantou-se perante a Arca, bateu na mesa de leitura e anunciou:  O digno Reb Gimpel convida a congregação para uma festa em honra ao nascimento de um filho. 
A Casa de Orações inteira ressoou de risos. Meu rosto estava em chamas. Mas não havia nada que eu pudesse fazer. Afinal, eu era o único responsável pelas honras da circuncisão e dos rituais. Metade da cidade veio correndo. Não cabia nem uma agulha mais. As mulheres trouxeram grão-de-bico apimentado, e havia um pequeno barril de cerveja da taverna. Comi e bebi tanto quanto os outros e todos se congratularam comigo. Depois, houve a circuncisão e dei ao menino o nome de meu pai, que ele repouse em paz. Quando todos haviam saído e eu me achava sozinho com minha mulher, ela pôs a cabeça por entre as cortinas da cama e me chamou para perto dela. 
Gimpel  falou  por que você está tão quieto? Será que você perdeu a fala? 
Que é que eu posso dizer?  respondi.  Veja o que você me fez? Se minha mãe soubesse disto, tornaria a morrer pela segunda vez. 
Ela se indignou:  Você está maluco, ou o quê? 
Como é que você pode fazer de mim um tolo tão grande, eu, que deveria ser seu amo e senhor?  Que é que há com você?  indagou.  Que é que você meteu na cabeça?
Percebi que tinha de falar rude e abertamente:  Você acha que é assim que se trata um órfão?  falei.  Você deu à luz um bastardo. 
Tire esta loucura de sua cabeça. A criança é sua  respondeu ela. 
Como é que pode ser minha?  argumentei.  Ela nasceu dezessete semanas depois do casamento. 
Então ela me contou que a criança era prematura. Disse-lhe:  Não será um pouco prematura demais? 
Explicou-me que tivera uma avó cuja gestação também era curta assim e que ela se parecia com aquela avó como uma gota de água se parece com a outra. Jurou com juramentos tais que qualquer pessoa teria acreditado até num campônio da feira, se ele os empregasse. Para falar a verdade, não acreditei nela; mas quando, no dia seguinte, conversei com o melamed a respeito, contou-me que a mesma coisa havia acontecido a Adão e Eva. Começaram a dois e logo se viram a três. 
Não há mulher no mundo que não seja neta de Eva  disse ele. 
Era essa a situação: me encheram os ouvidos com seus argumentos. Mas, afinal, quem é que realmente sabe como são essas coisas? 
Comecei a esquecer minha mágoa. Amava loucamente a criança e ela me amava também. Logo que me via, acenava-me com as mãozinhas e queria que a pegasse, e quando tinha cólicas, eu era o único que sabia acalmá-la. Comprei-lhe um pequeno anel de osso para os dentes e um pequeno solidéu dourado. Estava constantemente pegando mau-olhado, e então eu tinha de correr e buscar um daqueles exorcistas para curá-la. Trabalhava como uma besta. Bem, sabem como as despesas aumentam quando há uma criança em casa. Não pretendo mentir a respeito; não é que eu não gostasse de Elka, por causa disso. Ela blasfemava e me amaldiçoava, e eu não me fartava dela. A força que ela tinha! Era capaz de tirar a fala de qualquer pessoa com um de seus olhares. E seus discursos? Eram como raios e trovões, mas, ainda assim, cheios de encanto. Eu adorava todas as suas palavras. Ela me feriu profundamente, contudo. 
De noite, levava-lhe um pão branco, um pão preto e também rolinhos de semente de papoula assados por mim. Roubava por causa dela e passava a mão em tudo que podia: macarrão, passas, amêndoas, bolos. Espero que me perdoem por ter roubado das panelas de sábado que as mulheres deixavam para assar no forno do padeiro. Eu tirava pedaços de carne, um bocado de pudim, uma perna ou cabeça de galinha, um pedaço de tripa, qualquer coisa que pudesse furtar rapidamente. Ela comia e ficava gorda e bonita. 
Tinha de dormir fora de casa, na padaria, durante toda a semana. Na sexta-feira, quando vinha para casa, ela sempre tinha uma desculpa. Ou estava com azia, ou com uma pontada do lado, ou soluços, ou dor de cabeça. Você sabe como são as desculpas das mulheres. Ela me fez passar maus pedaços. Era duro. Ainda por cima, aquele seu irmão menor, o bastardo, estava crescendo. Atirava-me coisas e quando eu queria revidar, ela abria a boca no mundo e praguejava com tanta força que eu via uma névoa flutuando ante meus olhos. 
Dez vezes por dia ameaçava divorciar-se. Um outro homem, em meu lugar, tomaria o sumiço. Mas eu sou do tipo que aguenta e não diz nada. Que é que se vai fazer? Deus deu os ombros e os fardos também. 
Uma noite na padaria aconteceu uma desgraça; o forno explodiu e quase houve um incêndio. Não havia nada a fazer exceto ir para casa, e então fui. Deixe-me, pensei, provar também a alegria de dormir na minha cama no meio da semana. Não quis acordar o pequenino adormecido e entrei na casa na ponta dos pés. Ao entrar, pareceu-me ouvir não o ronco de um, mas era como que um duplo ronco, um que era bem fino e outro semelhante ao de um boi no matadouro. Ai, meu Deus, não gostei, não gostei nem um pouco! Fui até a cama e as coisas, de repente, ficaram pretas. Junto a Elka estava a forma de um homem. 
Outro em meu lugar teria armado um escândalo e barulho suficiente para levantar a cidade toda, mas ocorreu-me o pensamento de que poderia acordar a criança. Uma coisinha como aquela - "para que assustar um pardalzinho como este", pensei. Pois bem, voltei à padaria e estendi-me sobre um saco de farinha e até o amanhecer não preguei olho. Tremia como se tivesse malária. "Chega de ser burro", disse eu com meus botões. "O Gimpel não há de ser um trouxa a vida toda. Existe um limite mesmo para a tolice de um tolo como Gimpel." 
De manhã fui ao rabi em busca de conselho, e isto provocou imenso rebuliço na cidade. Mandaram o bedel em busca de Elka na mesma hora. Ela veio, carregando a criança. E que é que você pensa que ela fez? Negou, negou tudo, do começo ao fim. 
Ele está fora de si!  berrou.  Não tenho nada a ver com os sonhos ou as visões dele. 
Gritaram com ela, preveniram-na, bateram na mesa, mas ela continuou firme: "era acusação falsa", dizia. 
Os açougueiros e os mercadores de cavalo tomaram seu partido. Um dos rapazes do matadouro veio e disse para mim:  Estamos de olho em você; você é um homem marcado. 
Neste ínterim a criança começou a fazer força e se sujou. Na corte rabínica havia uma Arca Sagrada e não podiam permitir isto, de modo que mandaram Elka embora. 
Eu disse ao rabi: 
Que é que vou fazer? 
Você deve divorciar-se imediatamente  respondeu. 
E se ela recusar? 
Você deve pedir o divórcio, é a única coisa que você pode fazer. 
Bem, está certo, rabi. Deixe-me pensar a respeito. 
Não tem nada que pensar. Você não deve permanecer sob o mesmo teto com ela. 
E se eu quiser a criança?  perguntei. 
Deixe-a ir, aquela meretriz, e aquele bando de bastardos com ela. 
O seu veredito foi que eu não devia sequer pisar a soleira da casa dela, nunca mais, enquanto eu vivesse. Durante o dia não me incomodava tanto. Pensei: "Tinha de acontecer, o tumor tinha de rebentar". Mas, à noite, quando me estendia sobre os sacos de farinha, sentia tudo com muita amargura. A saudade dela e da criança tomava conta de mim. Queria estar zangado, mas esta é exatamente a minha desgraça, não está em mim ficar realmente zangado. "Em primeiro lugar  era assim que meus pensamentos iam  é sempre possível haver um deslize. Não se vive sem cair em falta. Provavelmente aquele rapaz que esteve com ela a levou na conversa e lhe deu presentes e não sei o que mais, e as mulheres muitas vezes têm o cabelo comprido e a inteligência curta, pode ser que a levou no bico. E depois, já que ela nega tudo, pode ser que eu esteja apenas vendo fantasmas. Alucinações podem acontecer. Você vê uma figura ou um boneco ou qualquer coisa e chegando mais perto, não é nada, não existe nada lá. E se assim for, estou cometendo uma injustiça para com ela." E quando cheguei a este ponto, em meus pensamentos, comecei a chorar. Soluçava tanto que molhei a farinha sobre a qual estava deitado. De manhã fui à casa do rabi e disse-lhe que tinha cometido um engano. O rabi continuou na sua escrita e falou que, se assim era, precisaria reconsiderar o caso. Até lá eu não deveria me aproximar de minha mulher, mas poderia mandar-lhe pão e dinheiro por mensageiro. 
 
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Nove meses se passaram até que todos os rabis pudessem chegar a um acordo. Cartas foram para lá e para cá. Não imaginara que pudesse haver tanto erudição por causa de um caso como este. 
Entrementes, Elka deu à luz mais uma criança, desta vez uma menina. No sábado, fui à sinagoga e invoquei uma bênção sobre ela. Chamaram-me para recitar a Torá e dei à criança o nome de minha sogra, que ela repouse em paz. Os grosseirões e os desbocados da cidade passaram pela padaria para me gozar. Toda Frampol ganhou vida nova por causa de minha desgraça. contudo, decidi acreditar sempre naquilo que me contavam. De que adianta não acreditar? Hoje é em sua mulher que você não acredita, amanhã nem mesmo em Deus. 
Por intermédio de um aprendiz que era seu vizinho, diariamente eu lhe mandava pão de cevada ou de trigo, ou então uma fatia de pastelão, bolinhos ou beiguelech, ou quando possível, um pedaço de pudim, uma fatia de bolo de mel ou strudel de casamento  tudo que atravessasse meu caminho. O aprendiz era um rapaz de bom coração e mais de uma vez acrescentou alguma coisa por sua conta. Antes me amolava bastante, puxando meu nariz e furando minhas costelas, mas quando começou a ser um visitante de minha casa, tornou-se amigo: 
Olhe aqui, Gimpel, você tem uma mulherzinha muito decente e dois belos filhos. Você não os merece. 
Mas as coisas que dizem sobre ela...  repliquei. 
Bem essa gente é muito linguaruda  explicava.  Só sabem é mexericar. Esqueça-os como esqueceu o frio do inverno que passou. 
Um dia o rabi mandou-me chamar e disse:  Você tem certeza, Gimpel, que se enganou a respeito de sua mulher? 
Tenho  respondi. 
Bom, mas olhe aqui! Você mesmo o viu. 
Deve ter sido uma sombra. 
Sombra de quê? 
De uma das vigas, eu acho. 
Então pode ir para casa. Pode agradecer ao rabi de Ianover. Ele encontrou uma referência obscura em Maimônides que favoreceu a você. 
Agarrei a mão do rabi e beijei-a. 
Quis correr para casa imediatamente. Não é fácil ficar separado durante tanto tempo de mulher e filhos. Depois refleti: "É melhor voltar ao trabalho agora e ir para casa de noite." Não disse nada a ninguém, apesar de meu coração se sentir como nos Dias Terríveis ². As mulheres me importunavam e escarneciam como costumavam fazer todos os dias, mas eu pensava: "Podem continuar com sua conversa fiada. A verdade subiu como o óleo na água. Maimônides disse que está certo; portanto, está certo!" 
À noite, depois de cobrir a massa para deixá-la crescer, peguei minha parte do pão e um pequeno saco de farinha e rumei para casa. A lua estava cheia e as estrelas cintilavam; era de meter medo à alma. Apressava-me em meu caminho e na minha frente alongava-se uma delgada sombra. Era inverno, tinha caído neve fresca. Senti vontade de cantar, mas estava ficando tarde e não queria acordar os de casa. Depois senti vontade de assobiar, mas lembrei que não se deve assobiar à noite porque isto atrai os demônios. Mantive-me, pois, em silêncio e andei o mais depressa que pude. 
Ao passar pelos quintais dos cristãos, os cachorros latiam contra mim, mas eu pensei: "Que latam até cair os dentes! Que são vocês senão uns pobres cachorros? Ao passo que eu sou um homem, o marido de uma boa mulher, o pai de crianças promissoras." 
Quando me aproximei da casa, meu coração começou a bater como se fosse um criminoso. Não senti medo, mas meu coração fazia bum! bum! Bom, nada de recuar. Sem ruído levantei o trinco e entrei. Elka estava dormindo. Olhei para o berço da criança. A veneziana esta fechada, mas a lua forçava seu caminho pelas frestas. 
Vi o rosto do recém-nascido e amei-o desde o primeiro instante  imediatamente  cada pedacinho dele. 
Depois aproximei-me da cama. E que é que eu vi... o aprendiz deitado ao lado de Elka. A lua desapareceu de repente. Estava completamente escuro e eu tremia. Meus dentes batiam. O pão caiu de minhas mãos e minha mulher acordou e disse: 
Quem está aí? 
Sou eu  murmurei. 
Gimpel?  perguntou. 
Como é que você veio aqui? Não é proibido? 
O rabi deixou  respondi, tremendo como se estivesse com febre. 
Escute, Gimpel, vá lá fora no alpendre e veja se a cabra está bem. Parece que ela está doente. 
Esqueci-me de contar que tínhamos uma cabra. Quando soube que estava indisposta, fui ao quintal. A cabrinha era uma boa criatura. Nutria por ela um sentimento como se fosse humana. 
Com passos hesitantes, fui ao alpendre e abri a porta. A cabra lá estava nas suas quatro patas. Apalpei-a toda, puxei-a pelos cornos, examinei suas tetas, e não achei nada de irregular. Provavelmente tinha comido casca de árvore demais:  Boa noite, cabrinha. Passe bem. 
E o animalzinho respondeu com um "Mé" como que para me agradecer a boa vontade. 
Voltei. O aprendiz tinha sumido. 
Onde está o rapaz  perguntei. 
Que rapaz?  minha mulher respondeu. 
Ora essa... O aprendiz. Você estava dormindo com ele. 
Tomara que as coisas que sonhei esta noite e a noite passada  começou a falar  tomara que elas se realizem e o arrasem, de corpo e alma! Um mau espírito o possuiu e está te perturbando a vista. 
Pôs-se a berrar:  Sua criatura abominável! Seu lunático! Seu bruxo! Seu espantalho! Suma daqui, ou vou acordar Frampol inteira com meus gritos! 
Antes que pudesse esboçar um movimento, seu irmão saltou da estufa às minhas costas e me golpeou na cabeça. Pensei que me tivesse quebrado o pescoço. Senti que algo estava profundamente errado comigo, e disse:  Não façam um escândalo. Só faltava agora as pessoas me acusarem de levantar fantasmas e dibukim
Pois era isso que ela havia insinuado. 
Daí, ninguém vai querer tocar no pão que eu fizer. 
Em resumo, consegui acalmá-la de alguma maneira. 
Bem,  disse ela  basta. Deite-se e vá pro inferno. 
Na manhã seguinte chamei o aprendiz de lado:  Olhe aqui, irmão!  falei. E assim por diante. 
Que é que você está dizendo?  Ele me encarou como se tivesse caído do telhado ou algo assim. 
Juro  continuou  é melhor você ir consultar um médico ou algum curandeiro. Acho que está lhe faltando um parafuso, mas não vou contá-lo a ninguém. 
E era nesse pé que se encontravam as coisas. 
Para encurtar uma longa história, vivi durante vinte anos com minha mulher. Ela deu à luz seis filhos, quatro meninas e dois meninos. Toda sorte de coisas aconteceu, mas nada vi nem ouvi. Acreditei, e só. O rabi, há pouco tempo atrás, disse para mim:  A fé por si só é benéfica. Está escrito que um homem bom vive pela sua fé. 
De repente minha mulher ficou doente. Começou com uma ninharia, um pequeno crescimento no seio. Mas, aparentemente, não era seu destino viver muito tempo: seus anos estavam contados. Gastei uma fortuna com ela. Esqueci de contar que a esta época eu já possuía uma padaria própria e que era considerado em Frampol quase um homem rico. 
Diariamente vinha o curandeiro e todo e qualquer médico de poderes mágicos na vizinhança era chamado. Decidiram usar sanguessugas e depois disto tentaram operar. Chamaram até um médico de Lublin, mas era tarde demais. Antes de morrer, ela me chamou à sua cabeceira:  Perdoe-me, Gimpel. 
Eu disse:  Não há nada para ser perdoado. Você foi sempre uma mulher boa e fiel. 
Chi, Gimpel!  ela disse.  Foi muito feia a maneira como o enganei todos estes anos. Gostaria de ir limpa ao meu Criador e por isso devo-lhe contar que as crianças não são suas. 
Se tivesse recebido uma cacetada na cabeça, não poderia ter ficado mais desconcertado. 
De quem são?  perguntei. 
Não sei.  respondeu  Havia tantos... Mas não são seus. 
E, ao falar, virou a cabeça para o lado, seus olhos se tornaram vidrados, e tudo havia terminado para Elka. Seus lábios esbranquiçados conservavam um sorriso. 
Imaginei que, mesmo depois de morta, continuava dizendo:  
Enganei Gimpel. Esta foi a razão de minha breve vida. 
 
² Dias terríveis ou "iamim noraim": os dez dias que incluem as maiores festividades judaicas, o Ano Novo e o Dia de Expiação. Este último (Yom Kipur) ocorre anualmente no dia 10 de Tishrei, o primeiro mês do calendário hebraico.
 
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Uma noite, terminado o período de luto, quando estava sonhando deitado sobre os sacos de farinha, o Espírito do Mal veio em pessoa e me disse: 
Gimpel, por que é que você está dormindo? 
Respondi:  Que é que eu devia fazer? Comer kreplach
O mundo inteiro abusa de você e você deveria, por sua vez, abusar do mundo. 
Como posso abusar de todo o mundo?  perguntei-lhe. 
Respondeu:  Poderia juntar um balde de urina todo dia e à noite derramá-lo na massa de pão. Que os sábios de Frampol comam imundície! 
E como serei julgado no outro mundo?  indaguei. 
Não há outro mundo. Impingiram-lhe um saco de coisas e o convenceram de que você estava com um gato na barriga. Que bobagem! 
Pois bem  falei  e Deus existe? 
Respondeu:  Deus também não existe. 
Que é que existe, então? 
Uma sujeira bem grossa. 
Estava de pé diante de mim, com uma barba de cabra e cornos, dentes compridos e um rabo. Ao ouvir tais palavras, quis pegá-lo pelo rabo, mas caí nos sacos de farinha e quase quebrei uma costela. Depois aconteceu que tive de satisfazer um imperativo da natureza e, passando, vi a massa crescida, que parecia falar para mim:  "Faça-o!" Em resumo, deixei-me persuadir. 
Ao amanhecer, chegou o aprendiz. Amassamos o pão, espalhamos semente de cariz nele e o pusemos a assar. Depois o aprendiz foi embora e fiquei sentado no pequeno lugar escavado junto ao forno, numa pilha de madeira. "Bem, Gimpel,  pensei,  você se vingou de toda a vergonha com que eles o cumularam." Lá fora o frio luzia, mas estava quente junto ao forno. As chamas esquentavam meu rosto. Baixei a cabeça e caí num sono leve. 
De repente, em sonho, vi Elka em sua mortalha. Interpelou-me: 
Que é que você fez, Gimpel? 
Respondi-lhe:  É tudo por sua culpa  e comecei a chorar.  
Seu tolo!  disse ela.  Seu tolo! Só porque fui falsa, tudo é falso também? Não enganei ninguém, a não ser a mim mesma. Estou pagando por tudo, Gimpel. Não me poupam nada aqui. 
Olhei a sua face. Estava negra. Acordei sobressaltado e quedei-me estupidificado. Tive a sensação que tudo estava na balança. Um passo falso agora e perderia a Vida Eterna. Mas Deus deu-me Seu auxílio. Alcancei a pá comprida e tirei os pães, carreguei-os para o quintal e comecei a cavar um buraco na terra congelada. 
Nesse meio tempo, meu aprendiz voltou:  Que é que está fazendo, patrão?  perguntou e ficou pálido como um cadáver. 
Sei o que estou fazendo  disse, e enterrei tudo bem diante de seus olhos. 
Depois fui para casa, tirei minhas economias do esconderijo e as dividi entre as crianças: 
Vi a mãe de vocês esta noite  contei-lhes.  Ela está ficando negra, coitada. 
Estavam tão pasmados que não puderam pronunciar uma palavra. 
Felicidades  falei  e esqueçam que alguém como Gimpel jamais existiu. 
Vesti meu casaco, as botas, tomei da bolsa que continha meu xale de oração em uma das mãos, e na outra, meu cajado, e beijei a mezuzá. Quando as pessoas me viram na rua, ficaram muito surpresas. 
Aonde vai?  perguntaram. 
Respondi:  Pelo mundo afora. E assim parti de Frampol. 
Caminhei por sobre a terra e as boas almas não me esqueceram. Muitos anos se passaram, tornei-me velho de cabelos brancos; e ouvi muitas coisas, muita mentira e muita falsidade, mas, quanto mais vivi, mais compreendia que na realidade não eram mentiras. Tudo o que não acontece realmente é sonhado à noite. Acontece para um quando não acontece para outro, amanhã senão hoje, ou um século mais tarde, quando não no ano que vem. Que diferença pode fazer? Muitas vezes ouvi coisas das quais se dizia: "Bem, aí está algo que não pode ocorrer." Mas, antes de se passar um ano, ouvia que o fato realmente ocorrera algures. 
Indo de lugar a lugar, comendo em mesas estranhas, muitas vezes desfio longas estórias  coisas improváveis que não poderiam nunca ter acontecido  sobre diabos, mágicos, moinhos de vento e assim por diante. As crianças correm atrás de mim, chamando: "Avôzinho, conte-nos uma estória." Às vezes pedem estórias especiais e procuro agradar-lhes. Um rapaz gordo disse-me, certa vez: "Avôzinho, esta você já nos contou antes." Aquele malandrinho, ele tinha razão. 
Assim se dá também com os sonhos. Faz muitos anos que deixei Frampol, mas logo que fecho os olhos, estou lá de novo. E a quem pensam vocês que eu vejo? Elka. Parada junto ao tanque de roupa, como no nosso primeiro encontro, mas sua face resplandece e os olhos são radiantes como os olhos de uma santa, fala estranhas palavras para mim, coisas extraordinárias. Quando acordo, esqueci-me de tudo. Mas, enquanto o sonho dura, sinto-me reconfortado. Responde a todas as minhas perguntas e daí resulta apenas que tudo está bem. Choro e suplico: "Deixe-me ficar com você." E ela me consola e me pede para ser paciente. O tempo está mais próximo do que longe. Às vezes, ela me acaricia e beija e chora sobre meu rosto. Ao acordar, sinto seus lábios e provo o sal de suas lágrimas. 
Sem dúvida, este mundo é inteiramente um mundo imaginário; foi simplesmente separado, em tempos idos, de um mundo verdadeiro. Na porta da choupana, onde estou deitado, encontra-se a prancha na qual os mortos são levados. O coveiro judeu tem pronta a sua pá. O túmulo está esperando e os vermes estão famintos; a mortalha está pronta, carrego-a no meu saco de mendigo. Um outro schnorrer está à espera para herdar minha cama de palha. Quando o tempo chegar, irei alegremente. 
Como quer que seja lá, será verdadeiro, sem complicação, sem ridículo, sem decepção. Deus seja louvado: lá nem mesmo Gimpel pode ser enganado. 
 
GLOSSÁRIO
 
beigelech: rosca
dibuk (pl. dibukim): alma errante, penada, condenada a vagar entre o céu e a terra, por causa de suas faltas. É uma concepção cabalístico-hassídica. 
golem: literalmente, corpo informe, embrião, homúnculo, autômato. Gigante de barro, cuja criação era atribuída aos cabalistas. Tem também o sentido pejorativo de bronco, estúpido, imbecil.
halá: nome dado ao pão que é feito para o Schabat e as festividades.
iamim noraim: Dias Terríveis; os dez dias que incluem as maiores festividades judaicas, o Ano Novo e o Dia de Expiação
ieschivá: escola ou seminário rabínicos, academia talmúdica, escola de estudos judaicos superiores.
kreplach: pastelzinho recheado com carne picada.
melamed (pl. melam'dim): professor. Em geral, de primeiras letras no sistema educacional religioso que vigorou entre os Judeus.
mezuzá: estojo de metal que contém, em pergaminho, os primeiros parágrafos da oração Sch'ma Yisrael (Ouve, Israel), e que serve de talismã, sendo colocada no batente das portas.
rabi: rabino
reb: senhor, sr.
schamess: bedel de sinagoga
schnorrer: mendigo, miserável. Designa um tipo popular de pedinte, achacador, impudente.
schofar: chifre, corno. Denomina a trombeta de chifre de carneiro, que se toca na sinagoga durante a solenidade do Ano Novo e no encerramento do Yom Kipur (Dia de Expiação).
strudel: torta de maçã com massa folhada

Um comentário:

Francisco José dos Santos Braga disse...

Prezad@,
ISAAC BASHEVIS SINGER, nascido em 1903 em Leoncin (comuna rural polonesa) e faleceu em 1991 em Surfside, Flórida) foi um autor polonês-americano de ascendência judaica, conhecido principalmente por seus contos. Ele foi uma das principais figuras do movimento literário iídiche e é considerado o maior escritor em língua iídiche do século XX, pelo que foi ganhador do Prêmio Nobel de Literatura em 1978.
Nosso autor está entre os maiores escritores na citada língua, um idioma germânico dos judeus ashquenazitas que habitavam a Europa central e oriental. A fonética do iídiche lembra o idioma alemão. Infelizmente, o iídiche está em extinção e há poucos falantes nativos para tal idioma, embora já tenha sido a principal língua falada pelos judeus da cultura ashquenazita.
O Blog do Braga já publicou outros trabalhos cujo tema é essa maravilhosa língua, tais como Um Amigo de Kafka pelo mesmo contista Bashevis, Nos Rastros do Cabalista de Praga, Como se diz Adeus em Judeu-arábico? e A Mãe Judia: da canção gravada por Sophie Tucker a Philip Roth.

Em 1945, ambientado nos Estados Unidos, Bashevis publicou o conto "GIMPEL, O TOLO", onde se destacam o clima e a atmosfera do shtetl (significando um pequeno aglomerado urbano, tipo aldeia), onde, durante um largo período, viveram os judeus da Europa Oriental), que nutriu o imaginário de Bashevis durante sua estada em Bilgoray, Polônia.
O conto “Gimpel, o tolo” é ambientado na era pré-moderna. Gimpel é enganado e ridicularizado por todo o mundo, mas com sua ingenuidade, acaba levando a melhor, porque sua fé é inabalável.”

TEXTO
Link: https://bragamusician.blogspot.com/2024/09/colaborador-isaac-bashevis-singer.html 👈

BREVES NOTAS SOBRE O AUTOR
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Cordial abraço,
Francisco Braga