terça-feira, 30 de junho de 2015

EPITÁFIO DE SEIKILOS: duas contribuições ao estudo de sua "partitura"


Por Francisco José dos Santos Braga




Ὅσον ζῇς φαίνου
μηδὲν ὅλως σὺ λυποῦ
πρὸς ὀλίγον ἐστὶ τὸ ζῆν
τὸ τέλος ὁ χρόνος ἀπαιτεῖ.
(Estrofe em koiné no Epitáfio de Seikilos)

Όσο ζείς, να λάμπεις
να μη λυπάσαι καθόλου,
γιατί η ζωή είναι σύντομη
ο χρόνος απαιτεί τον φόρο του.
(Mesma estrofe em grego moderno)

"Brilha, enquanto viveres,
não  te entristeças demasiado;
a vida existe só por um instante
e o tempo cobra seu tributo."
(Minha tradução)


"Tant que tu vis, montre-toi joyeux.
Ne te lamente jamais longtemps.
La vie est peu de chose
Et son terme est fixé par le temps."
(Épitaphe de Seikilos, par Gérard de Nerval)

"As long as you live, shine
Let nothing grieve you beyond measure.
For your life is short 
and time will claim its toll."



I. GROUT, Donald J. & PALISCA, Claude V.: História  da Música Ocidental, Cap. 1, parte 1.2b ¹


Apesar das contradições e imprecisões que dificultam o trabalho do estudioso dos textos antigos sobre música, há uma correspondência assinalável entre os preceitos teóricos de Aristóxeno a Alípio e os fragmentos musicais que sobreviveram. Dois dentre estes prestam-se a ser estudados com algum pormenor: o epitáfio de Seikilos (NAWM 2) e um coro do Orestes de Eurípides (NAWM 1).

Ambos os exemplos ilustram até que ponto os escritos teóricos podem servir de guia para a compreensão dos recursos técnicos da música grega que subsistiu até aos nossos dias. Os sistemas tonais descritos na literatura parecem ter aplicação na música escrita e poderão ter sido igualmente fundamentais para a música mais corrente que não ficou registrada por escrito. Entretanto, convém lembrar que, se Eurípides escreveu a música do fragmento do Orestes, fê-lo quase um século antes de Aristóxeno e de outros autores começarem a analisar o sistema de tons. Por conseguinte, não é de admirar que esse fragmento não se harmonize tão bem com a teoria. Se a canção de Seikilos está mais de acordo com a teoria, talvez seja porque a teoria orientou a sua composição.



NAWM 2 — Epitáfio de Seikilos





O epitáfio de Seikilos, embora seja o mais tardio dos dois exemplos, será examinado em primeiro lugar, uma vez que está completo e apresenta menos problemas analíticos. O texto e a música estão inscritos numa estela ou pedra funerária encontrada em Aidin, na Turquia, próximo de Trales, e datam, aproximadamente, do século I d. C. Todas as notas da oitava mi-mi', com Fá sustenido e Dó sustenido (v. exemplo 1.5), entram na canção, de forma que a espécie de oitava é inequivocamente identificável como aquela a que Cleónides deu o nome de frígia, equivalente à escala de Ré nas teclas brancas de um piano. A nota que mais se destaca é o lá, sendo as duas notas extremas mi e mi'. A nota lá é a mais frequente (oito vezes), e três das quatro frases começam com ela; mi' é a nota mais aguda das quatro frases e repete-se seis vezes; mi é a nota final da peça. De importância subsidiária são sol, que encerra duas das frases, mas é omitido no fim, e ré', que é a última nota de outra das frases.

A importância do lá é significativa, porque se trata da nota central, ou mese, do sistema perfeito completo. Em Problemas, obra atribuída a Aristóteles (mas que poderá não ser inteiramente da sua autoria), afirma-se o seguinte: "Em toda a boa música o mese repete-se com frequência, e todos os bons compositores recorrem frequentemente ao mese, e, se o deixam, é para em breve voltarem a ele, como não o fazem com mais nenhuma nota.
²
 
A oitava mi-mi', com dois sustenidos, é um segmento da dupla oitava Si-si', identificada por Alípio como correspondendo ao tonos diatônico iástico, uma forma menor do modo frígio que é também conhecida pelo nome de tonos  jônico (v. exemplo 1.5 e figura 1.1). Este tonos
[ou modo] transpõe o sistema perfeito maior para um tom inteiro acima da sua localização natural, hipolídia, em Lá-lá', na notação de Alípio. A identidade do tonos, porém, não parece ser essencial à estrutura da peça, pois as notas que nela mais se destacam, lá e mi, funcionam nesse tonos como lichanos meson e paranete diezeugmenon, ambos instáveis (v. exemplo 1.3). Na escala tética, em contrapartida, as notas mi, lá e mi' são hypate meson, meson, mese e nete diezeugmenon, todas notas estáveis, e a espécie de quinta lá-mi', que domina a maior parte da peça, bem como a espécie de quarta mi-lá, que prevalece no final, dividem a espécie de oitava em duas metades consonantes.

Exemplo 1.5 — Epitáfio de Seikilos (transcrição)







Foi possível analisar a estrutura tonal desta breve canção segundo os critérios explanados pelos teóricos. No que diz respeito ao ethos da canção, pode dizer-se que não é eufórico nem depressivo, mas sim equilibrado entre os dois extremos, o que está em harmonia com o tonos jônico. Na ordenação dos quinze tonoi segundo Alípio, o jônico, com proslambanomenos em Si e mese em si, ocupa um lugar intermédio entre o mais grave, o hipodórico, com proslambanomenos em Fá e mese em fá, e o mais agudo, o hiperlídio, com proslambanomenos em sol e mese em sol'. As terceiras maiores dariam ao ouvinte de hoje, e provavelmente também ao da época, uma impressão de alegria, tal como a quinta ascendente de abertura. A mensagem do poema é, com efeito, otimista.


Estela funerária de Aidin, próximo de Trales, na Ásia Menor.
Tem inscrito um epitáfio, uma espécie de escólio ou canção de bebida,
com notação melódica e rítmica; o autor é identificado nas primeiras
linhas como sendo Seikilos. Datação provável: século I a.C.
(Copenhague, Museu Nacional, nº 14.897 de inventário)


Figura 1.1 — Análise da inscrição de Seikilos




A canção de Seikilos teve especial interesse para os historiadores devido a clareza da sua notação rítmica. As notas sem sinais rítmicos por cima das letras do alfabeto equivalem a uma unidade de duração (chronos protos); o traço horizontal indica um diseme, equivalente a dois tempos, e o sinal horizontal com um prolongamento vertical do lado direito é um triseme, equivalente a três tempos. Cada verso tem doze tempos.


❀      ❀      ❀


II. MATHIESEN, T.J.: Apollo's Lyre: Greek music and music theory in Antiquity and Middle Ages, University of Nebraska Press, 1999, p. 148-151  ³


Entre os fragmentos musicais preservados, uma composição tem sido frequentemente descrita como um skólion ou escólio (σκόλιον): o famoso Epitáfio de Seikilos inscrito numa lápide. Embora essa peça seja curta e simples no estilo, seu contexto dificilmente sugere um skólion. Antes, a peça é um epigrama, uma curta e simples estrofe comumente colocada em lápides funerárias e placas votivas.  Como observado acima, o escoliasta a Górgias de Platão 451e faz uma associação explícita entre o epigrama e o skólion, e não é surpreendente a confusão dos modernos estudiosos sobre essa composição.

O Epitáfio de Seikilos tem tido uma história verificada. Pela primeira vez trazida à atenção dos estudiosos em 1883, a lápide formou uma parte da Coleção De Jong in Borja perto de Esmirna (Izmir hoje em dia) até o incêndio da cidade em setembro de 1922, após o que a coluna desapareceu por 35 anos. Sua redescoberta foi anunciada em 1957, e em 1966 compôs as coleções do Museu Nacional em Copenhague (Invº 14897). Uma fricção da pedra feita logo após sua descoberta inicial mostra que a lápide então exibia 13 linhas de texto, com notação musical aparecendo sobre as linhas 6-11. Um pouco antes de 1922, a linha 13 foi destruída quando o fundo da pedra foi polido de forma que ela pudesse ficar ereta e servisse de pedestal para um vaso de flores!

A paleografia da inscrição permite que a lápide seja seguramente datada do século I d.C., e as primeiras cinco linhas da inscrição claramente identificam o objetivo da coluna:
Eu sou a lápide, uma imagem. Seikilos colocou-me aqui como um sinal duradouro de memória perene.
O próprio epigrama segue imediatamente, disposto em 6 linhas na coluna. A disposição, contudo, é meramente devida às exigências de espaço; a composição é claramente construída em 4 linhas de jâmbico dímetro.
(Aqui foi reproduzido o Exemplo 1.5 transcrito acima)

Como os outros fragmentos discutidos neste capítulo, o Epitáfio de Seikilos exibe inúmeras sílabas dicrônicas (por exemplo, a penúltima sílaba na linha 2) e comuns que podiam ser ambíguas fora do contexto musical. Mas, diferentemente de outras peças, esta composição apresenta clara notação rítmica em toda parte: sílabas que já seriam longas por posição ou natureza recebem ainda um diseme para garantir a adequada duração, sílabas que seriam breves no texto (por exemplo, a penúltima sílaba na linha 3) viram longas pela música, e fica claro o valor de toda sílaba ambígua. Trisemes aparecem ao fim de cada linha bem como no meio da primeira linha, em cada caso recaindo num ditongo ou numa vogal longa com um acento circunflexo. Esses sons longos e cheios recebem desta forma ênfase extramusical, especialmente porque eles sempre seguem uma longa duração musical, e essa extensão musical das sílabas longas certamente lembra a observação de Dionísio de Halicarnasso de que sílabas longas e breves têm extensões que variam: "algumas são mais extensas do que as longas e algumas, mais curtas do que as breves." Além da clareza da notação rítmica, "stigmai" designam todo pé; a maioria delas recaem em disemes ou trisemes, porém nas linhas (3-4) onde a segunda metade do primeiro pé está separado em três curtos "chronoi", cada um recebendo uma "stigme", exatamente  como foi visto na análise do papiro de Orestes.

Não há modulações no Epitáfio, e a notação claramente indica o tonos diatônico iástico. O plano melódico dessas poucas linhas faz uso considerável de padrões de composição mélica descrita por teóricos posteriores como Cleónides e Aristides Quintilianus, incluindo sequência ascendente e descendente (ἀγωγή), que é particularmente notável na linha 2, e sucessão (πλοκή), que aparece no fim da linha 3 e começo da linha 4. No geral, a composição emprega bastante conscientemente a extensão de uma oitava, com fortes pontos polares em e', a', e e''. Além disso, as linhas 2-4 estão relacionadas por óbvias afinidades motívicas, e a arpeggiatura ascendente e descendente da oitava inteira na linha 4 fornece um forte equilíbrio cadencial para a quinta ascendente da abertura na linha 1.

Em vista de sua data relativamente tardia, parece razoável supor que essa peça possa ter sido deliberadamente composta com um olho na direção dos princípios teóricos articulados pelos teóricos como Cleónides ou talvez Ptolomeu, especialmente porque a peça se ajusta perfeitamente dentro do tonos frígio. De qualquer forma, a melodia simples mas perfeitamente equilibrada e controlada parece bem adequada à natureza epigramática do texto:

Brilha, enquanto viveres,
Não te entristeças demasiado;
A vida existe só por um instante
E o tempo cobra seu tributo.

O significado preciso das linhas (12-13) seguindo o epigrama permanece incerto — especialmente desde que a linha 13 não sobrevive mais sobre a lápide —, mas, como a primeira palavra é claramente o nome de Seikilos de novo, as linhas podem ter pretendido identificar Seikilos como o autor do epigrama.
 
III.  NOTAS  EXPLICATIVAS




¹  Trata-se do 1º capítulo do livro que já se encontra traduzido em Portugal. Foram necessários apenas alguns ajustes para o português do Brasil.

³  Toda a matéria contida nas páginas 148 a 151 são de minha tradução, bem como os trechos que se encontram abaixo, extraídos das páginas 142 a 144 desse livro de Mathiesen.

  Skolion de Seikilos é como ficou também conhecido o mais antigo exemplo conhecido de música grega antiga. 
Cf. in https://en.wikipedia.org/wiki/Skolion


[MATHIESEN, 1999, 142-143] observa que "os escritores gregos diferem entre si nas suas descrições do skólion, e parece que o termo foi aplicado a vários diferentes tipos de canção realizados nos banquetes. Embora possam não ter sido executados em todo banquete, duas características de performance eram comuns: os convidados cantavam sucessivamente, talvez mais frequentemente de forma aleatória; e seguindo a ordem dos cantores, passava-se um ramo de murta de convidado a convidado. Além disso, a expectativa é que os cantores se acompanhassem à lira. Plutarco descreve o processo no Livro I, questão 1, das suas Quæstiones convivales: "Quanto aos skólia, alguns dizem que eles pertencem ao tipo de canções obscuramente construídas, mas que primeiro os convivas juntos cantariam a canção do deus, solando o peã, e, passando adiante a cada por vez, era dado o ramo de murta   (que chamava de aisakos, eu acho, porque o homem a receber canta) e também a lira era passada ao redor, o convidado que podia tocar o instrumento o tomaria e cantaria, enquanto o não executante  o recusaria , e assim o skólion deve seu nome ao fato de não ser cantado por todos e não ser fácil. Mas outros dizem que o ramo de murta não prosseguia de cada convidado a seu vizinho em sequência ordenada, porém era passado de triclínio a triclínio de cada vez, que o primeiro homem a cantar repassava-o ao primeiro homem no segundo triclínio, e este último ao primeiro homem no terceiro triclínio, e assim por diante; assim, dizem, parece que foi dado o nome de skólion à canção devido ao caráter complicado e tortuoso de sua trajetória."
(...) 
Ao definir o skólion, Chrestomathia de Proclus adiciona algum detalhe. O skólion, parece, podia ter caráter mordaz e satírico, e era influenciado pela embriaguez dionisíaca: "O canto skólion era praticado em festins báquicos. É livre na construção e extremamente simples. É chamado de skólion, não, como alguns supõem, por antífrase (pois palavras por antífrase na maioria das vezes visam ao eufemismo, não transformar uma observação positiva num boato maldoso), mas antes porque, quando os sentidos estão arrebatados e os adeptos estão perto do vinho, o bárbito é introduzido nos banquetes, e sob a influência de Dioniso, cada comensal é precariamente interrompido na sua expressão do canto. Quando os que estão embriagados convertem isso em canto, chamam isso, mais simplesmente, de skólion.



  Apud [MATHIESEN, 1999, 144]: "No Prytaneum de Atenas eram cantados skólia enquanto bebiam para certos homens como Harmodius, Admetus, Telamon; e esse tipo de canção foi chamado skólion por antífrase por ser fácil de cantar e tinha apenas algumas linhas como os epigramas; eram chamados de skólia porque os companheiros de farra ofereciam a vergôntea um ao outro em volta e os que não cantavam eram considerados não musicais (incultos)."

  Lira grande de nove cordas. 
Cf. in https://en.wikipedia.org/wiki/Barbiton

Horácio, na Arte Poética (v. 83-85), compôs lindos versos, indo do sacro ao profano, quando fala da função da lira (fidēs, ĭum), usando metáforas para diferentes gêneros líricos, a saber: 



“(...) musa dedit fidibus Divos puerosque Deorum
et pugilem victorem et equum certamine primum
et iuvenum curas et libera vina referre (...)”.    


“ (...) musa concedeu à lira o cantar deuses e filhos de deuses; o vencedor no pugilato e o cavalo que, primeiro, cortou a meta nas corridas; os cuidados dos jovens e o vinho que liberta dos cuidados (...)”.
(trad. Rosado Fernandes, 1984) 




IV.  BIBLIOGRAFIA




GROUT, D.J. & PALISCA, C.V.: História da Música Ocidental, Lisboa: Gradiva — Publicações Ltda, 5ª ed., 2007.



MATHIESEN, T.J.: Apollo's Lyre: Greek music and music theory in Antiquity and Middle Ages, University of Nebraska Press, 1999, 811 p.


quinta-feira, 25 de junho de 2015

PADRE GODINHO PRESTA HOMENAGEM PÓSTUMA A JOHN FITZGERALD KENNEDY




Por Francisco José dos Santos Braga


Padre Godinho (☆ Carmo da Cachoeira, 1920 ✞ São Paulo, 1992)


Enquanto houver homens como eles (Abraham Lincoln e John Kennedy), a liberdade não perecerá sobre a face da terra, pois ela não pede apenas líderes, exige também os mártires.


I.  INTRODUÇÃO


Em 26 de novembro de 1963, o Deputado Padre Godinho pediu a palavra, em sessão da Câmara dos Deputados, para registrar nos Anais o sentimento de consternação que assolara o mundo com o assassinato do 35º Presidente dos Estados Unidos, John Fitzgerald Kennedy, ocorrido em Dallas, Texas, no dia 22. Em seu discurso desenvolve mote latino, que se traduz por "Caíram as trevas".

Pe. Godinho, na tribuna, destacava-se pela eloquência e erudição. Conhecedor de várias línguas, prendia seus ouvintes citando e comentando vários autores nos seus respectivos idiomas. Era um prazer ouvi-lo em seus discursos, nos quais deixava transparecer a argúcia do sacerdote, doutor em Filosofia, Teologia e Direito Canônico pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma.



II.  O DISCURSO DO DEPUTADO PADRE GODINHO EM 26 DE NOVEMBRO DE 1963



Discurso proferido por Pe. Godinho em sessão da Câmara dos Deputados em 26/11/1963, publicado no Diário da Câmara dos Deputados de 27/11/1963, p. 9.261 


Senhor Presidente, Senhores Deputados.

Foi como se uma luz se tivesse apagado, de repente, no mundo. "Tenebræ factæ sunt." ¹

Foi como se uma noite de angústia e de soturnos íncubos tivesse baixado, repentinamente, sobre a face da Terra. "Tenebræ factæ sunt."

Foi como se um pesadelo e uma delirante alucinação tivessem, inesperadamente, dilacerado nas suas garras de loucura o coração de milhões de homens. "Tenebræ factæ sunt."

Eram aquelas horas mansas e preguiçosas, quando a tarde escorre, plácida, para os braços do crepúsculo, velho e cansado porteiro da noite. Mas, aquele dia, a noite se antecipou. Ia descer primeiro sobre os corações, depois, sobre o mundo.

Na hora sexta, "tenebræ factæ sunt." A noite com o seu mistério, a noite com os seus fantasmas, a noite com o seu pavor, a noite com a sua mentira, a noite com as suas armadilhas sagazes e as suas emboscadas traiçoeiras, a noite com os seus laços bem urdidos e os seus venenos sutis, com os seus gritos solitários e os seus uivos lancinantes, a noite que gela o coração e acoberta o crime, a noite que atrai a vítima desprevenida e empresta à morte o seu regaço de sombra  para solerte tocaia – aquele dia, a noite chegou inesperada, trazendo no seu bojo a gargalhada sinistra que, num átimo – num átimo quase eterno, num átimo que fixou o tempo e estancou o fluxo da História – ecoou pelos quatro cantos do mundo, como que desafiando a mais tenaz capacidade de crer, zombando da mais desesperada esperança e deixando escorrer a baba envenenada do ódio inimaginável, do ódio que se julgara proscrito, para sempre, da convivência humana.

Com os olhos vendados pela súbita escuridão e velados pelas primeiras lágrimas que nenhuma força humana consegue reter, homens e mulheres de todas as raças e de todas as crenças tentaram agarrar-se a alguma coisa que lhes permitisse não crer, que desmentisse as palavras sinistras que, àquela hora, já se atropelavam nas asas das ondas velozes por sobre montanhas e mares, cidades e vales, até a última fronteira do mundo. Mas, ai de nós, a verdade temida, a verdade terrível, a verdade jamais pressentida, era, desgraçadamente, a verdade verdadeira.

A milhares de quilômetros, numa cidade embandeirada em festa, entre flores e aclamações, entre os gritos dos peões na pradaria sem fim, ao cheiro acre do petróleo brotando aos borbotões do solo esturricado, alguém fechara a derradeira porta à compreensão e à fraternidade, e uma janela se abrira ao ódio assassino, covarde e desvairado. Sobre ela a morte se debruçara paciente e tranquila, fria e calculada. Como quem sabe que a presa não lhe fugirá. Como quem não tem pressa porque conhece a sua hora. Como o caçador previdente a quem o instinto não engana e sabe que a flecha da sua aljava é ligeira e é certeiro seu olho experimentado. Como o encenador que prepara a tragédia para que o herói caia, entre o céu e a terra, ao som das tubas gloriosas, ao rufar de místicos tambores, ante o espanto da multidão colhida de surpresa e as vozes do coro que justifica, soturno, a catástrofe.

Foi assim que alguns estampidos ecoaram na hora do triunfo, no instante do mais belo sorriso, quando a árvore jovem forte era mais forte do que nunca, quando deitava sólidas raízes no chão de um mundo áspero e agressivo, quando os primeiros frutos da luta tenaz e da teimosa esperança apenas amadureciam para a fartura dos vazios seleiros e para as expectativas das alegres colheitas. Estampidos naquela hora de glória, espocando no céu claro do outono, seriam sempre os rojões da alegria, soltados pelas mãos escuras de algum negro agradecido, nunca o rumor das balas assassinas partidas das janelas do ódio, das mãos de um jovem cevado no ódio e educado para o ódio; que, não podendo renegar a sua pátria, como desejou, conheceu o plano sinistro de privá-la de quem dedicara a vida a restituir ao mundo, no plano temporal, o amor banido e a fraternidade perdida.

Lá em cima, uma janela se esvaziava, uma sombra se prendia na multidão, um rosto e uma mão chamuscados eram apenas duas manchas de pólvora numa página virada da história dos homens. Lá em baixo, uma fronte jovem se curvava para sempre repousada sobre os joelhos da esposa jovem e bela, com uma grinalda vermelha a envolver-lhe os densos e revoltos cabelos negros. A grinalda da sua vitória, a coroa da sua luta, a paga da sua esperança, o prêmio da sua vida. “Só o que corre no estádio recebe o prêmio”, disse alguém que entendia disso - Paulo, Apóstolo. Lá em cima, a mansarda vazia, uma arma escondida entre livros, restos de uma refeição feita com sossego e sem temores de olhos indiscretos.

Lá embaixo, um mundo vazio, um corpo exânime e os restos de uma vida que não temeu os olhos dos homens, nem a ira dos insensatos, nem os esgares do ódio cego e fratricida. Lá em cima e lá em baixo, dois jovens, dois mundos – o mundo do desespero, que o ódio engendra e constrói, e o mundo da esperança, que só o amor é capaz de plasmar com os pobres materiais que a condição humana oferece, uma visão que ultrapassa o tempo e tira a sua força dos valores eternos. Uma janela se fechou para o mundo; uma porta se abriu para a eternidade. Uma rua de Dallas, manchada de sangue quente como o perdão rubro, como as flores do martírio, é a nova fronteira entre o amor que redime e o ódio que o esteriliza e mata, entre a liberdade que é capaz de dar a vida para que outros a tenham e a opressão que a estanca nas mais recônditas fontes do espírito, antes mesmo de destruí-la na pobre e frágil argila do corpo humano.

Foi dessa rua que ficará, quem sabe, como um marco redentor na história do século trágico, que partiu para o mundo a terrível noticia. John Fitzgerald Kennedy, o jovem; John Fitzgerald Kennedy, o herói de guerra; John Fitzgerald Kennedy, o cidadão do mundo; John Fitzgerald Kennedy, o paciente artesão da paz entre os homens; John Fitzgerald Kennedy, o marinheiro dos celestes oceanos; John Fitzgerald Kennedy, que reintegrou na casa grande de seu povo os irmãos enjeitados da raça escura como a noite; John Fitzgerald Kennedy, o menino grande que tinha nas mãos as sortes da humanidade; John Fitzgerald Kennedy, o que acreditava e, por isso, amou e, por isso, esperava; John Fitzgerald Kennedy, o 35º Presidente dos Estados Unidos da América; John Fitzgerald Kennedy, o pai de dois pequenos anjos que lhe iluminavam os poucos instantes em que lhe era dado dedicar-se a si e aos seus; John Fitzgerald Kennedy já não existe.

Oh! A fragilidade dos homens, a vacuidade do poder, a inanidade da glória!

Uns poucos centímetros de metal, o ódio longamente semeado e transformado em sistema de vida bastam para que uma existência se interrompa e sejam sacudidos os alicerces da História.

Mas o jovem caído em plena caminhada, o soldado prostrado em pleno fragor da áspera batalha, o menino irlandês, predestinado para ter nas mãos as sortes do mundo no século dos deslumbramentos da ciência e da técnica, sabia de cor as palavras que, ontem, ressoaram sob as abóbadas da Catedral de São Mateus: vita mutatur, non tollitur. ² A morte não é um fim, é apenas uma mudança; não é um termo, é apenas uma transfiguração dos mártires caídos sob o fio da espada, pregados à cruz infamante, assados nas grelhas ardentes, ou triturados pelos dentes das feras. Diz a Liturgia antiga: Visi sunt oculis insipientium mori; illi autem sunt in pace.  Aos olhos dos insensatos, parecem ter morrido; eles, porém, estão em paz. Seu sangue tinha fecundidade de vida, era semente semeada por mãos inesperadas.

Ele está em paz – o menino grande que o mundo amava e cuja partida chorará por longo tempo. Partiu cedo, mas redimiu o seu tempo. Viveu em plenitude essa curta vida. Dele se conhecem gestos de grandeza e de heroísmo. Não se conhece uma só gesto de mediocridade.

Na Universidade, onde forjou seu espírito e o enriqueceu de ideias; na Marinha, onde lutou pela liberdade; no Parlamento, onde se inaugurou na vida pública e onde se credenciou para a magistratura mais alta; na Presidência, onde recebeu um legado onde parecia ímpar aos seus jovens anos, John Kennedy foi sempre o primeiro na luta, na tenacidade do risco, e o último no repouso sobre os êxitos colhidos. 

Nascido num berço de ouro, viu o irmão mais velho, piloto voluntário da Força Aérea, desaparecer nos céus com as dez toneladas de explosivos do seu avião. Ele mesmo, voluntário da Marinha, foi, pouco depois, guindado à posição de comando de seu pequeno barco, que um destróier inimigo poria a pique ao largo das Ilhas Salomão. Não abandonou um só de seus homens, nadando ferido uma noite inteira, e conduzindo-os a salvo. Carregou para sempre as marcas da ferida que o colocou, pela primeira vez, face a face com a morte. Mais tarde, já senador pelo seu Estado natal, a enfermidade recrudesceu, o rapagão forte teve de recorrer a muletas para caminhar. Mas a doença não o abateu. “Prefiro morrer – disse aos médicos que lhe comunicavam as poucas esperanças de êxito para operação a que devia se submeter –, prefiro morrer a ter de caminhar de muletas”. As muletas não eram o seu forte. Não nascera para elas, nem elas existiam para ele. A longa convalescença levou-o ao estudo da vida dos grandes homens do seu país e daí nasceu um livro que não faltou sequer a láurea de um famoso prêmio literário e a que não faltará – espero – o capítulo derradeiro que retrate para as gerações o “perfil de coragem do seu próprio autor". 

Para um moço de espinha ferida não era fácil carregar sobre os ombros o peso do mundo. Mas, por que, na história destes anos de Kennedy na Presidência do seu país e o luto universal que toldou as esperanças da humanidade na sexta-feira trágica, é o melhor atestado de que na guerra, ou na doença, na luta do Parlamento e na cadeira de Lincoln e Roosevelt, John Kennedy não provou jamais o gosto da mediocridade? Venceu o preconceito da religião, venceu o preconceito da raça, venceu o preconceito da mocidade.

"Hoje, o mundo é muito diferente. Porque o homem retém em suas mãos mortais o poder de abolir toda forma de vida humana.”  ³

Quem disse isso foi um jovem de quarenta 43 anos, no seu discurso de posse na Presidência da República. “Raras vezes a beleza da forma, num discurso de circunstância, foi tão despida de ornamento para servir a verdades tão puras que parecem nascidas para o mármore das mais nobres inscrições”. (Carlos Lacerda, prefácio a A Estratégia da Paz, de John F. Kennedy, Difusão Pan-Americana do Livro, 1961.)

"Era a nova geração que tomava nas mãos a direção de um mundo que desembocava na era atômica e no ciclo das conquistas espaciais. Sem ter posto em ordem ainda o quintal de suas casas.”

“Que deste momento e deste lugar chegue aos amigos e aos inimigos a notícia de que a tocha foi passada a uma nova geração de norte-americanos, nascidos neste século, temperados pela guerra, disciplinados por uma paz fria e amarga, orgulhosos de nossa antiga herança e não dispostos a testemunhar a lenta destruição dos direitos humanos com que esta nação esteve sempre comprometida e com os quais estamos hoje comprometidos.”

“Que saiba toda nação, quer nos queira bem ou nos deseje o mal, que pagaremos qualquer preço, suportaremos qualquer encargo, suportaremos qualquer dificuldade, apoiaremos qualquer amigo e nos oporemos a qualquer inimigo, a fim de assegurar a sobrevivência e o êxito da liberdade.” 

O preço mais alto, o preço que não tem preço, foi pago, sexta-feira, em Dallas, no Texas, por si e pelo mundo.

"Aos que vivem em choças e aldeias, em metade do globo, lutando por romper as cadeias da miséria, prometemos nossos melhores esforços, para ajudá-los a se ajudarem durante o tempo que for necessário, não porque os comunistas o estão fazendo, não porque queremos os seus votos, mas porque é justo. Se a sociedade livre não puder ajudar os muitos que são pobres, não poderá jamais salvar os poucos que são vivos.”

Às Repúblicas irmãs ao sul de nossas fronteiras fazemos uma promessa especial – de transformar nossas boas palavras em atos bons numa nova Aliança para o Progresso; de ajudar os homens e governos livres a se libertarem das cadeias da miséria. Entretanto, esta pacífica revolução da esperança não se pode tornar uma presa de potências hostis. Que saibam todos os nossos vizinhos que nos uniremos a eles na oposição à agressão e à subversão, em qualquer parte das Américas. E que saiba toda outra potência que este hemisfério pretende continuar dono de sua própria casa.

Unamo-nos para invocar as maravilhas da ciência, em vez de seus terrores. Exploremos juntos as estrelas, conquistemos os desertos, erradiquemos as enfermidades, toquemos as profundezas do oceano e estimulemos as artes e o comércio. Unamo-nos para escutar em todos os recantos da terra o mandato de Isaías: 'Desfazei os pesados fardos da opressão e deixai livres os oprimidos'.” 

E, quase numa estranha profecia: 

"Em vossas mãos, meus concidadãos, mais do que nas minhas, estará o êxito ou fracasso da nossa senda. Desde que este país foi fundado, cada geração foi chamada a dar testemunho de sua lealdade nacional. Os túmulos de jovens norte-americanos que atenderam a este chamamento pontilham o globo.” 

A partir de ontem, o seu túmulo, entre os heróis de Arlington, diz que ele não se enganara.

"Concidadãos do mundo: não pergunteis o que os Estados Unidos podem fazer por vós e, sim, o que podeis fazer, juntos, pela liberdade do homem.” 

Com uma consciência tranquila como única recompensa e a História como juiz final dos nossos atos, marchemos avante para guiar a terra que amamos, implorando a bênção e a ajuda de Deus, porém sabendo que, aqui na terra, o trabalho de Deus deve ser, na realidade, o nosso próprio trabalho. 

Esse discurso inaugural, de que acabo de ler trechos colhidos aqui e ali, vale como um testamento, a que deverão ser juntadas, como codicilo, as palavras derradeiras, que deviam ter sido  pronunciadas em Dallas:

"Nós, neste país, nesta geração, somos, por destino, mais do que por escolha, as sentinelas das muralhas da liberdade mundial. Porque, como foi escrito há muito tempo, 'a não ser que o Senhor monte guarda à cidade, em vão vigiarão sentinelas'.

Quando a Câmara presta, reverente, o tributo da sua dor pela perda que o mundo acaba de sofrer, não é certamente a hora para recolher os admiráveis pensamentos desse jovem que pôs, corajosamente, as ideias a serviço da ação, num mundo em que pseudo–ideologias estão apenas a serviço da subversão. Seus discursos e pronunciamentos ficarão, como os de Lincoln, como os de Jefferson, como os de Churchill, como os de Rui, transformados num roteiro de liberdade, válidos para todos os tempos e para todas as gentes. Sobre eles se curvarão os responsáveis pelas sortes do mundo. Sobre eles se debruçará a juventude que foi feita para o amor e para as nobres, difíceis e ousadas empresas, como as que ele ousou, amou, e levou a cabo, e não para o ódio homicida e para as inúteis carnificinas.

Fique assinalado, nesta hora, o nosso pesar mais sentido. Seja manifestada a nossa amargura mais profunda. Que Deus o tenha em paz e nos alimente do seu exemplo, para que não caiamos na tentação de descrer de qualquer esforço e para que não vejamos triunfantes sobre seu túmulo a brutalidade da opressão, contra cujo domínio ele imolou, mais que a liberdade, uma vida que já era um patrimônio dos homens livres.

Aos olhos dos insensatos, parece ter morrido; ele, porém, está em paz.

Suas crianças não o tiveram ontem, não o terão amanhã, não o terão nunca mais, para ajudá-las a apagar as pequeninas velas do pequeno bolo dourado da vida.

Foram vê-lo sob a cúpula do Capitólio, a fronte cercada de uma estranha grinalda vermelha. As crianças, menos do que ninguém, entendem a morte. Estão próximas demais das eternas fontes da vida. Devem ter pensado numa curiosa festa em que havia soldados e bandeiras e multidões que soluçavam, quase sem fazer ruído, e “Daddy the President”, imóvel, na glória de seu poder... Que importa, se tanta gente chorava? As crianças entendem o choro; é seu companheiro constante. É a voz antiga da dor que, por sua vez, é a teimosa mensageira da morte.

Mas, se elas soubessem alguma coisa das Sagradas Escrituras teriam dito ao mundo, do alto do Capitólio, com a voz que Deus empresta aos inocentes: “Aos olhos dos insensatos, parece ter morrido; ele, porém, está em paz.”

Ele está em paz, sua vida recomeça. Sua voz não se apagará, não envelhecerá, não perderá o timbre argentino e o nobre sotaque da velha cidade natal. Do asfalto, manchado de sangue, em Dallas, no Texas, ele partiu para a História, como jovens heróis que, um dia, Homero cantou em ritmos imorredouros. Às margens do Potomac, à sombra das cerejeiras em flor, um novo símbolo para humanidade vai sentar-se ao lado de Lincoln, repetindo as mesmas palavras que o amor de Cristo ensinou aos homens, e que continuam, pelos séculos, inspiradoras de todas as conquistas humanas e de todos os sacrifícios, até mesmo o da própria vida.

Enquanto houver homens como eles, a liberdade não perecerá sobre a face da terra, pois ela não pede apenas líderes, exige também os mártires.

Mas, antes que a glória dos mármores olímpicos, como na Grécia Antiga, o imobilize nas formas hieráticas dos deuses e dos heróis, prefiro, já que está tão próximo o Natal, vê-lo ao nosso menino, caído nas calçadas de Dallas, sozinho e exânime, como o mais pobre menino do mundo. É rico e não terá nenhum presente este ano. É poderoso e não há ninguém que consiga reanimá-lo. Deu-se de presente a si mesmo. Emprestou-nos a sua força para sustentar-nos na luta que não tem quartel. Lá se foi o nosso menino com a cabeça aureolada por uma linda grinalda vermelha. Como um pássaro ferido, de asas partidas. Como naquela noite de pavor do Pacífico. Só que agora não haverá mais terra firme. Ele se foi para sempre. Sem, sequer, dizer-nos adeus. Foi remando pelo oceano das águas eternas, onde a liberdade se funde no amor que não tem fim. 

Mas partiu contente consigo mesmo. É o que serve. Nós o choramos, como se todos fôssemos um pouco seus pares, como se todos fôssemos um pouco seus irmãos.  Deus o guarde por nós, que não o soubemos guardar. Ele está em paz.

Senhor Presidente, Senhores Deputados, 

Esta é a homenagem de respeito e de saudade que a Minoria nesta Casa presta, pelas minhas pobres palavras, à memória de John Fitzgerald Kennedy, trigésimo quinto Presidente dos Estados Unidos da América, desaparecido, tragicamente, para a dor dos que o amaram e para a esperança dos que confiaram às suas mãos jovens as sortes da sua paz e o destino da sua liberdade. (grifos meus)


III.  NOTAS EXPLICATIVAS



¹  "Tenebræ factæ sunt" (Caíram as trevas) seria um título extremamente adequado para este discurso, já que Pe. Godinho utiliza como temática de seu discurso o Responsório V (de nove) das Matinas da Sexta-feira Santa que diz:

Responsório V: Tenebræ factæ sunt, dum crucifixissent Jesum Judæi: et circa horam nonam exclamavit Jesus voce magna: Deus meus, ut quid me dereliquisti? Et inclinato capite emisit spiritum.

Versículo: Exclamans Jesus voce magna, ait: Pater, in manus tuas commendo spiritum meum. Et inclinato capite emisit spiritum. 

Trad. Responsório V: Tudo se cobriu de trevas, quando os Judeus crucificaram Jesus; e perto da hora nona exclamou Jesus em voz alta: Meu Deus, por que me abandonaste? E, com a cabeça inclinada, entregou o espírito.

Versículo: Clamando Jesus em voz alta, disse: Pai, em tuas mãos entrego meu espírito. E, com a cabeça inclinada, entregou o espírito.

Observe que o Responsório é composto de duas partes: o responsório propriamente dito e seu versículo.

As fontes bíblicas para este Responsório são Mt. 27: 45-46, Jo. 19: 30 e Lc. 23: 46.

Muitos compositores tiveram especial predileção por esse texto e nele se inspiraram, compondo autênticas obras primas, tais como: Gaspar van Weerbeke (1501), Tomas Luis de Victoria (1585), Carlo Gesualdo (1611),  Johann Michael Haydn (1772), Pe. José Maria Xavier e muitos outros. 

²  A vida não é tirada, mas transformada.

³  O trecho completo, logo no segundo parágrafo do discurso de posse de JFK, em 20 de janeiro de 1961, foi:

" Agora o mundo é muito diferente. Porque o homem retém em suas mãos mortais o poder de abolir todas as formas de pobreza humana e todas as formas de vida humana. Contudo, ainda continuam em litígio em todos os recantos do globo as mesmas crenças revolucionárias pelas quais lutaram nossos antepassados — a crença de que os direitos do homem não emanam da generosidade do Estado, mas da mão de Deus."

Observe que, tendo ganho a eleição por uma das menores margens de votação na história, JFK estava consciente da grande importância deste discurso. As pessoas que testemunharam o pronunciamento ou o ouviram pela televisão ou através do rádio elogiaram o novo presidente. Até ginasianos  lhe escreveram em reação a suas ideias. Em seguida a esse pronunciamento inaugural, cerca de 75% de norte-americanos expressaram aprovação a JFK.

 Aqui JFK convoca os dois blocos da Guerra Fria ao entendimento e à concórdia.

  Com esta incitação, JFK já se encaminha para o fim do discurso de posse. Imediatamente antes, ele fez a seguinte provocação a seus cidadãos norte-americanos: "Não perguntem o que seu país pode fazer por vocês – perguntem o que vocês podem fazer por seu país."

  Trata-se do mesmo provérbio da nota 3, só que no singular, referindo-se obviamente a John Fitzgerald Kennedy.


IV.  OBSERVAÇÕES



 1)  Para ouvir o áudio do célebre discurso, queira acessar o link abaixo. Também forneço o áudio no formato mp4 que pode ser acionado diretamente. Informo que tanto o corpo central do discurso quanto algumas poucas expressões não aparecem gravadas, parecendo que a gravação do discurso foi truncada. Seja como for, é um importante testemunho das "ipsissima verba" de Pe. Godinho naquela memorável sessão da Câmara dos Deputados em 26/11/1963. Vale a pena ouvir o que Pe. Godinho tem a dizer aos Brasileiros de hoje.







2) Embora a Internet possua o texto do discurso, alerto para o fato de que o meu texto aparece levemente alterado em relação àquele, tendo em vista ter-me servido do áudio do discurso para fazer os devidos ajustes necessários ao perfeito entendimento da exposição oral das ideias de Pe. Godinho. Não obstante, tal discurso pode ser encontrado na Internet no seguinte link: 
http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/plenario/discursos/escrevendohistoria/190-anos-do-parlamento-brasileiro/padre-godinho_261163 


V.  AGRADECIMENTO



Gostaria de consignar aqui meu agradecimento a Bruno Braga Campos por ter transformado o arquivo de áudio, para o formato mp4, do discurso de Pe. Godinho, facilitando a sua audição pelo leitor deste Blog.