domingo, 31 de janeiro de 2016

MEU DISCURSO DE POSSE NA ACADEMIA LAVRENSE DE LETRAS EM 30/01/2016


Por Francisco José dos Santos Braga



Ilmo. jornalista Dr. José Passos de Carvalho, DD. Presidente da Academia Lavrense de Letras; 
Ilmo. Dr. Paulo José de Oliveira, Presidente da Academia Formiguense de Letras;  
Ilmo. Dr. Olavo Celso Romano, DD. Presidente da Academia Mineira de Letras e paraninfo dos neoacadêmicos;
Ilmo. Dr. Luiz Carlos Abritta, DD. Presidente da Academia do Ministério Público de Minas Gerais;
Dra. Rosemary Chalfoun Bertolucci, DDª. Acadêmica responsável pela Comissão de análise de currículos dos neoacadêmicos;
Minha esposa Rute Pardini, eterna companheira dos meus momentos de reflexão, dificuldades e alegrias, e demais autoridades que compõem a Mesa Diretora dos trabalhos desta noite:

O autor no púlpito da Academia Lavrense de Letras

Para alguém, como eu, que adentro, pela primeira vez, esta nobre Academia, vem-me logo à mente e ao espírito uma indagação: qual é o significado desta Instituição para mim? Indago-me então: quantos, antes de mim, já formularam esta mesma pergunta? Vou tentar responder à primeira das duas questões, após uma profunda meditação sobre o tema deste discurso.

A Academia Lavrense de Letras cresceu e frutificou, mercê do esforço e da dedicação de muitos ilustres lavrenses, e é com profundo respeito, humildade e admiração que sou convidado a adentrar o seu pórtico.

Desde os saudosos fundadores da Arcádia lavrense de 1968, especialmente Expedito Almir Paula Lima (presidente em 4 mandatos), passando pelas administrações dos acadêmicos Dr. Hugo José de Oliveira (também fundador) e chegando à atual diretoria dirigida pelo jornalista José Passos de Carvalho, constato uma incessante busca pelo aperfeiçoamento institucional e sua solidificação, culminando com a localização de sua sede numa sala do prédio da Casa da Cultura, uma conquista do saudoso presidente Dr. Fred, como era conhecido o presidente Carlos Frederico Leite Corrêa.

Durante este longo período (Lá se vão 48 anos!), foram alcançados pelos ex-presidentes os objetivos de promover a cultura, divulgar a cidade de Lavras e manter vivo o ideal acadêmico, diga-se de passagem com especial denodo pelo atual presidente Passos de Carvalho, com reuniões e atividades culturais promovidas em diferentes locais da cidade, contando com a adesão de simpatizantes da causa, ilustres lavrenses a quem agradeço sobremodo e peço licença para não nomeá-los, evitando o risco de imperdoável omissão.

Ao início de um novo período administrativo na Academia Lavrense de Letras, acho de extrema relevância fazer-se uma breve memória sobre o significado desta instituição para a cidade de Lavras, especialmente quando se pode orgulhosamente dizer que seus fundadores são personalidades que muito honraram e dignificaram sua terra natal.

Observo com imensa alegria que já desfruta de notável cobertura dos meios de comunicação esta Casa de Cultura que adentro, pela primeira vez, na qualidade de Acadêmico Correspondente, fruto da insistência solidária e magnânima do presidente Passos de Carvalho, o qual se empenhou pessoalmente para esta minha nomeação na data de hoje.

De pronto, sobressai o notável compromisso desta Academia com a ampla divulgação, fazendo carinhosamente circular temas de interesse público, particularmente lavrenses, por incontáveis cidades e instituições, tanto pelas formas tradicionais de imprensa, quanto pelas mídias mais avançadas e interativas. Os temas abordados por esta Academia, sob cuidadosa, leve e fecunda apresentação, embasam inúmeras conversas (chats) e comentários, sendo submetida
 sua mensagem aos mais diferentes crivos e sempre recebendo o mais confortável retorno de pessoas e de instituições congêneres, que se mantêm em permanente interação. 

É o caso de se lembrar aqui o saudável intercâmbio que a Arcádia lavrense tem estabelecido com sua coirmã, a Academia Formiguense de Letras, dirigida pelo nobre presidente Paulo José de Oliveira, também Acadêmico Correspondente desta ALL, que recentemente a parabenizou pelo dinamismo e fortalecimento dos quadros no Facebook.

Superando os relevantes aspectos materiais envolvidos neste duradouro trabalho, curvo-me ao exercício de imaginar as incontáveis horas dedicadas à escolha dos assuntos, à redação dos textos e à sempre presente e angustiosa expectativa do alcance dos resultados! São os ossos do ofício do jornalismo presente, militante e diuturno…

Nesta noite de 30 de janeiro de 2016, devo dizer, em nome dos neoacadêmicos, que esperamos continuar compartilhando do dedicado esforço do presidente Passos de Carvalho, com o apoio do Acadêmico Dr. Antônio César de Pádua, que tem colaborado com a presidência em diversas atividades, para podermos, em nosso retorno a nossas cidades de origem e em visita a outras cidades ou países, ajudar a divulgar e contribuir, mesmo à distância, para o engrandecimento desta Casa de Cultura, colaborando para o alcance de seus objetivos sociais e culturais, enaltecendo nossas presenças na Academia e na cidade de Lavras e levando aos mais diferentes rincões os valores fundamentais de sua cultura.

Particularmente em meu nome, não sei como expressar com vibrantes palavras o que me vai no peito: é com voz embargada que agradeço, tanto ao presidente quanto à comissão que unanimemente referendou o meu nome para integrar o quadro de Acadêmicos Correspondentes desta egrégia Arcádia, a homenagem que acaba de me ser conferida, ao me franquearem o ingresso no pórtico desta Academia Lavrense de Letras, tendo como meu patrono José Severiano de Resende. Estejam certos de que, com esse gesto singelo, ao passarem às minhas mãos o diploma de membro desta Academia, sinto que estão não só avalizando o meu trabalho intelectual como também irmanando minha terra natal (São João del-Rei) a Lavras, que procurarei engrandecer e exaltar a partir de hoje.

Obrigado. 

Paraninfo Dr. Olavo Celso Romano e o autor
Presidente da Academia Lavrense de Letras, 
jornalista José Passos de Carvalho, e o autor

Presidente da ALL, jornalista José Passos de Carvalho
Presidente da Academia Formiguense de Letras, Paulo José de Oliveira, e o autor; na
2ª fileira, Edson Tavares (Belo Horizonte) e José Carlos de Bom Sucesso (Bom Sucesso).



             Diploma de Acadêmico Correspondente da Academia Lavrense de Letras do autor









quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

HOMENAGENS AO EX-SENADOR BERNARDO CABRAL


Por Francisco José dos Santos Braga


Esta é apenas mais uma das muitas homenagens que têm sido prestadas a Bernardo Cabral, ex-ministro da Justiça, ex-presidente da OAB de 1981 a 1983, relator da Comissão de Sistematização da Assembleia Constituinte e ex-senador. Ainda no ano passado, em fevereiro de 2015, Cabral foi homenageado em livro sobre a referida Constituição de 1988, intitulado "Estudos de Direito Constitucional: Homenagem a José Bernardo Cabral", lançado pela Editora JC no dia 5, na sede da seção da OAB-RJ. Esse livro relata a atuação da Assembleia Constituinte e faz uma reflexão sobre o legado da Carta Magna de 1988. 

O ministro Marco Aurélio escreveu: 
"A Constituição Federal de 1988 reforçou o papel institucional do Judiciário.  Houve ampliação do acesso à Justiça, considerada a instalação de juizados especiais cíveis e criminais, juizados federais e defensorias públicas. Deu-se o fortalecimento do Ministério Público e o aperfeiçoamento da ação de improbidade." 
Além de Marco Aurélio, também são co-autores dessa obra, dentre outros nomes do Direito, o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, e o ministro da Suprema Corte, Luiz Fux; os ministros do Superior Tribunal de Justiça Felix Fischer, Luís Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques e Humberto Martins; a presidente do Superior Tribunal Miliar, Maria Elizabeth Rocha.

No ano anterior (2014), a 1º de fevereiro, Cabral foi condecorado com a Medalha Sobral Pinto, concedida pela OAB a pessoas com destacada atuação na garantia dos direitos humanos e da democracia.

Em setembro de 2013, durante a VII Conferência Estadual dos Advogados, em Porto Alegre, Bernardo Cabral foi homenageado pela OAB/RS com a Medalha Leonardo Macedônia, ao mesmo tempo que lhe coube proferir a conferência de abertura.

É, portanto, com muita propriedade que a OAB nacional e suas seções estaduais vêm dando a devida relevância à dimensão do seu ex-presidente no dificílimo período de 1981 a 1983, quando teria dito que "a OAB não se subordina a poderes."


Aproveito a oportunidade para relembrar uma faceta de Cabral que não é suficientemente conhecida: a sua admiração pelo sistema parlamentarista de governo. Para comprová-lo, sirvo-me de sua Apresentação ao livro "Eleições Federais na Alemanha", em versão bilíngue (português e alemão), de julho de 1998, quando tive a honra de colaborar com a sua publicação pelo Conselho Editorial do Senado, como Consultor Legislativo do Senado Federal e assessor do Senador in casu. Os autores do referido livro eram: André Nascimento Barbosa, Ed Lyra Leal, João José Correia, Miguel Araújo de Matos, Profª Monika Köhler, Odim Brandão Ferreira, Roniere Ribeiro do Amaral e Sinecio Jorge Greve. A Profª Monika Köhler, além de autora da Introdução, colaborava com o primeiro capítulo do livro, em coautoria com José João Correia, intitulado Aspectos Históricos das Eleições (de 1848 a 1983).

APRESENTAÇÃO 
O trabalho que tenho a honra de apresentar é o resultado do esforço de sistematização, empreendido por um grupo de estudiosos do sistema parlamentarista alemão, no seu contexto histórico. Ele esteve exposto com enorme sucesso no Goethe-Center de Brasília e na Consultoria Legislativa do Senado Federal e suscitou enorme interesse em estudantes, universitários e pesquisadores, sendo-me então apresentado pelo Consultor Legislativo do Senado Federal, Dr. Francisco José dos Santos Braga, que não poupou esforços para a realização da presente edição da obra. Dada a importância da Alemanha para a história universal do século XX, é natural que os historiadores e cientistas políticos se interessem pela forma de democracia que ali foi moldada a partir de 1949, quando foi promulgada uma Constituição (Grundgesetz) democrática, após doze anos de ditadura, e aconteceu a primeira eleição para o Parlamento (Bundestag). 
A publicação desse trabalho ocorre num momento extremamente delicado para a Alemanha. Reunificada há oito anos, esse País continua aspirando a mudanças. No dia 27 de setembro do corrente ano, o povo alemão consagrou nas urnas a sua preferência pela social democracia, em consonância com a maré de centro-esquerda que varre a União Europeia, com destaque para a Grã-Bretanha, França, Itália e Portugal. Cumpriu-se, na Alemanha, o desejo do filósofo Jürgen Habermas de que a vitória da oposição, pela primeira vez na história do pós-guerra, constitua elemento de normalidade na evolução da cultura democrática. Como candidato a seu quinto mandato, Helmut Kohl, o Chanceler da Reunificação alemã, é o primeiro líder da Alemanha do pós-guerra a ter de deixar o governo devido a uma derrota nas urnas. Para a sua reeleição não foram suficientes sua habilidade de comandar a reunificação alemã em 1990, a de capitanear um surto sólido de crescimento econômico em seu país, nem a de liderar o processo de integração europeia e a expansão da OTAN rumo ao Leste europeu, uma vez que Helmut Kohl não foi igualmente eficiente em conter a taxa de crescimento do desemprego. 
Como parlamentarista histórico e estudioso do Parlamentarismo em diversos países, devo reconhecer que o sistema parlamentarista alemão, graças a institutos e instituições democráticas sólidas, é um dos que melhor funciona dentro da normalidade, sem atropelos e sem ameaças de solução de continuidade, podendo ser considerado um dos mais estáveis do mundo. 
Grosso modo, no modelo parlamentarista alemão, o Parlamento nacional (Bundestag) é a Câmara dos Deputados, a representação popular da República, sendo os Deputados Federais eleitos pelo povo a cada quatro anos. Entre suas inúmeras tarefas, destaca-se a de eleger o Chanceler ou Primeiro Ministro. 
O Senado alemão (Bundesrat), a segunda câmara do Parlamento, é a representação dos Estados; os Senadores não são eleitos diretamente, e sim indicados pelos governos estaduais. O Presidente do Senado substitui o Presidente da República nos seus impedimentos.  
O Gabinete consiste do Chanceler e dos Ministros. Como chefe do governo, o Chanceler dá as diretrizes da política nacional e indica os Ministros à nomeação do Presidente da República. O Chanceler é eleito indiretamente pelo Parlamento, o qual pode também derrubar o Gabinete através de um "voto construtivo de desconfiança", quando àquele faltar o apoio da maioria no Parlamento, desde que este eleja ao mesmo tempo o sucessor do Chanceler deposto.  
O Presidente da República, como a Rainha da Inglaterra, reina, mas não governa. É o chefe de Estado; contudo, tem apenas funções representativas. É eleito para um mandato de cinco anos por membros das Assembleias Estaduais (Landtage) e do Parlamento. O Presidente representa internacionalmente a República Federal e, em nome da União, firma tratados com países estrangeiros, credencia e recebe Embaixadores e, por fim, nomeia e demite  por sugestão do Chanceler  os Ministros. Devido a suas funções, o Presidente está acima do embate político diuturno, podendo exercer, através de sua autoridade pessoal, um papel moderador muito importante nas crises.  
Como se vê, as enormes e complexas funções que no Brasil são desempenhadas pelo Presidente da República, na Alemanha estão distribuídas a dois atores que militam em campos diversos, mas com reconhecida eficiência.  

A nível estadual, os cidadãos elegem seus representantes na Assembleia Estadual. O seu Governador (Ministerpräsident), entretanto, não é eleito diretamente, mas pelos Deputados Estaduais.  
Como estudioso das relações teuto-brasileiras, acompanho com interesse uma parceria estratégica entre os dois Países. Acredito que as condições políticas atuais favoreçam o diálogo mais profundo tanto sobre temas mundiais, quanto sobre as relações bilaterais entre o Brasil e a Alemanha. O Presidente brasileiro e o Chanceler Gerhard Schroeder são tidos como nomes de expressão da Terceira Via, ou nova esquerda que procura um caminho alternativo ao neoliberalismo. Além disso, a Alemanha não é somente o principal parceiro econômico do Brasil (intercâmbio comercial de US$ 12 bilhões), mas também o segundo maior investidor em nosso País, com US$ 11 bilhões. Por fim, a Alemanha é o único país do G-8 que transformou a retórica ambientalista em cooperação financeira para apoiar projetos de desenvolvimento sustentável na região amazônica.  
Pelas razões aqui expendidas, saúdo veementemente a publicação de "Eleições Federais na Alemanha" que o Conselho Editorial do Senado em boa hora decidiu incorporar a seu acervo. 

Senador Bernardo Cabral

O lançamento do livro "Eleições Federais na Alemanha", em versão bilíngue (português e alemão), preparado por técnicos do Goethe-Center de Brasília deu-se no dia 10/03/1999. 
Convite de lançamento do livro "Eleições Federais na Alemanha"

Discursaram os Senadores Bernardo Cabral e Lúcio Alcântara, basicamente elogiando o magnífico trabalho dos alunos do Goethe-Center.

Na presença do Presidente do Congresso Nacional Senador Antônio Carlos Magalhães, dos Senadores Lúcio Alcântara (presidente do Conselho Editorial da Secretaria Especial de Editoração e Publicações do Senado) e Bernardo Cabral, bem como do staff de professores do Goethe-Center, tendo sido escolhido para fazer um agradecimento em nome do grupo de trabalho do Goethe-Center responsável pelo conteúdo daquela memorável edição, usei da palavra:

Exmo. Sr. Senador Antônio Carlos Magalhães, DD. Presidente do Congresso Nacional,
Exmo. Sr. Senador Bernardo Cabral,
Exmo. Sr. Senador Lúcio Alcântara, Presidente do Conselho Editorial do Senado Federal,
Demais Parlamentares e Autoridades presentes,
Senhoras e senhores,

"Eleições Federais na Alemanha" é uma coletânea de textos feita durante o 1º semestre de 1998 no Goethe-Center de Brasília e de autoria de alunos do nível mais elevado (Oberstufe), sob a coordenação da Profª Monika Köhler.

Durante a exposição do material bilíngue no próprio Goethe-Center e na Consultoria Legislativa do Senado, para a qual contou com o decidido apoio do Consultor-Geral Legislativo Dr. Estêvão Chaves de Rezende Martins, constatou-se enorme interesse do público pelos temas abordados, desde um retrospecto histórico das eleições na Alemanha, os elementos constitutivos do sólido e eficaz sistema parlamentarista alemão, passando pela Reunificação das duas Alemanhas e atingindo a eleição de 27 de setembro de 1998.

Neste momento, gostaria de enaltecer o empenho e a acolhida carinhosa que o referido material recebeu tanto do "Parlamentarista Histórico", Senador Bernardo Cabral, que brindou e enriqueceu a obra com expressivo Prefácio, quanto do Senador Lúcio Alcântara, que não mediu esforços para tornar o trabalho disponível ao grande público, através de sua publicação primorosa pela Secretaria Especial de Editoração do Senado.

O evento desta noite tem um significado importante, qual seja o de aproximar o Brasil e a Alemanha, através do melhor entendimento da atuação do Bundestag (Parlamento alemão) e do funcionamento do sistema parlamentarista do País-irmão. Mas, sobretudo, o lançamento de "Eleições Federais na Alemanha" sinaliza um enorme respeito do Legislativo brasileiro pela democracia vigorosa praticada pela Alemanha reunificada que conta com "partidos políticos que foram e são atores políticos decisivos na história da Alemanha atuando, depois da II Guerra Mundial, como fundadores do Estado."

Muito obrigado!






OBRA  CONSULTADA


BARBOSA, LEAL, CORREIA, MATOS, KÖHLER, FERREIRA, AMARAL & GREVE: Eleições Federais na Alemanha (Die Wahlen in Deutschland), Brasília: Conselho Editorial do Senado, julho de 1998, 74 p. 

sábado, 23 de janeiro de 2016

FESTIVAL INTERNACIONAL DE MÚSICA DE 1974 EM SÃO PAULO


Por Francisco José dos Santos Braga



Em 1º de junho de 1974 saiu em O Estado de S. Paulo uma chamada para o Festival Internacional de Música, promovido pela Secretaria estadual de Cultura, Esportes e Turismo,  intitulada "Quarenta solistas virão para festival". O Festival, a iniciar-se a 30 de junho, contou com grande cobertura da mídia paulistana, porque pela primeira vez a Pauliceia iria sediá-lo, tradicionalmente encenado em Campos do Jordão. A propaganda dizia:

QUARENTA SOLISTAS VIRÃO PARA FESTIVAL 

"Mais de 40 professores e solistas deverão tomar parte este ano no Festival Internacional de Música, programado para o campus da Universidade de São Paulo de 30 de junho a 28 de julho. Na ocasião, além dos 37 concertos, recitais e outras apresentações, está prevista a realização de cinco seminários: "Composição e Musicologia", sob a direção do maestro francês Maurice Le Roux; "Música Antiga", que será dado por Roberto de Regina; "Música Eletrônica", dirigido por Morton Subotnick; "Violão", dirigido por Turíbio Santos, e "Música de Câmara", sob a responsabilidade de diversos professores de instrumentos e canto. 
Dos professores estrangeiros que confirmaram sua presença, alguns já são conhecidos de outros festivais ou concertos. É o caso do oboeísta norte-americano Henry Schuman, do clarinetista belga Guy Douchy e do coralista norte-americano Hugh Ross. Assim também alguns brasileiros radicados no exterior, como o violonista Turíbio Santos, atualmente em Paris, e o flautista Ricardo Kanji, morando na Holanda. 
Outros, contudo, são estreantes em promoções deste tipo em São Paulo. O contrabaixista Christian Mesdon, que atuará com exclusividade num concerto com a Orquestra Sinfônica do Estado, nunca participou de nenhum festival em São Paulo, muito menos os componentes do elenco operístico de Viena ou do Trio Fontanarosa, conjunto francês formado por membros de uma mesma família.  
COLÓQUIO 
Segundo o maestro Eleazar de Carvalho, diretor de um dos três departamentos que funcionarão durante a promoção (Música Instrumental, Coral e Ópera), um dos pontos altos do festival será o Colóquio organizado pelo Conselho Internacional de Música da UNESCO, sob a presidência de Yehudi Menuhin, e que terá como tema "A Música Tradicional e a Criação Musical Contemporânea nas Diversas Culturas".  
Programado para os dias 19, 20, 21 e 22 de julho, o Colóquio será dividido em conferências e audições. No primeiro, às 17 horas, sob a direção de Yehudi Menuhin — que em seguida vai apresentar-se com a Orquestra Sinfônica do Estado — haverá uma conferência do brasileiro Luiz Heitor Correa de Azevedo. No dia seguinte, serão realizadas duas sessões. Na primeira, tendo como presidente Pierre Colombo, Ladislav Mokrý proferirá uma palestra sobre Música Ocidental, exceto a América Latina. À tarde, na segunda sessão plenária, sob a presidência de Narayana Menon, Tran Van Khe falará sobre a Ásia, exceto o Mundo Árabe. 
No dia 21 de julho, na terceira sessão plenária, sob a presidência de John Roberts, Kwabena Nketia falará sobre a Música Africana, com exceção do Mundo Árabe. À tarde, presidido por Biris Yarustovski, o musicólogo Salah El Mahdi falará sobre o Mundo Árabe. Por fim, na 5ª sessão plenária, sob a presidência de Roberto Caamaño, José Maria Neves falará sobre a América Latina. À tarde, presidido por Marlos Nobre, representante do setor musical da UNESCO no Brasil, John Morton encerrará o Colóquio." 

Fonte: O ESTADO DE S. PAULO, Ano 95, Nº 30.422, edição de 1º de junho de 1974, p. 10.



Neste post vou apreciar algumas dessas realizações no campo musical. Depois de 29 dias de estudos intensivos, num domingo, 28 de julho de 1974, o Festival Internacional de Música, um dos grandes acontecimentos musicais do ano, promovido pela Secretaria estadual de Cultura, Esportes e Turismo, distribuiu 428 diplomas a jovens musicistas e encerrou com uma audição de alunos, às 11 horas da manhã no anfiteatro da USP. Três desistências, contudo, deixaram alguma frustração nos alunos: de Yehudi Menuhin, Morton Subotnick e Alberto Ginastera. O violinista Yehudi Menuhin, anunciado como uma das presenças certas ao Colóquio Internacional de Música, teve problemas de saúde e cancelou não apenas sua viagem para o Brasil, mas, ao que se diz, uma programada excursão à América Latina. O mesmo teria acontecido com Morton Subotnick, titular da cadeira de música eletrônica. Quanto ao compositor argentino Alberto Ginastera, não houve explicações para sua desistência.


A edição de 19 de julho de 1974, p. 7 trata do Colóquio que era aguardado com grande expectativa pelos entendidos e melômanos, a saber:


O COLÓQUIO COMEÇA, SEM YEHUDI MENUHIN 


"Sem a presença de Yehudi Menuhin  que cancelou a conselho médico sua excursão para a América Latina este ano  inicia-se hoje no anfiteatro da USP, às 17 horas, um Colóquio Internacional de Música, organizado pelo Comitê Internacional de Música da UNESCO. O encontro, que recebeu o título geral de "Música Tradicional e Criação Musical Contemporânea nas Diferentes Culturas", terá a duração de quatro dias e contará com a participação de 48 musicólogos de vários países. Será realizado paralelamente ao Festival Internacional de Música, promoção da Secretaria de Cultura, Esportes e Turismo do Estado. 
Dos 48 convidados que iniciam hoje a série de debates e conferências, 11 pertencem ao Comitê Brasileiro de Música, entidade de onde sairá o conferencista da abertura do Colóquio  Luiz Heitor Corrêa de Melo. A partir de então, o Colóquio funcionará com duas sessões plenárias por dia. Amanhã, na primeira sessão plenária, às 9 horas, sob a presidência do musicólogo francês Pierre Colombo e tendo como relator o checoslovaco Ladislav Mokrý, será discutida a música do Ocidente, exceto a América Latina. Às 14 horas, está programada a segunda sessão plenária, que terá como tema a Ásia, exceto o Mundo Árabe. Para este encontro, o presidente será Narayana Menon, da Índia e, relator, Tran Van Khe, do Vietnã do Norte.  
Completando o programa do segundo dia do Colóquio, haverá um concerto de música de câmara do Ocidente e da Ásia, marcado para as 20:30, no anfiteatro da USP. As interpretações estarão a cargo dos artistas Arno Babajanian, da Armênia; Attila Bosay, da Hungria; Tran Van Khe, do Vietnã, e Turíbio Santos, do Brasil. Domingo, dia 20, sempre na Cidade Universitária, o Colóquio terá prosseguimento às 9 horas, sob a presidência de John Roberts, canadense, e de Kwabena Nketia, de Ghana (relator). Nesta sessão será estudada a música da África, exceto o Mundo Árabe. Às 14 horas, nova sessão plenária, desta vez sobre o tema Mundo Árabe. A presidência deste encontro estará a cargo de Boris Yarustovski, da URSS; o relator será Salah El Mahdi, da Tunísia. Às 20:30, concerto de Música de Câmara Africana. Segunda-feira, às 9 horas, está programada a quinta sessão plenária, que terá como tema a América Latina, presidida por Roberto Caamaño, da Argentina e tendo como relator José Maria Neves, do Brasil. No mesmo dia haverá encerramento do Colóquio, marcado para as 14 horas. Este último encontro do Colóquio da UNESCO terá como presidente o brasileiro Marlos Nobre e como relator o inglês John Morton.  
KLEIN
Em virtude do cancelamento do concerto do violinista Yehudi Menuhin, marcado para hoje à noite, a Orquestra Sinfônica do Estado apresentará às 21 horas, no Teatro Municipal, um programa dedicado inteiramente a Tchaikowski. Na ocasião, sob a regência de Eleazar de Carvalho, serão executados a Sinfonia nº 4 e o Concerto nº 1 para piano e orquestra, que terá como solista Jacques Klein. Este programa substitui as apresentações do concerto para violino de Bach que seria solado por Yehudi Menuhin e as Sinfonias números 1 e 41, respectivamente, a primeira e a última de Mozart, marcadas para hoje à noite como parte do Festival Internacional de Música.  
CAMPOS DO JORDÃO 
Como parte ainda do Festival Internacional de Música haverá hoje às 20:30, em Campos do Jordão, um recital de piano a cargo de Magda Tagliaferro. Amanhã, no mesmo horário, será apresentado um espetáculo intitulado "Noite de Música Antiga", a ser executado pelo conjunto de Roberto de Regina. Completando a programação deste fim de semana, Nathan Schwartzman fará no domingo, às 16:30, um recital de violino." 
Fonte: O ESTADO DE S. PAULO, Ano 95, Nº 30.463, edição de 19 de julho de 1974, p. 7.


Nessa mesma edição, ao lado da matéria anterior da página 7, o Estadão noticiou que "Eleazar de Carvalho vai dirigir o Municipal", como se segue: 


ELEAZAR DE CARVALHO VAI DIRIGIR O MUNICIPAL



"Hoje ou no começo da próxima semana o prefeito Miguel Colasuonno deve enviar à Câmara Municipal projeto-de-lei criando o cargo de diretor artístico do Teatro Municipal. Embora não se saibam quais as especificações do cargo, o futuro diretor artístico já e conhecido: será o maestro Eleazar de Carvalho, que acumulará suas novas funções com o cargo que já possui de regente titular e diretor artístico da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OSESP).  
Para a função que deverá ocupar no Municipal, o Maestro Eleazar de Carvalho não tem ainda planos concretos. Afirma apenas que não ensaiará a orquestra — pois seu cargo não lhe permitiria isso — e que tratará de nomear dois maestros jovens para reger como titulares a orquestra do Teatro, na sua opinião o melhor conjunto sinfônico do país juntamente com a Sinfônica do Teatro Municipal do Rio de Janeiro. 
Assim, a única questão que deverá preocupar o diretor artístico do Municipal de São Paulo, no começo, será o nome dos possíveis candidatos aos cargos de assistentes e de regentes titulares da orquestra. Segundo o próprio maestro, os futuros candidatos deverão reunir, entre outras, pelo menos duas condições: talento e juventude. Daí os nomes que o próprio maestro Eleazar de Carvalho alinha como possíveis futuros assistentes da diretoria artística — Diogo Pacheco, Carlos Eduardo Prates, John Luciano Neschling e David Machado." 
Independente disso, parece que o festival deixou saudade naqueles que dele participaram em alguma de suas atividades programadas. Vejamos por exemplo a crítica de Caldeira Filho ao recital do pianista Roberto Szidon, uma apresentação programada pelo Festival Internacional de Música para o dia 24/07/1974 no Teatro Municipal:

RECITAL REAFIRMA O TALENTO DE SZIDON


Por Caldeira Filho



FESTIVAL INTERNACIONAL DE MÚSICA: RECITAL DO PIANISTA ROBERTO SZIDON. Programa: Brahms, Três Intermezzos; Chopin, Sonata em si menor; Villa-Lobos, Noturno e Balada (Homenagem a Chopin); Manuel de Falla, Fantasia Bética. Dia 24.7.74, no Municipal. 
"A arte de Roberto Szidon tem suas raízes mais profundas no próprio instrumento. Ele é pianista por excelência e sou levado a dizer que, enquanto o compositor faz música, ele, por meio desta, faz arte pianística. Não se poderia chamá-la "pianismo"? Toda a sua musicalidade parece que se transfigura, toma as aparências do instrumento e é pianisticamente que se realiza. Isso é conseguido, obviamente, pela sonoridade, coisa de difícil definição, mas compreensível se a colocarmos em analogia com o colorido da pintura. O colorido não é a cor, simplesmente, mas o tratamento expressivo dela. Assim, a sonoridade não é somente o som, mesmo que já individuado pelo timbre. É o conjunto de modificações que ele assume pelas mãos de Szidon para a composição de um quadro sonoro, de uma obra de arte construída com o som, com valor estético próprio e necessariamente vinculada à emoção que se quer provocar. 
A técnica para isso empregada se baseia no "toque" (no "toucher", como dizem os franceses), campo em que Roberto Szidon é realmente um mestre. 
Por isso pôde executar os três "Intermezzos" de Brahms com uma expressão toda especial, mais de ordem íntima do que exterior, fazendo ver quanto pode o piano ser poeta. Os "cantabili" da "Sonata" de Chopin soaram luminosamente serenos, pois Roberto fazia que a transparência sonora tornasse quase visível a idéia musical em execução. E a sua virtuosidade transcendente expandiu-se em todos os trechos da "Sonata", nas peças de Villa-Lobos e na bela e dificílima "Fantasia Bética" de Falla. 
A facilidade e a espontaneidade técnicas de Szidon levam-no a um andamento por vezes inadequado, mormente nos trechos de brilhante agilidade. Fica assim escondido um toque "perlé", que seria certamente admirável, tanto mais que é o toque específico do piano, instrumento de cordas percutidas. Ocorre-me o ensino de Marguerite Long: "É preciso que haja ar entre as notas". A fina ourivesaria viu-se substituída por energia, entusiasmo e dinamismo, a que a aceleração temporal emprestava inegável grandiosidade. 
Roberto Szidon domina magistralmente a matéria sonora: ao lado de ofuscantes reverberações, a indizível suavidade da "Rêverie" de Schumann, dada extraprograma. É difícil conceber tal qualidade de som, a sua impossível, mas evidente, imaterialidade, criadora de momentos admiráveis pela beleza da sensação. Como é possível fazer da máquina pianística a criadora de tão irreal poesia?" 
Fonte: O ESTADO DE S. PAULO, Ano 95, Nº 30.470, edição de 27 de julho de 1974, p. 7.



O Estadão, na sua edição de 21 de julho de 1974, prenunciava a divisão do público diante de uma peça sinfônica inusitada: "Santos Futebol Music", da autoria do compositor Gilberto Mendes. De fato, foi o que aconteceu no dia seguinte:

PEÇA SINFÔNICA LEVA AMANHÃ O FUTEBOL AO TEATRO MUNICIPAL
"Depois de 63 anos de existência quase totalmente aristocrática, o Teatro Municipal de São Paulo será palco, amanhã, de uma homenagem insólita a uma das mais caras e populares paixões do brasileiro: o futebol. Regida pelo maestro Eleazar de Carvalho, a Orquestra Sinfônica do Estado (OSESP) executará pela primeira vez no Brasil a peça "Santos Futebol Music", do compositor santista Gilberto Mendes, obra tocada em primeira audição, com grande êxito, no Festival de Música Nova de Varsóvia em 1972. 
"Santos Futebol Music", como seu próprio criador admite, é antes de tudo uma homenagem partindo do princípio de que Pelé e seus companheiros divulgaram para o mundo o nome de sua cidade. Gilberto Mendes resolveu compor a peça dedicada especialmente ao time de futebol — algo de música sinfônica, bastante de "happening" e uma grande dose de teatro musical. 
Em sua primeira audição, em 1972, "Santos Futebol Music" eletrizou um teatro inteiro. Os assistentes do Festival de Música Nova de Varsóvia surpreenderam-se com uma peça musical que misturava, às intervenções fortuitas de uma orquestra sinfônica, os apupos da torcida e o matraquear incessante de locutores esportivos, desfiando, lance por lance, o desenrolar nem sempre dramático de uma partida de futebol. Naquela ocasião, como parte do espetáculo, surgiram torcedores entusiastas no meio do público e o que prometia um espetáculo convencional de música de vanguarda brasileira terminou como uma noitada surpreendente, principalmente quando o regente, num "finale" pouco convencional, chutou uma bola de verdade contra a platéia.  
OS EFEITOS
Comentando a estréia de "Santos Futebol Music", a crítica dividiu-se. Alguns ficaram em dúvida quanto ao valor estritamente musical da peça de Gilberto Mendes — mas a maioria mostrou-se favorável à experiência, e parte do público, porém, não teve dúvidas. Segundo o maestro Eleazar de Carvalho, responsável pela estréia da obra, os aplausos duraram quase tanto tempo quanto sua execução.  
"Sob o ponto de vista exclusivamente musical — explica o maestro — não há muitas dificuldades técnicas em "Santos Futebol Music" para o instrumentista. O compositor, de um modo geral, exige apenas certa dose de criatividade nas partes aleatórias: difícil mesmo é o ensaio do público — tarefa que precede o espetáculo".  
Conforme as exigências de Gilberto Mendes, o público é parte integrante da obra. Em momentos bem definidos — a critério do regente — ele vaia ou aplaude, encenando o ambiente de uma partida de futebol verdadeira. É o momento em que a obra chega a seu ápice, pois dali em diante "Santos Futebol Music" deixa de lembrar remotamente uma partida de futebol, para transformar-se num espetáculo lúdico a que não faltam os equipamentos próprios de um campo futebolístico. Por isso, até pouco antes da execução de "Santos Futebol Music", uma das preocupações do maestro Eleazar de Carvalho será arranjar equipamentos que em 63 anos de existência nunca fizeram parte do acervo normal do Teatro Municipal — uma bola tamanho profissional, apito de juiz e várias redes de futebol — todos, juntamente com três 'tapes' com gravações do último campeonato mundial fundamentais para a execução de "Santos Futebol Music"." 
Fonte: O ESTADO DE S. PAULO, Ano 95, Nº 30.465, edição de 21 de julho de 1974, p.17.



GINASTERA E FUTEBOL NO TEATRO MUNICIPAL

Por Caldeira Filho


FESTIVAL INTERNACIONAL DE MÚSICA — Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo. Programa: Alberto Ginastera, Variações Concertantes; Villa-Lobos, Concerto nº 5 para piano e orquestra. Solista, Ivy Improta. Regente, David Machado. Gilberto Mendes, "Santos Futebol Música" para orquestra, vozes e ritmos pregravados e com a participação do público. Regente, Eleazar de Carvalho. Dia 22/7/74, no Municipal. 
   
"(...) A peça de Gilberto Mendes "Santos Futebol Música", tanto quanto se pôde depreender em meio à algazarra em que mergulhou o espetáculo, foi montada sobre um fundo preparado na narração de um jogo por um desses locutores de fala rapidíssima, em que as palavras correm vertiginosamente, muito mais depressa do que a bola. Dada em baixo volume sonoro, a gravação foi pouco ouvida, o que talvez tenha prejudicado o efeito esperado. Os ouvintes figuravam como presentes ao estádio, e a eles coube a torcida com vaias, aplausos, etc. A orquestra pouco ou nada tinha a fazer, pois sua parte limitou-se a manter uma sonoridade neutra, sons longamente prolongados, às vezes uns roncos nos violoncelos e uns assobios nos violinos. 
A participação do público foi dirigida pelo autor, que comandava a atuação por meio de apresentação de cartazes, cujas indicações em maiúsculas vermelhas sobre fundo branco deviam ser obedecidas e mantidas enquanto levantados, e cessadas quando baixados. Eis a lista: "Vogais" (a..., o..., etc.), "Leitura Rápida e forte" de um texto qualquer, folha de programa por exemplo; "Leitura Lenta e baixa"; "Cantos esportivos", de que não se ouviu nenhum, se é que existem; "Gol", em que o público gritava "goooooool...", segundo o modelo dos locutores esportivos; e "mais um!". Várias realizações poderiam ser pedidas simultaneamente. Essa participação foi ensaiada na hora, mas apoiada em grande grupo de alunos do festival previamente treinado à tarde, por via das dúvidas. Criava-se assim uma nova figura de macacas de auditório, à semelhança dos tipos "chacretes" e quejandos.  
Todo mundo aderiu à brincadeira, cada um a seu modo. A maioria parecia imbecilizada na unanimidade do primarismo a que desceu. Muitos limitavam-se a sorrir e muitos outros faziam gozação. Gritos como "fora, palhaço", insultos e palavrões foram ouvidos, e uma senhora, na platéia, gritava "fiau! fiau!" com quanta força tinha.  
O regente Eleazar de Carvalho deu "cartão amarelo" a um dos músicos e ao final atirou à platéia uma bola que foi jogada daqui para ali — o chute era impossível — entre os ouvintes, e acabou sumindo. A orquestra saiu do palco aos poucos, até restar um só executante, o violino "spalla", que continuou tocando, e só saiu quando vieram buscá-lo com o aviso de terminação do jogo impavidamente apitado por Eleazar de Carvalho. 
Se se tratasse de algo a ser levado a sério, poder-se-ia colocar a obra num dos momentos da história em que o "eu", ou melhor, a "pessoa", emerge do "nós", do coletivo social. Avanços e recuos marcam o processo. E na hora atual, em que a "personalidade" se afirma com maior intensidade, pretende-se submergi-la mais uma vez na massa. A pretensa participação do público, de seu lado, é uma contradição pois torna-o co-autor de uma mensagem a ser a ele mesmo dirigida. 
Mas tudo não passou de uma brincadeira sem espírito, sem gosto, sem sentido, e sem música nenhuma. Uma grande gozação que restitui atualidade à expressão "panem et circenses"...  
Com isto não se quer dizer que a obra seja uma vigarice musical. Não. O autor não quis enganar ninguém, não quis vender gato por lebre, porque era gato mesmo..." 
Fonte: O ESTADO DE S. PAULO, Ano 95, Nº 30.469, edição de 26 de julho de 1974, p. 8.




O Suplemento Especial de "O Estado de S. Paulo" trouxe em 31/12/1974 uma retrospectiva das grandes realizações na área do teatro, através do artigo intitulado "Para o teatro, o festival abriu novas perspectivas", considerando que "o fato mais importante no panorama teatral paulista de 1974 foi a realização do 1º Festival Internacional de Teatro, que trouxe aos nossos palcos quatro espetáculos de primeira grandeza: Yerma, de Garcia Lorca, sob direção de Victor Garcia, com a Companhia de Núria Espert, The Times and Life of Dave Clark, de Bob Wilson, doze horas consecutivas da mais extraordinária experiência teatral vista em São Paulo até hoje, e A Ceia e Os Autos (da Alma e da Barco do Inferno) pela  Comuna de Portugal, uma revitalização em boa hora surgida dos textos de Gil Vicente. (...)".


A mesma página do jornal, no artigo intitulado "Música, um balanço positivo", faz também uma retrospectiva das grandes realizações no campo da música paulistana. Eis o que apresentou: 

MÚSICA, UM BALANÇO POSITIVO  


"No movimento musical de 1974 assinala-se de início a atividade das sociedades promotoras de concertos: Sociedade de Cultura Artística, Pró-Arte e seus Seminários de Música, Sociedade Orquestra Filarmônica (cujo hiato inicial se compensou depois com a fixação da sua orquestra sinfônica), Sociedade Bach de São Paulo. Todas cumpriram a respectiva programação, ao lado dos concertos das sinfônicas Municipal e Estadual, Quarteto de Cordas Municipal e vários conjuntos, algumas já permanentes, como a Camerata Benda e o Grupo de Percussão do Brooklin Paulista. Numerosos os recitais de artistas dos diversos ramos. Além do piano, que continua à frente, foram ouvidos o violão, cravo, violino, órgão e, em quantidade apreciável, o canto, tudo por jovens solistas de real talento, alguns em início de promissora carreira internacional.  
A Música de Vanguarda vem ganhando terreno. Apresentou autores de uma obra. Apresentou autores de uma obra séria e pensada. Entre eles, José Antonio de Almeida Prado e Mario Ficarelli. Esse movimento lavrou mais um tento ao realizar pela décima vez consecutiva e anual o Festival de Santos, já importante no país e no exterior. E o ano começou com a I Bienal Internacional de Música da USP. 
À frente da música municipal, José Luiz Pais Nunes, criador do Movimento Mário de Andrade, desenvolveu incrível atividade. Contam-se entre suas realizações: Segundas Musicais, Série de Primeiras Audições Brasileiras, Música nos Parques Morumbi e Ibirapuera etc., com uma programação variadíssima justamente denominada "Pauliceia Desvairada", ou seja, música e arte em todos os cantos possíveis e imagináveis da cidade. Ao início deste mês estava em preparação a Música de Natal: vários corais cantando pela cidade toda e encerramento com grandiosa manifestação conjunta nas escadarias do Teatro Municipal.  
No âmbito estadual, Eleazar de Carvalho pôs em ação a Sinfônica Estadual, realizou uma série de Encontros com J. S. Bach, que despertou inusitado interesse entre a juventude; pôs em evidência a música nacional nos Encontros com a Música Brasileira, programação musicológica e histórica de real importância; levou avante o Festival Internacional, desenvolvido na Capital e em Campos do Jordão. Ao lado de Colóquios de índole musicológica, grandes artistas ofereceram a um público sempre entusiasmado vasto e valioso repertório, e isto sem esquecer os Concertos Educativos para a Juventude. 
Em resumo: saldo totalmente positivo para a música paulista de 1974, não só no setor realização, como em musicologia, educação musical e criatividade." (grifo meu)
FonteO ESTADO DE S. PAULO, (Suplemento Especial "Arte e Comunicação"), Ano 95, Nº 30.603, edição de 31 de dezembro de 1974, p. 49.


Também na edição do dia 25 de janeiro de 1975,  da p. 63 em diante, mas mais especificamente na p. 68 (da qual retirei o trecho abaixo), O Estado de S. Paulo voltou ao tema do Festival Internacional de Música de 1974, no Suplemento do Centenário do jornal, desta vez publicando um ensaio de Caldeira Filho intitulado "Cem Anos de Música Brasileira". O autor não poupou críticas publicadas pelo próprio Estadão, no tocante ao Festival: 
"(...) Eleazar de Carvalho levou avante, em julho, um Festival Internacional de Música. Desenvolvido anteriormente em Campos do Jordão, foi transferido em 1974 para a capital, o que lhe deu maior projeção e área de ação, embora alguns programas fossem dados naquela estância climática. No Teatro Municipal paulistano fizeram-se ouvir Magda Tagliaferro, violoncelista André Navarro e pianista Roberto Szidon. Foram dados concertos sinfônicos com a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, dos quais o primeiro foi o de inauguração  do Festival, regência de Eleazar de Carvalho, solista Jacques Klein e obras de Marlos Nobre, Almeida Prado — este dirigiu sua peça Estações — e Stravinsky. O último, de encerramento, foi dedicado a Beethoven: Fantasia Coral e 9ª Sinfonia. Outros concertos foram dados com os maestros Diogo Pacheco, Tulio Collaciopo, David Machado e Gilberto Mendes. 
No Anfiteatro da USP desenvolveram-se manifestações paralelas ao Festival: colóquio Internacional C.I.M. (Unesco) e atos musicais. As sessões plenárias dos colóquios trataram em separado Música Ocidental (exclusive América Latina), Ásia, África e Mundo Árabe e América Latina. Um reparo foi feito por este jornal (Estadão de 28/07/74): "Segundo alguns musicólogos brasileiros que, como os estrangeiros, criticaram a falta de organização do Colóquio, a ausência de uma conferência dedicada exclusivamente à música tradicional brasileira foi uma espécie de 'mistério insondável', o qual, entretanto, podia ter sido evitado."
A data da entrega deste trabalho iniciara-se no Teatro São Pedro, com a OSESP, uma série de 4 Encontros com a Música Brasileira, desde o Barroco Mineiro até a Música de Vanguarda.  
A Secretaria de Cultura, Esportes e Turismo e a assessoria de Eleazar de Carvalho realizaram durante o ano um trabalho amplo de apresentação musical, em que virtuoses, professores de orquestra, conjuntos e musicólogos viram-se chamados a cooperar, o que foi conseguido com inegável êxito. Os Encontros com J. S. Bach, o Festival Internacional e os Encontros com a Música Brasileira, constituem uma visão panorâmica de todo um mundo sonoro em grande parte novo para o grande público. (...)" 


Fonte: O ESTADO DE S. PAULO, (Suplemento do Centenário - O Estado de S. Paulo, 25/1/1975, p. 68 no Acervo do Estadão), Ano 96, Nº 30.624.



OBRAS CONSULTADAS




O ESTADO DE S. PAULO: Ano 95, Nº 30.422, edição de 01/06/1974; Ano 95, Nº 30.463, edição de 19/07/1974; Ano 95, Nº 30.465, edição de 21/07/1974; Ano 95, Nº 30.469, edição de 26/07/1974; Ano 95, Nº 30.470, edição de 27/07/1974; Ano 95, Nº 30.603, edição de 31/12/1974; Ano 96, nº 30.624, edição de 26/01/1975.

SECRETARIA DE CULTURA, ESPORTES E TURISMO  DO GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO: Festival Internacional de Música. Cf. http://www.pauloegydio.com.br/acervodigital/FASPG000151.pdf

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

BEM-VINDOS À GRÉCIA ISLÂMICA!


Por Francisco José dos Santos Braga


Uma semana atrás fiz a tradução do texto abaixo, intitulado "Bem-vindos à Grécia islâmica!", por sugestão do Prof. Aléxandros Orfanídis, residente em Atenas, mas não o postei, enquanto aguardava um acontecimento que justificasse a sua publicação. 

Não foi necessário esperar muitos dias, pois os meios de comunicação de todo o mundo noticiam os ataques sexuais em massa ocorridos em Colônia, Alemanha. O noticiário informa que a polícia alemã está à procura de 1.000 homens acusados de cometerem atos de roubo e de abuso sexual no Ano Novo de 2016 naquela cidade. Pelo menos 379 vítimas apresentaram queixa por roubo, ameaças e assédio sexual por parte dessa gangue. O chefe da polícia, Wolfgang Albers, comunicou que os ataques foram descritos pelas testemunhas como partindo de um grupo de 1.000 homens que pareciam "originar-se de países árabes ou do Norte da África."

A Chanceler Angela Merkel se disse "enojada", ao expressar a sua "fúria para com estes ataques e assédios nojentos". 

Neste Dia de Reis Magos, Sra. Merkel disse ser necessário resolver o desafio que o grande fluxo de refugiados representa e manter a liberdade de circulação na Europa, que considera um dos pilares da integração europeia. Não veio o tão aguardado "Mea culpa!".

Em uma coletiva de imprensa sobre como reagir a eventuais agressões, Henriette Reker, a prefeita da cidade alemã de Colônia, cenário da onda de ataques sexuais na virada do Ano Novo, recomendou que as mulheres observassem a distância maior do que "o comprimento de um braço" em relação a desconhecidos. Seu conselho deslanchou uma avalanche de críticas e piadas no Twitter, com a hashtag "Armlaengeabstand", palavra que significa "distância com o comprimento de um braço".

De acordo com os números oficiais mais recentes, no ano passado entraram na Alemanha 1.100.000 refugiados.


BEM-VINDOS À GRÉCIA ISLÂMICA!

Por Strouthokamilos

Imigrantes


Enquanto todos se ocupam do pacto de convivência dos homossexuais (como se isso fosse o maior problema da Grécia), a islamização da Grécia continua.


Os números são terríveis


Infelizmente, com o governo de esquerda, que faz referendos para zombar da gente, a Grécia em breve viverá cenas da França e da Suécia.

(Na verdade, por que Tsipras não faz referendos sobre a imigração clandestina? Vejamos: os Gregos os querem? Ou preferem fecharmos as fronteiras? Porém, conforme dissemos, os governos democráticos fazem plebiscitos apenas quando sabem que dará o resultado que querem. Como fez acerca do memorando (de acordo da dívida grega), independente se o resultado não era o que era esperado).

Neste momento a Suécia é tida como a Capital dos Estupros do Ocidente! Também a França, como vocês sabem, é o centro dos islamitas na Europa. As cidades francesas, como Marselha, têm acima de 35% da população como muçulmanos, e são regiões proibitivas para a polícia, porque predomina a sharia.

Vocês não acreditam? Acessem o Google e façam uma busca para verem o que se passa.


Nesses países, há cerca de 20 anos atrás, alguns "progressistas" aprovavam leis em defesa dos infelizes imigrantes clandestinos. Os que discordavam então eram chamados de fascistas ou neo-nazistas.


Isso lhes lembra algo? Sim: o que acontece hoje na Grécia!

Já dissemos, nesses assuntos, a Grécia é a Suécia, só que 20 anos atrás.

Também porque, na Grécia, os de esquerda têm força, já que os apóiam os meios de comunicação  e quem quer que discorde é chamado de fascista; em breve Atenas se tornará a capital dos abusos sexuais. Esperem para ver!

Não é possível acontecer a mesma coisa em TODOS os países aonde foram os muçulmanos e a Grécia ficar de fora. Em toda a parte, em qualquer país aonde tenham ido acontece exatamente a mesma coisa! Aonde vão, trazem consigo a Idade Média! E como estão perto da maioria, aplicam a sharia e a guetização.

Façam uma busca. A Internet é livre. Façam uma pesquisa e vejam o que acontece na Europa. Abram o Google e digitem "Islam na Europa", "Islam na Suécia", "Rape in Sweden" (Estupro na Suécia).

Encerrando, quero dizer: Para continuar a existir uma nação, é preciso nascerem 2,1 crianças por família. Na Grécia, de Gregos, nascem 1,3 crianças. Por conseguinte, com simples matemática... em alguns anos a partir de agora, a nação grega cessará de existir!

Obrigado aos esquerdistas e a seus amigos clandestinos... ou antes aos neo-Gregos!

Vejam os dados para a imigração clandestina desde 2006 até 2015:


Imigrantes clandestinos presos


Fontehttps://strouthokamilos.wordpress.com/2015/12/22/καλως-ήρθατε-στην-ισλαμική-ελλάδα/





sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

HOMENAGEM PÓSTUMA A MEU MELHOR AMIGO, PROF. DR. JACOB ANCELEVICZ


Por Francisco José dos Santos Braga




Sei muito pouco de seus ancestrais. De seu pai Ruwin e de sua mãe Schulamit, ouvi-os dizer que eram naturais de Vilno (ou Vilnius ou Wilno) e se consideravam judeus polacos, sendo falantes do iídiche. Durante as Grandes Guerras, percebendo a iminência do perigo alemão e russo,  o casal decidiu emigrar-se inicialmente para Israel (cidade de Hadera, onde nasceram seus três filhos, Jacob, Yoaav e Mordechai), depois para Londres e, finalmente, para o Brasil, estabelecendo-se em São Paulo. 
 
Da esq. p/ direita: Ruwin, Jacob, Mordechai, Schulamit e Yoaav 
antes de chegarem ao Brasil, provavelmente em Londres

Chegaram ao porto de Santos em 31 de março de 1964 a bordo de um navio. Em São Paulo, o Sr. Ruwin pôde aplicar seus conhecimentos técnicos de construtor civil, morando inicialmente num hotel. Quando a família Vicunha construiu para si o prédio da Avenida Angélica, 696, Sr. Ruwin foi o primeiro a conseguir adquirir um dos apartamentos no 3º andar, por desistência de um diretor. Consta que o casal Ancelevicz solicitou naturalização brasileira, tendo o Ministério da Justiça se manifestado através de portaria nº 17.143/68. ¹

Família Ancelevicz Da esq. p/ dir.: Yoaav, Dª Schulamit, Jacob, Mordechai e Ruwin

Jacob Ancelevicz
Da esq. p/ dir.: Jacob, Dª Schulamit, Mordechai e Yoaav

Como chegaram ao Brasil após o início do ano letivo, Sr. Ruwin decidiu contratar uma professora particular para ensinar a seus filhos a língua portuguesa.  No ano seguinte, matriculou seus filhos no Colégio Rio Branco, cujo diretor era o Prof. Antônio Delorenzo Neto, que iria tornar-se o grande benfeitor de Jacob por toda a sua vida.
Jacob Ancelevicz como aluno do Curso Clássico do Colégio Rio Branco
Jacob como aluno de curso intensivo na USP
Na ocasião que travamos conhecimento, Sr. Ruwin e seu filho Mordechai construíam casas em São Roque-SP. Conheci todos os cinco Ancelevicz em São Paulo em 1976 e pude saborear alguns pratos típicos judeus, divinamente preparados pelas mãos abençoadas de Dª Schulamit, em especial o bolinho de peixe (gefilte fish), o pão sem fermento (matzah), a sopa de beterraba (borscht), o pão redondo (bêigale), a sopa judaica (kneidale que utiliza o caldo de galinha como ingrediente), biscoito com recheio (oznei chaman), etc. Fui acolhido pela família judaica, residente no bairro Higienópolis, com meu enorme apetite e não pequena curiosidade. Aprendi algumas expressões tradicionais dos judeus, como chag samêach (feliz festa!), le chaim (saúde!, literalmente À vida!), mazel tov (boa sorte!), kaballah, Baruch atah Adonai (Bendito sejas, Deus), mitzvah (mandamento), bar mitzvah (festa para o menino adolescente), kosher ou kasher (termo que faz referência aos alimentos adequados ou permitidos pelas leis alimentares do judaísmo), yeshivah (nome genérico para qualquer escola que ensine Torá, Mishná e Talmud), knesset (sinagoga), sêfer (livro), kipah (solidéu, chapéu de cobertura), etc. Além disso, entrei em contato com as principais festas judaicas, como o pêssach (páscoa), rosh hashanah (ano novo), shabat (sábado), purim (festa do sorteio), iom kipur (dia do perdão), sukot (festa das cabanas ou dos tabernáculos), chanukah (festa do candelabro de 9 velas ou menorá), shavuot (festa das colheitas ou das primícias), kibutz, shalom, etc. Devido à minha curiosidade, conquistei logo o coração dessa bondosa família, especialmente de Dª Schulamit. Privei da intimidade dessa família exemplar até meados de 1980, quando fui aprovado no concurso para Agente Fiscal do Tesouro Nacional, abandonando São Paulo e viajando para Brasília, onde me submeti a um curso intensivo na ESAF-Escola de Administração Financeira do Ministério da Fazenda, durante seis meses. Dª Schulamit não viveu por muito mais tempo, vindo então a falecer, deixando saudades no coração de todos que a conhecíamos e estimávamos. 

No início de 1990, tive o prazer de conhecer Israel na companhia de Prof. Jacob e de seu sobrinho Lior. O nosso voo fez escala em New York após o Natal de 1989, onde passamos uma agradável semana em elegante apartamento do pai de seu amigo Elias num ponto central da cidade, que nos acolheu com grande simpatia e cordialidade. Foram dias inesquecíveis os passados em Tel Aviv, Hadera, Haifa, Yaffo, Petach Tikva, Jerusalém (onde residia uma sua tia, que nos hospedou por 15 dias e era assistente de mikveh ou mikvah, um tradicional rito judaico de purificação em piscina para mulheres casadas), deserto de Neguev, Cesareia, Jericó, Massada e Mar Morto, rio Jordão, Eilat, Tibérias e kibutz Brochail. Daí resultou minha admiração pelo povo israelense e meu amor pelo hebraico.
Prof. Jacob em alguma localidade de Israel

Em 1976, o chefe do COFINCO (hoje CFC)-Departamento de Contabilidade, Finanças e Controle da EAESP-FGV, Prof. Antônio Luiz de Campos Gurgel, convidou alguns alunos do Mestrado em Administração a lecionarem a disciplina de Contabilidade Básica para o curso de graduação em Administração de Empresas e Administração Pública, na condição de professores horistas. Entre vários candidatos, foram selecionados quatro mestrandos: Moisés Skitnevsky (então funcionário da Sharpe, atual presidente da Seal Sistemas e Tecnologia de Informação Ltda.), Oscar Malvessi (professor que fez carreira na FGV, além de consultor empresarial e escritor), Nilton Gomes Paz (então funcionário do Metrô de São Paulo, atualmente proprietário de uma empresa de plásticos em Tubarão-SC) e eu. O Professor Titular do COFINCO, Prof.  Dr. Jacob Ancelevicz, foi designado para nos assessorar como orientador pedagógico em nossa tarefa de ministrar a referida disciplina para alunos iniciantes. Algumas características desse professor eram prontamente percebidas: sua prodigiosa inteligência, capacidade gerencial e consultiva, competência pedagógica, facilidade de se relacionar com colegas e alunos, além de sua extraordinária paciência e grande simpatia pessoal. A par disso, exibia um sotaque muito esquisito, para quem a língua materna era o hebraico, talvez um pouco contaminado pelas línguas iídiche, russa e polonesa. Foi assim que entrei em contato com aquele que marcaria minha vida daí por diante de diversas formas, especialmente apresentando-me à sua família e estabelecendo comigo uma relação de amizade que se estendeu por quase quarenta anos.
Jacob Ancelevicz nos seus áureos tempos

Prof. Jacob cursou a sua graduação em Ciências Econômicas (1965-9) na FEAO-Faculdade Municipal de Ciências Econômicas e Administrativas de Osasco, criada pelo Prof. Antônio Delorenzo Neto, o qual foi o seu primeiro diretor. Dizia-me que era uma ótima faculdade, patrocinada pela Prefeitura Municipal de Osasco, cujo corpo docente era da USP. Consta também que, durante os anos de 1970 e 1971, Jacob se especializou em Administração de Empresas na FGV, como bolsista da CAPES-Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. No ano de 1976, Jacob era um prestigiado professor titular da FGV  conforme disse  que tinha ingressado no Departamento com o beneplácito do Prof. Wladimir Antônio Puggina (professor de disciplinas superiores relativas ao Mercado de Capitais e que o entusiasmara a cursar o programa de Mestrado em Administração de Empresas na FGV, de 1972 a 1974, sendo o orientador de sua monografia de Mestrado intitulada "Relevância dos Dividendos"). Ao mesmo tempo, Jacob tinha sido também aprovado para professor de carreira da USP, cargo que foi impedido de exercer porque a FGV na ocasião exigia dedicação exclusiva (exceção feita ao Prof. Heinrich Rattner que serviu as duas instituições de ensino superior). Acompanhei o dilema de Prof. Jacob na escolha da universidade que melhor atenderia seus interesses, decidindo-se finalmente pela FGV. 

Reproduzo abaixo um breve resumo das atividades de Prof. Jacob, como integrante do corpo docente e pesquisador do Departamento de Contabilidade e Atuária da FEA da USP, extraído da p. 164 do livro "História da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (1946-1981), Volume Dois: Personália, em especial o constante do item II.1:





Por essa decisão, Prof. Jacob deixou de trabalhar no Departamento de Contabilidade e Atuária da FEA da USP, abrindo mão de ter muitos de seus projetos e livros aprovados pela FIPECAFI-Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras; afinal, o nome do Prof. Jacob Ancelevicz é mencionado como um dos instituidores da FIPECAFI em 1974. ² Em compensação, ao optar por integrar o quadro de professores e pesquisadores da EAESP-FGV, o Prof. Jacob teve o privilégio de trabalhar ao lado de grandes conhecedores de mercado de capitais, tais como os professores Wladimir Antônio Puggina, Milton Huppert Monte Carmelo e Mário Sérgio Cardim Neto.

Jacob gabava-se de sua excelente amizade com o Prof. da USP, Sérgio de Iudícibus, consagrado autor de livros como "Contabilidade Introdutória" e, mais tarde, "Contabilidade Gerencial", além de coordenador do "Manual de Contabilidade das Sociedades por Ações", todos lançados pela Editora Atlas; mencionava inclusive que Iudícibus participara da banca de aprovação de sua monografia  de Doutorado em Administração, intitulada "Política de Dividendos", pela FEAO-Faculdade Municipal de Ciências Econômicas e Administrativas de Osasco (1975), a mesma escola onde cursou a sua graduação em Ciências Econômicas (1965-9). 

Para exemplificar o fato de não ser unilateral essa amizade entre os dois ilustres professores, o currículo Lattes do Prof. Sérgio de Iudícibus menciona Prof. Jacob ³ como integrante de banca da qual participava também como jurado.  Em 2003, por exemplo, certamente a convite do Prof. Iudícibus, ambos julgaram a monografia intitulada "Uma Análise Societária das Empresas de Capital Aberto no Setor Imobiliário" ou ainda, no mesmo ano, julgaram a monografia "Contribuição para a escolha de um Sistema de Custos em Instituições de Ensino Superior Privado", ambas defendidas por mestrandos da PUC-SP. 

Outra personalidade, com quem Jacob se orgulhava de manter ótimas relações, era Prof. Antônio Delorenzo Neto, prestigiado diretor da Faculdade de Sociologia e Política da USP em duas gestões e diretor do Instituto de Estudos Municipais, o qual escrevera livros como "Sociologia Aplicada à Administração", "Sociologia Aplicada à Educação", "A Grande São Paulo e a Mudança da Capital", etc. Contam que Prof. Delorenzo, aos 30 anos de idade, ganhou uma bolsa de estudos do governo francês para cursar Pós-Gradução em Direito Internacional na Universidade de Paris. Na época foi convidado pelos  seus mestres a participar de um congresso de Municípios em Haya (Holanda), sendo o referido congresso presidido pela Rainha Juliana, cuja realização coincidiu com o centenário de Rui Barbosa, o "Águia de Haya". Consta que Prof. Delorenzo foi convidado a sentar-se na cadeira do grande jurista brasileiro, em cuja homenagem discursou em francês. Quanto a Prof. Jacob, ele fora acolhido pelo grupo do Prof. Delorenzo e alardeava com muito orgulho suas novas amizades.

Prof. Jacob é agraciado com o anel de doutor pelo diretor/paraninfo Prof. Delorenzo, em 1975
Prof. Jacob, sendo entronizado doutor pelo diretor/paraninfo Prof. Delorenzo, em 1975
Outro traço marcante do Prof. Jacob é que ele possuía, em seu apartamento na Av. Angélica, um portfólio recheado de Letras de Câmbio de diversas empresas, possibilitando que seus amigos mais chegados   da FGV, principalmente Prof. Nilton e eu   tirássemos igualmente proveito de vantagens oferecidas por seus investimentos, o que fazíamos com certa frequência. Ele costumava repassar alguns desses títulos de crédito com certo prazo já transcorrido, quando tínhamos algum excedente de caixa, passando para nós sua parcela de lucro garantido até o vencimento.

De 1977 em diante, Jacob passou a fazer resenhas de livros na área financeira para a RAE-Revista de Administração de Empresas da FGV.  De acordo com a relação de artigos da autoria desse colaborador, posso mencionar que, em 1977, Jacob fez a resenha do livro de Jack Clark Francis, em artigo intitulado "Investments: Analysis and Management", o mesmo nome do livro daquele autor, de 1976. Em 1979, em artigo intitulado "Investments", Jacob apresenta a resenha de um livro do mesmo nome, de 1978, por William F. Sharpe, que, em 1970, já tinha surpreendido o mundo acadêmico com o livro "Portfolio theory and capital markets". Sirvo-me desses dois exemplos para mostrar a contribuição de Jacob para a Academia na área de mercado de capitais e análise de investimentos, evidência de que ele se mantinha plenamente atualizado nas disciplinas de sua especialização. Na relação da RAE acima, Jacob foi colaborador ativo até o ano de 2000, ficando ausente após 2000 e durante quase toda a década de 90, embora em 1999 tenha publicado na RAE um artigo de 98 páginas, pelo NPP-Núcleo de Pesquisa e Publicações da FGV, como resultado do Relatório de Pesquisa 32/1997, intitulado "A Utilização do Sistema de Custos ABC no Brasil", em co-autoria com seu orientado Carlos Yorghi Khoury. Em 2000, escreveu, em co-autoria com Khoury, "Controvérsias Acerca do Sistema de Custos ABC", artigo publicado na RAE, jan/mar 2000 . Cabe mencionar que, em co-autoria com Khoury, Jacob produziu outros trabalhos acadêmicos.

Prof. Jacob na época da apresentação de sua pesquisa ao NPP

Em 1976-7, fiz sozinho a tradução da 2ª edição (de 1976) de Principles of Financial Management (Princípios de Administração Financeira), por Lawrence J. Gitman para a editora, sediada em São Paulo, Harper & Row do Brasil, livro lançado apenas em 1978 e que teve ótima aceitação entre os professores de Administração Financeira de todo o país. Além de eu ser o autor de praticamente todas as notas de rodapé do livro, ainda inovei produzindo um Apêndice de minha lavra para o 2º capítulo do livro denominado O Ambiente Legal, Operacional e Fiscal da Empresa. Prof. Ivan Pinto Dias, em resenha intitulada "Princípios de Administração Financeira", finaliza seus abalizados comentários da seguinte forma:  
"A qualidade da tradução, além da ótima impressão gráfica, com tabelas e gráficos fáceis de serem visualizados, e do fato de o(s) tradutor(es), em vários capítulos iniciais  principalmente aqueles relacionados com a terceira parte "A administração de capital de giro"  ter(em) colocado em notas de rodapé algumas das novidades introduzidas pela Lei nº 6.404 de 15.12.76 [Lei das Sociedades por Ações] e pelo Decreto-lei nº 1.598 de 26.12.77 [Altera a Legislação do Imposto sobre a Renda], faz(em) com que o livro de Gitman seja recomendado a todos aqueles que desejam iniciar-se no campo de administração financeira.   
Observem que assinalei entre parênteses o que não corresponde à realidade: o tradutor foi apenas um e é o autor desta matéria. A revisão técnica da minha tradução, oferecida ao Prof. Dr. João Carlos Hopp, conforme fui informado pela Editora, teve apenas razões mercadológicas e honoríficas, já que o dito professor da FGV era bastante conhecido no mundo acadêmico, contribuindo enormemente para a divulgação do livro.

Além disso, fiz sozinho também a tradução de inúmeros capítulos do livro Practical Controllership (Controladoria Prática), por David Anderson, Leo Schmidt e Andrew McCosh, que apareceram como material didático da FGV. Quando Jacob e eu tentamos negociar a tradução de todo o livro com a Editora Atlas, de São Paulo, não tivemos sorte.

Nesta ocasião, Prof. Jacob criou e organizou um curso que abrangia simultaneamente mercado de capitais e mercado financeiro para seus amigos da Prefeitura de São Roque-SP e das firmas lá sediadas. Os instrutores daquele curso eram operadores do mercado financeiro e corretores da bolsa de valores, bem como funcionários especialistas do mercado de capitais em São Paulo. Prof. Jacob e eu saíamos no fim da tarde acompanhados do especialista que falaria sobre o tema programado para a data e dirigíamo-nos até São Roque. Certamente procurando reduzir os custos que tinha, ele buscava o palestrante à porta de seu escritório e o trazia à sua residência ao final da palestra. Prof. Jacob tinha já antecipadamente reservado um salão para essas brilhantes apresentações, sempre bem avaliadas e inesquecíveis. Recordo-me ter presenciado plena satisfação por parte dos alunos inscritos naquele curso. Não me lembro se, ao final do curso, os que dele participaram fizeram juz a um certificado ou diploma. Imagino que sim.

Entusiasmados com a ótima repercussão que teve a segunda edição do livro Princípios de Administração Financeira de  Gitman no meio acadêmico, Jacob e eu dispusemo-nos a traduzir diversos livros na área financeira. Inicialmente, a Editora Saraiva apostou no lançamento de um livro nosso como co-autores. Para ela escrevemos, como tais, o livro Contabilidade Básica: um Estudo Programado, lançado em janeiro de 1980 que tinha como característica especial ser um livro-texto de contabilidade utilizando o método de estudo programado de maneira inovadora, já que o aluno devia primeiro preencher as informações solicitadas e, só então, conferir as informações corretas, colocando um filtro de acrílico sobre a trama colorida. Esse livro foi escrito em 1979 dentro de um mês na sala de meu apartamento na Alameda Franca, que foi o tempo que Jacob dispunha entre suas diversas ocupações. Por outro lado, a Editora Saraiva-SP lançou em 1980 o livro Casos em Administração Financeira, por Lawrence J. Gitman, Timothy Jonhson e Ross Flaherty, em nossa tradução. Ainda no mesmo ano, a Editora Interamericana-RJ lançou o livro Casos em Administração Financeira - Segunda Edição, por Eugene Brigham, Timothy Nantell e Richard Pettway, traduzido por nós. A mesma editora lançou um novo trabalho de tradução nosso: os livros Contabilidade de Custos-Exercícios e Contabilidade de Custos-Texto, da autoria de David H. Li, respectivamente nos anos de 1980 e 1981. Em 1984, a Harper & Row do Brasil nos contratou como tradutores do livro Princípios de Administração Financeira-Terceira Edição de Lawrence J. Gitman, que ganhou enorme notoriedade (vide imagem abaixo). Fizemos ainda para a Editora Interamericana-RJ a tradução da 7ª edição de Managerial Finance, por Fred Weston e Eugene Brigham, que não sei se foi lançada no Brasil. Ao fazer um retrospecto de nossa fase editorial, observo que Jacob, além de tradutor/parceiro muito disciplinado, era um professor  com grandes conhecimentos na área financeira e da língua inglesa. Ouso dizer que podemos, sem falsa modéstia, ser considerados como introdutores de uma moderna terminologia na área financeira, na língua portuguesa, tendo milhares de professores universitários utilizado nossas traduções modelares de livros-texto consagrados e em uso nas universidades norte-americanas e tendo outros tradutores da área financeira aproveitado nossa contribuição para suas novas edições dos mesmos livros ou de outros autores.

De nossa produção independente menciono apenas um livro: Contabilidade Básica-Exercícios editado em agosto de 1981.
Princípios de Administração Financeira-Terceira Edição, por Lawrence J. Giman
Tradução dos Professores Jacob Ancelevicz e Francisco José dos Santos Braga, 
São Paulo: Editora Harper & Row do Brasil, 1984, 781 p.

Mas não pretendo insistir neste ponto: o de termos sido possivelmente os primeiros no Brasil a divulgar uma moderna terminologia na área de finanças e de contabilidade de custos. O que recordo, neste momento, desolado, é o amigo.

Observe-se que na ocasião da publicação da 3ª edição de Princípios de Administração Financeira, por Lawrence J. Gitman, Prof. Jacob era chefe do NATAD-Núcleo de Assessoria Técnica e Administrativa da EAESP-FGV, ou seja, era um professor que priorizava sua vida acadêmica, extremamente valorizado por seu Departamento CFC.

Durante a minha estada no Departamento CFC, havia sempre a realização de Seminários internos de fim de ano para previsão de atividades da EAESP-FGV, normalmente num grande hotel sediado em Águas de Lindóia ou em Águas de São Pedro. Nesses Seminários era obrigatória a participação de professores titulares e de carreira, mas eventualmente eu era convidado a comparecer pelo Diretor Administrativo e de Benefícios, Sr. Reynaldo Magri, por quem nutria amizade e admiração. A respeito deste funcionário exemplar, comentava-se que o fundador da FGV, Luiz Simões Lopes,  depositava nele total confiança.
Da esq. p/ dir.: Professores Jacob Anceleviz, Victor Colella (autor do livro Auditoria: Controle Interno e Estoques) e o autor

Em 1980, Prof. Jacob venceu um concurso de monografia pela ABAMEC-Associação Brasileira dos Analistas do Mercado de Capitais, pelo qual foi premiado. Provavelmente meu homenageado tenha concorrido com o artigo "Estágio da Análise de Investimento no Brasil", publicado na Revista da ABAMEC, São Paulo, nº 31, pp. 71-98, 1979. Posteriormente, de 21 a 23 de novembro de 1984, Prof. Jacob compareceu ao VII Congresso da ABAMEC, no Centro de Convenções de Brasília.
Prof. Jacob participando do VII Congresso da ABAMEC

De 1985 em diante, por cerca de dez anos, fizemos Jacob e eu várias viagens aos Estados Unidos. Nosso destino era normalmente o Estado da Flórida, com exceção de uma vez que fizemos escala em New York com destino a Israel e de outra vez que fomos a New York encontrar um seu primo, rabino ortodoxo que supervisionava açougues de carne kasher e que veio algumas vezes à América Latina, inclusive ao Brasil.  Costumávamos alugar um carro no aeroporto de Miami ou Orlando e percorríamos a Flórida ou subíamos em direção a Washington (onde certa vez assistimos à apresentação de uma cantata do compositor Leonard Bernstein, sob a sua regência, na escadaria do Capitólio no 4 de julho), New York e Boston. Nos Estados Unidos residiam vários parentes de meu amigo. Lembro-me especialmente de Leonard Zion , de sua esposa pianista Deborah e de sua filha Alana, que, se não me falha a memória, residiam em Providence, Rhode Island. Visitamos essa família algumas vezes e Leonard Zion teve a oportunidade de vir a São Paulo proferir uma palestra sobre assunto de sua especialidade a convite da EAESP-FGV, como professor visitante. Lembro-me ainda muito bem de Scott Daniels, seu primo, que residia em Tampa, Flórida, aonde íamos visitá-lo de carro. Lembro-me ainda de uma tia (provavelmente irmã de Leonard Zion) que residia num condomínio, também na Flórida, e que Jacob sempre visitava, quando passava férias nos Estados Unidos. Conforme se vê, meu amigo Jacob tinha muitos familiares nos Estados Unidos e em Jerusalém, diferentemente dos Ancelevicz que deram com os costados em São Paulo, ficando um pouco isolados e mostrando com tal decisão muita independência em relação ao restante da família.

Convém lembrar que Jacob foi excelente orientador de monografias e teses, de que se beneficiaram diversos alunos mestrandos e doutorandos. Temos que reconhecer que ele sabia como fazer parcerias importantes e permanentes, onde observamos sua habilidade inata de excelente negociador, desenvolvendo com seus parceiros laços de amizade duradouros e definitivos. É justo lembrar aqui alguns nomes que podem comprovar a veracidade dessas informações: Oldemar Santos Filho (1983-Mestrado), Oscar Malvessi (1983-Mestrado), Nelson Carlos Ribeiro (1994; Mestrado), José Francisco Calil (1991-2000; Doutorado), Peter Greiner (1995; Doutorado), Jean Jacques Salim (1995; Doutorado), Edson de Oliveira Pamplona (1997; Doutorado), Carlos Yorghi Khoury (1997; Doutorado), Marcus Canavarros Stephan (2000; Mestrado), Rodrigo Ramalho Dubeux (2001; Mestrado), Arlos Renato Bernardi (2005; Doutorado) e muitos outros, conforme se pode localizar na Internet e ler no currículo Lattes do Prof. Dr. Jacob Ancelevicz.

Prof. Jacob foi também catedrático em outras instituições de ensino superior, a saber: professor titular do Instituto Metodista de Ensino Superior de São Bernardo do Campo e professor convidado sem vínculo da UNIMEP-Universidade Metodista de Piracicaba, na época em que a Profª Maria Antônia Fioravanti, uma das orientadas pelo Prof. Jacob em Mestrado, coordenava o curso de Pós-Graduação Lato Sensu de Gestão Financeira.

Em 1995, Prof. Jacob obteve, junto à Universidade da Carolina do Sul (College of Business Administration), um Prêmio de Realização Acadêmica em reconhecimento da excelência com que se houve quando participou do Programa do FDIB-Faculty Development in International Business (Desenvolvimento de Corpo Docente em Negócio Internacional).




Nos últimos anos, juntamente com sua aposentadoria da Fundação Getúlio Vargas, Prof. Jacob teve uma especial alegria ao constituir uma empresa com o nome fantasia Revestir Revestindo Couros, com showroom na Alameda Gabriel Monteiro da Silva, 248, em sociedade com sua esposa, procuradora do Estado de São Paulo, Scarlet Andrade Buchalla. Iniciava-se então a sua fase de indivíduo empresário em 15 de setembro de 2005, data da abertura da firma. Na direção da empresa, Jacob cuidava de tudo: administrava, gerenciava compras, preparava orçamentos, sendo muito querido no meio dos arquitetos. Scarlet cuidava do desenvolvimento dos produtos no ramo desse mercado de luxo. Cada produto tinha a característica de ser artesanal, ou seja, único. O casal orgulhava-se de executar projetos sob encomenda e com exclusividade: o serviço da empresa abrangia desde o revestimento de uma maçaneta até o de paredes e tetos. 

E foi na labuta diária que Prof. Jacob sofreu um acidente dentro de sua empresa, ao cair do alto de uma escada. Esse acidente lhe foi fatal. Prof. Jacob "ficou encantado" em 3 de dezembro de 2015, deixando-nos órfãos de sua alegria contagiante e de seu otimismo persistente. "A gente não morre. Fica encantado" foi a feliz expressão de Guimarães Rosa recitada no seu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras. Como o escritor mineiro, que, três dias depois do famoso discurso, faleceu para espanto de todos os seus leitores,  premonição ou profecia? , Prof. Jacob igualmente nos surpreendeu a todos quando partiu assim, sem dar adeus a tantos quantos o amávamos e o admirávamos como ser humano digno, correto e leal. Estávamos tão acostumados com a sua força interior descomunal que não percebemos quão frágil era sua anatomia humana. Alguns dirão que ele partiu cedo demais. Não para Deus que entendeu que Prof. Jacob já tinha realizado tudo o que anelava e cumprido suas diversas missões nesta vida.

Da esq. p/ dir. (ano 2002): Dr. Cláudio Haddad, o autor, 
Oldemar Santos Filho e Jacob
Da esq. p/ dir. (num aniversário do homenageado): 
Jacob, Dr. Cláudio Haddad e o autor

É muito difícil, nesta hora, deixar de lembrar algumas gentilezas de que fui alvo por parte do Prof. Jacob. Como poderia esquecer-me de sua hospitalidade quando me hospedou no período pós-cirúrgico de um tratamento ortodôntico?! Acaso seria possível esquecer-me de sua  assistência e apoio psicológicos a mim dispensados, quando do acidente automobilístico que envolveu o meu veículo Escort com uma Variant, ocorrido na primeira quinzena de dezembro de 1994 num trevo de Pirassununga-SP, próximo à Cachoeira das Emas, o que o levou a abandonar seus afazeres na capital e dirigir-se com a maior boa vontade ao local da avaria, auxiliando-me no acordo com o outro motorista envolvido no acidente? Também não poderia silenciar-me sobre o empenho do Prof. Jacob em favorecer-me, durante nossa viagem à Grécia em 2000, quando insistiu e conseguiu que enviassem da EAESP-FGV à Universidade Aristotélica de Salônica um fax atestando minha conclusão do curso de Mestrado em Administração com proficiência e aprovação de monografia em 1983, para que eu pudesse cursar um Seminário para Assessores da União Europeia, oferecido pela Escola de Grego Moderno da referida universidade grega; ao reconhecer que o curso era importante para mim, sabia que automaticamente a minha frequência ao curso levaria à interrupção de nossa viagem  de turismo à ilha de Creta; o resultado foi que realmente privei o casal Scarlet e Jacob da minha companhia no restante da viagem. E lá se foram Scarlet e seu "παππούλης" ou papúlis (diminutivo de papús ou "παππούς"=vovô) para a ilha de Creta. Como calar-me diante de sua disponibilidade em buscar minha saudosa mãe Celina dos Santos Braga na estação rodoviária do Tietê, nas madrugadas frias, na minha companhia, para que ela pudesse submeter-se a sessões de acupuntura na Pauliceia? São muitíssimos os motivos para me emocionar diante de tantos mimos recebidos. 
 
Em uma de nossas viagens, em algum aeroporto do mundo


Talvez eu tenha tido a oportunidade de retribuir-lhe, dentro de minhas modestas possibilidades, um pouco, à minha maneira, ao acompanhar o meu saudoso amigo aos Estados Unidos por diversas vezes e uma única vez a Israel e, em 2000, sendo guia do casal amigo em nossa viagem à Grécia. Inesquecível e digno de registro, nesta última viagem turística, foi o convite para uma lauta refeição que recebemos do Sr. Theodore Kopolo Sotírios, um vizinho muito querido do casal em São Paulo, a fim de degustarmos variadas iguarias da culinária grega num dos mais prestigiados restaurantes do porto de Piréus.

Em uma de nossas idas aos Estados Unidos

Como eu sei quão difícil é trabalhar em grupo, motivar, incentivar e entusiasmar uma equipe focada no mesmo objetivo, queria aqui reconhecer que Prof. Jacob foi muito eficiente em lidar com grupos e chegar a grandes realizações. Além de excelente professor e consultor em mercado de capitais, fez importantes pesquisas e, como já vimos anteriormente, orientou diversos alunos a fazerem suas monografias e teses de Mestrado e Doutoramento.  

Igualmente não pode ser esquecida sua capacidade de fazer amigos e influenciar pessoas com seu carisma pessoal, suas tiradas espontâneas e seus gestos francos. Por isso, quero aproveitar o ensejo para agradecer a todos os que o auxiliaram a realizar tudo o que deixou como legado e testemunho de sua enorme competência em todas as áreas em que atuou. Outro traço característico de Prof. Jacob era seu permanente e cativante sorriso que levava seu interlocutor a fazer tudo o que aquele lhe pedia (fosse sua secretária, seu faxineiro, seu colega, seu superior, um advogado, um arquiteto ou uma autoridade). Com isso quero dizer que Jacob Ancelevicz, um dos temperamentos mais gregários que conheci, tinha o dom de atrair e de fazer amigos, vivendo rodeado de pessoas. Muito prestativo,  apreciava quando algum amigo solicitava a sua colaboração. Alegre e comunicativo, seu sorriso era contagiante. 


Pedi à esposa do Prof. Jacob, Dra. Scarlet Andrade Buchalla, que desse seu depoimento a respeito da sua vida ao lado do meu saudoso amigo. Segundo ela, ambos se realizaram plenamente na vida conjugal. Relatou que ela foi a sua primeira namorada e o grande amor da sua vida, com quem ele viveu por 27 anos um intenso amor (de 1988 a 2015) e a quem ele se dedicou de corpo e alma como eterno namorado. Disse ainda que, com a sua chegada, Jacob amadureceu como homem, pois até então ele tinha se realizado intelectual e profissionalmente, mas faltava ainda encontrar alguém a quem se dedicasse e dispensasse seu amor. Verificou-se consequentemente um encaixe perfeito entre o casal com base na intelectualidade, havendo debate entre os dois enamorados, cada um deles afirmando a superioridade intelectual do parceiro. 

Em inúmeras ocasiões, testemunhei o crescimento desse amor: inicialmente, no primeiro encontro  do casal na Avenida Angélica; no namoro que se seguiu; na ida do casal a São João del-Rei, durante a Semana Santa de 1993, para assistir a um concerto de piano e trompa no Teatro Municipal, tendo na trompa Celso José Benedito e no piano o autor dessas notas; em uma viagem à Grécia em 2000 na minha companhia; nos encontros na casa de praia de Juqueí, onde o casal franqueava a entrada a todos os de seu círculo, principalmente aos seus colegas e amigos professores da FGV, transformando-a num verdadeiro clube; na comemoração do 62º aniversário de Jacob (em 10/07/2010), quando foi registrado o comparecimento de mais de 100 convidados e o aniversariante foi homenageado com declarações da parte de sua amada e músicas interpretadas pela cantora lírica Rute Pardini acompanhada ao piano por seu esposo, autor dessas notas. A respeito desse piano, quero aqui deixar registrada a enorme consideração de Scarlet, ao adquirir para execução deste pianista, um piano digital Yamaha modelo Clavinova, que animou inúmeros recitais, especialmente o que comemorou o citado aniversário de Jacob, em uma noite repleta de enlevo e declarações de amor do casal enamorado.

Scarlet e Prof. Jacob num momento de descontração
Segundo ela, o convívio de ambos foi marcado por muitas alegrias, pela sociabilidade e envolvimento com outras pessoas e seus muitos amigos, de jovens a idosos (Shoshanah, Zacarias, Salim, tia Elisa, D. Marcela, sua sogra Dª Mucha, etc.). Seu apartamento no quinto andar da Avenida Angélica, 580, acolhia amigos de diversos Estados da Federação, tais como eu próprio de Brasília, Heleno de Foz do Iguaçu, Antônio Mesquita e todo o grupo de São Luiz-MA, Arlete Andreazza do Rio Grande do Sul, etc. Também foi motivo de grandes alegrias para o casal o casarão que alugaram em Juqueí até 2007 para seu lazer e para acolher diversas famílias e pessoas amigas nos fins de semana. 

Em Juqueí: Prof. Jacob e Scarlet, e convidados Rute Pardini e este autor

Ela ainda relembrou que várias famílias de São Luiz-MA adotaram o casal, como se fosse de casa: Cibele Lauande, Dr. Maranhão, Mesquita, Calixto, Ilma, juiz Carlos Nina e juiz Carlos Nina. Quando o casal ingressou na escola do Viola, em São Paulo, encontrou um grupo que não se falava. Dentro de pouco tempo, conseguiu congregar grupos de pessoas dentro de um mesmo espaço, dando muitas provas de carinho e amizade entre ambos, em tempos de dança, música e festas

 
Rute, Jacob e o autor no antigo apartamento da Avenida Angélica, 580


 
Frases inesquecíveis de Prof. Jacob:
"A melhor cidade para mim é onde há poluição."
"Eu amo São Paulo. Em Brasília há muita corrupção."
"Menino, recolha-se à sua insignificância." (quando uma criança falta ao respeito para com seus pais)
"O comprador tem primazia, pode escolher e decidir com toda a calma; o estresse é de quem precisa vender."
"Não interessa." (diante dos problemas)
"Eu tenho você; você tem a mim. Nós dois juntos somos fortes." (declaração de amor a Scarlet, conforme esta, quando Jacob a cumulava de outros elogios, como "minha princesa", "minha bambina" e "meu amor".)

Réveillon de 2001: o autor e sua esposa Rute, Jacob  e sua esposa Scarlet




Foto  recente de Scarlet e Prof. Jacob (Natal de 2014)

 

I.  NOTAS  EXPLICATIVAS


¹ http://www.jusbrasil.com.br/diarios/2990235/pg-7-secao-1-diario-oficial-da-uniao-dou-de-07-08-1968

² Cf. http://www.fipecafi.org/downloads/biblioteca/livro-comemorativo-35-anos.pdf, p. 66

³ Cf. https://uspdigital.usp.br/tycho/CurriculoLattesMostrar?codpub=D7A0A998C96D

⁴  Cf.  http://rae.fgv.br/autor/jacob-ancelevicz

⁵   http://www.scielo.br/pdf/rae/v40n1/v40n1a07.pdf

⁶   Cf. http://www.scielo.br/pdf/rae/v19n2/v19n2a13.pdf

⁷  Fui informado que Leonard Zion faleceu em 2006, mas, alguns anos antes, publicou um emocionante livro de poemas: "Finding another voice: Moments of Wonder", quando padecia de um distúrbio conhecido como afasia (perda parcial ou total da fala). É possível a visualização desse seu livro, disponível na Internet:
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⁸  Cf. http://lattes.cnpq.br/7667975641875882



II.  AGRADECIMENTO


Agradeço à minha esposa Rute Pardini sua colaboração, pesquisando os nossos arquivos fotográficos e da Dra. Scarlet e eternizando em imagens aqui postadas as fotografias do saudoso Prof. Jacob, parceiro de inúmeras viagens e amigo certo das horas incertas. Agradeço-lhe ainda por ter-se disposto a prestar uma homenagem à memória de Jacob Ancelevicz, cantando o Lied de Schubert intitulado "Du bist die Ruh" (Vós Sois a Tranquilidade) na Missa de 7º Dia (09/12/2015), após a comunhão, na igreja do Imaculado Coração de Maria, no bairro de Santa Cecília, acompanhada ao piano pelo autor desta matéria.