segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

2010 - ANO CHOPIN > > > Parte 13 > > > POLÔNIA, por George Friedman


Por Francisco José dos Santos Braga





Tenho o prazer de homenagear o bicentenário de nascimento do compositor polonês Fryderyk Franciszek Chopin (Żelazowa Wola, 1810 - Paris, 1849), disponibilizando aos leitores do Blog do Braga a tradução feita por mim de um texto em língua inglesa de George Friedman, intitulado "Polônia", que corresponde à 7ª parte de sua Viagem Geopolítica à Europa Central e do Leste (Special Series: Geopolitical Journey with George Friedman). Queiram reportar-se ao link http://www.stratfor.com/ para ler o texto em língua inglesa (Geopolitical Journey, Part 7: Poland).¹
Para qualquer ensaísta que pretenda escrever sobre a Polônia, é quase impossível deixar de mencionar Chopin, tal foi a afinidade entre esse gênio e sua terra natal. Assim, aproveitando as opiniões e considerações do especialista George Friedman, fundador de Stratfor, ficaremos conhecendo um pouco mais sobre Chopin e de que forma a geopolítica e Chopin se confundem.


POLÔNIA
Por George Friedman 3 de dezembro de 2010

Para compreender a Polônia, deve-se compreender Frédéric Chopin. Primeiro, ouvir a sua Polonaise e então o seu Estudo Revolucionário. Tratam de esperança, desespero e fúria. Na Polonaise, ouve-se a mais extraordinária destilação da existência de uma nação. No Estudo Revolucionário, escrito no despertar de um levante em Varsóvia em 1830 esmagado pelas tropas russas, há tanto furor quanto resignação. No seu diário pessoal, Chopin interpelou Deus por permitir que acontecesse essa catástrofe nacional, amaldiçoando os russos e condenando os franceses por não virem em socorro dos poloneses. Depois, Chopin nunca retornou à Polônia, mas a Polônia jamais saiu de sua mente.

A Polônia finalmente se tornou uma nação independente em 1918. O primeiro-ministro que escolheu para representá-la em Versalhes foi Ignacy Paderewski, um pianista e um dos melhores intérpretes de Chopin. A conferência restaurou os territórios da Grande Polônia², e Paderewski ajudou a criar a Polônia no período entre-guerras. Gdańsk (a Danzig alemã) preparou o caminho para o maior desastre nacional da Polônia acontecer, quando a Alemanha e a União Soviética se aliaram para arrasar a Polônia, e Danzig tornou-se a justificativa alemã para sua destruição.

Uma História de Tragédia e Grandeza

Para os poloneses, história sempre trata de traição, frequentemente francesa. Mesmo que a França (e o Reino Unido) tivessem planejado honrar seu compromisso com a Polônia, teria sido impossível levá-lo a cabo. A Polônia ruiu em menos de uma semana; ninguém pode ajudar um país que rui tão rápido. (Restou aos invasores as operações de limpeza.)

Travar guerras leva tempo, e os poloneses preferiram o gesto romântico a travar guerra. Os poloneses usaram cavalaria contra os blindados alemães, um acontecimento de grande simbolismo, se não uma proeza militar importante. Como ato de grandeza humana, houve magnificência na sua resistência. Eles travaram guerra — mesmo depois da derrota — como se fosse uma obra de arte. Foi também um exercício em futilidade. Ouça cuidadosamente Chopin: Coragem, arte e futilidade estão intimamente relacionados a favor da Polônia. Os poloneses esperam ser traídos, ser derrotados, perder. Seu orgulho foi serem capazes de reter sua humanidade em face da catástrofe.

Acho que Chopin pode ser compreendido geopoliticamente. Dê uma olhada onde a Polônia está situada. Situa-se na Planície do Norte Europeu, um país aberto cujas fronteiras nacionais para seu oeste e leste não estão protegidas nem mesmo definidas por quaisquer importantes divisas geográficas. A leste está a Rússia, que por volta de 1830 era um império sólido. A oeste estavam primeiro os prussianos e depois de 1871 os alemães. A sul, até 1918 estava o Império Habsburgo.³ Nenhuma quantidade de coragem ou sabedoria poderia sobreviver a forças tão gigantescas quanto essas.

A Polônia não é o mestre de seu destino nem o capitão da sua alma. Vive e morre pela vontade de outros. Pouco pode ser feito para estancar os alemães e russos quando juntam forças ou usam a Polônia como seu campo de batalha. O máximo que a Polônia pode fazer é esperar que poderes mais remotos venham em seu socorro. Esses últimos não poderão: ninguém pode socorrer um país tão longe a não ser que ele se ajude a si mesmo. Chopin sabia disso em sua alma e sabia que os poloneses não conseguiriam ajudar a si mesmos. Acho que Chopin se sentia orgulhoso da certeza da catástrofe.

Há um livro da autoria de Ivan Morris intitulado “A Nobreza do Fracasso”. Trata do Japão, mas o título desperta interesse em mim, quando eu penso na Polônia, em Chopin e Paderewski. Os poloneses foram magníficos na derrota, algo que eu digo sem ironia. Porém é preciso lembrar que a história polonesa não diz respeito sempre à nobreza do fracasso, nem essa espécie de nobreza é o destino certo da Polônia. Antes que o império russo surgisse, antes que os Habsburgos organizassem o sudeste da Europa e antes que a Prússia nascesse, a Polônia era um dos grandes poderes da Europa, a Comunidade Polaco-Lituana.

Quando os alemães estiverem divididos, os russos enfraquecidos e os austríacos preocupados com os turcos, então a Polônia cessa de ser vítima. Os poloneses relembram isso e constantemente se referem à sua grandeza de outrora. Não fica clara a razão que eles verdadeiramente prezam: por que eles uma vez foram grandes, por que a grandeza lhes foi tomada e por que sua ressurreição não é impensável. Os poloneses sabem que uma vez dominaram a Planície do Norte Europeu. Estão convencidos de que isso jamais acontecerá de novo.

Os poloneses hoje desejam livrar-se de sua história. Desejam ir além do senso trágico de Chopin, evitando sonhos fantásticos de grandeza. Aquele primeiro desejo não fez nada para proteger suas famílias dos Nazistas e dos Comunistas e este último é simplesmente irrelevante. Eles foram poderosos por um instante quando não havia Alemanha nem Rússia, mas não são agora. Ou assim pareceria. Eu objetaria que essa visão carece de imaginação.

Polônia, Rússia e Europa

Os poloneses, como o resto da Europa Central, olham para a União Europeia como a solução para seu problema estratégico. Como membro da União Europeia, o problema alemão da Polônia está resolvido. As duas nações estão agora unidas em uma vasta estrutura institucional que elimina o perigo que uma vez ambas se propuseram. Os poloneses também acham que os russos não são um perigo, porque os russos são mais fracos do que parecem e porque, como um funcionário do Ministério de Assuntos Exteriores mo expôs, nem a Ucrânia nem a Bielorrússia são simplesmente satélites russos. Na verdade, ele pensava na Ucrânia e Bielorrússia mais como amortecedores. Quanto à velha ameaça austro-húngara, temos que esse Império foi dissolvido em uma miscelânea de nações fracas, nenhuma das quais pode ameaçar a Polônia.

Sob tais circunstâncias, muitos poloneses estão convencidos de que os riscos de vida na Planície do Norte Europeu foram abolidos. A meu ver, há dois problemas com essa percepção. O primeiro, conforme disse em ensaios anteriores nesta série, é que a Alemanha está reavaliando seu papel dentro da União Europeia. Isso não é porque a liderança alemã queira fazer isso; as elites financeiras e políticas da Alemanha estão profundamente unidas na ideia da União Europeia. Mas, conforme aconteceu com muitas elites mundo afora depois de 2008, as elites da Alemanha perderam muito espaço para manobra. A opinião pública suspeita seriamente das múltiplas fianças que o governo alemão subscreveu e pode ter que subscrever nos anos vindouros. Como a Chanceler Angela Merkel o apresenta, os alemães não estão dispostos a aposentar-se aos 67 anos para que os gregos possam aposentar-se aos 58.

Do ponto de vista dos alemães — e as menos interessantes visões são expressas pela elite cada vez mais fraca — a União Europeia está-se tornando uma armadilha para os interesses alemães. Para os alemães, é necessária uma redefinição da União Europeia. Se a Alemanha vai ser convocada para prestar fiança a falências na área da União Europeia, então quer controle real sobre o resto da política econômica da Europa. Está surgindo um sistema de duas camadas na Europa, no qual patrões e clientes não terão o mesmo grau de poder.

A Polônia está indo extraordinariamente bem em termos econômicos por enquanto. Sua economia está crescendo e é claramente o líder econômico entre os antigos satélites soviéticos. Mas o período em que os subsídios norte-americanos fluíam à Polônia está chegando ao fim, e estão ficando visíveis problemas com o sistema de aposentadoria da Polônia. A capacidade da Polônia de manter sua posição econômica dentro da União Europeia vai ser contestada nos anos futuros. A Polônia poderia então ser relegada à categoria de cliente.

Não acho que os poloneses se importariam de ser um cliente bem atendido. O problema é que os alemães e outros membros centrais da União Europeia não possuem nem os recursos nem a inclinação de sustentar a periferia no estilo que a periferia quer ser atendida. Se a Polônia cometer um deslize, terá sobre si a mesma espécie de controles que estão sendo postos sobre a Irlanda. Um funcionário polonês esclareceu que não via isso como problema. Quando eu mencionei a perda potencial da soberania polonesa, disse-me que havia diferentes tipos de soberania e que a perda da soberania orçamentária não mina a soberania nacional.

Disse-lhe que eu achava que ele não estava encarando a magnitude do problema. A faculdade de um estado determinar como tributa e distribui a arrecadação é a essência do estado soberano. Se ele perder isso, é deixado com o poder de proclamar o mês nacional do sorvete e outros que tais. Outros, mais particularmente os alemães, supervisionarão defesa, educação e tudo mais. Se se colocar o orçamento acima do processo democrático, a soberania perdeu seu significado.

Aqui a conversa invariavelmente alcançou a essência da questão: o intento. Reiteradas vezes foi dito que os alemães não pretendem subtrair a soberania mas simplesmente reestruturar a União Europeia cooperativamente. Concordei “in toto” que os alemães não cobiçam a soberania polonesa. Eu também disse que intenções não importam. Primeiro, quem sabe o que está na mente de Merkel? WikiLeaks poderia revelar o que tinha dito a um diplomata norte-americano, mas isso não significa que ela disse o que pensa. Segundo, Merkel não estará no comando em alguns anos, e ninguém sabe quem vem a seguir. Terceiro, Merkel não é um ator livre, mas é constrangida pela realidade política. E quarto, chame isso como quiser, mas os alemães realinham a estrutura da União Europeia, então o poder estará em suas mãos — e é o poder que importa, não a inclinação subjetiva relativamente a como usar o poder.

Outra conversa disse respeito ao poder russo. De novo, funcionários enfatizaram duas coisas. A primeira foi que a Rússia era fraca e não uma ameaça. A segunda foi que o controle russo sobre a Ucrânia e Bielorrússia era muito menor do que se imaginou — nenhuma das duas está situada na órbita russa. Sobre isso, eu concordei parcialmente. Os russos não têm nenhum desejo de recriar o império russo ou a União Soviética; eles não querem responsabilidade por esses dois países. Mas querem limitar as opções da Ucrânia e da Bielorrússia na política externa. Os russos permitirão todas as espécies de evoluções internas. Porém, não permitirão alianças político-militares entre as duas e as nações ocidentais, bem como insistirão no acesso que o exército russo e as forças navais têm ao solo bielorrusso e ucraniano.

Não achei convincente o argumento sobre a fraqueza russa. Primeiro, força é relativa. A Rússia pode ser fraca comparada com os Estados Unidos. Não é fraca comparada com a Europa ou com as repúblicas independentes fronteiriças à Rússia. Uma nação não tem que ser mais forte do que suas necessidades estratégicas, e a Rússia é decerto suficientemente forte devido a essas. Na verdade, a população da Rússia está em declínio e é um desastre econômico. Mas a Rússia foi uma ruína econômica desde Napoleão, se não antes. Sua capacidade de mobilizar campanhas militares em desproporção a seu poder econômico é historicamente demonstrável.

Levantei a questão da dependência energética europeia (e particularmente alemã) da Rússia, e disseram que a Alemanha só importa da Rússia 30% de sua energia. Eu tinha pensado que eram 45%, mas ainda considero 30% uma imensa dependência. Interrompa essa porcentagem e a economia alemã se torna insustentável. E isso dá à Rússia muito poder. E embora a Rússia precise das receitas oriundas da energia, ela pode sofrer um corte nas receitas num período muito maior do que a Alemanha e a Europa podem aguentar uma interrupção de energia.

Finalmente, há a questão da cooperação alemã e russa. Como discuti anteriormente, a dependência alemã da energia russa e as necessidades russas por tecnologia têm criado uma sinergia entre os dois países, algo refletido na sua constante conferência diplomática. Além disso, as questões alemãs sobre o futuro da União Europeia os têm levado a uma rota independente e exploratória. Por seu lado, os russos têm alcançado os fundamentos de uma recuperação geopolítica. Comparado com 10 anos atrás, Putin tem levado a Rússia a uma recuperação extraordinária. A Rússia está agora interessada em rachar a Europa, dos Estados Unidos e, particularmente, da Alemanha. À medida que a Alemanha está buscando uma nova fundação para sua política externa, os russos estão de olho em se associar com a Europa.

Os líderes poloneses com quem falei deixaram claro que eles não viam isso como um problema. Acho difícil acreditar que um entendimento entre alemães e russos não inquiete os poloneses. Sim, eu sei que nem a Alemanha nem a Rússia pretende fazer mal à Polônia. Mas um elefante não necessariamente planeja fazer mal a um rato. Intenções à parte, o rato fica danificado.

Acho que a razão por que os poloneses estão fazendo o que fazem é que eles não têm nenhuma escolha. Quando eu apontei para a opção do Intermarium com a retaguarda norte-americana, um funcionário graduado do Ministério Exterior salientou que, sob o novo plano da OTAN, os alemães garantiram duas divisões para defender a Polônia, enquanto que os Estados Unidos ofereceram uma brigada. Ele foi extraordinariamente amargo nessa avaliação. Em seguida à decisão norte-americana de retirar-se de um compromisso de construir uma instalação fixa e permanente de Defesa Míssil Balística na Polônia e a natureza tentativa de distribuição rotativa de uma única bateria Patriot, viu isso como uma traição pelos Estudos Unidos a compromissos assumidos anteriormente. Desajeitadamente eu argumentei que uma brigada norte-americana era uma força armada mais efetiva do que duas divisões alemãs de hoje, porém isso é discutível na melhor das hipóteses, e eu decididamente perdi a razão. Seu ataque foi que não havia nenhum compromisso norte-americano sob o novo plano da OTAN, ou pelo menos nada confiável.

Auto-confiança polonesa e os Estados Unidos

Minha real reação a essas ideias foi algo diferente. A Polônia esteve desamparada por séculos, vítima de ocupação e desmembramento. Tinha sido livre e soberana no período entre-guerras. Tinha jogado fora sua soberania, ao depender simplesmente das garantias francesas e britânicas. Essas garantias podiam ter sido desonestas, mas honestas ou não, elas não poderiam ter sido honradas. A Polônia desmoronou rápido demais.

Garantir a soberania nacional polonesa é, acima de tudo, a primeira questão nacional polonesa. Em primeiro lugar, uma nação não vende barato o controle das prerrogativas nacionais básicas, como sua economia, a organizações multinacionais, particularmente aquelas dominadas por ameaças históricas como a Alemanha. Todas as nações alteram suas intenções; considere a Alemanha entre 1932 e 1934. Em segundo lugar, consolar-se com a fraqueza econômica da Rússia é deliberadamente interpretar mal a história.

Porém mais importante é que a soberania de uma nação depende de sua capacidade de defender-se. Na verdade, a Polônia não pode defender-se de um tratado assinado pela Alemanha com a Rússia, pelo menos não sozinha. Mas pode comprar tempo. O socorro pode não vir, mas sem tempo o socorro possivelmente não venha. É claro que a Polônia pode decidir acomodar-se aos alemães e russos, supondo que desta vez as coisas sejam diferentes. É uma suposição confortável. Pode ser até verdadeira. Mas a Polônia está apostando a sua nação nessa suposição.

Minha leitura da situação é que tanto os funcionários poloneses quanto o povo polonês compreendem que estão seguros por ora, mas que o futuro é desconhecido. Eles também se sentem desamparados. A Polônia é um país afobado, cheio de joint ventures⁵ e hedge funds⁶. Mas toda a atividade só cobre o senso trágico subjacente da nação polonesa, ou seja, que, afinal, a ideia da nação polonesa não está nas mãos polonesas. O que vier virá, e os poloneses farão um esforço heróico se ocorrer mesmo o pior. Chopin converteu essa sensibilidade em arte elevada. Ao final, a sobrevivência é mais prosaica, e definitivamente mais difícil de atingir-se, do que a criação artística. Ou mais precisamente, para a Polônia a sobrevivência é mais difícil do que obras artísticas de gênio, e mais rara.

Em última análise, sou um norte-americano e portanto menos possuído por sensibilidades trágicas do que por estratégia viável. Para a Polônia, aquela estratégia vem do reconhecimento de que não apenas ela está presa entre a Alemanha e a Rússia, ela é a chave inglesa no acordo germano-russo. Pode ser esmagada por isso. Mas pode evitá-lo. Para fazer isso, três coisas são necessárias. Primeiro, precisa de uma estratégia de defesa nacional planejada para tornar mais custoso atacar a Polônia do que achar o caminho dando-lhe a volta. Isso é caro. Porém, quanto os poloneses teriam pago para evitar a ocupação nazista e soviética? O que parece caro pode ser barato no retrovisor.

Segundo, a Polônia sozinha é muito delicada. Como parte de uma aliança que alcance desde a Finlândia até a Turquia — o Intermarium —, a Polônia teria uma aliança de peso suficiente para significar que estaria livre das impertinências da OTAN. A OTAN foi a aliança da Guerra Fria. Esta já acabou, mas a aliança continua a viver como uma alma mal alimentada por uma burocracia bem nutrida.

A Polônia precisaria combinar com a Romênia, independente, digamos, da opinião de Portugal sobre a questão. Essa aliança requer liderança polonesa. Não emergirá dela. Mas a Polônia deve primeiro superar a fantasia de que a União Europeia de 18 anos de idade represente a transformação milenar da Europa no pacífico Reino do Céu. Dezoito anos não são muito tempo nos padrões europeus, e a Europa está com aparência enferma ultimamente. Se a Alemanha fizer uma "aposta de não-passe" à União Europeia, ela sobreviverá. A Polônia conseguirá, se o fizer? A estratégia nacional está baseada no cenário da pior das hipóteses futuras possível, não nos acordos esperançosos com líderes transitórios.

Finalmente, os poloneses precisam manter sua relação com o principal poder global. Certamente, os últimos anos da administração Bush e os primeiros da administração de Obama não têm sido divertidos para a Polônia. Mas afinal, os Estados Unidos lutaram três vezes no século XX para evitar um acordo germano-russo e a dominação da Europa por um poder, quer seja a Alemanha, a Rússia ou uma combinação das duas. Essas guerras não foram feitas por sentimento; os Estados Unidos não tiveram nenhum Chopin. As guerras foram conduzidas por geopolítica. Um acordo germano-russo ameaçaria os Estados Unidos profundamente. Aí está porque combateram na 1ª Grande Guerra, na 2ª Grande Guerra e na Guerra Fria.

Há coisas que os Estados Unidos não podem permitir, se puderem estancá-las. A dominação da Europa por um poder está no topo da lista. No momento, os Estados Unidos estão mais preocupados com o fim da corrupção no Afeganistão. Esta "fixação" não terá longa duração. Obviamente, os Estados Unidos funcionam por um relógio diferente e mais de longo alcance do que a Polônia. Os Estados Unidos têm mais espaço para manobra. A Polônia também tem tempo agora, mas precisa usá-lo para preparar-se para a época em que os norte-americanos recuperarem seu senso de perspectiva.

A União Europeia poderia endireitar-se, e o que emergir poderia ser uma confederação de nações iguais, como planejado originalmente. Os russos poderiam caminhar calmamente para dentro daquela boa noite. Por mais dúvidas que tenha, isso pode acontecer. Mas o problema que os poloneses têm é o que eles farão se a melhor das hipóteses não emergir. Eu argumentaria que não há nobreza numa derrota que poderia ser evitada. Também acrescentaria que, se você ouvir cuidadosamente a Polonaise, ela é um convite não apenas à sobrevivência, mas à grandeza.

A margem de erro polonesa é extraordinariamente fina. O que eu encontrei na Polônia não foi uma indiferença àquela margem, mas um senso de desamparo casado com intensa atividade para fazer bem enquanto viver bem é impossível. Mas é o senso de fatalismo desamparado que me apavora como norte-americano. Nós dependemos da Polônia, de um jeito que meus conterrâneos não vêm ainda. Quanto mais esperamos, maior a chance de tragédia. Os alemães e os russos não são montros no momento, nem querem sê-lo. Mas como Chopin deixa claro, o que queremos ser e o que somos são duas coisas diferentes, um assunto a ser considerado no meu ensaio final.

NOTAS

¹ A série completa desta viagem geopolítica de George Friedman compõe-se das seguintes partes: O Viajante (8/11), Borderlands (9/11), Romênia (16/11), República da Moldávia (18/11), Turquia (23/11), Ucrânia (30/11), Polônia (3/12) e retorno para casa (7/12).
Na Antiguidade, outros fizeram "esboços" de suas viagens. Um dos mais famosos é o de Pausânias que percorreu a Grécia no II século D.C. ("Hellados Periêgesis"), conforme descrito no meu texto no link abaixo deste Blog do Braga:
http://bragamusician.blogspot.com/2010/11/recomendacoes-delficas-parte-1.html

² Wielkopolska (Polonia Major em latim, Greater Poland em inglês, Grosspolen em alemão) é uma região histórica da Polônia ocidental-central. Foi o núcleo do primitivo estado polonês medieval. Sua principal cidade é Poznań. O nome da região pode ser interpretado como referindo-se à velha Polônia, em oposição à pequena (nova) Polônia (Małopolska em polonês, Polonia Minor em latim, Lesser Poland em inglês, Kleinpolen em alemão) a sudeste, com capital na cidade de Cracóvia. [N.T.]

³ Também chamado de Império Austro-húngaro. A Casa de Habsburgo, frequentemente anglicizada para Hapsburg e às vezes referida como Casa da Áustria, era uma das mais importantes casas reais da Europa. A Casa de Habsburg-Lorraine era uma das mais importantes e foi uma das dinastias reinantes mais longevas na história da Europa. Dessa dinastia descendia Maria Leopoldina de Habsburgo-Lorena (1797-1826), conforme seu nome aportuguesado e adotado, a qual foi arquiduquesa da Áustria, primeira Imperatriz-consorte do Brasil, regente do Brasil em setembro de 1821 e, durante oito dias, em 1826, rainha-consorte de Portugal. Parece que o nome completo da arquiduquesa, que viria a ser a primeira imperatriz do Brasil, era Carolina Josefa Leopoldina Francisca Fernanda de Habsburgo-Lorena, de acordo com seus principais biógrafos. Foi casada com D. Pedro I. Consta que ela era extraordinariamente culta para a época, tendo enorme interesse em botânica.
Uma irmã mais velha de Leopoldina foi Maria Luísa, a segunda esposa de Napoleão e segunda Imperatriz dos franceses. [N.T.]

Intermarium fornece uma mídia eletrônica para trabalho acadêmico notável e pensamento provocativo sobre a história e a política da Europa Central e do Leste em seguida à 2ª Guerra Mundial. O periódico é tido como a mídia ideal para ampliar o discurso sobre aspectos das histórias nacionais que estão sofrendo mudança graças à disponibilidade de nova documentação de arquivos recentemente abertos. É um projeto do Instituto de Estudos Políticos da Academia Polonesa das Ciências e do Centro para a Europa Central e do Leste da Universidade de Colúmbia. [N.T.]

Joint venture ou empreendimento conjunto é uma associação de empresas, que pode ser definitiva ou não, com fins lucrativos, para explorar determinados negócios, sem que nenhuma delas perca sua personalidade jurídica. No Brasil, um exemplo de joint venture foi a Autolatina, quando se uniram a Ford e a Volkswagen, de 1987 a 1996. Durante o período de atividade da Autolatina, a VW ofereceu à Ford determinados motores seus e a plataforma do Sedan Santana, ao passo que a Ford ofereceu à VW certos motores seus, bem como a plataforma do Escort. [N.T.]

Hedge funds são investidores institucionais, cuja principal meta é conseguir o maior retorno possível para os recursos à sua disposição, aplicando nos mais diversos ativos financeiros: moedas, ações de mercados emergentes ou títulos de dívida pública que rendem juros elevados, como no Brasil. Os conceitos-chave para os hedge funds são: agressividade, risco elevado e, principalmente, alavancagem. São voltados para investidores ricos e sofisticados e se caracterizam pelo sigilo de suas aplicações. Ficou famosa a quebra de um grande hedge fund (US$ 126 bilhões de ativos), o LTCM, no final da década de 90, que fazia aplicações arriscadas em mercados emergentes e que quase ruiu em fins de 1998. A crise da Rússia, que decretou uma moratoria em 1998, pulverizou as operações do LTCM. Para impedir que as perdas do LTCM se espalhassem pelo sistema bancário, o Federal Reserve coordenou uma operação de resgate, em que 16 bancos injetaram recursos para manter o LTCM respirando, até que voltasse a oferecer retornos positivos aos seus aplicadores. [N.T.]

Imagem:
"Chopin" por Delacroix, 1838