segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

ACADEMIA LAVRENSE DE LETRAS OUTORGA AO IHG-SÃO JOÃO DEL-REI O DIPLOMA DE HONRA AO MÉRITO CULTURAL


Por Francisco José dos Santos Braga


No dia 30 de janeiro p.p., tive a subida honra de conhecer pessoalmente o DD. presidente da ALL-Academia Lavrense de Letras, jornalista e escritor José Passos de Carvalho, ocasião em que também fui agraciado com o título de Acadêmico Correspondente em São João del-Rei daquela Casa de Cultura "Firmino Costa", se me fosse permitido dar um nome mais consentâneo à ALL.

Já tinha ouvido falar da atuação marcante da ALL na área de sua maior influência, especialmente nas cidades mineiras de Bom Sucesso, Formiga, Leopoldina, até Piumhi, etc., mas principalmente sabia de sua atividade profícua devido a seus estudos genealógicos, onde Lavras sobressai como terra natal do saudoso Ary Florenzano, que realizou pesquisas no arquivo paroquial da então Matriz de Nossa Senhora do Pilar de São João del-Rei e noutras localidades, o qual, devido à reconhecida importância de seus trabalhos, mereceu ser guindado a patrono da cadeira nº 25 do Colégio Brasileiro de Genealogia, sediado no Rio de Janeiro. Além disso, eu atualizava sempre as notícias acerca da ALL pela Internet, depois que felizmente caiu em minhas mãos uma Antologia da Academia Lavrense de Letras, de 1993, quando a presidia o Sr. Sebastião Naves de Silveira, onde pude apreciar o legado intelectual de diversos Acadêmicos colaboradores através de seus poemas, numa edição com patrocínio cultural do Banco Real. Foi principalmente graças a tais vínculos intelectuais e sentimentais que me uniam desde sempre à terra de Ary Florenzano que aceitei o convite do seu atual presidente para integrar aquela egrégia Arcádia.

Quanto ao presidente José Passos de Carvalho, tomei conhecimento de sua atuação em São João del-Rei, na década de 70, como colaborador do Jornal do Poste, quando era seu diretor "Juanino" Lobosque, e como soldado no 11º Regimento de Infantaria, mais conhecido como Regimento Tiradentes. Comunicou-me ter residido com o Tenente Gentil Palhares, na rua Resende Costa, 336, lembrando-se ainda de um grande amigo do historiador, o Subtenente Benigno Parreira, a quem Gentil o encarregava diuturnamente de entregar correspondências na Associação dos Sargentos, local de ensaio da Banda. Recordou-se, com lágrimas nos olhos, do regente da Banda do "11" e do Orfeão da "Sinfônica", bem como do baixo da Orquestra Lira Sanjoanense.

Quando do meu comparecimento a Lavras, eu tinha sido encarregado pelo presidente da ABL-Academia Barbacenense de Letras, Prof. Mário Celso Rios, de representá-lo no evento, o qual fora convidado a comparecer mas, por compromissos assumidos anteriormente, viu-se obrigado a declinar do convite. Pediu-me então fazer a leitura de uma mensagem de congratulações pela feliz promoção da ALL de um evento tão grandioso, a qual acabou sendo lida pelo mestre de cerimônias. Escreveu o distinto presidente da ABL:

LAVRAS EM FESTA 
"Barbacena, 30 de janeiro de 2016.  
Prezados componentes da ACADEMIA LAVRENSE DE LETRAS (ALL),  
Nós, da ACADEMIA BARBACENENSE DE LETRAS, sentimo-nos honrados em saber que nesta data a ALL recepciona seus novos integrantes na secção dos Acadêmicos Efetivos e dos Correspondentes. Também ao promover a efetivação da Academia Juvenil de Letras e Artes de Lavras (AJLAL), empossando sua primeira diretoria, demonstra seu respeito para com a geração do porvir. Idem ao reconhecer o mérito de várias instituições, conferindo-lhes o Diploma de Honra ao Mérito Cultural Professor Firmino Costa. 
Que o sonho do mestre FIRMINO COSTA sirva de multiplicador para que os corações e mentes daqueles que acreditam na expressão das artes e da literatura em particular. E, assim fazendo, possam os referidos valorizar, reconhecer e incentivar os verdadeiros talentos, tendo LAVRAS como polo difusor. 
Parabéns e votos de sucesso!  
Atenciosamente, 
MÁRIO CELSO RIOS, presidente."
O presidente da ABL encarregou-me ainda de transmitir o seguinte complemento à sua linha de pensamento, onde explicita o seu credo de intelectual sério e comprometido: 
"É vital, por sermos minoria digo, os da área da cultura estreitarmos laços e darmos nosso recado como povo que ainda tem consciência de sermos brasileiros e de termos uma base luso-latina como legado maior que precisa ser conhecida por toda parte, por ser nossa herança para as gerações futuras. 
Gostaria ainda de manter contato com a ALL por ser um projeto que valoriza a Região do Campo das Vertentes. Aliás, Lavras é um dos vértices do triângulo composto por São João del-Rei e Barbacena, cidades-polo da já citada mesorregião. Pela História comum dos três sítios, sabe-se que tiveram o mesmo início, como bandeirantes vindos de Taubaté; rios como o Grande e o das Mortes e muito a ver ainda com o Ciclo do Ouro. Santana, Nossa Srª do Pilar e Nossa Srª da Piedade são referências iniciais de culto religioso nos três pontos focalizados, fora os fatos políticos, sociais e de relevância que têm contribuído para a constituição de nossa ideia de pátria e nação. 
Em resumo, se insistirmos em resgatar nossas raízes e fortalecermos nossa identidade, o melhor caminho é a interação, a ligação através de tudo o que possa nos aproximar e, em particular, nossa abertura ao novo e ao que possa nos unir e fazer com que tenhamos orgulho de quem somos, mesmo com nossos defeitos, mas também dando o devido lugar às nossas boas qualidades!" 

Além de ser empossado Acadêmico Correspondente da ALL e representar o presidente da ABL na reunião, incumbiu-me, na qualidade de Secretário de Relações Institucionais, o presidente do IHG de São João del-Rei, jornalista e escritor José Cláudio Henriques, de receber, em nome do Instituto Histórico de São João del-Rei, o Diploma de Honra ao Mérito Cultural "Professor Firmino Costa", tendo nosso IHG sido considerado entidade merecedora dessa dignidade por "fazer jus a essa honrosa distinção outorgada pela Academia Lavrense de Letras".




O autor recebendo o Diploma de Honra ao Mérito Cultural 
"Professor Firmino Costa" outorgado pela ALL ao IHG de São João del-Rei, ladeado pelo Major da PM Ageu Evangelista Ferreira, DD. Comandante da 6ª Companhia Independente de Polícia Rodoviária e Trânsito baseada em Lavras

terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

HOMENAGENS À MINHA AVÓ, JOSEFINA FONSECA BRAGA (☆ 1893 MADRE DE DEUS ✞ 1967 SÃO JOÃO DEL-REI)


Por Francisco José dos Santos Braga


Sempre me orgulhei do tronco dos Carvalho Duarte, do qual descendo. Foi no convívio com minha saudosa homenageada que aprendi a apreciar as minhas raízes e a me orgulhar delas. Por ironia do destino ou da decisão de pessoas, perdi o apelido ou sobrenome de minha predileção. Mas isso acontece com a maioria das pessoas, não cabendo maledicência ou revolta. Quando muito, podemos, como será feito aqui, reverenciar o que perdemos, consciente de que há uma energia muito forte que se esvai com aquela carência.

Josefina Fonseca Braga (1893-1967)
 
Foto na Carteira de Inscrição e Saúde do IAPTEC
























Minha avó, quando solteira, chamava-se Josefina Fonseca de Carvalho, e depois de casada com meu avô, José da Silva Braga ("Nhonhô), adotou o nome de Josefina Fonseca Braga. Meu pai, Roque da Fonseca Braga, puxou à mãe (quando perdeu o Carvalho), e eu, Francisco José dos Santos Braga, perdi não só o Carvalho, mas também o Fonseca, denotando um processo contínuo de enfraquecimento ou empobrecimento, o que é inevitável.

Mas vamos então ao que interessa. Minha avó era filha de João Carvalho de Ávila, nascido em 15/06/1860, casado em setembro de 1885 com Delfina Carvalho da Fonseca nascida em 08/05/1869, esta, por sua vez, filha de Antônio Duarte de Carvalho e Mariana Cândida da Fonseca. Os oito filhos dos meus bisavós paternos nasceram na seguinte sequência: Antônio Fonseca de Carvalho ("Totonho"); Iria Fonseca  de Carvalho (falecida solteira); Josefina Fonseca de Carvalho, nascida em 17/03/1893 em Madre de Deus e falecida a 11/12/1967 quando assistia à "missa das 5" na Matriz do Pilar de São João del-Rei em companhia de sua filha Anita; João Carvalho Duarte; Amélia Fonseca de Carvalho; Maria das Dores Fonseca de Carvalho; Elevinda Fonseca de Carvalho e José Carvalho da Fonseca. 

Josefina Fonseca Braga


Como vimos, minha avó Josefina casou-se em São Gonçalo do Brumado (Caburu) a 22/07/1911 com José da Silva Braga ("Nhonhô), nascido a 14/07/1890 na área rural de São Sebastião da Vitória e falecido a 19/11/1965 em São João del-Rei, vítima de um derrame cerebral. Foram proprietários da Fazenda da Lagoa Verde. 

À Josefina, minha avó, devo o meu amor à genealogia. Possuidora de uma memória prodigiosa, guardava fatos, datas e nomes relacionados com os próprios antepassados e os de seu marido com grande facilidade e sempre se mostrou pródiga em dispensar a seus netos ensinamentos e esclarecimentos sobre nossa família. A ela, portanto, devo a minha própria vida, bem como a cessão de inúmeros dados que me foram transmitidos durante o amável convívio de avó e neto que com ela mantive na rua Santo Antônio, 136, nos últimos dois anos de sua vida. Ela residia no segundo piso do sobrado que lhe pertencia e que fora sede do bloco carnavalesco "Boi Gordo", mesmo local onde, antes, funcionara o Externato Travanca, dirigido pelo Prof. José Rodrigues Ferreira Travanca, o qual, comprometido na propaganda republicana em Portugal, se refugiou em São João del-Rei e aí, a 31/01/1903 desposou Ana Machado.

Casal José da Silva Braga e Josefina Fonseca Braga (cerca de 1965)

Como visto, minha avó quando viúva e eu ocupávamos o piso superior do sobrado e, no térreo, de nº 132, morava uma família de inquilinos muito amáveis, constituída da mãe viúva e quatro filhos, dentre os quais o autor do conto que será transcrito a seguir, oferecido à memória daquela que ele nomeia "Velha Senhora". Compreende-se que o autor, no arroubo de sua verve, permitiu-se o uso de licença poética, alterando as circunstâncias de sua morte. Na realidade, minha avó faleceu, conforme seu manifesto desejo a inúmeras testemunhas, dentro da Catedral Matriz do Pilar, na ocasião ainda não era Catedral Basílica, assistindo à primeira missa do dia, conhecida por "Missa das Almas ou Missa das 5", vitimada por um mal súbito. Na época em que eu residia com minha avó no referido casarão, tornei-me amigo do autor Marco Antônio Camarano, naquela época teatrólogo e diretor de teatro, e foi assim que ele, após o falecimento dela, decidiu homenageá-la com o seguinte conto: 


O Relógio da Velha Senhora

Por Marco Antônio Camarano 

Eles formavam um trio perfeito. Uma trindade inseparável. Velha. Relógio. Casaco. Um relógio inglês, do século passado. Um casaco de peles. Raro. Uma velha risonha. Baixinha. Magra. E aquele casarão. Grande demais para os três. Moravam juntos e eram felizes. O relógio oferecia-lhe as horas. O casaco abrigava-a do frio. Na missa das 5.

Nos meses frios, íamos a sua casa à noite. Em torno do fogão de lenha, ouvíamos casos de assombração. De escravos. Era muito querida na rua. Em quase todas as ruas. Acredito. De casa, ouvíamos seu relógio dar as horas. Forte. Ressonante. Compasso. Quase solene. Certa noite não ouvimos seu toque familiar. Começava a chover e as janelas de sua casa batiam muito ao vento. Chamei meus amigos e fomos à casa da velha senhora. A chuva aumentava. E o vento aumentava também. Batemos várias vezes seguidas. Será que ela estaria dormindo? Talvez o barulho da chuva não a deixasse ouvir. As janelas do sobrado batiam como asas. Gritamos. Cada vez mais alto. Ninguém atendia. Ficamos preocupados. Talvez estivesse doente. Resolvemos arrombar a porta. Apesar de maciça, era fechada apenas por uma tramela. Num empurrão, a porta abriu-se. Escuridão quase total. De vez em quando, um raio iluminava o cimento remendado. Lembramos dos casos de assombração. Entreolhamo-nos. Éramos quatro. Subimos as escadas de madeira. Que era podre. E rangia. Chiava. Riscamos fósforos. Acompanhamos a fuga das cidades das chamas. Que nos projeta nas paredes como gigantes. Atravessamos o corredor. Em fila indiana. Chamando-a, nenhuma resposta. Fomos para a sala de jantar. O vento e a chuva maltratavam os telhados. As janelas escancaradas davam bordoadas nas paredes. Querendo despregar-se dos batentes. Coloniais de verdade. Os interruptores não atendiam ao nosso toque. Súbito a vimos. Sentada numa cadeira de veludo. Tão antiga e gasta como ela. Corremos em sua direção. Falando todos ao mesmo tempo. O casaco de peles gelado. A sala gelada. Os móveis gelados. E ela gelada. Seus lábios pareciam sorrir. Devia estar dormindo. Tocamos em suas mãos. Hirtas. Havia enorme nobreza em sua pessoa. Em sua miséria material. Custamos a crer que estivesse morta. Cuidadosamente a carregamos para o quarto. Colocamos seu corpo pequeno e frio sobre a cama. Acendemos um lampião. Silêncio total. Sabíamos que estava morta. Mas era preciso chamar um médico. Um dos nossos saiu para providenciar. Sentamo-nos ao seu lado. Coração esmagado. Morrera sozinha. No escuro. No frio. Mas parecia tranquila. Feliz até. No quarto que era também sala, estava o relógio que ela amou como se fosse gente. Uma pessoa que a vira jovem. A olhá-lo ansiosa à espera do namorado. Que a vira mãe. Olhando-o aflita à espera dos filhos. Uma companhia de toda a vida. E que parou de funcionar junto com ela. No furor da noite. No silêncio do casarão. Duas máquinas estáticas. Com a diferença que uma possuía algo mais que já ganhara o infinito e a outra continuava presa às engrenagens da terra...