“Nossa língua é o tsakoniano. Pede às pessoas que o falem contigo” - Cartaz bilíngue (tsakoniano/grego moderno) de Leonídio ou Tyrós (Kyronía no Peloponeso) - Crédito: https://en.wikipedia.org/wiki/File:Leonidio-Tsakonian-sign.jpg |
Vamos começar o presente artigo com um texto mais simples, traduzido do espanhol por mim, para facilitar a compreensão, intitulado “El Tsakonio es el único linguaje griego actual que proviene del que hablaban los espartanos”, por Guillermo Carvajal.
O dialeto tsakoniano é a única língua grega atual que vem do que os Espartanos falavam
Embora oficialmente considerado um dialeto, o tsakoniano é uma variedade divergente do grego, muitas vezes classificada como uma língua separada, pois não é inteligível para os falantes do grego moderno padrão.
Hoje é falado em uma pequena área montanhosa no interior da costa leste da península do Peloponeso, no Golfo de Argos, ao redor das cidades de Leonídio e Tyrós (embora anteriormente se estendesse muito mais ao sul), e é uma língua única entre as variedades do grego. A razão é que se acredita que ele não venha do antigo koine do ático e do jônico (de onde vêm as demais línguas gregas, incluindo o grego moderno), mas sim do dórico ou de uma variedade antiga e tardia do koiné influenciada pelo dórico que era falado anteriormente em uma área mais ampla do Peloponeso, incluída a Lacônia. Quer dizer, da língua que os Espartanos falavam.
Em azul, a pequena zona de fala tsakoniana em um mapa de 1890 – Crédito: Foto in https://en.wikipedia.org/wiki/File:Pelopones_ethnic.JPG |
Assim, ele é considerado o único descendente vivo da língua dórica (embora os especialistas ainda discutam se devem incluir aqui o dialeto maniota). Em qualquer caso, restam apenas algumas centenas de falantes do tsakoniano, considerando-se hoje que está ameaçada de extinção. ¹
O vocabulário tsakoniano é, de acordo com os especialistas, reconhecidamente dórico, embora ao longo dos anos tenha tomado vários empréstimos do grego moderno e inclusive do turco. Para representá-lo, o alfabeto grego padrão é tradicionalmente usado, ao qual são adicionados dígrafos e símbolos para representar aqueles sons que não existem no grego demótico.
A região onde é falado é chamada de Tsakoniá, embora não seja uma entidade política dentro do Estado grego. Em sua Breve Gramática do Dialeto Tsakoniano publicada em 1951, o professor Thanásis Kostákis definia Tsakoniá como a área que vai da cidade de Santo André em Kinouría ao sul de Leonídio e Tyrós, e no interior de Kastánitsa e Sítaina, mas afirma que em tempos anteriores a área de língua tsakoniana se estendia até o Cabo Malea, no leste da Lacônia.
A principal cidade de Tsakoniá na época do Império Otomano era Prastós, que se beneficiou de um privilégio comercial especial concedido pelas autoridades de Constantinopla. Prastós foi queimado por Ibrahim Pashá durante a Guerra da Independência da Grécia e foi abandonado, seus residentes fugiram para a área ao redor de Leonídio e Tyrós e outros locais no Golfo Argólico (também conhecido como Golfo de Argos ou de Náfplio), a área onde hoje se encontram os falantes do tsakoniano.
Já o termo “tsakoniano” aparece pela primeira vez nos escritos dos cronistas bizantinos, que derivam o etnônimo de uma corruptela de Lakonas (lacônico-lacedemônico, isto é, espartano), uma referência às raízes dóricas da língua tsakoniana e da conversão relativamente tardia do povo ao Cristianismo e à prática dos costumes helênicos tradicionais.
Link: https://www.labrujulaverde.com/2019/09/el-tsakonio-es-el-unico-lenguaje-griego-actual-que-proviene-del-que-hablaban-los-espartanos (no vídeo há uma entrevista com um falante de tsakoniano que, em dois momentos, ao falar a sua língua, tenta explicar-se melhor em grego, prática que é coibida pelo entrevistador)
Outro link interessante de informações gerais sobre o tsakoniano em português, cuja leitura recomendo, é o seguinte da BBC:
Link: https://www.bbc.com/portuguese/vert-tra-55709316
PRINCIPAIS AUTORIDADES NO DIALETO TSAKONIANO
“Kynouría deriva seu nome do antigo colono da área, Kynouros, filho de Perseu e líder dos Argivos que primitivamente a colonizaram. É uma área histórica e província da prefeitura de Arcadía. Inclui a parte costeira da prefeitura e a parte montanhosa localizada nas encostas do norte do Monte Párnon ou Malevós (cordilheira que está situada entre duas províncias: Lacônia e Arcadía. De seu cume é possível enxergar o sudeste da Arcadía, a Kynouría do Sul e o norte e centro da Lacônia até o Monte Taigeto, além de parte da prefeitura da Argólida.)
Além de Astrós e Leonídio, os assentamentos montanhosos de São Pedro e Prastós eram as sedes mais antigas da província. Uma parte sul da província de Kynouría inclui as aldeias dos Tsákones, um grupo populacional que se instalou no Peloponeso oriental, falante do dialeto tsakoniano.Em uma área do sul de Kynouría, conhecida como Tsakoniá, o dialeto tsakoniano é falado. O dialeto tsakoniano veio do dialeto dórico que prevaleceu na área na antiguidade devido ao estabelecimento de Dórios em Kynouría. O dialeto tsakoniano é encontrado em Kynouría do Sul (Leonídio, Tyrós, Sapounakaíïka, Péra Mélana, Pramateftís, Vaskína, Livadíou, Sampatikí) e em Kynouría do Norte: (Prastós, Sítaina, Kastánitsa e Santo André).
A antiga Kynouría
Nos tempos antigos, Kynouría era
o país dos Kynourianos, um povo provavelmente de origem jônica. Após a descida
dos dórios em Kynouría, ali se estabeleceram. O estado de Kynouría logo se tornou
o alvo de seus poderosos vizinhos, os Espartanos de Árgos e os Tegeates da
Arcádia. Foi principalmente o pomo da discórdia entre os Espartanos e os Argivos,
por se situar entre os dois estados. Apesar da intensa pressão de seus
vizinhos, Kynouría deve ter permanecido independente até a época do Tirano Feídonas,
quando ficou sob o governo de Argos. Argos estava então no auge. Depois de Feídonas,
no entanto, Argos começou gradualmente a declinar, enquanto Esparta ganhava
força. O destino de Kynouría parece ter sido finalmente decidido em 546 a.C.,
na batalha de Thyréa ou na batalha dos
seiscentos escolhidos, quando Esparta prevaleceu sobre Argos e ganhou o
controle de Kynouría. Esta permaneceu espartana até 338 a.C. Neste ano, Filipe
II cedeu o norte de Kynouría aos Argivos, enquanto a região sul de Prasiá e Tyrós,
que era a fronteira natural da antiga Esparta, permaneceu em Esparta. As
cidades mais importantes da antiga Kynouría estavam na Kynouría do Norte, Thyréa
e Anthíni, e, na Kynouria do Sul, Prasiés,
Tyrós, Políchni, Glypía e Mário.”
Link: https://el.wikipedia.org/wiki/ Κυνουρία#Η_Τσακωνική_Διάλεκτος
Além disso, do livro de Filipe Bekyros e Eléni Tsangoúri, intitulado A Dança Tsakoniana (1995), extraímos dois trechos (de interesse da Arqueologia e da Musicologia):
“A ORIGEM
O culto de Apolo na antiga Kynouría era de suma importância, pois também seria um elemento de identidade nacional para os seus habitantes. Apolo aparece com dois apelidos principais como Apolo Tyríta e Apolo Maleáta (mas também como Pythaieus e Lithíssius).
No santuário de Apolo Tyríta, no topo do Profeta Elias Melánon, foram descobertos um altar quadrado e um muro de contenção do 4º século a.C., por exemplo. A maioria das ofertas votivas, no entanto, pertence aos anos arcaicos. Sobre uma estátua de bronze de um touro está a inscrição ΑΠΕΛΟΝ ΚΛΕ; em uma fivela de bronze em forma de leão, ΑΠΟΛΟΝΟΣ ΕΜΙ; na borda de uma garrafa de bronze, ΑΠΕΛΟΝ ΤΥΡΙΤ[ΑΣ]. Em um vaso (taça lacônica) estava gravada a inscrição [ΕΥΓ]ΕΙΤΟΝΙΔΑΣ ΑΝΕΘΕΚΕ ΤΟΙ ΑΠΟΛΟΝΙ ΠΑΡ ΔΟΡΙΕΟΣ ΔΟΡΟΝ.
Provavelmente do mesmo santuário vem uma estátua masculina de bronze com a inscrição APELON TYRITAΣ. A figura é representada na posição agachada, como quando as ovelhas são ordenhadas, com uma caixa de couro pendurada entre os joelhos, com o auxílio de tiras que formam alças e um disco com inscrição gravada na superfície: ΜΕΛΑΣ Μ΄ΕΝΙΚΕ ΠΥΘΑΙΕΙ...
O culto no santuário de Tyríta começou no século VIII a.C. e foi mais intenso no VII, VI e V a.C com um vislumbre do século IV. Tyritas era provavelmente uma antiga divindade local que ajudava a produzir leite e queijo, mas com o tempo se identificou com Apolo, mantendo o antigo nome como um adjetivo. Seu santuário experimentou a maior prosperidade de todos os santuários da região no período arcaico, talvez devido à sua localização central em Kynouría.
O santuário de Apolo Maleáta estava localizado no D.BD. extremidade de Kosmás, onde hoje se encontra o Profeta Elias. Entre os muitos achados, destaca-se a estatueta de bronze de um guerreiro com a inscrição ΧΑΡΙΛΟΣ ΑΝΕΘΕΚΕ ΤΟΙ ΜΑΛΕΑΤΑΙ. (...) ”
Link: http://tsakoniandance.bekyros.gr/tsakon_002.htm
A dança tsakoniana, como um conjunto indiviso, melodia, ritmo e dança, é, talvez, a única amostra de música da Grécia antiga que chegou aos nossos dias. E veio porque é uma dança sagrada, uma dança de culto. É bem sabido que os costumes cultuais são os únicos que perduram com o tempo. Na Grécia, apesar do ataque que receberam da nova fé, vários costumes cultuais sobreviveram. Aqueles que a nova fé não conseguiu eliminar incorporou em seu próprio culto ou tolera calado...”
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Encontrei igualmente no YouTube alguns vídeos que, sem dúvida, despertarão o interesse do leitor pela dança praticada na região em que o Tsakoniano é falado. Sugiro pelo menos que assista aos seguintes vídeos selecionados para uma só canção tradicional em tsakoniano:
1) Grupo de dança de Leonídio
Link: https://th-th.facebook.com/groups/110224242346401/
Letra:
Σου ‘πα μάνα, μάνα μου πάντρεψέ με (δις)
Σου ‘πα μάνα πάντρεψέ με, σπιτονοικοκύρεψέ με (δις)
Εις τα ξένα μάνα μου μη με δώσεις (δις)
εις τα ξένα μη με δώσεις, γιατί θα το μετανιώσεις (δις)
Εις τα ξένα μάνα μου θ’ αρρωστήσω (δις)
εις τα ξένα θ’ αρρωστήσω και μανούλα θα ζητήσω (δις)
Θα ζητήσεις κόρη μου την κουνιάδα (δις)
θα ζητήσεις την κουνιάδα και την πρώτη συννυφάδα (δις)
Η κουνιάδα, μάνα μου δεν αδειάζει (δις)
η κουνιάδα δεν αδειάζει, συννυφάδα λογαριάζει (δις)
Η κουνιάδα, μάνα μου τα προικιά της (δις)
η κουνιάδα τα προικιά της, συννυφάδα τα παιδιά της (δις)
2) Link: https://www.youtube.com/watch?v=nnHe2murMd8
3) Link: https://www.youtube.com/watch?v=9e-VT4IkZ2Y (ΓΙΩΡΓΟΣ ΒΕΛΙΣΣΑΡΗΣ)
4) Link: https://www.youtube.com/watch?v=0JbS9CdLs6o
5) Link: https://www.youtube.com/watch?v=IFakDGY4mpI
Grupo de Dança Tsakoniana |
NOTAS EXPLICATIVAS
¹ Uma língua ameaçada é uma língua que está caindo fora de uso, geralmente porque tem poucos falantes sobreviventes. Se ela perder todos os seus falantes nativos, irá tornar-se uma língua extinta. A UNESCO, que distingue quatro níveis de risco para línguas ameaçadas, com base na sua transferência entre gerações, considera o tsakoniano uma língua criticamente ameaçada, isto é, quando "as mais novas gerações que a falam são avós e mais velhos, e ainda assim pouco frequentemente ou parcialmente".
² Póntos ou Pontus (em latim): nos trabalhos homéricos, esta palavra é usada para qualquer mar, porém mais tarde começou a referir-se especificamente ao Mar Negro, e eventualmente a uma região situada na sua costa sudeste. É nesta última acepção que o topônimo é usado aqui.
7 comentários:
Os últimos falantes de uma das línguas vivas mais antigas do mundo ainda se estabelecem no sudeste do Peloponeso. São considerados os últimos remanescentes dos Espartanos.
Os falantes do grego não os entendem, enquanto eles entendem o grego porque sabem as duas línguas.
O tsakoniano é baseado na língua dórica falada pelos antigos espartanos, e é o único dialeto remanescente do ramo dórico ocidental das línguas helênicas. Já o idioma grego descende dos dialetos jônicos e áticos do ramo oriental.
O presente artigo vai examinar os esforços de pesquisadores e desses últimos falantes do dialeto tsakoniano para preservá-lo da ameaça de extinção. De fato, atualmente vários falantes da língua estão pensando em atualizá-la e republicá-la online. Os municípios de Kynouría do Sul e do Norte e a Associação dos Arquivos Tsakonianos apóiam moralmente a iniciativa, mas falta financiamento para colocar o projeto em prática.
https://bragamusician.blogspot.com/2021/03/o-dialeto-tsakoniano-ameacado-de.html
Cordial abraço,
Francisco Braga
Caro Francisco Braga.
Mandei esta matéria para a Academia Brasileira de Filologia.
Enviei para Tarcízio, também.
Excelente texto, que encaminhei para Portugal.
Meu abraço e admiração
José Carlos Gentili
Grato, amigo. Um abraço cordial. Bom dia.
A ETERNA CULTURA GREGA.
ABS
Caro professor Braga,
Causa espanto os dados apontando que metade dos idiomas no mundo estejam em risco de extinção. O fenômeno não se restringe a regiões de populações nativas pressionadas pela chamada "globalização" e pela hegemonia de certos idiomas envolventes, afetando inclusive áreas consolidadas na Europa, como é o caso desse idioma Tsakoniano, tão precioso como seu artigo bem demonstra.
Só no Brasil estima-se em quase duzentas as línguas entre vulneráveis, severa e definitivamente ameaçadas.
Grato,
Cupertino
Caro amigo Braga
Agradecemos pela gentileza do envio.
Abraços, Mario e Beth.
Muito obrigado pela matéria
Interessantíssima.
ABS, mestre.
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