quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Oscar Niemeyer, Membro emérito da Academia de Letras de São João del-Rei


Por Francisco José dos Santos Braga


Tenho o prazer de comunicar ao leitor do Blog do Braga que, desde 29 de junho de 2008, a Academia de Letras de São João del-Rei se sente honrada de possuir, entre seus membros, Dr. Oscar Ribeiro de Niemeyer Soares, ou simplesmente Dr. OSCAR NIEMEYER, o conhecido arquiteto que ilustra o País com suas monumentais obras espalhadas pelos quatro cantos do Orbe.

Coube-me a subida honra de saudar o ingresso do maior de nossos arquitetos na Arcádia são-joanense. Não obstante estar impedido de comparecer à reunião comemorativa de admissão de tão ilustre personagem, devido a compromissos assumidos anteriormente, fiz-me representar no evento festivo, comunicando a todos meus Pares minhas sinceras felicitações pela aprovação de seu nome para engrandecer o nosso Sodalício.

Após a sua admissão ao convívio dos Acadêmicos são-joanenses, Oscar Niemeyer, demonstrando grande criatividade e vigor sem par, surpreendeu-nos com o arrojado projeto arquitetônico da Cidade Administrativa, inaugurada há seis meses atrás, para sediar o Governo de Minas Gerais. O complexo arquitetônico composto de cinco edificações principais, totalizando 270 mil metros quadrados de área construída, unindo beleza e funcionalidade, está sendo considerado um importante marco da arquitetura moderna e urbanística de Belo Horizonte e um dos projetos mais ousados de Oscar Niemeyer, destinando-se a unir secretarias e órgãos estaduais no mesmo espaço físico.

Digno de destaque é o vão livre de 147 metros de comprimento e 26 metros de largura do edifício em que ficará a Sede do Governo. Impressiona o fato de que o vão foi construído sobre colunas convencionais, que foram depois retiradas, passando o prédio a ser sustentado por um pórtico de concreto e trinta tirantes formados por um conjunto de 36 cabos de aço.

Para não me estender demasiado nesta Introdução, passo imediatamente ao meu discurso de saudação, sem mais delongas.

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Confrades,

A Academia de Letras de São João del-Rei tem o prazer de se reunir hoje para votar a inclusão do Dr. Oscar Niemeyer no Quadro de Sócios Correspondentes deste Sodalício. A indicação do nome desse ilustre arquiteto deve-se ao Presidente Dr. Wainer Ávila, o qual tudo tem feito para prestar homenagem a brasileiros ilustres, com o objetivo de assegurar o maior alcance cultural possível para as ações de nossa Academia em prol de nossa terra.

Tenho a honra de ser nomeado pelo Senhor Presidente relator da proposta de ingresso de tão ilustre personalidade no seio de nossa Academia, cujo currículo engrandeceria qualquer Instituição de cultura no País e no mundo, enriquecendo, sem dúvida nenhuma, igualmente o nosso Quadro de Sócios.

Como render as devidas homenagens a um dos maiores arquitetos do século XX, que é também um dos brasileiros mais reconhecidos e admirados no exterior? Como homenagear o carioca que levou a curva para a arquitetura moderna, espalhando a inventividade e a leveza de seus edifícios por muitas cidades brasileiras e estrangeiras? Como honrar condignamente, enfim, o ser humano ímpar, de rara dignidade e generosidade, um dos fundadores do Brasil moderno e, também, uma de suas mais definitivas expressões?

A Academia de Letras de São João del-Rei comemora o centenário de Oscar Niemeyer e tem o especial privilégio de poder fazê-lo em plena vitalidade do seu homenageado. Mais que vivo e coerente com os ideais pelos quais sempre lutou, Niemeyer permanece lúcido e espantosamente produtivo.

Quem julgava, dez ou quinze anos atrás, que o genial criador do conjunto arquitetônico de Pampulha, dos edifícios monumentais de Brasília, da Universidade de Constantine, da Editora Mondadori, do Sambódromo, viveria apenas dessas e de muitas outras glórias passadas, enganou-se redondamente.

Oscar Niemeyer já ultrapassara seus 80 anos quando surpreendeu a todos criando a jóia arquitetônica que veio enfeitar uma das mais belas linhas litorâneas do mundo. O Museu de Arte Contemporânea de Niterói surpreende não só por sua simples e ousada beleza como pela mais que feliz integração à paisagem da Baía da Guanabara.

Depois disso, Niemeyer continuou criando, em um ritmo que impressiona, prédios de concepção arrojada e lírica, tanto para o Brasil quanto para o exterior. Agora mesmo, em diversas cidades do mundo, tais como Brasília, Niterói ou Avilés, na Espanha, há prédios de sua autoria sendo construídos.

Sinto-me, Senhoras e Senhores Confrades, alguém que tem a felicidade de estar cercado pela criatividade ímpar de Oscar Niemeyer, já que resido no Plano Piloto de Brasília, planejado pelo homenageado e tombado como Patrimônio Cultural da Humanidade por decisão da Unesco.

Falar da presença de Oscar Niemeyer em Brasília soa como redundância, tão extensa e marcante ela é. Brasília, monumento da arquitetura moderna, resulta, entre outras coisas, da renovação de duas parcerias felizes de Oscar Niemeyer, a saber, com o Presidente Juscelino Kubitschek e com Lúcio Costa.

A inventividade de Niemeyer vai aqui se expressar tanto na modesta escala da Igrejinha Nossa Senhora de Fátima, como na monumentalidade inimitável do Congresso Nacional, onde se encontram nossos Parlamentares; tanto na surpreendente, se não milagrosa, Catedral, quanto nas linhas mais clássicas do Palácio do Itamaraty. A elegante simplicidade da Coluna do Palácio da Alvorada tornou-se, por sua vez, um símbolo da nova Capital, encantando e correndo o mundo na década de 60.

Um ano atrás, no mesmo dia em que Niemeyer completava seus 99 de existência, tive a honra de assistir à inauguração do Complexo Cultural da República. Formado por um museu de arte e por uma biblioteca, e localizado bem próximo ao centro geométrico do Plano Piloto – ou seja, a Estação Rodoviária, – o Complexo Cultural não só seduz os visitantes e moradores da Capital, como parece estar mostrando a necessidade de levar a cultura letrada e a cultura artística ali para onde o povo está.

Sua ligação com minha Minas Gerais natal é bem conhecida. Foi com o Conjunto da Pampulha, onde se sobressai a Igreja de São Francisco, que, convidado pelo então Governador Juscelino Kubitschek, Niemeyer alçou seu primeiro grande vôo individual. Nesse projeto, que concede à curva uma presença e uma importância que tinham sido recusadas pela arquitetura moderna, Niemeyer parece estar em íntimo diálogo com a escola barroca mineira, tão bem estudada pelo grande arquiteto e urbanista Lúcio Costa, seu mestre e amigo.

Alguns anos antes disso, em 1936, Niemeyer assinara, junto com Lúcio Costa, com outros colegas brasileiros e com o incontestável pai do modernismo arquitetônico, Le Corbusier, o projeto da sede do Ministério da Educação, no centro do Rio de Janeiro, que se tornou um verdadeiro manifesto em concreto da nova escola.

Oscar Niemeyer confessa que uma parte ao menos da inspiração mais profunda de sua obra arquitetônica vem da cidade do Rio: da magnífica topografia sinuosa da Cidade Maravilhosa, com seus morros, montanhas e praias; e - por que não? - das curvas, também tão justamente celebradas, das mulheres cariocas.

Essa dupla paixão, se assim posso me exprimir, recebeu sua consagração com a construção da Passarela do Samba, monumento arquitetônico à alegria e à maior festa da cultura brasileira, que, não fosse o bastante, cumpre também sua função social de escola pública ao longo de todo o ano. De certa forma, é isso o que a arquitetura de Niemeyer sempre fez: trazer para o dia-a-dia e para a consciência dos cidadãos a beleza das formas que se levantam do solo e criam um novo espaço habitável.

Suas criações atestam o arrojo da imaginação humana e mostram que a beleza deve estar presente no espaço público, integrada à sua função social, anunciando, assim, uma vida coletiva mais bela e mais completa.

Gostaria também de confidenciar aos meus Pares que tive o prazer ou privilégio de conviver com a criatividade de Oscar Niemeyer, em seu lado íntimo e quase secreto, quando assessorei o Senador Darcy Ribeiro, nos anos 90. No gabinete desse memorável Senador, hoje ocupado pelo Senador Francisco Dornelles, havia um painel traçado pela mão de Oscar Niemeyer que ocupava toda uma parede. Tratava-se de um presente do genial criador a seu amigo antropólogo Darcy Ribeiro. Os desenhos de Niemeyer recriam, livremente, aspectos de quatro de suas maiores obras. Duas delas são de universidades por ele projetadas: a Universidade de Brasília e a de Constantine, na Argélia. As outras duas correspondem a edificações de especial significado simbólico para nossa coletividade: a Passarela do Samba, ou Sambódromo, a que já me referi; e o Memorial da América Latina, sua mais original contribuição para a cidade de São Paulo.

Todas essas quatro obras tiveram a participação decidida e entusiasmada de Darcy Ribeiro, o que inspirou Niemeyer a presentear o amigo com os bonitos desenhos de seu traço limpo e elegante, que decoram o gabinete supracitado. O painel está hoje tombado como patrimônio do Senado Federal, assim como o gabinete que os possui se tornou uma espécie de patrimônio informal dos representantes do Estado do Rio de Janeiro.

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Confrades,

O privilégio de contemplar e de conviver com as obras arquitetônicas de Oscar Niemeyer é partilhado por todos os brasileiros e também por cidadãos de outros Países.

O orgulho de que um brasileiro tenha se tornado um gênio ímpar da arquitetura moderna, um dos grandes artistas de um século intensamente criativo, pertence a toda a população brasileira!

Parabéns a Oscar Niemeyer, por esse século de vida que nos brindou com tantas genialidades de sua lavra!

Parabéns, igualmente, ao nosso Presidente pela indicação do nome ilustre de Oscar Niemeyer para pertencer ao Quadro de Sócios Correspondentes deste Sodalício.

Muito obrigado!

Francisco José dos Santos Braga
Sócio Correspondente




* Francisco José dos Santos Braga, cidadão são-joanense, tem Bacharelado em Letras (Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras, atual UFSJ) e Composição Musical (UnB), bem como Mestrado em Administração (EAESP-FGV). Além de escrever artigos para revistas e jornais, é autor de dois livros e traduziu vários livros na área de Administração Financeira. Participa ativamente de instituições no País e no exterior, como Membro, cabendo destacar as seguintes: Académie Internationale de Lutèce (Paris), Familia Sancti Hieronymi (Clearwater, Flórida), SBME-Sociedade Brasileira de Música Eletroacústica (2º Tesoureiro), CBG-Colégio Brasileiro de Genealogia (Rio de Janeiro), Academia de Letras e Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei-MG, Instituto Histórico e Geográfico de Campanha-MG, Academia Valenciana de Letras e Instituto Cultural Visconde do Rio Preto de Valença-RJ e Fundação Oscar Araripe em Tiradentes-MG. Possui o Blog do Braga (www.bragamusician.blogspot.com), um locus de abordagem de temas musicais, literários, literomusicais, históricos e genealógicos, dedicado, entre outras coisas, ao resgate da memória e à defesa do nosso patrimônio histórico.Mais...

5 comentários:

Fernando Teixeira disse...

Caro Braga, tenho para mim que Oscar Niemayer é mais que um arquiteto, o poeta das linhas. Afinal suas construções trazem graça e leveza, dançam no espaço. Não ficará na saudade, ficará sempre presença na arte que plantou . Cumprimento-o pela saudação.
Lembranças para a esposa. Fernando Teixeira

Antonio Emilio da Costa disse...

Prezado Francisco Braga, irmão das artes, da cultura, da história e da memória, que aqui não tem o mesmo significado,

Assim como você, nasci na barroca São João del-Rei e vivo na capital brasileira, em um edifício cuja construção, em 1960, seguiu as linhas arquitetônicas de Oscar Niemeyer, projetadas para o urbanismo de Lúcio Costa. Segundo dizem, o Edifício Amazonas, onde moro na SQS 215, foi o primeiro edifício residencial construído na Asa Sul do avião de Brasília.

Funcionário do Arquivo Público do Distrito Federal durante sete anos, como Gerente Cultural e Técnico, tive a oportunidade de ver de perto e divulgar em diversas linguagens, nos mais variados meios, originais de Lúcio Costa e projetos do grande mestre da arquitetura mundial do século XX,documentação fotográfica da edificação dos monumentos e depoimentos de engenheiros, arquitetos, fotógrafos, intelectuais,artistas e trabalhadores da construção civil que, nos canteiros de obra, colocaram literalmente a mão na massa para transformar em realidade os sonhos do grande criador.

Esta proximidade com a obra do grande nome da arquitetura mundial do século XX e o testemunho tanto diante de sua obra maior quanto dos registros que a documentam me tornam cúmplice deste seu pronunciamento, que só conheci agora. É com este sentimento de cumplicidade que o cumprimento pela feliz saudação, feita há pouco mais de dois anos e tão atual e plena de significado, sobretudo neste dia em que nosso mestre se foi. A ele, nosso reconhecimento e nosso agradecimento, por projetar para o mundo o ideal de um Brasil que, apesar de ainda hoje ser o próprio carrasco dos brasileiros*, não imagina o quão grande possa vir a (e precisa) ser.

*alusão ao livro Quarto de despejo, da escritora favelada Carolina Maria de Jesus.

Grande e respeitoso abraço.

Emilio.

Pedro Silva, de Portugal disse...

Caro Amigo Francisco Braga,

Muito bom discurso!
Infelizmente, o grande Niemeyer faleceu. Por outro lado ficou imortalizado pelas obras que legou à posteridade.

Um abraço,
Pedro Silva

A. Molina disse...

Boa tarde, amigo Braga !!

Fico grato de receber os seus posts, onde posso visualizar muitas coisas que eu nem conhecia, como especialmente este do saudoso Oscar.

Abraços. Grato,
Molina

Gilberto Madeira Peixoto disse...

Francisco:
Recebi, li e gostei.
É ótima a maneira como você aborda o artista maior da arquitetura nacional.
Muito bom.
Continue.
Gilberto Madeira Peixoto