domingo, 27 de março de 2016

MAESTRO ASSIS REPUBLICANO EM SÃO PAULO


Por Francisco José dos Santos Braga



I.  INTRODUÇÃO

Com base em minhas pesquisas apenas no Acervo do Estadão, duas foram as vindas do Maestro Assis Republicano a São Paulo em missão oficial, a convite para reger obras de sua autoria. 

Inicialmente, com uma récita popular da sua ópera "O BANDEIRANTE", a companhia lyrica da Sociedade Theatral Sul-Americana, empresa de Walter Mocchi, encerrou a temporada lírica de 1925 no Teatro Municipal de São Paulo, na noite do dia 25 de outubro de 1925. O elenco que participou da primeira representação da ópera "O Bandeirante" em São Paulo era constituído de: sopranos Flora Revalles ¹ (no papel de Jahyra), Lydia Garinska e Agnes Porter; mezzo-soprano Fernanda Denti; tenores Salvador Paoli, Lamberto Bergamini e Carlo Giusti; barítono Gaetano Viviani (no papel de Antônio de Sá); e baixo Vincenzo Cassia. A regência da orquestra esteve a cargo do próprio compositor da ópera, Antônio de Assis Republicano, que veio do Rio de Janeiro para a apresentação.
O Estadão cobriu esse evento através de matérias anunciando a ópera (itens I e II abaixo), com uma crítica musical da representação da ópera (item III) e, finalmente, com uma crônica de uma ceia (item IV), que "os redactores da 'Folha da Manhã', offereceram ao distincto compositor riograndense, afim de render uma justa homenagem ao talento do maestro patricio e ao successo alcançado pela sua primeira partitura lyrica em S. Paulo".
Soprano suíça Flora Revalles
Barítono italiano Gaetano Viviani































Outra vinda do Maestro Assis Republicano a São Paulo foi a convite da Sociedade de Concertos Sinfônicos para reger no Teatro Santa Helena, às 16 horas do dia 19 de fevereiro de 1927, peças de sua autoria, entre outras composições de Beethoven, Tchaikovsky e Hector Berlioz. De sua autoria o Maestro apresentou 1ª Dança Brasileira, Improviso sobre tema brasileiro e Canção indígena da ópera "O Bandeirante". Tomamos conhecimento, através da crítica musical do evento, que "as composições do maestro Assis Republicano executadas pela orquestra contaram com o concurso do violoncelista (Armando) Belardi e da cantora Carmen Eiras e foram muito aplaudidas pelo auditório".
Igualmente, o Estadão deu bastante publicidade ao evento, noticiando-o desde o dia 14 de fevereiro (itens V, VI e VII), e fazendo a cobertura da apresentação com uma crítica musical na edição do dia 20 de fevereiro (item VIII). Nesta última, ficamos sabendo que o maestro partiria no dia seguinte para o Rio de Janeiro, onde faria os preparativos para sua viagem à Europa a fim de aperfeiçoar seus conhecimentos musicais e que aquele concerto do Maestro Assis Republicano era de despedida do público paulista. Lamentavelmente, essa viagem de aperfeiçoamento à Europa não se concretizou, para desgosto e frustração na vida do grande músico brasileiro, que poderia ter sido totalmente diferente, caso tivesse conseguido uma bolsa que pleiteava do poder público para se sustentar no exterior.

Quanto a uma possível terceira vinda do Maestro, a  fonte pesquisada (item IX) não menciona a sua presença, quando da apresentação de seu Concerto para violino e orquestra em 23 de abril de 1954, sob a regência de Eleazar de Carvalho à frente da Orquestra Sinfônica Brasileira; portanto, o certo é que, se veio, não foi para reger a sua obra, como das vezes anteriores.

Entendo que seria muito útil para a historiografia musical brasileira que algum pesquisador sediado no Rio de Janeiro, onde o Maestro residiu por longos anos e ali produziu suas grandes obras, trouxesse a lume a apresentação de suas obras no Teatro Municipal, no Teatro Lírico, etc., e da mesma forma em Belo Horizonte, possibilitando que tivéssemos uma visão perfeita da sua produção musical e consequente repercussão de seu trabalho. Outra sugestão é que alguma pesquisa confirmasse a amizade entre o Maestro e Villa-Lobos, o que demanda comprovação, já que a ligação entre o Maestro e seu professor Francisco Braga (1868-1945) me parece bastante evidente. Uma terceira proposta é que seja utilizada uma metodologia científica para a catalogação da obra musical do Maestro, pois, de acordo com seu filho Esaú de Assis Republicano: 
"Sua obra é vasta e digna de maior atenção dos cultores da música sinfônica, gênero em que se têm notabilizado poucos brasileiros. (...)  
Longa é a enumeração de suas obras. (...)  
Outras obras poderiam ser citadas, embora seja impossível apresentar uma lista exaustiva não só devido à extraordinária capacidade de trabalho de Assis Republicano, que escreveu consecutivamente durante mais de cinqüenta anos, como também pelas obras suas que se encontram extraviadas, como as que ele escreveu graciosamente para amigos." ²

Neste  trabalho será respeitada a grafia de época.


II.  PESQUISA SOBRE A PRESENÇA DO MAESTRO ASSIS REPUBLICANO EM SÃO PAULO NO ACERVO DO ESTADÃO


I. Na coluna PALCOS E CIRCOS: NOTICIAS THEATRAES 
"O BANDEIRANTE", DE ASSIS REPUBLICANO  O encerramento da actual temporada lyrica far-se-á, como já tivemos ensejo de noticiar, com outra novidade por que o nosso publico de ha muito anceava: "O Bandeirante", do maestro brasileiro Assis Republicano.
Cantada pela primeira vez na recente temporada do Rio de Janeiro, a opera do compositor nosso patricio deu opportunidade a que se reconhecesse, no seu autor, um grande e incontestavel talento musical.
A recita de amanhan será extraordinária e a preços populares, estando os principaes papeis confiados às sras. Flora Revalles, Lydia Garinska, Agnes Porter e Fernanda Denti e aos srs. Salvador Paoli, Gaetano Viviani, Cassia, Bergamini e Giusti.
A orchestra como da primeira vez em que a opera foi cantada, será regida pelo seu autor.


FonteO ESTADO DE S. PAULO, Anno LI, nº 17.044, edição de 24 de outubro de 1925, p. 5.


II. Na coluna PALCOS E CIRCOS: NOTICIAS THEATRAES EM S. PAULO

TEMPORADA LYRICA OFFICIAL - OS DOIS ULTIMOS ESPECTACULOS ³ - A OPERA "O BANDEIRANTE"Em ultima vesperal de assignatura e da temporada lyrica official deste anno, no Theatro Municipal, se cantará hoje a delicada opera de Massenet "Thais", que os assignantes das dez recitas já tiveram opportunidade de ouvir.
Um dos attractivos da "Thais" que tivemos desta vez é o facto de ser o papel de protagonista desempenhado pela notavel soprano Ninon Vallin, que já nos outros annos tanto havia feito pelo renome de que hoje gosa em S. Paulo como nos mais cultos centros de arte do mundo.
São seus companheiros na interpretação da linda obra do grande compositor francez os srs. Armand Crabbé, que tem igualmente um papel magnifico e que é um dos elementos de maior destaque do conjunto que hoje se despede do nosso publico; e o sr. L. Bergamini, que nesta temporada conquistou aqui muitas sympathias.
A orchestra será regida pelo maestro Alceo Toni. 
________________________________________
É com uma opera nacional, ainda não conhecida de nossa platéa, que a empresa da Sociedade Theatral Sul Americana quiz encerrar a temporada de 1925, satisfazendo a anciedade do publico, que dessa obra já tinha noticia pelas elogiosas referencias com que a imprensa do Rio registou  a sua "primeira", na ultima estação carioca. O espectaculo, em que se cantará "O Bandeirante", do compositor riograndense Assis Republicano, será a preços populares, tendo havido, já ontem, grande procura de bilhetes. Para dar uma idéa do trabalho do nosso patricio que vamos hoje ouvir, damos a seguir o argumento do poema: 
Acto 1º —  Sala tosca, na habitação dos bandeirantes. Mobilia: mesa rustica, um tamborete, malas e caixas de madeira. Ao fundo, campos e floresta. Sol claro. Antonio Sá, o bandeirante, victorioso na luta contra uma tribu do Paranapanema, medita sobre o rapto de Jahyra, a bella indigena que trouxera da taba, sentindo-se apaixonado. A bandeira apresta-se para seguir em direção à Ciudad Real, no Guahyra, ouve-se o vozeirão alegre dos bandeirantes, que entram em scena com o sub-chefe d. Ruy Cordeiro. Após saudações e ordens recebidas pelos bandeirantes, apparece Jahyra, timida e appreensiva, dirige-se aos dois chefes, ainda na sala e, finalmente só, lamenta-se: tem deveres para com a taba e está apaixonada pelo chefe bandeirante. Entra Guará, irmão de Jahyra, que premedita uma cilada à bandeira, para vingar a tribu e a irman.
Ouve-se fora o coro dos bandeirantes. A índia reppele o irmão e é por elle considerada trahidora.
Acto 2º —  Clareira ao lado da estrada, proxima à habitação dos bandeirantes. Jahyra, Isabella e uma sertaneja colhem flores agrestes. A indigena e a mameluca fazem confidencias sobre Antonio Sá, o chefe bandeirante, que se destaca de um grupo e dirige-se a Jahyra, tendo-se retirado já, Isabella.
Os dois namorados cantam o duetto de amor.
Entram bandeirantes em companhia de Ruy Cordeiro, que declara ao chefe estar a bandeira a postos para seguir e recebe ordens para commandal-a. Um arieiro (sic) apressado vem communicar a aproximação de uma cavalgada paulista. É d. Branca, a esposa do chefe dos bandeirantes, que está a chegar.
Jahyra mostra-se afflicta e esquiva. O bandeirante diz-lhe sua paixão. Ouvem-se côros de bandeirantes e de indios.
Começa o crepusculo.
Os dois namorados resolvem a fuga, sendo o encontro à noite, na margem do Itararé.
Acto III —  Margem do Itararé. Manhan tempestuosa.
À beira do rio vêem-se as roupas de Jahyra. Antonio Sá, que fôra detido pela tempestade, apparece com um pagem, bradando pela india e comprehendendo que ella se suicidara, joga-se no rio, em desespero.
Amaina o temporal. D. Branca, seguida de damas e sertanejos, apresenta-se e amaldiçôa o rio, que desapparece, transformando-se numa gruta.
Intermezzo musical.
Cessou o temporal, clareia o sol e, ao longe, ouve-se o côro dos bandeirantes. Em lenta marcha funebre, um cortejo de camponios traz à scena o cadaver do bandeirante. Sob o assombro e timidez dos sertanejos sae da treva da gruta a sombra de Jahyra, por elles reconhecida —  a alma não morre, dizem, e dirige-se ao corpo do seu amado, cahindo de joelhos, em soluço.
De novo, ao longe, ouve-se o côro dos bandeirantes.
O desempenho do "O Bandeirante", cujo libreto é de autoria do sr. Silveira Netto, está a cargo das sras. Revalles, Garinska, Porter e Denti e dos srs. Paoli, Viviani, Cassia, Bergamini e Giusti.
A orchestra será regida pelo maestro Assis Republicano.


Fonte: O ESTADO DE S. PAULO, Anno LI, nº 17.045, edição de 25 de outubro de 1925, p. 6.

III. Na coluna PALCOS E CIRCOS: THEATRO MUNICIPAL

A companhia lyrica do Theatro Municipal despediu-se hontem do nosso publico com a opera —  "O Bandeirante"  do nosso joven compatriota Assis Republicano.
O compositor é um moço de modesta origem, que se fez pelo seu próprio esforço até conseguir matricular-se no Instituto Nacional de Musica, onde recebeu o seu diploma.
O "Bandeirante" é o seu primeiro trabalho para o theatro. Qualquer apreciação que se deva fazer dessa obra, não pode deixar de levar em conta a relatividade de todas estas circumstancias.
Como producção theatral "O Bandeirante" ressente-se da deficiencia do libreto, quasi sem movimento scenico. Ha grandes vacuos no desenvolvimento da acção, que mais evidentes se tornaram por uma absurda marcação e pela falta de ensaios.
Os defeitos do libreto não eximem completamente o compositor da responsabilidade, nas falhas da sua obra de estréa. Nem todos podem, como Wagner, escrever o poema das suas composições e nem a todos os musicos se depara, como a Gluck, um Calzabigi... Mas, ninguem é obrigado a escrever uma opera sobre um mau poema e uma das condições de quem compõe para o theatro é saber escolher o libreto.
Com esses elementos não poderia o sr. Assis Republicano produzir um drama lyrico à altura do progresso musical da nossa época.
Pode, porém, revelar bellas qualidades de symphonista, principalmente no terceiro acto.
Não ha na partitura muita unidade, nem aquellas rajadas de inspiração, como as tinha o nosso Carlos Gomes, e que fazem com que lhe perdoemos muitas das suas falhas.
Comtudo, o sr. Assis Republicano, não tendo triumphado completamente no theatro, pôde dar ao seu trabalho, refundindo-o, o caracter de um poema symphonico, no qual, parece-nos, elle se apresentará melhor.
Nem por isso deixamos de applaudir os seus esforços e os bellos resultados já conquistados, pois não é pouca coisa, para um moço pobre e sem protecção, que nunca sahiu do Brasil, o haver composto e orchestrado uma opera inteira em que ha paginas reveladoras de incontestavel talento.
O publico soube comprehender bem tudo isso. Ao empunhar a batuta para dirigir a execução do "Bandeirante", o maestro Assis Republicano recebeu uma vibrante manifestação da sala, que estava cheia, e os applausos se repetiram no fim de cada acto.
Dos interpretes, aos quaes não desejamos fazer censuras, porquanto não poderiam ter estudado as suas partes nas condições em que a opera foi dada, apenas a sra. Revalles (Jahyra) estava mais ou menos à vontade no seu papel. Sobre esta distincta artista, que só ante-hontem se pôde revelar à nossa platéa na "Monna Vanna" , e sobre o sr. Viviani (Antonio de Sá) repousava o exito da parte vocal e ambos se desempenharam bem da tarefa.
O maestro Assis Republicano mostrou dirigir a orchestra com autoridade, mantendo o equilibrio da representação, o que não era facil tarefa com os cantores incertos como estavam.
Uma nota desagradavel e absolutamente infeliz foi a execução, antes do 2º acto, da "Elegia", do sr. F. Mignone, escripta para a commemoração de Puccini, inteiramente deslocada, essa peça, que aliás não augmenta os louros do joven compositor, só poderia desnortear o publico desprevenido e prejudicar a unidade do espectaculo.
A empresa Mocchi, não contente de sacrificar o trabalho do sr. Republicano, numa edição atamancada, ainda commetteu a indelicadeza dessa interposição de um trecho musical estranho à peça, idéa tão despropositada que só poderia surgir num cerebro destituido inteiramente de criterio artistico ou mesmo de senso commum.
Neste anno fatidico era impossivel que o fim da temporada não ficasse assignalado por mais um erro lamentavel...

Fonte: O ESTADO DE S. PAULO, Anno LI, nº 17.046, edição de 26 de outubro de 1925, p. 2.


IV. Na coluna SOCIEDADE: HOMENAGEM 

Após o espetáculo anteontem realizado no Municipal, onde se cantou, em despedida da companhia lyrica da Sociedade Theatral Sul-Americana, a ópera brasileira "O bandeirante", de Assis Republicano, os redactores da "Folha da Manhã", offereceram ao distincto compositor riograndense uma ceia, afim de render uma justa homenagem ao talento do maestro patricio e ao successo alcançado pela sua primeira partitura lyrica em S. Paulo. 
A ceia, servida no Restaurante Palacio, decorreu sob a atmosphera da melhor alegria, tendo nela tomado parte varios jornalistas dos matutinos desta capital. Sentaram-se à mesa, na cabeceira: o maestro Assis Republicano; à esquerda: os srs. Nestor Rangel Pestana, Paulo Gonçalves, dr. Vicente Ancona, Silveira Bueno, Edmundo Barreto, dr. Epitecto Fontes e Sylvio Sanguigni Damiani; à direita: Gastão Barroso, Aristides Avila, maestro Villa-Lobos, José Augusto Corrêa Junior, Pedro Cunha e Waldomiro Fleury.
Foram trocados varios brindes. 

Fonte: O ESTADO DE S. PAULO, Anno LI, nº 17.047, edição de 27 de outubro de 1925, p. 6. 

V.  Na coluna ARTES E ARTISTAS: SOCIEDADE DE CONCERTOS SYMPHONICOS


Veiu do Rio de Janeiro o maestro Assis Republicano, que, a convite da Sociedade de Concertos Symphonicos daqui, regerá o concerto a realizar-se no próximo sabbado no Theatro Santa Helena, às 16 horas.
Iniciará o distincto compositor patricio, desde logo, os ensaios de apuro do programma organizado, com o qual se apresentará ao nosso publico.
Contém esse programma duas composições do nosso talentoso patricio, a segunda symphonia de Beethoven, a ouverture de Tchaikovsky intitulada "1812", para orchestra e banda e a ouverture de "Benvenuto Cellini", de Hector Berlioz.
Despertará, pois, vivo interesse entre os amadores de musica o concerto symphonico da tarde de 19 proximo. (...)

Fonte: O ESTADO DE S. PAULO, Anno III, nº 17.518, edição de 14 de fevereiro de 1927, p. 2.


VI.  Na coluna ARTES E ARTISTAS: SOCIEDADE DE CONCERTOS SYMPHONICOS

Realiza-se amanhan, às 16 horas, no Theatro Santa Helena, o concerto da Sociedade de Concertos Symphonicos correspondente ao mez de Fevereiro, e que será dado para os socios do primeiro e do segundo turnos.
Obedecerá o concerto a attrahente programma, estando a regencia a cargo do compositor patricio sr. Assis Republicano, de quem o nosso publico já teve occasião de applaudir a opera "O Bandeirante".
Prestará tambem o seu concurso a esse concerto a cantora patricia sra. Carmen Eiras, que interpretará uma pagina do maestro Assis Republicano.
Contém o programa duas composições do nosso talentoso patricio, a segunda symphonia de Beethoven, a "ouverture" intitulada "1812", de Tchaikovsky, para orchestra e banda, e a "ouverture" de "Benvenuto Cellini", de Hector Berlioz. (...)

Fonte: O ESTADO DE S. PAULO, Anno LIII, nº 17.522, edição de 18 de fevereiro de 1927, p. 5.

VII.  Na coluna ARTES E ARTISTAS: SOCIEDADE DE CONCERTOS SYMPHONICOS

Realisa-se hoje, às 14 horas, no Theatro Santa Helena, o concerto correspondente ao mez de Fevereiro da Sociedade de Concertos Symphonicos de S. Paulo e para os socios do primeiro e segundo turno conjuntamente.
A orchestra estará sob a regencia do talentoso compositor brasileiro Assis Republicano, que dentro em breve segue para a Europa, onde vae concluir os seus estudos de aperfeiçoamento.
Prestará tambem o seu concurso à reunião de hoje a distinta cantora patricia sra. Carmen Eiras, que cantará a canção indigena da opera "Bandeirantes" (sic), de Assis Republicano, e "Mia piccirella", da opera "Salvador Rosa", de Carlos Gomes.
O programa é o seguinte:
H. Berlioz  Benevenuto Cellini (Ouverture)
L. van Beethoven  2ª Symphonia
A. Republicano  1ª Dansa Brasileira 
 Improviso sobre thema brasileiro 
 Canção indigena da opera "Bandeirantes"
Carlos Gomes  "Mia piccirella", da opera "Salvador Rosa"
R. Wagner  "Walkyria" (Cavalgada). (...)

Fonte: O ESTADO DE S. PAULO, Anno LIII, nº 17.523, edição de 19 de fevereiro de 1927, p. 3.

VIII.  Na coluna ARTES E ARTISTAS: SOCIEDADE DE CONCERTOS SYMPHONICOS

Apesar do tempo chuvoso, grande foi a assistencia que teve o Theatro Santa Helena para ouvir o concerto organisado pela esforçada Sociedade de Concertos Symphonicos, a qual confiou a direcção da orchestra ao compositor patricio sr. Assis Republicano.
Abriu o programma a "ouverture" de "Benvenuto Cellini", bella pagina de Berlioz, que foi ouvida attentamente pela platéa curiosa por conhecer a maneira de reger do autor de "O Bandeirante".
Seguiu-se a Segunda Symphonia, de Beethoven, que poderia ter tido mais segura execução. O trabalho orchestral se sentia um tanto prejudicado talvez por se tratar do primeiro encontro do distincto regente com a orchestra em audição publica.
As composições do maestro Assis Republicano executadas pela orchestra, com o concurso do violoncelista Belardi e da cantora sra. Carmen Eiras foram muito applaudidas pelo auditorio.
Fechou o programma a consagrada "Walkyria", de Wagner.
O maestro Assis Republicano, que nos deu ontem o prazer de sua visita, parte para o Rio amanhan e logo depois seguirá para a Europa.

Fonte: O ESTADO DE S. PAULO, Anno LIII, nº 17.524, edição de 20 de fevereiro de 1927, p. 2.

IX. Na coluna MÚSICA: ORQUESTRA SINFÔNICA BRASILEIRA

A Orquestra Sinfônica Brasileira realizou anteontem, no grande auditório do Teatro Cultura Artística o primeiro concerto da série de 1954 em São Paulo. (...)
Eleazar de Carvalho apresentou a Segunda Sinfonia, de Borodin; Concerto para violino e orquestra, de Assis Republicano (1ª audição O.S.B.), do qual foi solista o violinista Oscar Borghert , e Petrushka, de Strawinsky.
Assinalamos de início, o Concerto de Assis Republicano, obra ampla, de grandes proporções, desenvolvida numa linguagem musical de moderado modernismo, e que se distingue pela variedade temática, inegável fantasia criadora e uma orquestração reveladora dos conhecimentos do autor. Como resultado de uma única audição, ao lado das impressões acima, ficou-nos também a da existência, talvez, de alguma desigualdade entre o espírito do primeiro movimento e o dos seguintes. Assis Republicano demonstra gosto pela grandiosidade, pela magnificência, preenchendo por vezes a parte do solista com uma escrita de grande dificuldade mas de conteúdo simplesmente ornamental, o que, de resto, parece opor-se ao tipo de musicalidade do solista. Oscar Borghert desempenhou-se com brilho da sua incumbência. Embora a sua sonoridade não possua a amplitude desejada pela obra, nem seu temperamento seja tão transbordante quanto o espírito daquela, sua atuação foi digna de calorosos aplausos. (...)

Fonte: O ESTADO DE S. PAULO, Ano LXXV, nº 24.221, edição de 25 de abril de 1954, p. 10.



III.  NOTAS EXPLICATIVAS


¹  Flore (ou Flora) Revalles (25/01/1889-29/08/1966) foi uma "entertainer" suíça, ativa durante as primeiras décadas do século XX. Revalles começou como cantora na Suíça, dançou nos Balés Russos na Europa e Estados Unidos e figurou nas produções da Broadway e Hollywood (estrelou como Messalina no melodrama romântico de Maurice Tourneur, "Woman", de 1918) antes de retomar sua carreira de cantora na Europa. É também lembrada por ser tia do ator francês Guy Tréjan (1921-2001).

² Cf. http://saojoaodel-rei.blogspot.com.br/2016/03/maestro-assis-republicano.html

Também acredito ser possível, através de uma pesquisa mais extensiva, confirmar a minha hipótese sobre a composição da Sinfonia de São Paulo, do Maestro Assis Republicano (nota explicativa nº 9 no post acima), que reproduzo a seguir: 
"Embora não tenha elementos para afirmar que o Maestro Assis Republicano, com a sua 'Sinfonia de São Paulo', tenha participado do concurso promovido pela Comissão do IV Centenário da Fundação de São Paulo, há uma grande possibilidade de que a sua obra tenha sido composta para o certame, concluída, portanto, até 30/06/1953, data-limite para entrega da sinfonia. Saiu-se vitorioso Camargo Guarnieri, agraciado com o 'Prêmio Carlos Gomes', tendo feito jus a Cr$ 200.000,00. Vencedora do concurso do IV Centenário de São Paulo, em 1954, a 'Sinfonia de São Paulo' de Camargo Guarnieri (Sinfonia nº 3, de 1952) é  considerada por alguns o ponto mais alto da música orquestral do compositor já maduro artisticamente e em plena posse de todos os meios de composição e foi executada com pleno êxito pela Orquestra Sinfônica Brasileira, sob a regência do maestro Eleazar de Carvalho. O ESTADÃO de 12/10/1954, na coluna 'A Sociedade', na matéria intitulada 'Homenagens', noticia as providências tomadas pela comissão organizadora para homenagear o agraciado com o prêmio. A título de informação, a comissão organizadora das homenagens a Camargo Guarnieri era constituída pelas sras. Antonieta Rudge, Magdalena Tagliaferro, Dinorah de Carvalho, Esther Mesquita, Yara Bernette, Arícia Araújo Cintra, Mina Waschawehik, Nenê Medici, Lilly Wolff, Lídia Kliass, Felicia Blumental, Madalena Lebeis, Alay da Silva Martins e Odette de Freitas. "
Cf. O ESTADO DE S. PAULO, Anno LXXV, nº 24.366, edição de 12 de outubro de 1954, p. 6 

³  O dia 25 de outubro de 1925 encerrou a temporada lírica paulistana de 1925, com "Thais", em "matinée", e, à noite, "O Bandeirante", ópera de Assis Republicano, pela primeira vez representada em São Paulo, em récita popular.  

  Na coluna PALCOS E CIRCOS: NOTICIAS THEATRAES "A PRIMEIRA AUDIÇÃO DE MONNA VANNA EM S. PAULO" — "Monna Vanna", que a empresa Walter Mocchi escolheu para encerramento da assignatura da temporada lyrica official do corrente anno, e que será cantada esta noite (sic) no Municipal, figura no repertorio da Opera de Paris e constitue uma novidade que muito interessa à nossa sociedade.
Musica de Février, discipulo de Massenet, seu libreto foi extrahido pelo próprio Maeterlinck de seu original poema. De autoria de seu autor são varias producções de musica de camara e de caros e numerosas melodias, além de um hymno "Aux mortes pour la patrie" (talvez a mais notável composição patriótica alusiva à guerra). São tambem de sua lavra as "tres orações" sobre poemas de Francis Jammes, bem como uma peça em dois actos "Le roi aveugle", cantada na Opera-Comique, em 1906. O libreto de Monna Vanna resume-se no seguinte:
"A cidade de Pisa está sitiada pelas tropas da Republica de Florença, commandadas pelo aventureiro Prinzivalle. Na cidade ha a desolação da fome. Prinzivalle offerece-se para abastecel-a secretamente, mas impõe uma condição para sua trahição: Vanna, a virtuosa esposa de Guido Colonna, irá ter com elle, à noite, nua, sob um manto. Vanna acceita o sacrificio para salvar Pisa, não obstante o desespero de Guido.
Eil-a, pois, na tenda de Prinzivalle, vendo a seus pés, não o veterano que imaginava, mas um homem que lhe traz recordações da infância, que ella esquecera, e lhe confessa o seu amor e a sua submissão. Tornou a vel-a:  eis realizado o seu sonho  e apenas lhe pede um beijo na fronte, porque o seu amor é muito puro. Prinzivalle, porém, é ameaçado pela Republica de Florença, que lhe teme a ditadura. Vanna, commovida por tanto amor desinteressado, offerece-lhe um recurso em Pisa, que ella acaba de salvar.
Voltando a Pisa trazendo em sua companhia Prinzivalle, Vanna é recebida com aclamações pelo povo. Diz a Guido que vem pura como partira. Seu esposo recusa-se a acreditar nisso, porque, se Prinzivalle trahiu Florença por um simples beijo na fronte, é que os dois se entendem. Deixando-se levar pelo odio, elle entrega Prinzivalle à multidão, quando Vanna, para o salvar, resolve mentir. Sim! Prinzivalle a possuiu, mas só a ella cabe a vingança. Manda fechal-o num calabouço, do qual tem a chave.
Como o marido não compreendesse o que lhe dizia a esposa, surdo aos protestos de fidelidade, obstinando-se em julgal-a polluida, quando ella, volta intacta, então Vanna se transforma e inventa a mentira para castigal-o, reconhecendo-o indigno della.
Marco, pae de Guido, velho humanista que applaudira a ida de Vanna ao acampamento inimigo, applaude agora tambem a sua conducta, porque tudo comprehendeu. A obstinação do filho parece-lhe de tal sorte condemnavel, que elle approva a fuga de Monna Vanna com Prinzivalle o seu verdadeiro esposo.
Essa transformação da mulher já conquistada pela abnegação do Prinzivalle e aos braços delle arremessada pela colera de Guido, é palpitante e commovedora. Fogem ambos. Foi um mau sonho que se dissipou:  a felicidade ia começar."
A parte de protagonista será interpretada pela soprano Flora Revalles; a de Prinzivalle pelo tenor Sullivan; a de Guido Colonna pelo barítono Crabbé; e a de Marco Colonna pelo baixo Cirino.
"Monna Vanna" será dirigida, na sua primeira audição, pelo maestro Alceo Toni. (...)

FonteO ESTADO DE S. PAULO, Anno LI, nº 17.044, edição de 24 de outubro de 1925, p. 5.

  Notável violinista brasileiro, radicado no Rio de Janeiro, professor catedrático da Escola Nacional de Música da Universidade do Brasil e recitalista de grandes qualidades.

7 comentários:

Francisco José dos Santos Braga (compositor, pianista, escritor, colaborador de vários periódicos, gerente do Blog do Braga e do Blog de São João del-Rei, e membro de diversas instituições de cultura no Brasil e no exterior) disse...

Dando continuidade à minha pesquisa inédita sobre o MAESTRO ASSIS REPUBLICANO (1897-1960), venho aqui mostrar que, com base no Acervo do ESTADÃO, o Maestro foi duas vezes a São Paulo na década de 20, ambas cobertas de sucesso, para reger algumas de suas obras musicais. Mostro ainda que há a possibilidade de uma terceira ida do Maestro a São Paulo em 1954, ainda não comprovada, mas com certeza é possível afirmar que não foi como regente de seu Concerto para violino e orquestra.
Vale mencionar que a orquestração do Hino Nacional Brasileiro, por ele feita, pelo seu elevado nível técnico foi adotada pelo Governo Federal, conforme Decreto Lei nº 4.545, de 31 de julho de 1942. Por tal feito, foi agraciado pelo Governo com a Comenda da Ordem do Mérito.
Além disso, foi o Maestro sócio-fundador da Academia Brasileira de Música, onde ocupou a cadeira nº 33, cujo patrono era Francisco Valle, sendo seu atual ocupante o Acadêmico Raul do Valle, razões mais do que suficientes para que uma pesquisa mais extensiva sobre a vida e obra do Maestro seja viabilizada e uma catalogação completa de sua obra musical seja implementada.

Prof. Fernando Teixeira (professor universitário, escritor e Secretário Geral da Academia Divinopolitana de Letras) disse...

Uma preciosa pesquisa, com certeza. Cumprimentos do Fernando Teixeira

Dr. Mário Pellegrini Cupello (pesquisador, escritor e presidente do Instituto Cultural Visconde do Rio Preto, de Valença) disse...

Caro amigo Braga
Mais uma vez queremos felicitar o Ilustre amigo Braga, pela refinada pesquisa sobre o Maestro Assis Republicano, contribuindo para a historiografia musical brasileira.
Com os nossos agradecimentos, receba o abraço fraterno,
Do amigo Mario.

Edson Hiromitsu Tobinaga disse...

Muito obrigado, Francisco!
Seu trabalho é apaixonado e, por isso mesmo, apaixonante. Parabéns!

Paulo Roberto Souza Lima (escritor e gestor cultural) disse...

Parabéns pelo esforço de mapeamento da obra e vida deste eminente Maestro.

Ruth do Nascimento Viegas (presidente do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural de São João del-Rei) disse...

Francisco, parabéns pelo grandioso trabalho! Encantada, Ruth

José Claret Mattioli (empresário na área de informática, escritor, membro e Coordenador da COMISSÃO PERMANENTE DE COMUNICAÇÃO E MARKETING INSTITUCIONAL / CPCMI da ALL-Academia Lavrense de Letras) disse...

Bom dia, colega Braga...

Acabo de ler os textos de seu blog. São matérias de grande interesse, muito bem preparadas e de relevância histórica.

Esses textos são perfeitos para o site da ALL que estou criando, cuja proposta acadêmica é exatamente essa: tornar acessíveis e divulgáveis textos assim, mais eruditos, mais filosóficos, de interesse histórico... Enfim, para um público, digamos, mais qualificado.
Claret