segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

DESTRUIÇÃO DE POMPÉIA PELO VULCÃO VESÚVIO > > > Parte 1


Por Francisco José dos Santos Braga



Localização do Monte Vesúvio

O Vesúvio é um vulcão ativo, junto da baía de Nápoles, no sul da Itália. Sua altura se modifica a cada erupção e, no fim do século XX, era de 1.280 metros.
No cume do Vesúvio há uma grande cratera de 600 metros de diâmetro e 300 metros de profundidade, proveniente da erupção de 1944. Uma escarpa semicircular, o monte Somma, envolve o cone principal do vulcão pelo lado norte, a partir dos 1.057 metros de altura. Entre as duas elevações encontra-se o vale do Gigante.

Constituição do vulcão Vesúvio


Segundo o célebre vulcanólogo francês, Alfred Lacroix, o Vesúvio é designado Vulcano-estromboliano porque umas vezes existem explosões com grande produção de cinzas e lava espessa (do tipo vulcaniano), e outras vezes eclodem com magma fluido, poucas cinzas, mas muitos gases explosivos, projetando materiais sólidos (do tipo estromboliano). Segundo outro vulcanólogo, Alwin Scarth, o Vesúvio é Pliniano, porque a sua lava é muito fragmentada e espalha-se por uma grande área, atingindo grande espessura, podendo exceder os 100 km³ de volume. A coluna de gases e cinzas pode ter alguns quilômetros de altura.

Erupções mais importantes da sua história


O Vesúvio surgiu no pleistoceno, provavelmente há menos de 200.000 anos. Esteve adormecido durante séculos até a violenta erupção do ano 79 d.C., que sepultou Pompéia, Herculano e Estábias (ou Estábia), soterradas sob lapilli (fragmentos de lava) e cinzas vulcânicas que formaram uma camada de seis a sete metros de espessura. Em 79 d.C., as erupções foram tão grandes que toda a Europa do sul esteve coberta por cinzas.
A partir de então, registraram-se diversas erupções graves (em 472, 512 e 1036, pelo menos).
Seguiu-se longo período de latência, quando florestas cresceram na cratera, de solo muito fértil e três lagos deram de beber aos rebanhos que pastavam por ali.
Terremotos precederam uma nova erupção grave, em 1631. Nesse ano, em nova e tremenda demonstração de seu poder destruidor, arrasou a maior parte das localidades existentes à sua volta, matando mais de 3.000 pessoas e levando um rio de lava até o mar. Nessa erupção, suas cinzas atingiram Constantinopla (agora chamada de Istambul, na Turquia), a mais de 1.609 quilômetros de distância, como também já ocorrera com a erupção de 472.
Erupções mais recentes ocorreram em 1682, 1685, 1689, 1694, 1707, 1737, 1760, 1767, 1779, 1794, 1804, 1805, 1822, 1850, 1855, 1861, 1871, 1872, 1875, 1891, 1895, 1899, 1900, 1903, 1904, 1906, 1913, 1926, 1929 e 1944. Não houve mais nenhuma erupção desde 1944.

O Vesúvio é um perigoso e mortífero vulcão. Sua erupção no ano de 1631 matou cerca de 3.500 pessoas. Sua última manifestação, em 1944, parece ter encerrado um ciclo eruptivo iniciado em 1631, e causou sérios danos a Nápoles e cidades vizinhas. Atualmente, as autoridades temem uma inesperada erupção e estão constantemente em alerta. Tudo indica que a cratera esteja novamente obliterada por um tampão de lava solidificada e que, como em 79 d.C., haja uma explosão lançando aos ares esse tampão.
Estima-se que numa erupção de proporções moderadas, uma área de 7 km de raio em torno do vulcão, poderá ser destruída. Atualmente, um milhão de pessoas vivem nesta área. A antiga Pompéia dista cerca de 8 km da cratera.

Contrariamente à visão do Vesúvio como mortífero, certo achado em escavações permite compreender a idéia que os pompeianos faziam da montanha: na chamada Casa do Centenário (região IX, insulas 8-5), no alojamento dos escravos, um larário (nicho ou capela para os deuses lares) representa Baco em primeiro plano, o corpo coberto por um cacho gigante de uvas, com seu tirso e uma pantera, tendo por trás de si um monte coberto de vinhedos (o Vesúvio?).
Longe de possuir uma reputação perigosa essa montanha parece, ao contrário, ser a morada do deus, por excelência, das festas e da prosperidade!

Considerado o período de 1631 a 1944, os estágios eruptivos do Vesúvio variaram de seis meses a quase 31 anos; os períodos de latência, de 18 meses a sete anos e meio. Durante esse período de quase quatro séculos, a atividade do vulcão tornou-se cíclica, com estágios de repouso durante os quais a boca do vulcão fica obstruída.
O Vesúvio é o único vulcão do continente europeu que há quase 19 séculos manifesta atividade regular.

Histórico

Pompéia (em latim, Pompeii), antiga cidade da Campânia, no sul da Itália, situa-se a 23km a sudoeste de Nápoles. Fundada pelos oscos, caiu sob domínio grego no século VIII a.C. e foi ocupada pelos etruscos no século VII a.C. Invadida pelos samnitas no final do século V a.C., aliou-se a Roma no século III a.C. A cidade participou da guerra civil do século I a.C. e converteu-se em colônia romana. O historiador Tácito relata a eclosão de uma revolta popular no ano 59 da era cristã. Três anos depois, um terremoto danificou os edifícios pompeianos e, em 24 de agosto de 79, violenta erupção do Vesúvio soterrou-a. Dos vinte mil habitantes, morreram dois mil.

Herculano (em latim, Herculaneum) situa-se a oito quilômetros a sudeste de Nápoles, em parte sob os alicerces da atual localidade de Resina, o que praticamente impossibilitou o acesso às ruínas. Sua história, paralela à de Pompéia, interrompeu-se em consequência da mesma erupção.

Estábia ou Estábias (em latim, Stabiae), situada no extremo oriental do golfo de Nápoles, foi também arrasada pela erupção do Vesúvio. As pinturas murais encontradas aí são comparáveis às de Pompéia e Herculano. Essa pequena localidade passou à história, porque entre as suas vítimas fatais na erupção do Vesúvio em 79 d.C. estava o naturalista Plínio, o Velho, comandante da esquadra romana.

A morte trágica do republicano brasileiro Antônio da Silva Jardim (1860-1891)

Com apenas 28 anos, advogado do fôro santista, Silva Jardim, depois de um discurso inflamado em Santos, transformou-se no orador mais solicitado na campanha republicana. Seu discurso foi transcrito em jornais republicanos de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Pernambuco. O evento de Santos repercutiu em todo o País e não só modificou o panorama da campanha republicana, como também transformou a vida do jovem advogado em defensor da grande causa pública.

Após rodar por várias cidades com seus discursos, Jardim acabou sendo mero espectador da Proclamação da República. E nesta condição acabou mantido pelos executores do golpe que derrubou a Monarquia, os quais não se sentiam comprometidos com os líderes civis que haviam preparado o momento histórico. Silva Jardim, que se afastara do Partido Republicano por exigir participação mais popular e direta na campanha, foi deixado de lado no processo. Magoado, retirou-se da vida política e rumou para a Europa, onde passou a aprofundar-se no estudo do Direito.

Num de seus passeios pelo Velho Continente, no dia 1º de julho de 1891, seguiu até Nápoles, na companhia de Carneiro de Mendonça, um velho amigo. Lá, decidiram conhecer de perto o temido Vulcão Vesúvio. Quando estavam no cume, sentiram um tremor no solo. O chão fendeu-se por trás de Silva Jardim, tragando-o para a cratera fumegante do vulcão. Mendonça não pôde fazer nada. Só conseguiu escapar para contar a história.

A erupção de 79 d.C. e a morte de Plínio, o Velho (23-79 d.C.)

Caio Plinio Segundo (em latim, Gaius Plinius Secundus), dito Plínio, o Velho — para distingui-lo do sobrinho Caio Plinio Cecílio, dito Plínio, o Moço ou Jovem (61-114 d.C.) —foi historiador, cientista, gramático, talvez o maior erudito da idade imperial romana. Nasceu em Como, foi educado em Roma e entrou na carreira equestre no meado do século I d.C. comandando por muito tempo um esquadrão de cavalaria na região do rio Reno - Alemanha. No ano 58 voltou para a Itália dedicando-se aos estudos da retórica e gramática. Ocupou importantes cargos públicos no tempo dos imperadores Vespasiano e Tito.
A obra mais importante de Plinio, o Velho, que nos chegou completa, é a "Naturalis Historia", que inicia com uma dedicatória a Tito, que regia, na época, o império junto ao pai Vespasiano, assim disposta:
- um índice e a lista das fontes bibliográficas (livro I);
- tratados sobre a Astronomia e a Geografia (livros II – VI);
- tratados sobre o Homem e os outros animais (livros VII – XI);
- tratado sobre a Botânica (livros XII – XIX);
- tratado sobre a Medicina (livros XX – XXXII);
- tratado sobre os metais e as pedras e de seus usos na medicina, a arte e a arquitetura (livros XXXIII – XXXVII).
Misturando as experiências pessoais e as testemunhas de fontes antigas, utilizando um estilo afetado e, às vezes, tortuoso, Plínio, o Velho nos dá, além de inúmeras e preciosas notícias sobre o conhecimento científico daquele tempo, constituindo um exemplo único do profundo humanismo e da vastidão de interesses da cultura latina do século I.
Ao falecer — final de agosto do ano 79 d.C. — durante a famosa erupção do Vesúvio, comandava a frota do Capo Misena (nos arredores de Nápoles). Sua trágica morte nos foi narrada, em riqueza de detalhes, numa carta do sobrinho, Plínio, o Moço (61-113 d.C.) ao historiador romano Tácito (55-120 d.C.).

A erupção do Vesúvio em 79 d.C. não era esperada por ninguém, pois a última erupção tinha tido lugar antes de Pompéia ter começado a existir, no séc. VII a. C, de acordo com alguns cientistas, ou muito antes, segundo outros.
Quando o longo sono do vulcão terminou naquele dia 24 de agosto, a explosão foi espetacular, como se verifica quer através da análise dos materiais lançados pelo vulcão quer pela leitura de dois documentos absolutamente extraordinários, as duas cartas de Plínio, o Jovem, que descrevem as diferentes fases da erupção.

Há 1930 anos atrás, Pompéia sucumbiu entre a tarde do dia 24 e a manhã do dia 25 de agosto, do ano 79 d. C. De forma imprevista, no dia 24 o Vesúvio lançou uma enorme quantidade de lapilli, lava e gás venenoso que destruiriam para sempre a cidade, juntamente com Herculano e Estábia.
Ainda que pareça estranho, o acontecimento colheu desprevenidos os habitantes de Pompéia. Eles sabiam que viviam numa zona sísmica: 17 anos antes, em 62 d. C., um forte terremoto tinha provocado o desabamento e danificado muitos edifícios que em 79 d.C. estavam ainda ou fechados ou a ser restaurados. Nos anos subsequentes, outros tremores de terra teriam provavelmente ocorrido na região, provocando outros danos tais como os de 62 d.C., os quais eram ainda visíveis no momento da erupção. Nesta data de fato a colunata da Basílica continuava por terra e dos edifícios termais só estava aberto ao público a seção masculina das termas do Foro; dos três edifícios dedicados a espectáculos só o anfiteatro, a Palestra Grande, estava em via de restauro. Os terremotos, em suma, eram uma calamidade anunciada.

A carta de Plínio, o Jovem a Tácito

Abaixo apresento a minha tradução para a célebre carta de Plínio, o Jovem ao escritor Tácito, narrando as circunstâncias em que morreu seu tio Plínio, o Velho.
Esse documento impressionante e cientificamente relevante é uma das principais fontes primárias para o perfeito entendimento de cientistas e historiadores dos acontecimentos naquele fatídico 24 de agosto do ano 79 d.C. Esta descrição de Plínio, o Jovem passou a ser utilizada pelos vulcanólogos para compreender as várias fases da erupção, juntamente com a análise do restante material vulcânico.
Nesta 1ª carta a Tácito (Epístola VI, 16) — há outra (Epístola VI,20) — Plínio, o Jovem descreve o “pinheiro” vulcânico, identificado com a fase eruptiva que os vulcanólogos chamam de “pliniana”, caracterizada pela emissão de um jato de cinza e gás que se ergue no ar formando uma enorme coluna magmática. Esta coluna tomba no chão sob a forma de pedras-pomes, como o confirmam Plínio, o Jovem e a sequência de estratos encontrados em Pompéia. O tamanho das pedras vai aumentando com o avanço da erupção. Isto significa que a energia vai aumentando com o tempo e a coluna aumenta em força de expulsão e em tamanho. Como o vento soprava, por ocasião daquela referida erupção, para sudeste, a coluna caiu sobretudo sobre as encostas oriental e meridional do Vesúvio e atingiu Pompéia, Herculano e Estábia. Esta fase durou cerca de doze horas e depois as condições da erupção mudaram drasticamente.

O escritor dessa missiva era um jovem de dezessete anos quando ocorreu a erupção do Vesúvio. Instado pelo grande historiador romano Tácito, escreveu a referida carta, a saber:

C. Plinii Caecilii secundi epistolarum liber sextus (Epistolae VI, 16)


Caius Plinius Tacito suo s.
1 Petis ut tibi avunculi mei exitum scribam, quo verius tradere posteris possis. Gratias ago; nam video morti eius si celebretur a te immortalem gloriam esse propositam.
2 Quamvis enim pulcherrimarum clade terrarum, ut populi ut urbes memorabili casu, quasi semper victurus occiderit, quamvis ipse plurima opera et mansura condiderit, multum tamen perpetuitati eius scriptorum tuorum aeternitas addet.
3 Equidem beatos puto, quibus deorum munere datum est aut facere scribenda aut scribere legenda, beatissimos vero quibus utrumque. Horum in numero avunculus meus et suis libris et tuis erit. Quo libentius suscipio, deposco etiam quod iniungis.
4 Erat Miseni classemque imperio praesens regebat. Nonum Kal. Septembres hora fere septima mater mea indicat ei apparere nubem inusitata et magnitudine et specie.
5 Usus ille sole, mox frigida, gustaverat iacens studebatque; poscit soleas, ascendit locum ex quo maxime miraculum illud conspici poterat. Nubes — incertum procul intuentibus ex quo monte; Vesuvium fuisse postea cognitum est — oriebatur, cuius similitudinem et formam non alia magis arbor quam pinus expresserit.
6 Nam longissimo velut trunco elata in altum quibusdam ramis diffundebatur, credo quia recenti spiritu evecta, dein senescente eo destituta aut etiam pondere suo victa in latitudinem vanescebat, candida interdum, interdum sordida et maculosa prout terram cineremve sustulerat.
7 Magnum propiusque noscendum ut eruditissimo viro visum. Iubet liburnicam aptari; mihi si venire una vellem facit copiam; respondi studere me malle, et forte ipse quod scriberem dederat.
8 Egrediebatur domo; accipit codicillos Rectinae Tasci imminenti periculo exterritae — nam villa eius subiacebat, nec ulla nisi navibus fuga -: ut se tanto discrimini eriperet orabat.
9 Vertit ille consilium et quod studioso animo incohaverat obit maximo. Deducit quadriremes, ascendit ipse non Rectinae modo sed multis — erat enim frequens amoenitas orae — laturus auxilium.
10 Properat illuc unde alii fugiunt, rectumque cursum recta gubernacula in periculum tenet adeo solutus metu, ut omnes illius mali motus omnes figuras ut deprenderat oculis dictaret enotaretque.
11 Iam navibus cinis incidebat, quo propius accederent, calidior et densior; iam pumices etiam nigrique et ambusti et fracti igne lapides; iam vadum subitum ruinaque montis litora obstantia. Cunctatus paulum an retro flecteret, mox gubernatori ut ita faceret monenti 'Fortes' inquit 'fortuna iuvat: Pomponianum pete.' 12 Stabiis erat diremptus sinu medio — nam sensim circumactis curvatisque litoribus mare infunditur -; ibi quamquam nondum periculo appropinquante, conspicuo tamen et cum cresceret proximo, sarcinas contulerat in naves, certus fugae si contrarius ventus resedisset. Quo tunc avunculus meus secundissimo invectus, complectitur trepidantem consolatur hortatur, utque timorem eius sua securitate leniret, deferri in balineum iubet; lotus accubat cenat, aut hilaris aut — quod aeque magnum — similis hilari.
13 Interim e Vesuvio monte pluribus locis latissimae flammae altaque incendia relucebant, quorum fulgor et claritas tenebris noctis excitabatur. Ille agrestium trepidatione ignes relictos desertasque villas per solitudinem ardere in remedium formidinis dictitabat. Tum se quieti dedit et quievit verissimo quidem somno; nam meatus animae, qui illi propter amplitudinem corporis gravior et sonantior erat, ab iis qui limini obversabantur audiebatur.
14 Sed area ex qua diaeta adibatur ita iam cinere mixtisque pumicibus oppleta surrexerat, ut si longior in cubiculo mora, exitus negaretur. Excitatus procedit, seque Pomponiano ceterisque qui pervigilaverant reddit.
15 In commune consultant, intra tecta subsistant an in aperto vagentur. Nam crebris vastisque tremoribus tecta nutabant, et quasi emota sedibus suis nunc huc nunc illuc abire aut referri videbantur.
16 Sub dio rursus quamquam levium exesorumque pumicum casus metuebatur, quod tamen periculorum collatio elegit; et apud illum quidem ratio rationem, apud alios timorem timor vicit. Cervicalia capitibus imposita linteis constringunt; id munimentum adversus incidentia fuit.
17 Iam dies alibi, illic nox omnibus noctibus nigrior densiorque; quam tamen faces multae variaque lumina solvebant. Placuit egredi in litus, et ex proximo adspicere, ecquid iam mare admitteret; quod adhuc vastum et adversum permanebat.
18 Ibi super abiectum linteum recubans semel atque iterum frigidam aquam poposcit hausitque. Deinde flammae flammarumque praenuntius odor sulpuris alios in fugam vertunt, excitant illum.
19 Innitens servolis duobus assurrexit et statim concidit, ut ego colligo, crassiore caligine spiritu obstructo, clausoque stomacho qui illi natura invalidus et angustus et frequenter aestuans erat.
20 Ubi dies redditus — is ab eo quem novissime viderat tertius -, corpus inventum integrum illaesum opertumque ut fuerat indutus: habitus corporis quiescenti quam defuncto similior.
21 Interim Miseni ego et mater — sed nihil ad historiam, nec tu aliud quam de exitu eius scire voluisti. Finem ergo faciam.
22 Unum adiciam, omnia me quibus interfueram quaeque statim, cum maxime vera memorantur, audieram, persecutum. Tu potissima excerpes; aliud est enim epistulam aliud historiam, aliud amico aliud omnibus scribere. Vale.


Livro sexto das cartas de Caio Plínio Cecílio Segundo (Cartas VI, 16)

Caio Plínio ao seu (amigo) Tácito, saúde!
1 Pedes para eu descrever a morte de meu tio, de modo que possas dirigir-te aos pósteros com mais veracidade. Agradeço(-te): pois eu vejo que uma glória imortal poderá ser garantida à morte dele, se for celebrada por ti.
2 Pois, ainda que ele tenha morrido num desastre que assolou uma belíssima região, sucumbindo em meio à destruição de povos e cidades, vítima duma catástrofe que lhe eternizará a memória; ainda que ele tenha redigido diversas obras que deverão permanecer, a imortalidade dos teus escritos muito acrescentará à dele.
3 Sem dúvida, felizes os homens a quem coube, por graça dos Deuses, fazer coisas que foram escritas, ou escrevê-las dignas de serem lidas; porém, mais felizes ainda são aqueles a quem concederam tanto um quanto outro. Meu tio estará no número destes últimos já pelos seus, já pelos teus escritos. Pelo que com o maior prazer assumo, — (antes) até reivindico — o que me impões.
4 Por essa ocasião, ele se achava em Misena e comandava a tropa. No vigésimo quarto dia de agosto, aproximadamente a uma hora da tarde, minha mãe mostrou-lhe ter aparecido uma nuvem com inusitado tamanho e aparência.
5 Tendo tomado sol, depois banho frio, tomara a refeição e descansava no leito enquanto estudava; pedindo as sandálias, subiu a um lugar donde aquele prodígio pudesse ser bem contemplado. De um monte difícil de identificar, dada a distância (soube-se depois que era o Vesúvio) elevava-se uma nuvem, que se assemelhava na forma a uma árvore e, mais particularmente, a um pinheiro.
6 Por isso é que se elevando para o céu como um tronco imenso, dilatava-se em alguns ramos. Imagino que a nuvem, elevada por um vento novo, em seguida abandonada pelo vento que se enfraquecia, ou mesmo vencida por seu próprio peso(=gravidade), se dissipou latitudinalmente: às vezes branca, às vezes sombria e suja, conforme levantava terra ou cinza.
7 Pareceu ao eruditíssimo homem(=meu tio) que este grande prodígio fosse estudado mais de perto. Manda que seja preparada uma liburna (=navio ligeiro). Dá-me a oportunidade de acompanhá-lo, se eu quisesse vir; respondi que preferia estudar, e por acaso ele mesmo me dera algo para escrever.
8 Ele saiu de casa; recebeu um bilhete de Rectina, mulher de Cascus, assustada pelo perigo ameaçador, pois a residência dela se achava sob o vulcão, não existindo nenhuma fuga a não ser com embarcações: pedia que ele a tirasse de perigo tão grave.
9 Ele muda sua deliberação, e afronta com máxima coragem o que empreendera por amor ao estudo. Lança quadrirremes ao mar, sobe ele mesmo, decidido a levar auxílio não somente a Rectina, mas também a muitas outras pessoas (com efeito, o encanto da beira-mar fazia com que fosse povoada).
10 Apressa-se (dirigindo-se) para o lugar donde outros fogem, mantém-se em linha reta e no leme direto para o perigo, tão desligado de medo a ponto de ditar e anotar todas as fases e todos os aspectos (desta catástrofe) que flagra com os olhos.
11 Ora caíam cinzas sobre os navios, de forma mais quente e mais densa, à medida que eles se aproximavam (do sítio); ora caíam mesmo pedras-pomes negras e pedras tanto carbonizadas quanto despedaçadas pelo fogo; ora parecem agitar-se o fundo do mar, o inesperado e os escombros do monte impedidos pela praia. Um pouco hesitante se devia retornar, em seguida instruiu ao seu piloto que fizesse assim: "A sorte favorece os audazes; dirige-te para (a villa de) Pompônio". 12 Ele(=Pompônio) estava em Estábias, separado pela metade do golfo (pois o mar se verte sobre si mesmo nas costas recurvadas). Então, embora o perigo ainda não estivesse iminente, entretanto era visível e, como crescesse, próximo, (Pompônio) fizera embarcar as bagagens nos navios, certo de partir se o vento contrário amainasse; por isso, meu tio, arrastado por esse (mesmo) vento muito favorável, abraça seu amigo que tremia, consola-o, encoraja-o e, para acalmar o medo de seu amigo com a sua tranquilidade, pede para ser levado ao banho; lavado, (meu tio) deita-se à mesa, janta ou alegre ou então (o que é igualmente corajoso) parecendo alegre.
13 Neste ínterim, em muitos locais do monte Vesúvio reluziam chamas muito amplas e elevados incêndios, cujo brilho e claridade eram avivados pelas trevas da noite. Ele, para curá-los do espantalho, repetia que os fogos tinham sido abandonados por temor dos camponeses e que eram villas desertas que queimavam por abandono. Então pôs-se em repouso e na verdade repousou em sono profundo, pois era ouvida, por aqueles que eram observados na soleira da porta, a respiração (=passagem do sopro) que ele possuía mais grave e mais sonora por causa da dimensão de seu corpo.
14 Mas o pátio, donde se tinha acesso ao quarto, já se elevava repleto de cinza misturada com pedras-pomes, de tal forma que, se a demora no quarto fosse maior, ser-lhe-ia negada a saída. Tendo sido acordado, sai e se volta para Pompônio e outros que estavam de guarda.
15 Eles deliberam em comum se devem ficar abrigados nas casas ou vaguear a descoberto. Com efeito, as casas oscilavam pelos tremores repetitivos e colossais e agora pareciam ora ir para lá ou ora vir para cá, como abaladas de suas fundações.
16 A céu aberto, em compensação, temia-se a queda de pedras-pomes, embora fossem leves e corroídas; o que, no entanto, a comparação dos perigos elegeu (= fez escolher esta última opção). No seu caso (do meu tio), na verdade, a razão venceu a razão, enquanto, no caso dos outros, o medo venceu o medo. Com tecidos de linho ataram travesseiros colocados sobre as cabeças; isso foi uma proteção contra o que caía.
17 Em outro lugar já era dia, aqui mais negra e densa do que todas as noites era a noite, que, contudo, muitas tochas e diversas luzes abrandavam. Aprouve(-lhes) sair para a praia e olhar de perto se o mar (os) acolhia já, o qual até aqui permanecia colossal e contrário.
18 Aí, deitando-se (meu tio) sobre um lençol estendido, pediu água fria e dela tomou dois goles. Depois, as chamas e um cheiro de enxofre que as prenunciam põem os outros em fuga e o fazem levantar.
19 Apoiando-se em dois escravos, ele se levantou e incontinenti caiu morto; deduzo que a sua respiração foi obstruída por uma caligem densíssima e a sua glote se cerrou. Ele possuía uma natureza frágil, delicada e frequentemente sufocada.
20 Quando o dia retornou (este era o terceiro desde aquele que ele tinha visto ultimamente), seu corpo foi encontrado íntegro, ileso e coberto da forma como estivera vestido; o aspecto do seu corpo era mais parecido com alguém que descansa do que com um defunto.
21 Neste ínterim, eu estava em Misena e minha mãe ... mas para tua narrativa não quiseste saber nada nem outra coisa do que a respeito de sua morte. Então concluirei.
22 Acrescentarei uma coisa: que eu expus minuciosamente tudo o que presenciara e que ouvira, cada coisa sem recuar, quando principalmente as coisas verdadeiras são lembradas. Tu escolherás os excertos mais importantes; pois, uma coisa é escrever uma carta a um amigo, outra coisa é escrever uma narrativa a todo o mundo. Adeus!

Blogs consultados:
pt.wikipedia.org/wiki/Vesúvio,
www.ihgs.com.br/materias/novembro/silvajardim/silva.html, www.italiamiga.com.br/artecultura/artigos/plinio_il_vecchio.htm,
http://antesdetempo.blogspot.com/2004/08/h-1925-anos-pompeia-pompeia-morre.html



* Francisco José dos Santos Braga, cidadão são-joanense, tem Bacharelado em Letras (Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras, atual UFSJ) e Composição Musical (UnB), bem como Mestrado em Administração (EAESP-FGV). Além de escrever artigos para revistas e jornais, é autor de dois livros e traduziu vários livros na área de Administração Financeira. Participa ativamente de instituições no País e no exterior, como Membro, cabendo destacar as seguintes: Académie Internationale de Lutèce (Paris), Familia Sancti Hieronymi (Clearwater, Flórida), SBME-Sociedade Brasileira de Música Eletroacústica (2º Tesoureiro), CBG-Colégio Brasileiro de Genealogia (Rio de Janeiro), Academia de Letras e Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei-MG, Instituto Histórico e Geográfico de Campanha-MG, Academia Valenciana de Letras e Instituto Cultural Visconde do Rio Preto de Valença-RJ e Fundação Oscar Araripe em Tiradentes-MG. Possui o Blog do Braga (www.bragamusician.blogspot.com), um locus de abordagem de temas musicais, literários, literomusicais, históricos e genealógicos, dedicado, entre outras coisas, ao resgate da memória e à defesa do nosso patrimônio histórico.Mais...

23 comentários:

liliana guerra disse...

Desde já, obrigada por este texto elucidativo, ajudou-me a compreender a erupção de 79. Não encontrava as cartas de plínio, o moço, traduzidas.

obrigada

Anônimo disse...

Legal
Me ajudou bastante na escola

Anônimo disse...



Prezado mano,

Belíssima postagem a respeito
tanto da história do Vesúvio
quanto da belíssima carta de
Plínio,o Novo a respeito de
seu tio(?) Plínio, o Velho.
Excelente tradução permeada por
magnífica história.
Parabéns,

Rafael Braga

Rafael dos Santos Braga (filósofo) disse...

Belíssima! Postei meu comentário. Bjs e que estejam desfrutando dos prazeres da Itália,

Rafael

Hélio Petrus (escultor-poeta marianense) disse...

Prezados amigos Rute e Francisco Braga:

QUE PASSEIO DELIRANTE,
PELAS RUAS DE POMPÉIA:
SOU UM CAVALEIRO ANDANTE
PRA FAZER QUALQUER IDEIA!...

ESSE SEU DEPOIMENTO,
RECHEADO DE CULTURA:
TROUXE POMPÉIA, EM LAMENTO,
PARA A GERAÇÃO FUTURA!

(Com saudade dos amigos: Helio Petrus).

Augusto Ambrósio Fidelis (poeta, escritor e presidente da Academia Divinopolitana de Letras) disse...

Parabéns, caríssimo Braga, pelo artigo sobre Pompeia. Ao lê-lo, vi-me caminhando pelas ruas da cidade. Parabéns!

Abraço

Augusto Fidelis

Luzia Rachel dos Santos Braga (antropósofa, arquiteta e pianista) disse...

24 a 26 de agosto! 1935 anos atrás...deve ter sido bem trágico, mto, mto triste. Temos um livro romance mto bom para jovens: "Milon e o Leão", é passado em Pompeia, na época da erupção do Vesúvio.
Obrigada pelas boas informações. Vale para uma futura ida a Pompeia! Deve ser realmente mto bela.
Bjs, Luzia

Prof. Ulisses Passarelli (folclorista, escritor, gerente/redator do Blog Tradições Populares das Vertentes e Membro da Academia de Letras de São João del-Rei) disse...

Ótimo, muito obrigado. Sempre nos mantendo informados sobre as maravilhas culturais!
Abç. UP.

Prof. Oscar Malvessi (Professor de Finanças Corporativas na EAESP, Coordenador do Núcleo de Value Based Management no Instituto de Finanças da FGV-EAESP e Coordenador/Professor do curso de Fusões & Aquisições no PEC-FGV) disse...

Grande, valeu,
Estou aguardando aquela tua visita na minha casa e ver a minha família.
Saúde e aquele abração
sds

Oscar Malvessi

Eudóxia de Barros (pianista e Membro da Academia Brasileira de Música) disse...

Muito obrigada, vou guardar , abs.,

Eudóxia.

Éderson Bustamante (Diretor-Presidente do CREA Cultural em Minas Gerais) disse...

Obrigado Prof. Braga pelas informações sempre preciosas e interessantes. Espero que aproveitem bastante a viagem. Abraços. Bustamante.

Katia De Martino (amiga residente em Nápoles) disse...

Ciao Francesco e Rute,
Sono felice della vostra mail! Se vi fa piacere sabato vi vengo a prendere all hotel e vi porto in giro x Napoli! Mi potete chiamare al (...) o mandare una mail con il nome e l indirizzo dell hotel dove alloggiate!
Spero che ci vediamo
Un bacio
Katia

Carlos Sérgio Viana disse...

Carlos Sérgio Viana, 27 de Agosto de 2015
Sensacional! Excelente contribuição ao conhecimento de um evento tão significativo da História.

Francisco José dos Santos Braga (compositor, pianista, escritor, gerente do Blog do Braga e do Blog de São João del-Rei) disse...

Tenho o prazer de convidá-l@ para a inauguração da exposição UMA VIAGEM AO MUNDO ANTIGO: EGITO E POMPEIA, nas fotografias da Coleção D. Thereza Christina Maria no dia 30 de outubro de 2017, às 18h 30min, no Espaço Cultural Eliseu Visconti da Fundação Biblioteca Nacional [rua México, Centro, Rio de Janeiro]. Será uma centena das fotografias acumuladas por d. Pedro II, além de algumas estampas.

Na parte da exposição dedicada a Pompeia, serão utilizados dois breves trechos da minha tradução da Carta de Plínio o Jovem a Tácito, que o curador Sr. Joaquim Marçal Ferreira de Andrade encontrou no meu Blog do Braga. Esses trechos serão aplicados na parede da galeria, logo acima de duas grandes vitrines contendo obras iconográficas sobre Pompeia - com os devidos créditos.
Link: http://bragamusician.blogspot.com.br/2010/01/destruicao-de-pompeia-pelo-vulcao.html

E se o distinto curador vier a produzir um catálogo, para ser lançado mais à frente, acho que seria conveniente adquiri-lo também. Será uma raridade que não se deve perder.

Boa diversão!

Elisa Freixo (organista) disse...

Que interessante..

Obrigada!

Dr. Mário Pellegrini Cupello (escritor, pesquisador, presidente do Instituto Cultural Visconde do Rio Preto de Valença-RJ, e sócio correspondente do IHG e Academia de Letras de São João del-Rei) disse...

Caro amigo Braga

Fiquei feliz em receber o seu anexo, especialmente por falar em Pompéia, uma cidade que muito me impressionou, não só pela tragédia que lá aconteceu, como pela visão dos corpos de seus habitantes, consumidos pelo calor das cinzas.

Compulsei, rapidamente, os textos do seu blog, como sempre muito interessantes: a seguir farei uma leitura mais detalhada.

Mais uma vez, agradeço pelas constantes atenções do ilustre amigo, através no envio de temas de grande interesse.

Abraços.

Sílvio Firmo do Nascimento (escritor, editor da revista SABERES INTERDISCIPLINARES (periódico semestral multidisciplinar da UNIPTAN-Instituto de Ensino Superior Presidente Tancredo Almeida Neves), colaborador da AMEF-Academia Mantiqueira de Estudos Filosóficos de Barbacena e membro da Academia de Letras de São João del-Rei) disse...

Gratidão pelo convite. Bom êxito no evento.
Abraço.

João Carlos Ramos (poeta, escritor, membro efetivo da Academia Divinopolitana de Letras e sócio correspondente da Academia de Letras de São João del-Rei e da Academia Lavrense de Letras) disse...

A preciosidade veio em boa hora.
Parabéns!
Obrigado!

Consulado Honorário da Grécia no RJ disse...

Prezado Senhor Francisco,

Agradeço imensamente o seu convite e aproveito a oportunidade para parabeniza-lo pelo trabalho nos trechos traduzidos da Carta de Plínio o Jovem a Tácito.

ATT
Selma

Prof. Fernando de Oliveira Teixeira (professor universitário, escritor, poeta e presidente da Academia Divinopolitana de Letras) disse...

MUITO AGRADECIDO PELO ENVIO, AMIGO BRAGA. ABRAÇO.

Alan Elias da Silva (ex-comandante do 38º BPM de São João del-Rei) disse...

Parabéns meu amigo.
Continuado sucesso com as bênçãos de Deus.
Abraços.

Prof. Cupertino Santos (professor de história aposentado de uma escola municipal em Campinas) disse...

Olá, professor Braga.
Ótimo texto sobre Pompéia e a tradução do documento clássico. Quanto a essa rara coleção de Pedro II já a conhecia. Foi exposta há uns dez anos ou mais no antigo Banco Santos. Parabéns pela participação.
Obrigado.
Abraços.

Dr. Bruno Cherfên Peixoto (dentista e ex-presidente da Associação Brasileira de Odontologia Regional de São João del-Rei)) disse...

Um texto elucidativo e cuidadosamente escrito por alguém que realmente estudou o assunto!
Parabéns, meu amigo Francisco!