Por Francisco José dos Santos Braga
No ano de 2009, comemoraram-se não só 100 anos do Ginásio Santo Antônio, mas também 105 anos da presença franciscana em São João del-Rei.
Como parte das comemorações, o ex-aluno Murilo Geraldo de Souza Cabral decidiu organizar um encontro de ex-alunos na residência de seu cunhado, Dante José de Araújo, também um ex-aluno do Ginásio Santo Antônio.
Em 30 de dezembro de 2009, na Rua Maestro Batista Lopes, nº 345, em São João del-Rei, realizou-se portanto o referido encontro com os seguintes ex-alunos e algumas esposas presentes:
Murilo Geraldo de Souza Cabral, Dante José de Araújo e esposa Maria Aparecida Cabral de Araújo, Dr. Paulo César de Araújo Rangel, Attila Carvalho Godoy, Nelson Arantes, Luiz Antônio Ferreira, Antônio Santana Filho, Dr. Wainer de Carvalho Ávila e esposa Regina Maria Oliveira Faria de Carvalho Ávila, Abgar Antônio Campos Tirado, Dr. José de Carvalho Teixeira, o autor deste artigo e esposa Rute Pardini.
Murilo Cabral tomou a palavra, saudando todos os presentes na co-memoração dos 100 anos do Ginásio Santo Antônio.
A seguir, todos se sentaram a uma mesa comprida, repleta de iguarias, vinho, cerveja e refrigerantes, enquanto se punham a re-lembrar fatos e eventos que marcaram os tempos dourados do Colégio Santo Antônio, antes de sua transferência para Belo Horizonte em 1971. Cada um re-memorava com emoção sua época de ginasiano, procurando eventuais pontos de contato com os outros conhecidos.
Dante, Wainer e Murilo foram colegas em todas as séries do Curso Ginasial e Científico do Ginásio. Referindo-se a fatos curiosos ocorridos nessa época em questão, Dante narrou dois casos de que se recordava, envolvendo Frei Beno van Buijtenen, professor de Biologia.
O primeiro caso se passou assim:
Em determinado dia, Frei Beno entrou na sala de aula para mais uma de suas preleções.
A turma se calou diante da solenidade de sua entrada. O frei, sisudo, anunciou prova para a próxima semana.
Os meninos entram em pânico diante da péssima notícia e, preocupados, pedem ao professor algumas dicas do que iria cair na prova.
“ Peguem o livro de Biologia. Abram o livro. Capítulo I: página 5 à página 12. Capítulo II: página 18 à página 23.” E assim por diante, capítulo a capítulo do livro até chegar ao tópico dos Invertebrados no Capítulo VII, cuja principal característica é a ausência de espinha dorsal.
“ O Capítulo VII, da página 70 a ...”
Neste momento, um dos alunos interrompe Frei Beno em sua enumeração:
“ Professor!”
Todos olham para trás e vêem o Wainer, um estudante magro e alto, procurando dar uma de entendido.
“ Professor, para facilitar o nosso estudo, eu poderia trazer alguns espécimes de invertebrados ao vivo que meu pai Evandro Ávila “Vandico” coleciona em sua fazenda.”
De fato, “Vandico” era um dos que enriquecera o Museu de História Natural.
“ Como assim, meu filho?”
“ Temos em vidros, lá em casa, lesma, caracóis, caranguejos, minhocas, aranhas, besouro, lacraia, borboleta, formiga, joaninha... Certa feita, papai chegou até a despachar para o Vaticano uma cobra coral.”
“ No seu caso, meu filho, não precisa trazer nenhum vidro: é só trazer seu espelhinho.”
No segundo caso, os alunos do Ginásio costumavam sair em desabalada carreira, ao soar do sino ao meio-dia, para dirigirem-se ao refeitório.
“ Quem chega cedo bebe água limpa”, diziam.
Tinham antes que aguardar o término da Ave Maria. O professor se persignava e rezava:
"Ave Maria, cheia de graça..."
Ao que os alunos respondiam: "Santa Maria, mãe de Deus..."
Em determinado ano, a turma de que trato tinha aulas numa espécie de anfiteatro em que as carteiras de madeira estavam dispostas sobre um estrado também de madeira. À frente e à direita do professor, entre o estrado e as janelas, havia acesso ao corredor externo através de uma porta dos fundos. Os alunos mais afobados, que se sentavam nas carteiras do fundo e, portanto, mais altas em relação ao professor, optavam por essa porta dos fundos, porque queriam evitar o caminho para a porta da frente, mais demorado devido à fila que se formava no final da aula. O caminho mais direto consistia em, lá de cima do estrado, bater com a mão direita na parede, pular para o acesso à porta dos fundos e sair correndo rumo ao refeitório.
Dois desses alunos, os maiores da classe, e também os mais ansiosos, treinaram a bater a mão na parede entre duas janelas e a cair perfeitamente em pé lá embaixo, já à porta de saída, chegando primeiro ao refeitório, seguidos pelos retardatários.
Em determinado dia, tocou a sineta. Frei Beno não rezou, nem dispensou a turma para sua ida ao refeitório. Lentamente subiu até o alto do estrado, seguido pelo olhar de todos os alunos, e caminhou até próximo à parede. Ali, parou, observando a mancha ensebada de mãos. Voltando-se para os alunos, saiu-se com esta:
“ Pelo tamanho da lambança dá para identificar os porcos do chiqueiro.”
Para aumentar ainda mais a afinidade entre os presentes, foi proposta uma projeção de fotografias que fazem parte do acervo de Luiz Antônio Ferreira, funcionário do SETEC da UFSJ-Universidade Federal de São João del-Rei. Pudemos apreciar desta forma as maravilhas registradas pelas câmeras de pessoas, que há muito nos deixaram, entusiasmadas com o brilho que viam e que julgavam digno de também ser visto pelos pósteros. Durante a projeção, todos trocaram doces impressões e re-cordações. Foram especialmente bem-vindas as explicações dadas por Abgar e Luiz Antônio.
Após a projeção, Murilo Cabral comunicou a todos os presentes que naquela data estava sendo criada a Associação de Ex-alunos do Ginásio Santo Antônio e contava com a presença de todos os presentes nas próximas reuniões trimestrais. Pedia-lhes portanto para assinar um livro de presença e anotar o período em que cursaram no educandário são-joanense e todos os dados que julgassem interessantes para sua perfeita identificação.
Enquanto falava sobre a importância do Ginásio Santo Antônio para a história e cultura locais como agente de educação e local de transmissão e difusão de conhecimentos, técnicas e valores éticos, Attila Godoy pediu um aparte, que lhe foi prontamente concedido, iniciando assim a sua fala:
“Aproveito a oportunidade de estarmos aqui reunidos para expor brevemente o que penso sobre o papel que tiveram e têm importantes lideranças locais que passaram pelas carteiras das salas de aula do Ginásio Santo Antônio no destino da educação em nossa terra. Hoje nossa cidade seria impensável sem o concurso da UFSJ-Universidade Federal de São João del-Rei. Essa nossa instituição federal de ensino superior hoje mantém “campi” avançados em Ouro Branco, Divinópolis e Sete Lagoas e é uma das cinco mais bem avaliadas no Enade em 2006.
Acho que não se pode falar de UFSJ, sem antes se citarem:
1. a Fundação Universitária Municipal de São João del-Rei, instituída em 1970, tendo o seu nome corrigido para Fundação Municipal de São João del-Rei em setembro de 1973
2. a FUNREI-Fundação de Ensino Superior de São João del-Rei, instituída em 1986, resultado da federalização de duas instituições de ensino superior reunidas, a saber:
a FDB-Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras e a Fundação Municipal de São João del-Rei que então era mantenedora da FACEAC-Faculdade de Ciências Econômicas, Administrativas e Contábeis e da FAEIN-Faculdade de Engenharia Industrial. Da confiança do Dr. Milton Resende Viegas (Presidente da Fundação Municipal de São João del-Rei) e do Pe. Décio Zandonade (que assinou pela Inspetoria São João Bosco), ficou a seguinte comissão credenciada para cuidar da federalização da FUNREI:
Oyama de Alencar Ramalho, Rogério Carvalho de Godoy, José da Rocha Neto, Nilton Damásio de Paula Santos, Pe. João Duque dos Reis, Magda Mara Assis e Pe. Silvério Ivo Gomes.
A FUNREI foi em 19 de abril de 2002, durante o Governo de Fernando Henrique Cardoso, transformada em UFSJ-Universidade Federal de São João del-Rei.
Não foram poucos os são-joanenses ilustres que participaram de todo esse processo e muitos deles são egressos das carteiras do Ginásio Santo Antônio.
Muitos trabalharam de forma desinteressada, alguns dedicaram uma década de sua vida, embora seus nomes não estejam inscritos nos anais da Instituição, esquecidos nas gavetas dos departamentos, sem a possibilidade de serem re-memorados, já que não existe um órgão responsável pela custódia e manutenção da memória da Universidade.
Inesquecível na construção deste edifício são para nós sobretudo a participação do Dr. Milton Resende Viegas, do Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso, do Júlio Teixeira, do Ronaldo Simões e do Oyama de Alencar Ramalho, dentre outros.
É de lamentar que haja certas lacunas ou certos parênteses na historiografia são-joanense: alguns nomes de personalidades ilustres não podem ser citados e constituem verdadeiros “anátemas”.
Não devemos mais permitir que isso ocorra em nossa cidade.
Minha proposta é que este nosso grupo constitua uma Comissão para encaminhar o assunto da criação desse órgão junto ao Reitor Helvécio Luiz Reis. O referido órgão terá a função de reunir toda a documentação, que hoje se encontra esparsa ou inacessível, referente à Fundação Universitária Municipal (de junho de 1970 a setembro de 1973), depois Fundação Municipal (de setembro de 1973 a dezembro de 1986), depois FUNREI (de 23 de dezembro de 1986, quando o Presidente Sarney assinou a Lei 755, que criou a Fundação Federal em nossa cidade até 2002) e atualmente UFSJ (de 2002 até hoje). Meu sonho é que toda essa documentação farta esteja à disposição de professores, estudantes universitários, pesquisadores são-joanenses e de outras cidades brasileiras e de outros países interessados na história da educação de São João del-Rei, nos moldes do Centro Salesiano de Documentação e Pesquisa, o qual centraliza em Barbacena toda a documentação referente aos Salesianos. Dessa forma, será incentivada a produção de teses e livros poderão ser escritos para esses quarenta anos de ensino superior, que se originou a partir da decisão de um Provincial franciscano de doar o terreno e as benfeitorias do Ginásio Santo Antônio para o Estado de Minas Gerais.
Como vocês podem ver, a UFSJ não nasceu do nada em 2002. Há todo um envolvimento de pessoas e fatos, durante pelo menos 32 anos antes, que possibilitou à população de São João del-Rei ser beneficiada com uma Universidade Federal.”
Sua proposta foi unanimente aprovada por todos os presentes.
O Dr. Paulo César de Araújo Rangel, endossando a fala precedente, recomendou ainda que fosse encaminhada ao Reitor da UFSJ a criação de um espaço físico dentro da Universidade, a ser equipado com acervo constituído por documentação de época, bem como livros e artigos referentes tanto às instituições de ensino que precederam a Universidade quanto às pessoas que tiveram papel relevante nesse processo.
Rute Pardini, minha esposa, pediu para contar uma fábula que entendia ser de interesse para o encontro. Todos se puseram a ouvi-la:
"Conta a lenda que uma vez uma cobra começou a perseguir um vaga-lume.
Este fugia rápido no primeiro dia, com medo da feroz predadora e a cobra... nem pensar em desistir.
Fugiu outro dia e ela não desistia.
No terceiro dia, já sem forças, o vaga-lume, vendo que chegara o seu fim, parou e disse à cobra:
— Já que eu vou morrer, poderia antes lhe fazer três perguntas?
— Não costumo abrir esse precedente para ninguém, mas já que vou devorá-lo mesmo, pode perguntar...
— Dona Cobra, por acaso pertenço à sua cadeia alimentar ?
— Não.
— Eu lhe fiz algum mal algum dia?
— Não.
— Então, por que você quer acabar comigo?
— Porque não suporto o seu brilho."
A seguir, comentei sobre a evolução que sofreu a negociação, por parte do Provincial franciscano e do Estado de Minas Gerais, com referência ao destino que seria dado ao Ginásio Santo Antônio. Consta que os negociadores procuravam uma saída para o impasse: uma alternativa seria o Estado restaurar o prédio para abrigar um Colégio Estadual, sob a administração dos freis franciscanos. O resultado, contudo, foi outro: a Escola Estadual Cônego Osvaldo Lustosa foi instalada no Morro do Guarda-Mor e os freis tiveram que abandonar suas clausuras. Consta ainda que os freis contaram com o apoio financeiro de um ex-aluno interno, apelidado “Maritaca”, que era proprietário de muitos imóveis em São João del-Rei. Para o projeto arquitetônico e construção do novo convento próximo ao portão de entrada foi contratado o engenheiro José Norberto Esteves, dono da Construtora Sanjoanense.
Restam evidentes o destino e as transformações que foram dadas ao educandário são-joanense, após a referida doação ao Estado de Minas Gerais, pelos franciscanos, de um régio patrimônio, constituído por terrenos e benfeitorias, em troca de uma indenização de trezentos mil cruzeiros devida aos professores e funcionários do educandário. Se aos franciscanos devemos atribuir a glória de terem dado o melhor de si e de seus esforços para a construção da educação em São João del-Rei, maior glória ainda lhes cabe no momento histórico da transferência definitiva do Colégio Santo Antônio para Belo Horizonte, num sinal claro dos votos de pobreza que professaram, tendo feito uma negociação em que evidentemente o maior beneficiário foi a cidade de São João del-Rei (representada pelo Estado de Minas Gerais). É fato sobejamente conhecido que o Provincial da Província de Santa Cruz, Frei Erardo van Veen o.f.m., em 10 de março de 1970, fez a referida doação ao Estado de Minas Gerais, possibilitando que o prédio do ex-Ginásio Santo Antônio fosse usado pela Prefeitura de São João del-Rei para ali instalar a Fundação (Universitária) Municipal, o primeiro embrião de uma Universidade Federal.
Sem o gesto tresloucado desse Provincial, contrariando inclusive a maioria dos freis holandeses da Província, não teríamos hoje como nos orgulhar de nossa Universidade.
Como parte das comemorações, o ex-aluno Murilo Geraldo de Souza Cabral decidiu organizar um encontro de ex-alunos na residência de seu cunhado, Dante José de Araújo, também um ex-aluno do Ginásio Santo Antônio.
Em 30 de dezembro de 2009, na Rua Maestro Batista Lopes, nº 345, em São João del-Rei, realizou-se portanto o referido encontro com os seguintes ex-alunos e algumas esposas presentes:
Murilo Geraldo de Souza Cabral, Dante José de Araújo e esposa Maria Aparecida Cabral de Araújo, Dr. Paulo César de Araújo Rangel, Attila Carvalho Godoy, Nelson Arantes, Luiz Antônio Ferreira, Antônio Santana Filho, Dr. Wainer de Carvalho Ávila e esposa Regina Maria Oliveira Faria de Carvalho Ávila, Abgar Antônio Campos Tirado, Dr. José de Carvalho Teixeira, o autor deste artigo e esposa Rute Pardini.
Murilo Cabral tomou a palavra, saudando todos os presentes na co-memoração dos 100 anos do Ginásio Santo Antônio.
A seguir, todos se sentaram a uma mesa comprida, repleta de iguarias, vinho, cerveja e refrigerantes, enquanto se punham a re-lembrar fatos e eventos que marcaram os tempos dourados do Colégio Santo Antônio, antes de sua transferência para Belo Horizonte em 1971. Cada um re-memorava com emoção sua época de ginasiano, procurando eventuais pontos de contato com os outros conhecidos.
Dante, Wainer e Murilo foram colegas em todas as séries do Curso Ginasial e Científico do Ginásio. Referindo-se a fatos curiosos ocorridos nessa época em questão, Dante narrou dois casos de que se recordava, envolvendo Frei Beno van Buijtenen, professor de Biologia.
O primeiro caso se passou assim:
Em determinado dia, Frei Beno entrou na sala de aula para mais uma de suas preleções.
A turma se calou diante da solenidade de sua entrada. O frei, sisudo, anunciou prova para a próxima semana.
Os meninos entram em pânico diante da péssima notícia e, preocupados, pedem ao professor algumas dicas do que iria cair na prova.
“ Peguem o livro de Biologia. Abram o livro. Capítulo I: página 5 à página 12. Capítulo II: página 18 à página 23.” E assim por diante, capítulo a capítulo do livro até chegar ao tópico dos Invertebrados no Capítulo VII, cuja principal característica é a ausência de espinha dorsal.
“ O Capítulo VII, da página 70 a ...”
Neste momento, um dos alunos interrompe Frei Beno em sua enumeração:
“ Professor!”
Todos olham para trás e vêem o Wainer, um estudante magro e alto, procurando dar uma de entendido.
“ Professor, para facilitar o nosso estudo, eu poderia trazer alguns espécimes de invertebrados ao vivo que meu pai Evandro Ávila “Vandico” coleciona em sua fazenda.”
De fato, “Vandico” era um dos que enriquecera o Museu de História Natural.
“ Como assim, meu filho?”
“ Temos em vidros, lá em casa, lesma, caracóis, caranguejos, minhocas, aranhas, besouro, lacraia, borboleta, formiga, joaninha... Certa feita, papai chegou até a despachar para o Vaticano uma cobra coral.”
“ No seu caso, meu filho, não precisa trazer nenhum vidro: é só trazer seu espelhinho.”
No segundo caso, os alunos do Ginásio costumavam sair em desabalada carreira, ao soar do sino ao meio-dia, para dirigirem-se ao refeitório.
“ Quem chega cedo bebe água limpa”, diziam.
Tinham antes que aguardar o término da Ave Maria. O professor se persignava e rezava:
"Ave Maria, cheia de graça..."
Ao que os alunos respondiam: "Santa Maria, mãe de Deus..."
Em determinado ano, a turma de que trato tinha aulas numa espécie de anfiteatro em que as carteiras de madeira estavam dispostas sobre um estrado também de madeira. À frente e à direita do professor, entre o estrado e as janelas, havia acesso ao corredor externo através de uma porta dos fundos. Os alunos mais afobados, que se sentavam nas carteiras do fundo e, portanto, mais altas em relação ao professor, optavam por essa porta dos fundos, porque queriam evitar o caminho para a porta da frente, mais demorado devido à fila que se formava no final da aula. O caminho mais direto consistia em, lá de cima do estrado, bater com a mão direita na parede, pular para o acesso à porta dos fundos e sair correndo rumo ao refeitório.
Dois desses alunos, os maiores da classe, e também os mais ansiosos, treinaram a bater a mão na parede entre duas janelas e a cair perfeitamente em pé lá embaixo, já à porta de saída, chegando primeiro ao refeitório, seguidos pelos retardatários.
Em determinado dia, tocou a sineta. Frei Beno não rezou, nem dispensou a turma para sua ida ao refeitório. Lentamente subiu até o alto do estrado, seguido pelo olhar de todos os alunos, e caminhou até próximo à parede. Ali, parou, observando a mancha ensebada de mãos. Voltando-se para os alunos, saiu-se com esta:
“ Pelo tamanho da lambança dá para identificar os porcos do chiqueiro.”
Para aumentar ainda mais a afinidade entre os presentes, foi proposta uma projeção de fotografias que fazem parte do acervo de Luiz Antônio Ferreira, funcionário do SETEC da UFSJ-Universidade Federal de São João del-Rei. Pudemos apreciar desta forma as maravilhas registradas pelas câmeras de pessoas, que há muito nos deixaram, entusiasmadas com o brilho que viam e que julgavam digno de também ser visto pelos pósteros. Durante a projeção, todos trocaram doces impressões e re-cordações. Foram especialmente bem-vindas as explicações dadas por Abgar e Luiz Antônio.
Após a projeção, Murilo Cabral comunicou a todos os presentes que naquela data estava sendo criada a Associação de Ex-alunos do Ginásio Santo Antônio e contava com a presença de todos os presentes nas próximas reuniões trimestrais. Pedia-lhes portanto para assinar um livro de presença e anotar o período em que cursaram no educandário são-joanense e todos os dados que julgassem interessantes para sua perfeita identificação.
Enquanto falava sobre a importância do Ginásio Santo Antônio para a história e cultura locais como agente de educação e local de transmissão e difusão de conhecimentos, técnicas e valores éticos, Attila Godoy pediu um aparte, que lhe foi prontamente concedido, iniciando assim a sua fala:
“Aproveito a oportunidade de estarmos aqui reunidos para expor brevemente o que penso sobre o papel que tiveram e têm importantes lideranças locais que passaram pelas carteiras das salas de aula do Ginásio Santo Antônio no destino da educação em nossa terra. Hoje nossa cidade seria impensável sem o concurso da UFSJ-Universidade Federal de São João del-Rei. Essa nossa instituição federal de ensino superior hoje mantém “campi” avançados em Ouro Branco, Divinópolis e Sete Lagoas e é uma das cinco mais bem avaliadas no Enade em 2006.
Acho que não se pode falar de UFSJ, sem antes se citarem:
1. a Fundação Universitária Municipal de São João del-Rei, instituída em 1970, tendo o seu nome corrigido para Fundação Municipal de São João del-Rei em setembro de 1973
2. a FUNREI-Fundação de Ensino Superior de São João del-Rei, instituída em 1986, resultado da federalização de duas instituições de ensino superior reunidas, a saber:
a FDB-Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras e a Fundação Municipal de São João del-Rei que então era mantenedora da FACEAC-Faculdade de Ciências Econômicas, Administrativas e Contábeis e da FAEIN-Faculdade de Engenharia Industrial. Da confiança do Dr. Milton Resende Viegas (Presidente da Fundação Municipal de São João del-Rei) e do Pe. Décio Zandonade (que assinou pela Inspetoria São João Bosco), ficou a seguinte comissão credenciada para cuidar da federalização da FUNREI:
Oyama de Alencar Ramalho, Rogério Carvalho de Godoy, José da Rocha Neto, Nilton Damásio de Paula Santos, Pe. João Duque dos Reis, Magda Mara Assis e Pe. Silvério Ivo Gomes.
A FUNREI foi em 19 de abril de 2002, durante o Governo de Fernando Henrique Cardoso, transformada em UFSJ-Universidade Federal de São João del-Rei.
Não foram poucos os são-joanenses ilustres que participaram de todo esse processo e muitos deles são egressos das carteiras do Ginásio Santo Antônio.
Muitos trabalharam de forma desinteressada, alguns dedicaram uma década de sua vida, embora seus nomes não estejam inscritos nos anais da Instituição, esquecidos nas gavetas dos departamentos, sem a possibilidade de serem re-memorados, já que não existe um órgão responsável pela custódia e manutenção da memória da Universidade.
Inesquecível na construção deste edifício são para nós sobretudo a participação do Dr. Milton Resende Viegas, do Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso, do Júlio Teixeira, do Ronaldo Simões e do Oyama de Alencar Ramalho, dentre outros.
É de lamentar que haja certas lacunas ou certos parênteses na historiografia são-joanense: alguns nomes de personalidades ilustres não podem ser citados e constituem verdadeiros “anátemas”.
Não devemos mais permitir que isso ocorra em nossa cidade.
Minha proposta é que este nosso grupo constitua uma Comissão para encaminhar o assunto da criação desse órgão junto ao Reitor Helvécio Luiz Reis. O referido órgão terá a função de reunir toda a documentação, que hoje se encontra esparsa ou inacessível, referente à Fundação Universitária Municipal (de junho de 1970 a setembro de 1973), depois Fundação Municipal (de setembro de 1973 a dezembro de 1986), depois FUNREI (de 23 de dezembro de 1986, quando o Presidente Sarney assinou a Lei 755, que criou a Fundação Federal em nossa cidade até 2002) e atualmente UFSJ (de 2002 até hoje). Meu sonho é que toda essa documentação farta esteja à disposição de professores, estudantes universitários, pesquisadores são-joanenses e de outras cidades brasileiras e de outros países interessados na história da educação de São João del-Rei, nos moldes do Centro Salesiano de Documentação e Pesquisa, o qual centraliza em Barbacena toda a documentação referente aos Salesianos. Dessa forma, será incentivada a produção de teses e livros poderão ser escritos para esses quarenta anos de ensino superior, que se originou a partir da decisão de um Provincial franciscano de doar o terreno e as benfeitorias do Ginásio Santo Antônio para o Estado de Minas Gerais.
Como vocês podem ver, a UFSJ não nasceu do nada em 2002. Há todo um envolvimento de pessoas e fatos, durante pelo menos 32 anos antes, que possibilitou à população de São João del-Rei ser beneficiada com uma Universidade Federal.”
Sua proposta foi unanimente aprovada por todos os presentes.
O Dr. Paulo César de Araújo Rangel, endossando a fala precedente, recomendou ainda que fosse encaminhada ao Reitor da UFSJ a criação de um espaço físico dentro da Universidade, a ser equipado com acervo constituído por documentação de época, bem como livros e artigos referentes tanto às instituições de ensino que precederam a Universidade quanto às pessoas que tiveram papel relevante nesse processo.
Rute Pardini, minha esposa, pediu para contar uma fábula que entendia ser de interesse para o encontro. Todos se puseram a ouvi-la:
"Conta a lenda que uma vez uma cobra começou a perseguir um vaga-lume.
Este fugia rápido no primeiro dia, com medo da feroz predadora e a cobra... nem pensar em desistir.
Fugiu outro dia e ela não desistia.
No terceiro dia, já sem forças, o vaga-lume, vendo que chegara o seu fim, parou e disse à cobra:
— Já que eu vou morrer, poderia antes lhe fazer três perguntas?
— Não costumo abrir esse precedente para ninguém, mas já que vou devorá-lo mesmo, pode perguntar...
— Dona Cobra, por acaso pertenço à sua cadeia alimentar ?
— Não.
— Eu lhe fiz algum mal algum dia?
— Não.
— Então, por que você quer acabar comigo?
— Porque não suporto o seu brilho."
A seguir, comentei sobre a evolução que sofreu a negociação, por parte do Provincial franciscano e do Estado de Minas Gerais, com referência ao destino que seria dado ao Ginásio Santo Antônio. Consta que os negociadores procuravam uma saída para o impasse: uma alternativa seria o Estado restaurar o prédio para abrigar um Colégio Estadual, sob a administração dos freis franciscanos. O resultado, contudo, foi outro: a Escola Estadual Cônego Osvaldo Lustosa foi instalada no Morro do Guarda-Mor e os freis tiveram que abandonar suas clausuras. Consta ainda que os freis contaram com o apoio financeiro de um ex-aluno interno, apelidado “Maritaca”, que era proprietário de muitos imóveis em São João del-Rei. Para o projeto arquitetônico e construção do novo convento próximo ao portão de entrada foi contratado o engenheiro José Norberto Esteves, dono da Construtora Sanjoanense.
Restam evidentes o destino e as transformações que foram dadas ao educandário são-joanense, após a referida doação ao Estado de Minas Gerais, pelos franciscanos, de um régio patrimônio, constituído por terrenos e benfeitorias, em troca de uma indenização de trezentos mil cruzeiros devida aos professores e funcionários do educandário. Se aos franciscanos devemos atribuir a glória de terem dado o melhor de si e de seus esforços para a construção da educação em São João del-Rei, maior glória ainda lhes cabe no momento histórico da transferência definitiva do Colégio Santo Antônio para Belo Horizonte, num sinal claro dos votos de pobreza que professaram, tendo feito uma negociação em que evidentemente o maior beneficiário foi a cidade de São João del-Rei (representada pelo Estado de Minas Gerais). É fato sobejamente conhecido que o Provincial da Província de Santa Cruz, Frei Erardo van Veen o.f.m., em 10 de março de 1970, fez a referida doação ao Estado de Minas Gerais, possibilitando que o prédio do ex-Ginásio Santo Antônio fosse usado pela Prefeitura de São João del-Rei para ali instalar a Fundação (Universitária) Municipal, o primeiro embrião de uma Universidade Federal.
Sem o gesto tresloucado desse Provincial, contrariando inclusive a maioria dos freis holandeses da Província, não teríamos hoje como nos orgulhar de nossa Universidade.
* Francisco José dos Santos Braga, cidadão são-joanense, tem Bacharelado em Letras (Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras, atual UFSJ) e Composição Musical (UnB), bem como Mestrado em Administração (EAESP-FGV). Além de escrever artigos para revistas e jornais, é autor de dois livros e traduziu vários livros na área de Administração Financeira. Participa ativamente de instituições no País e no exterior, como Membro, cabendo destacar as seguintes: Académie Internationale de Lutèce (Paris), Familia Sancti Hieronymi (Clearwater, Flórida), SBME-Sociedade Brasileira de Música Eletroacústica (2º Tesoureiro), CBG-Colégio Brasileiro de Genealogia (Rio de Janeiro), Academia de Letras e Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei-MG, Instituto Histórico e Geográfico de Campanha-MG, Academia Valenciana de Letras e Instituto Cultural Visconde do Rio Preto de Valença-RJ e Fundação Oscar Araripe em Tiradentes-MG. Possui o Blog do Braga (www.bragamusician.blogspot.com), um locus de abordagem de temas musicais, literários, literomusicais, históricos e genealógicos, dedicado, entre outras coisas, ao resgate da memória e à defesa do nosso patrimônio histórico.Mais...
3 comentários:
A influencia cultural dos franciscano holandeses foi marcante em SJDR.Li que um frei descobriu e estimulou a exploração de jazidas de estanho, no inicio do Colegio e a cidade tem hoje uma importante renda mineral destaque nacional.Quando aluno um frei me confidenciou que a ida do colegio catolico para SJDR foi apressada por que os ¨protestantes¨já tinha chegado em Juiz de Fora 1886 Metodista americano Granbery, em Lavras Instituto Presbiteriano Gammon originario da Universidade Federal de Lavras.Neles a Biblia era lida diariamente não tinha muros e ninguem fugia. A Verdade vence.Eles desenvolveram e contunuam e o CSA acabou.Pena que os freis nos permitiram tempo ociosos.Frei Jordano foi meu lider tenho boas lembranças dele.Ele tirou varias fotos nossas que gostaria de vê-las publicadas.Turma de 1967/8.
José Marcos Rocha Ribeiro,BH/MG
[b][i][a] Sou professora de história e estou desenvolvendo um projeto resgatando a memória de Frei Jordano e preciso de muitas informações sobre ele..... vida acadêmica,quando veio para o Brasil e se deixou livros,fotos e outros.Ficaria muito grata se você puder relatar o que sabe sobre ele.
Obrigada Adélia Reis
Estudei no Colégio Santo Antonio. - SJDR ,nos anos 59/60 ,no século passado e encontrei um colega em Vitória/ES onde moro com o nome de Wernek de Ponte Nova ,lembro muito de Mauro Salim ,Minhoca ,Jacaré, Adelino de Melo Freire hoje médico Cardiologista em Lavras Mg ,Tio Antonio de Tres Pontas , Turcão e me lembro muito de Frei Jordano ,Frei Beno ,Tamancão com seu apito no refeitório ,lamentavelmente bons tempos que não voltam mais ,abraço a tos ex alunos.
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